Insurreição
Comunista de 1935
em
Natal e Rio Grande do Norte
Giocondo Dias,
a Vida de um Revolucionário
Nosso
Projeto |
Mapa Natal 1935 | Mapa
RN 1935 | ABC
Insurreição | ABC
dos Indiciados | Personagens
1935 | Jornal
A Liberdade | Livros
| Textos
e Reflexões | Bibliografia
| Linha
do Tempo 1935 | Imagens
1935 | Audios
1935 | Vídeos
1935 | ABC
Pesquisadores | Equipe
de Produção
Giocondo
Dias,
a Vida de um Revolucionário
João Falcão, Agir
1993
Infância
e Mocidade | Filiação
à ANL e ao PCB | Véspera
da Revolução | A
Rebelião de Natal | Junta
Governativa | Três
dias de governo | Jornal
da Revolução | A
Derrocada | A
Fuga | Refúgio
de comunistas
A
fuga
Antes
da debandada, a reserva de dinheiro ainda existente
foi dividida por Praxedes entre os principais
dirigentes do movimento. Ele mesmo relata:
- Aí, eu e Santa percebemos que não
havia mesmo mais nada a fazer. Era só
fugir. Antes, tínhamos que resolver o
problema do dinheiro. Levar todo o dinheiro
não seria possível por causa do
volume das caixas que iria atrapalhar nossos
movimentos. Pensei, então, comigo mesmo,
em incendiar o Palácio, com dinheiro
e tudo lá dentro. Mas achei melhor não
fazer isso. Poderia ser pior ainda. Iriam nos
chamar de incendiários. Achei, então,
que a melhor solução seria distribuir
o dinheiro entre o nosso pessoal. Propus ao
Santa e ele concordou. Colocamos os homens em
forma, em fila por dois, pegamos as caixas de
dinheiro e fomos distribuindo pro pessoal, sempre
dizendo que aquele dinheiro era do Partido,
que eles deveriam usar apenas o indispensável
e guardar o resto porque o Partido poderia precisar
do dinheiro. Não perdemos nada, vamos
continuar. Vamos nos preparar para o futuro,
ia dizendo para o pessoal e distribuindo os
maços de dinheiro. Quando acabou a distribuição,
peguei uma parte e o Santa ficou com a outra.
Eram mais ou menos quatro horas da manhã
do dia 27. Nos despedimos e fomos cada um para
um canto.1
Quanto ao restante que ficou em seu poder, ele
conta que em maio de 1936, no lugar onde estava
escondido, foi procurado por um camarada apelidado
Gaguinho (Manoel Severiano Cavalcante), enviado
pela direção do Partido de Recife.
"Ele me perguntou pelo dinheiro e eu disse
que havíamos distribuído entre o
nosso pessoal. Mandei ele procurar a Virgínia,
minha mulher, que ela poderia lhe dar uma parte
do dinheiro e lhe dizer com quem havia mais. Mais
tarde, o Comitê Central me confirmou que
o Gaguinho trouxera o dinheiro que estava com
minha mulher, com a mulher do motorista Epiphânio
Guilhermino e com outras pessoas."
Na verdade, apenas uma pequena parte do dinheiro
recolhido pelos rebeldes foi efetivamente recuperada
pelas autoridades, cerca de 992 contos de réis.
O restante, ou foi resgatado pelo Partido, ou
ficou em poder dos policiais encarregados da repressão,
após a Insurreição: "-
O dinheiro serviu para corromper a polícia.
Teve muita gente que escapou da cadeia dando dinheiro
aos policiais..."2
Lauro Cortez Lago, José Macedo e João
Baptista Galvão, trajando paletó,
gravata e chapéu, fugiram num automóvel
dirigido por seu proprietário, o chofer
Manoel Justino. Foram para a cidade de Canguaretama,
homiziando-se na casa do Dr. Nizário Gurgel.
Dias depois caíram prisioneiros do major
Elias Fernandes, comandante do destacamento da
Força Pública da Paraíba,
enviado para combater revolucionários do
Rio Grande do Norte. Em poder de José Macedo
foi apreendida a im¬portância de Rs.
210:180$100,00 (duzentos e dez contos e cento
e oitenta mil e cem réis). Os três
foram condenados pelo TSN a penas de dez anos
de reclusão.
O sargento Clementino de Barros fugiu para a cidade
de Baixa Verde, hoje João Câmara,
tendo sido preso no mesmo dia, 27 de novembro.
Em seu poder foi encontrada a quantia de oito
contos de réis, entregue depois ao deputado
estadual João Câmara. Foi condenado
pelo TSN a 14 anos de reclusão.
Ouvido em inquérito Policial Militar, apontou,
em seu depoimento, os nomes dos principais chefes
do movimento. Entre os civis: Lauro Lago, João
Baptista Galvão, José Macedo e José
Praxedes. Quanto aos militares, ele próprio
depoente "a quem avisaram no dia 25 que se
ocuparia da Secretaria da Defesa" - e aqueles
com os quais mantinha relações mais
próximas: os sargentos Eliziel Diniz Henriques,
Sebastião dos Santos, Julião Thomaz
de Aquino e Amaro Pereira da Silva; os cabos Giocondo
Alves Dias, Antônio Baptista da Costa, Gilberto
de Oliveira, Estevão Juvenal Guerra, Adalberto
José da Cunha e João Wanderley,
entre outros. Como soldado cita o nome de Valdemar
Ferreira Coelho.3
No inquérito, Quintino omitiu - provavelmente
para ocultá-Ios - os nomes de dois civis
que tiveram destacada atuação naquele
movimento: João Lopes, o Santa, e Horácio
Valladares, assessores do Comitê Central
do PCB. Ambos conseguiram escapar, e contra eles
não foi aberto nenhum processo no Rio Grande
do Norte.
Dentre os civis, atuaram ainda com destaque: Raimundo
Reginaldo da Rocha, professor; José Aguinaldo
de Barros e João Fagundes, comerciantes;
Epiphânio Guilhermino Maia, chofer; João
Francisco Gregório, estivador, presidente
do sindicato da categoria; Benildes Dantas, estudante;
e de outras profissões, Jaime de Brito,
Manoel Justino, Francisco Braz Leopoldo, Domício
Fernandes Lima e Carlos Vander Linder.4
Entre as mulheres destacaram-se: Leonila Felix
(mulher de Epiphânio), Amélia Reginaldo,
Francisca Alves de Souza, Virgínia Pereira
da Silva (mulher de Praxedes). Todas se fardaram
e atuaram na área militar. Chica da Gaveta
ou Chica Pinote prestou serviços domésticos
na Villa Cincinato.
José Praxedes de Andrade, quinto membro
da Junta, fugiu para Pajuçara, no interior
potiguar, permanecendo escondido no mato durante
seis meses. Daí, andando sempre à
noite, alcançou Nova Cruz, na fronteira
da Paraíba, onde conseguiu tomar um trem
que o levou a João Pessoa. Depois, chegou
de ônibus a Recife, deslocou-se para Maceió
e terminou sua via crucis em Salvador. Condenado
à revelia, impuseram-lhe oito anos de reclusão,
pena que jamais cumpriu.
João Lopes, o Santa, assessor do Comitê
Central, conta que antes de fugir foi procurar
o Valladares, "que era o nosso chefe de polícia
e era quem dava passaporte para quem quisesse
ir embora; e ele tinha sumido. Aí eu disse:
fracassamos. Às cinco da manhã fui-me
embora. Saímos em dois automóveis
do governo. Num o chofer era Lauro, e iam dois
primos seus. No outro, o chofer era Zé
Pretinho, e fomos eu, minha mulher e um garoto
de Pernambuco. Eu e ela levamos quinze dias no
mato. Largamos o automóvel, seguimos a
pé, e eu mandava ela pedir comida."5
Finalmente, João Lopes foi preso em Pernambuco
e levado para a cadeia de Recife; aí ficou
mais de um ano. Solto com a Macedada, em sete
de junho de 1937, viajou logo depois para o Rio,
onde novamente se ligou ao Partido. Nunca voltou
a ser preso.
Horácio Valladares, outro assessor do Comitê
Central, fugiu sem deixar qualquer pista. Não
foi processado.
Após deixar a salvo os oficiais presos
e ordenar a debandada no quartel, Giocondo deu
início a uma fuga rocambolesca. Primeiramente
homiziou-se na casa de um tio de Lourdes, Antônio
Tavares de Souza, que residia à Rua Marechal
Floriano, no bairro de Petrópolis, defronte
da cadeia pública. Ali permaneceu uma semana.
Depois, D. Alzira Floriano, viúva, ex-prefeita
de Lages – a primeira mulher no Rio Grande
do Norte a assumir esse cargo levou-o para a Vila
Jardim do Angico, situada naquele município.
Fazendo uma mudança arriscada – escondendo-o
na carga de um caminhão –, D. Alzira
deixou-o na fazenda Primavera, de propriedade
do advogado Paulo Teixeira, seu irmão.
Nesse refúgio, Dias permaneceu mais de
quatro meses, ficando a salvo das autoridades
policiais, apesar da caça inclemente feita
aos comunistas e implicados no levante de novembro.
Lourdes foi visitá-Io mais de uma vez.
Entretanto, um surpreendente e sinistro acontecimento
veio abalar sua tranqüilidade naquele esconderijo:
uma intriga de caráter amoroso envolveu-o
com a mulher do seu anfitrião, que reagiu
passional e violentamente, mandando três
capangas vingá-Io. Apunhalado muitas vezes,
Dias escapou por milagre, graças à
intervenção do comerciante Genésio
Cabral de Macedo. Mas, denunciado, foi preso pelo
delegado, capitão João Pedro, e
levado - quase morto - para a Casa de Detenção.
Era abril de 1936.
Os cuidados e a dedicação de sua
mulher Lourdes, de sua sogra, D. Maria Emília
Tavares, e da viúva, que lhe proporcionaram
assistência médica e boa alimentação,
foram providenciais para a rápida recuperação
de Giocondo. Ajudaram-no também sua compleição
atlética e sua juventude.
Permaneceu no presídio pouco mais de um
ano. Aí recebeu, em outubro, a notícia
do nascimento de sua filha, que só veio
a conhecer seis meses depois. Chamava-se Ana Maria,
o mesmo nome da avó paterna. Lourdes sabia
quanto essa homenagem lhe agradaria, principalmente
nas circunstâncias em que ele se encontrava.
Enquanto corriam centenas de processos, com as
cadeias repletas, e as autoridades procuravam
recuperar o dinheiro distribuído pela Junta,
fato que suscitava as mais variadas especulações,
Giocondo cuidava de sua saúde e elaborava
um plano para sair da prisão. Nesse ínterim
as condições políticas do
país foram se modificando com a perspectiva
das eleições, marcadas para janeiro
de 1938. A campanha pela anistia, a reorganização
dos partidos e a propaganda eleitoral para os
candidatos à Presidência da República,
José Américo de Almeida e Armando
de Sales Oliveira, agitavam o país. O novo
ministro da Justiça, José Carlos
de Macedo Soares, considerando a incompatibilidade
de uma campanha eleitoral com a existência
de milhares de presos políticos sem processo
formado, decidiu libertá-Ios. Este gesto
configurou uma alvorada que fez exultar a todo
o Brasil, ficando conhecida como a Macedada, anistia
provisória decretada a 27 de junho de 1937.
As prisões abriram-se e Giocondo foi posto
em liberdade.
Ele previa, entretanto, que esta não duraria
muito. Estava sendo processado pelo Tribunal de
Segurança Nacional, tribunal de exceção
recém-criado para julgar os implicados
no mo¬vimento de 1935. Estava livre, mas,
para onde ir? Giocondo não teve dúvida:
Salvador, para perto de sua família.
Com a ajuda da sogra, que lhe comprou roupas e
uma passagem, embarcou no porto de Natal. Ainda
muito fraco, contou com a solidariedade e a dedicação
de um leal companheiro, o cabo Valverde, que o
acompanhou e cercou de cuidados durante a viagem.
Sob o risco de ser preso pela temível polícia
política pernambucana, Valverde saltou
no porto de Recife para comprar leite, alimento
necessário a Giocondo e que não
existia a bordo.
Notas:
1
- Moacyr de Oliveira Filho. Ob. cit., p. 77.
2 - Id., ibid.
3 - João Medeiros Filho.
Ob. cit., p. 23.
4
- Moacyr de Oliveira Filho. Ob. cit., p. 77.
5 - Giocondo Dias. Ob. cit., p.
156.
^
Subir
Infância
e Mocidade | Filiação
à ANL e ao PCB | Véspera
da Revolução | A
Rebelião de Natal | Junta
Governativa | Três
dias de governo | Jornal
da Revolução | A
Derrocada | A
Fuga | Refúgio
de comunistas
<
Voltar
Nosso
Projeto |
Mapa Natal 1935 | Mapa
RN 1935 | ABC
Insurreição | ABC
dos Indiciados | Personagens
1935 | Jornal
A Liberdade | Livros
| Textos
e Reflexões | Bibliografia
| Linha
do Tempo 1935 | Imagens
1935 | Audios
1935 | Vídeos
1935 | ABC
Pesquisadores | Equipe
de Produção
História
dos Direitos Humanos no Brasil
Projeto DHnet / CESE Coordenadoria Ecumênica
de Serviço
Centro de Direitos Humanos e Memória
Popular CDHMP |
|
|
|
|