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Insurreição Comunista de 1935
em Natal e Rio Grande do Norte

Giocondo Dias, a Vida de um Revolucionário

 

 

 

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Giocondo Dias,
a Vida de um Revolucionário

João Falcão, Agir 1993

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A derrocada

Na quarta-feira, dia 27, às onze da noite, alguns membros da Junta estavam reunidos no Palácio, quando chega um emissário do Quintino com um telegrama enviado pelo comando das forças legalistas no Recife, o qual apresentava o seguinte teor: “A fim de não derramar precioso sangue de nossos irmãos, deponham armas. Já consolidamos nossas posições em Recife. Amotinados foram presos. Estamos vitoriosos."1

Com os membros da Junta encontravam-se os assessores João Lopes, o Santa, e Horácio Valladares, além dos influentes próceres João Fagundes e José Aguinaldo de Barros.

João Lopes, o Santa, achou que deveriam reagir, utilizando os prisioneiros para romper com o cerco de Dinarte Mariz e formar colunas de guerrilheiros pelo interior.

Uns dez minutos depois da saída do estafeta, chega ao Palácio o secretário de organização do Partido, José Costa que chefiava o controle das forças revolucionárias no cais com a notícia de que três caminhões haviam chegado ao porto trazendo soldados armados e prisioneiros a serem embarcados nas corvetas mexicanas.2

Ao mesmo tempo, os chefes do movimento foram informados de que as tropas do 22º Batalhão de Caçadores, sediado na Paraíba, deslocavam-se para Natal, e que os batalhões do interior haviam sido derrotados na Serra do Doutor. Isso possibilitaria a Dinarte Mariz atacar Natal com o apoio da policia paraibana. Todos perceberam, então, que não havia condições para a resistência. Mas os chefes militares anteciparam-se, e uma das primeiras providências foi a segurança da oficialidade e de algumas autoridades presas no quartel. Transferiram-nas para uma esquadrilha de guerra mexicana que se encontrava fundeada nas águas do Potengi, sob o comando do capitão de corveta Hector Mexueiro. Ai já estavam homiziados autoridades, politicos e pessoas da sociedade. Era a madrugada de 27 de novembro de 1935.

Participaram daquela operação salvadora, além de Giocondo, que a chefiou, os sargentos Amaro Pereira e Cláudio Dutra; os cabos Antônio Baptista da Costa, Adalberto José da Cunha, João Leite Gonçalves, Erasmo Lacerda, José Pontes e o músico Joaquim Neves.3 O sargento Quintino estava de acordo.

Essa medida não foi aceita pela Junta, que a recebeu com surpresa e indignação. Ao obter essa informação, Praxedes decidiu ir até o quartel do 21º BC para ver o que estava acontecendo. Quando lá chegou, encontrou o Quintino em pé, com uma metralhadora no ombro, quase dormindo. Estavam todos exaustos. Ninguém dormiu praticamente nada durante todos esses dias e o Quintino, praticamente sozinho, controlou a situação no quartel o tempo todo. Quando o viu, Praxedes foi logo perguntando:

- Quintino, o que está acontecendo? Ele respondeu: - Você recebeu o telegrama? - Recebi, mas o que é que há? retrucou. Então ele me disse: - Giocondo fugiu do hospital, chegou aí todo nervoso. Foi lá, conversou com os presos e disse que nós precisávamos tomar uma medida para lhes garantir a vida porque eles poderiam ser assassinados. Ele disse que havia prometido aos presos que nada lhes aconteceria e que, então, havia assumido o comando e liberado aos prisioneiros.4

Para Giocondo, "com essa medida eles mataram dois coelhos com uma cajadada só; ao mesmo tempo em que retardavam a possibilidade de persegui-Ios, estavam garantidos contra qualquer vingança que se tentasse fazer contra eles, que estavam apavorados, certos de que iam ser massacrados".5

De fato, havia surgido nas hostes revolucionárias, entre os civis mais exaltados, uma articulação para o fuzilamento dos presos. Naquele momento, o cabo Giocondo agiu com muita determinação, para evitar uma chacina, assumindo uma posição corajosa e oportuna contra o desejo da maioria da Junta Governativa e da direção do Partido. Foi um gesto de excepcional sabedoria política para um jovem cabo de apenas 22 anos de idade. Sua longa trajetória no PCB havia começado com a marca do autêntico revolucionário.

O ex-tenente Luiz Abner de Souza Moreira, 86 anos, re¬sidente no Rio de Janeiro, é provavelmente a única testemunha, entre a oficialidade do 21º BC, do levante desse Batalhão, em 1935. Em carta dirigida ao autor, ele dá o seguinte depoimento a respeito da participação do cabo Giocondo Dias naquele movimento armado:

"Em 1935 servia no 2º Regimento de Infantaria, R.J., quando a 27 de maio, do mesmo ano, fui por necessidade do serviço, transferido para o 21º Batalhão de Caçadores, sediado na cidade de Natal, estado do Rio Grande do Norte. A cinco de outubro, do mesmo ano, apresentei-me ao 21º BC, pelo motivo de minha transferência e fui classificado na lã Companhia de Fuzileiros: a oito de outubro assumi as funções de comandante da sub-unidade.

A "Intentona de 1935 em Natal" irrompeu às 19 horas do dia 23 de novembro, sábado, prolongando-se até às primeiras horas do dia 27, do mesmo mês. A maior parte dos militares rebelados (" chefes") era de sargentos da banda de música.

Nenhum oficial tomou parte na "Intentona de 1935 em Natal", - nem como chefe, nem como colaborador. Sei que um tenente do Quadro Auxiliar de Oficiais (QAO) foi convidado a chefiá-Ia, mas, não aceitou tal incumbência.

O cabo Giocondo Dias foi elemento de real destaque durante a "Intentona".

O oficial de dia ao quartel e o mestre da Banda de Música foram presos no Cassino dos Oficiais: eles lá estavam quando o movimento foi deflagrado.

Foi num sábado. Estava no centro da cidade, juntamente com o primeiro-tenente Ivo Borges da Fonseca Neto, quando vimos soldados, aparentemente sem comandos, armados, caminhando pelas ruas. Interpelando as aludidas praças, tivemos conhecimento que o 21º BC havia se rebelado. Eu e o tenente Ivo, em trajes civis, desarmados, resolvemos ir ao quartel; consegui entrar, pelo portão principal, dirigindo-me à lª Companhia; então fui preso e conduzido ao Cassino dos Oficiais.

Durante os dias 23, 24, 25 e 26 de novembro conversei com o cabo Giocondo (pertencente à 1ª Companhia de Fuzileiros), várias vezes. O assunto principal de nossa conversa girava sempre no sentido dos militares rebelados não permitirem aos comunistas (civis), serem os únicos senhores do poder de decisões.

No dia 26 de novembro tomei conhecimento, por intermédio do cabo Giocondo, da transferência dos "prisioneiros" para as corvetas mexicanas. Quem decidiu nos levar para as corvetas foi o cabo Giocondo, que sempre tratou os "prisioneiros" respeitosamente: ele demonstrou ser um chefe digno.

Asseguro-lhe que o cabo Dias foi a peça principal da "Intentona de 1935 em Natal."

 

Notas:

1 - Moacyr de Oliveira Filho. Ob. cit., p. 77.

2 - Id., ibid.

3 - João Medeiros Filho. Ob. cit., p. 23.

4 - Moacyr de Oliveira Filho. Ob. cit., p. 77.

5 - Giocondo Dias. Ob. cit., p. 156.

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