SUSP
Sistema Único de Segurança
Pública Estados
Arquitetura
institucional do SUSP
CAPÍTULO
2
Controle
Externo e Participação Social
1.
A Exigência Constitucional de Participação Social e Controle Externo
A
Constituição Federal de 1988, entre outros méritos, cuidou de devolver
à população brasileira os instrumentos e mecanismos institucionais de
participação social e de controle externo sobre a atividade do Estado,
completamente obstruídos pelo golpe militar de 1964.
Logo
no artigo primeiro, a Constituição acolhe, com todas as letras, o princípio
da participação direta dos cidadãos na gestão pública.
Não
satisfeito, o constituinte inseriu vários dispositivos que insistem no
mesmo sentido de garantir o controle social sobre a atividade estatal,
quer através da “participação da comunidade” na política da saúde (art.
198), ou da “gestão democrática”, no ensino público (art. 206), ou “por
meio de organizações representativas, na formulação das políticas e no
controle das ações em todos os níveis”, na política de assistência social
(art.204). São apenas alguns exemplos de como a Lei Maior procurou reabrir
os canais institucionais de ligação entre a sociedade civil e o Estado
e facilitar, para a cidadania, o acesso aos mecanismos de controle do
Poder Público, modificando radicalmente a situação criada pelo regime
militar no Brasil, em que “a cidadania era uma difusa sombra regulada
pelo Estado, não participando nem exercendo sobre ele qualquer controle”,
como bem observou Camargo e Gomes.1
Apesar
disso, é preciso reconhecer que nem todas as portas foram abertas e que
alguns setores, justamente os mais estratégicos, os que constituem o núcleo
mais duro da organização estatal, ainda continuam hermeticamente fechados
e resistentes a qualquer tipo de controle por parte da cidadania. A segurança
pública, sem dúvida, é um deles.
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2.
Controle Externo: A Amplitude Conceitual Adotada pelo Plano Nacional de
Segurança Pública
Ao
ressaltar a necessidade de transformações profundas das instituições policiais
brasileiras, de seus valores fundamentais, de sua cultura profissional
e de seus padrões de comportamento, o Plano Nacional de Segurança Pública
assevera que, em um contexto democrático, a estrutura policial somente
será eficaz se houver participação da cidadania no planejamento, na fiscalização
e na correição das atividades de segurança.
Como
se vê, o Plano adota um conceito bastante amplo de controle social, preconizando
para a sociedade civil, na política de segurança pública, papel bem mais
significativo que simples depositária de queixas e reclamações. A cidadania,
pelo contrário, deve estar sempre presente controlando o cumprimento de
metas, a lisura administrativa e, sobretudo, a justiça na aplicação de
medidas punitivas contra os atos de abuso de poder e de violência praticados
por servidores e agentes da segurança.
Segundo
o Plano, ao controle externo está reservado papel extremamente importante
na preservação dos objetivos da política democrática de segurança pública,
na identificação dos obstáculos que dificultam ou prejudicam a realização
dessa política e na prescrição das medidas corretivas para assegurar os
resultados almejados.
O
Plano reconhece as dificuldades existentes hoje no País: faltam informações,
faltam dados qualitativos e consistentes e, como conseqüência, o mundo
policial permaneceinacessível à população e aos próprios gestores da segurança
pública, em todos os Estados, impossibilitando qualquer exercício real
de participação no planejamento e de acompanhamento crítico e meticuloso
dos métodos aplicados e das intervenções realizadas pelos órgãos de segurança.
A
cidadania, nessas condições, não dispõe de informações e de meios para
fazer cobrança de resultados, aferir cumprimento de metas ou exigir programas
de prevenção ao crime.
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3.
Visibilidade, Transparência e Acesso
O
Plano lembra, então, a necessidade de se investir na criação de ferramentas
e de instituições de controle externo da atividade policial.
Como
controle social depende de informações, antes de qualquer outra coisa,
é necessário garantir os meios ou instrumentos que possibilitem à sociedade
ter acesso a todo um conjunto de dados e informações capazes de medir,
de quantificar e de avaliar o desempenho policial.
A
idéia é permitir um tipo de controle bem mais amplo e preventivo que a
mera identificação de falhas e de culpados. Um controle que se aproprie
de todas as informações que possibilitem a adoção de medidas, sobretudo
preventivas, que reduzam a criminalidade e a violência e aumentem a segurança
da população.
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Instrumentos
de Controle
Com
o objetivo claro de eliminar toda a documentação burocrática e desnecessária
e facilitar a utilização rápida de dados indispensáveis ao exercício do
controle, o Plano propõe expressamente:
-
A criação de um banco de dados nacional;
-
A substituição de livros e papéis por técnicas de informatização;
-
A criação de uma rede virtual;
-
A uniformização dos padrões de coleta das informações e das categorias
criminais;
-
A utilização da técnica do geoprocessamento das ocorrências policiais.
Instituições
de Controle
Além
dos instrumentos de controle, o Plano nacional prevê, também, a necessidade
da criação e do fortalecimento de instituições especificamente voltadas
aos organismos controladores da atividade policial.
Depois
de lembrar a importância do Ministério Público nessa tarefa, o Plano propõe
expressamente a criação de Ouvidorias de Polícia - na polícia federal
e nos Estados -, autônomas e independentes, como canais institucionais
da população e elo permanente de controle social das polícias, com atribuições
de fiscalização e investigação.
Na
esfera local, as propostas são de criação de Comissões Civis Comunitárias
de Segurança Pública, voltadas para favorecer a participação dos cidadãos
locais e para a articulação dos órgãos locais de prestação de serviços
de segurança. Essas Comissões Comunitárias teriam a finalidade de:
-
Aproximar polícia e comunidade;
-
Aprimorar medidas de prevenção;
-
Elevar o grau de consciência da comunidade sobre os problemas da segurança.
Finalmente, importante registrar que, para o enfrentamento específico
dos casos de violência doméstica, violência de gênero e violência
contra minorias, o Plano propõe a criação de Centros de Referência
contra o racismo, a homofobia, e de proteção aos idosos, à criança
e adolescentes e às mulheres, Centros estes baseados na idéia de participação
social, de diálogo com os policiais e de controle externo da ação
policial.
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4.
Instituições de Controle da Atividade Policial
O
controle da atividade policial no Brasil atualmente, a exemplo do que
ocorre em outros países, é exercido por diversos órgãos, alguns deles
criados especificamente com esta finalidade e outros que o exercem dentro
de um círculo amplo de atribuições. Existem organismos internos e externos
à própria polícia com a função de controlá-la. O controle interno geralmente
é exercido por um órgão específico, que na maioria dos Estados costuma
ser a Corregedoria. Encontramos Estados que têm uma única Corregedoria,
tanto para a Polícia Civil quanto para a Militar e Estados que têm uma
Corregedoria para cada Polícia. Em alguns Estados a função corregedora
é centralizada, em outros descentralizada, seja em relação ao órgão que
a exerce, seja em relação à descentralização espacial (existência
de “núcleos de corregedoria nas diversas regiões do Estado”).
O
controle externo, por sua vez, é exercido por vários órgãos de naturezas
diversas. Dentre eles, encontramos órgãos governamentais, entidades da
sociedade civil e até mesmo a imprensa que, apesar de modo não sistemático,
constitui-se em mecanismo eficaz no controle da atividade policial (embora,
geralmente, o faça pontualmente e a partir de casos concretos, de maneira
reativa).
Como
mencionado, os órgãos que exercem controle externo da polícia o fazem
de maneira inclusiva – quando o exercício se dá em conjunto com outras
atribuições – ou exclusiva – quando têm por finalidade específica o exercício
do controle externo da atividade policial.2 Dentre os primeiros estão
incluídos o Ministério Público, o Poder Legislativo e o Poder Judiciário
(órgãos governamentais/mecanismos institucionais), os partidos políticos
e as organizações da sociedade civil. Exercem controle externo exclusivo
as Ouvidorias de Polícia e conselhos de segurança criados pelo Poder Público
e que possibilitam a participação da comunidade na gestão da segurança
pública.
Esse
trabalho concentrar-se-á essencialmente no exercício do controle externo
da polícia pelo Ministério Público e pelas Ouvidorias de Polícia – o primeiro,
órgão constitucionalmente atribuído da função e as segundas, mecanismos
modernos que vêm sendo implementados nos Estados a partir da segunda metade
da década de 1990 e que têm como característica essencial servirem de
espaço institucional da sociedade civil no exercício do controle externo
da atividade policial.
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5.
As Ouvidorias de Polícia
As
Ouvidorias de Polícia começaram a surgir, em alguns Estados da Federação,
na segunda metade dos anos noventa, como decorrência do fortalecimento
da organização social e da falta de credibilidade da população no rigor
e na imparcialidade dos órgãos correcionais internos da própria polícia.
São
conhecidas as dificuldades que estas Ouvidorias tiveram que enfrentar
– e ainda enfrentam – para conseguir se instalar, começar a funcionar,
atender minimamente à população, documentar as denúncias e reclamações,
requerer e acompanhar providências apuratórias, ter acesso à documentação
e informações oficiais e dar alguma satisfação ao reclamante ou ofendido.
Apesar
dessas resistências, geradas no interior do próprio poder público, as
Ouvidorias ganharam a confiança da população, ampliaram a voz dos queixosos,
colocaram em evidência a má qualidade dos serviços públicos prestados
nas repartições policiais, chamaram a atenção para as deficiências da
política de segurança dos Estados, bem como das condições precárias de
trabalho dos policiais.
A
população sentiu-se mais a vontade com as facilidades de acesso às Ouvidorias,
sem a necessidade de intermediações e deslocamentos onerosos, sem exigências
formais. Na maioria dos casos, basta um simples telefonema: nem mesmo
a presença física do denunciante é exigida.
Apesar
do pouco tempo de funcionamento efetivo e das diferenças de atuação entre
as Ouvidorias dos diferentes Estados, elas conseguiram demonstrar que
podem aumentar consideravelmente as possibilidades de participação social
e de fiscalização da atividade policial no país.
Na
visão do planejador Nacional, controle externo é atributo da cidadania,
o que torna inaceitável e ilógico qualquer vínculo hierárquico ou de subordinação
com o poder controlado. O controle externo, como o próprio nome sugere,
não faz parte da polícia, não tem poderes de polícia, não é polícia, nem
deve se investir de atribuições próprias da polícia.
São
conhecidas as limitações legais e constitucionais em vigor, mas isso não
quer dizer que as Ouvidorias não possam fiscalizar e investigar a procedência
ou não de denúncias, de representações ou de reclamações encaminhadas
por qualquer pessoa ou entidade que se sinta desrespeitada ou ofendida
pela atuação ou falta de atuação policial.
Ao
controle externo, para que seja efetivo, tem que ser garantido o acesso
a todas as informações e documentos relativos à atuação policial, aos
laudos periciais, aos procedimentos adotados, às explicações ou justificativas
das autoridades pelos episódios questionados para que possa acionar a
autoridade competente para sanar omissões ou corrigir ilegalidades ou
abusos de poder praticados pela polícia. Controle externo é atividade
de fiscalização, de inspeção, de investigação e vigilância em relação
à atuação da instituição controlada. É bem mais, portanto, do que simplesmente
receber denúncias e reclamações e aguardar, de modo passivo eventuais
providências reparadoras.
Para
que o controle externo exercido pelas Ouvidorias possa ser viabilizado,
esses órgãos precisam de um aparato legal que os legitimem e os coloquem
numa posição de neutralidade, independência e autonomia em relação aos
Governos Estaduais e não na condição de simples órgãos de assessoramento,
dentro da estrutura das secretarias de segurança pública. Isso implica
a adoção de medidas que possibilitem a superação de suas limitações legais
e operacionais e a ampliação do seu campo de atuação e do conjunto de
atribuições com que foram inicialmente concebidas.
Nesse
sentido, a primeira medida que se impõe é a criação de Ouvidorias de Polícia
em todos os Estados e o fortalecimento das existentes, garantindo que
a indicação para o cargo de ouvidor seja feita com a participação de
representantes da sociedade civil organizada, bem como que tenha um
mandato por tempo predeterminado. Para o funcionamento e estruturação
mínimos das Ouvidorias é necessário:
-
Dotação de recursos materiais e corpo de funcionários próprio que não
sejam policiais; com orçamento que possibilite a aquisição e manutenção
de suas instalações, serviços, sistema informatizado e demais atribuições;
-
O desenvolvimento de sistema informatizado para recebimento das denúncias,
seu processamento e acompanhamento;
-
A capacitação dos funcionários para o atendimento ao denunciante, recebimento,
acompanhamento
e processamento das denúncias;
-
Criação de um banco de dados próprio que contenha as informações sobre
policiais e possibilitem cruzamento de dados para identificar melhor
os policiais agressores;
-
Integração e cooperação entre Ouvidoria e Ministério Público;
-
Divulgação institucional do trabalho da Ouvidoria em órgãos públicos;
em especial através de relatórios de suas atividades;
-
Acesso aos dados de criminalidade e de ocorrências criminais da Secretaria
da Segurança Pública;
-
Participação em reuniões e comissões especiais da Secretaria de Segurança
Pública que visem ao aprimoramento das Políticas de Segurança Pública;
-
Acesso aos bancos de dados, cadastros, registros, processos ou fichas
disciplinares das polícias civil e militar que contenham informações
sobre os antecedentes dos policiais;
-
Realização de pesquisas pela própria equipe das Ouvidorias e em parcerias
com fundações, ONGs e universidades;
-
Realização de audiências públicas descentralizadas;
-
Realização de reuniões e encontros de minorias, a exemplo dos centros
de referências, com a finalidade de aproximar a polícia e esses grupos
minoritários que, muitas vezes, são vítimas preferenciais da violência
policial.
No
mesmo sentido, visando a institucionalizar e fortalecer o papel das Ouvidorias,
a SENASP, junto com o Fórum Nacional de Ouvidores de Polícia, poderia:
-
Instalar e fazer funcionar a Ouvidoria da Polícia Federal.
-
Definir parâmetros gerais e comuns para o funcionamento das Ouvidorias
e estabelecer critérios apropriados e compatíveis de classificação e
tratamento das informações coletadas.
-
Incluir, através dos gabinetes de gestão integrada, as Ouvidorias como
um dos públicos privilegiados de utilização das informações do Sistema
de Gestão da Informação do SUSP.
-
Facilitar o intercâmbio entre as Ouvidorias, de estudos, relatórios,
práticas e experiências de controle da atividade policial. Mesmo admitindo
que todas possam aprender e evoluir com a experiência dos outros, cada
uma deverá criar seus mecanismos e estratégias locais de controle, levando
em conta as peculiaridades de cada local, de cada Estado.
-
Elaborar e divulgar material didático sobre as funções que este tipo
de entidade pode desempenhar, com uma indicação dos requisitos mínimos
para um funcionamento eficaz.
Carências
materiais atualmente existem – faltam verbas, faltam recursos, equipamentos,
funcionários, falta quase tudo –, mas é ilusório e impensável acreditar
que tudo isso logo será resolvido. De resto, essa é a mesma situação de
precariedade constatada na maioria das repartições policiais, situação
que perdura há muito tempo.
Assim,
mesmo com essa falta de recursos e de perspectivas imediatas de melhora,
as Ouvidorias têm que priorizar e investir toda a sua criatividade e empenho
para:
-
Continuar a receber e registrar as reclamações individuais. As denúncias
são excelentes fontes de informações. O monitoramento de casos individuais
demanda muito tempo, é certo, mas permite identificar os desvios de
conduta dos policiais, a maneira como cometem estes abusos, o grau de
tolerância dos superiores a esses delitos, a inoperância dos controles
internos, os policiais mais contumazes na prática de delitos, etc.
-
Acumular informações e estatísticas produzidas por órgãos oficiais.
-
Organizar dados estatísticos, cruzar informações estabelecer comparações,
confrontar desempenhos, apontar tendências, iluminar os resultados do
trabalho policial, colocando esses dados ao alcance da grande imprensa
e da opinião pública.
-
Aumentar o nível de conhecimento da população sobre o trabalho da polícia
naquele Estado, naquela região, naquele município, naquele distrito
policial para que os cidadãos, dessa maneira, possam comparar o desempenho
da sua polícia com o da polícia de outros distritos, de outros municípios,
de outras regiões, de outros Estados.
-
Aumentar o conhecimento dos funcionários policiais sobre as expectativas
e as prioridades da população a que estão servindo.
-
Com base nas informações acumuladas, propor mudanças efetivas na cultura,
nas práticas e no comportamento dos policiais e dos cidadãos, face à
responsabilidade compartilhada pela segurança de todos.
Dessa
maneira, o trabalho da Ouvidoria se prestará, por um lado, ao atendimento
da vítima da ação ou omissão ilegal da polícia e, por outro, de igual
importância, à divulgação de dados que possibilitem ao cidadão ter conhecimento,
e assim, aproximar-se da gestão da segurança pública.
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6.
Do Ministério Público
Ao
dispor sobre as funções institucionais do Ministério Público, a Constituição
Federal deu ênfase especial ao controle externo da atividade policial.
Ao fazê-lo, porém, não especificou em que consistiria esse controle, deixando
a atribuição para a legislação infraconstitucional.
No
entanto, embora tenha elencado algumas medidas judiciais e extrajudiciais
de como exercitar essa função controladora, a Lei Orgânica Nacional do
Ministério Público (LC. 75/93) não forneceu informações precisas sobre
o que seria, propriamente, o objeto desse controle.
As
leis orgânicas estaduais, por sua vez, também não avançaram nesta questão,
o que explica o número considerável de divergências doutrinárias e jurisprudenciais
sobre o assunto. Apesar dessas dificuldades no campo teórico, nada impede
melhorar, na prática, desde já, esse controle ministerial, uma vez que
o Ministério Público, não só por ser o titular da ação penal, como também
pela independência e autoridade que a lei confere a sua atuação, é o mais
importante órgão de controle externo da atividade policial, entre nós.
Entendemos
não existirem muitos limites a essa tarefa, que compreende tanto a atividade-fim
policial (grosso modo o controle do inquérito policial e do cumprimento
de prazos), como a própria prestação do serviço e a política pública que
norteia sua implementação (o que compreende, por exemplo, o controle da
eficiência, da distribuição de efetivos policiais, da prática de crimes
e infrações pelos policiais e dos índices de resolução de crimes).
Nesse
sentido, interessante a manifestação de Carlos Alexandre Marques,3 Promotor
de Justiça de Goiás, que também defende a ampliação do objeto de controle
nos seguintes termos:
“Não
vejo timidez no dever constitucional do controle externo da atividade
policial, e, por isso, concebo-o com largos limites: tal controle deve
abraçar as notícias de delitos recebidas pela polícia, a apuração dos
crimes e das infrações de improbidade administrativa praticados por policiais,
os casos esquecidos ou não investigados, a fiscalização dos prédiosm policiais
e de carceragem, a cobrança do regular trâmite dos procedimentos investigatórios,
o cumprimento das requisições ministeriais, a preservação das liberdades
e garantias individuais etc.
(...)
Vislumbro, portanto, um tripé que alicerça, que fundamenta a atuação ministerial
do controle externo da atividade policial: 1º) A fiscalização e a garantia
da prestação estatal obrigatória e eficiente do serviço de segurança social
(controle por força de defesa de interesses difusos via ação civil pública);
2º) defesa das liberdades constitucionais individuais e manuseio dos remédios
jurídicos que visam garanti-las (habeas corpus, habeas data,
mandado de segurança etc.); 3º) controle externo da atividade-fim policial
(criminal e cível)”.
A
investigação policial, no Brasil, em regra é bastante falha. E essa falha
é ainda mais gritante quando se trata de investigar crimes praticados
pelos próprios policiais. Não raro, inquéritos instaurados para apurar
a conduta de policiais são concluídos e remetidos ao Judiciário sem que
tenham sido colhidas provas elementares, como, por exemplo, depoimentos
de testemunhas não-policiais e provas técnicas e periciais. A possibilidade
de realização de investigações diretamente pelo Ministério Público, em
nosso entender, não apenas é compatível com nosso ordenamento, como só
tem a somar na busca por um maior índice de esclarecimento dos crimes
praticados por policiais.
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Panorama
atual do exercício do controle
Em
alguns Estados o exercício do controle externo da polícia foi regulamentado
em lei estadual (como, por exemplo, Sergipe e Ceará )4 , e, em outros,
através de atos internos do Ministério Público (como em São Paulo e na
Paraíba) e em alguns inexiste normatização a respeito.
A
princípio, porém, podemos afirmar que a legislação existente a respeito
deixa a desejar, uma vez que, em regra, se limita a estabelecer mecanismos
de controle essencialmente burocráticos como livre acesso aos estabelecimentos
policiais e prisionais e garantia de acesso e cópia de documentos relativos
à atividade policial.
Observando
as leis orgânicas estaduais dos Ministérios Públicos, encontramos, excepcionalmente,
em Santa Catarina e Sergipe dispositivos inovadores no que tange à realização
de investigação direta e à possibilidade de avocação do inquérito:
SANTA
CATARINA
Lei
Orgânica Estadual do Ministério Público - LC 197/2000 Art. 82. São funções
institucionais do Ministério Público, nos termos da legislação aplicável:
XVII
- exercer o controle externo da atividade policial, civil ou militar,
podendo, dentre outras medidas administrativas e judiciais:
i)
avocar inquérito policial em qualquer fase de sua elaboração e requisitar,
a qualquer tempo, as diligências que se fizerem necessárias;
SERGIPE
Lei
Orgânica Estadual do Ministério Público - LC 02/1990
Art.
39. Compete aos Promotores de Justiça:
XII
– assumir a direção de inquérito policial, quando designado pelo Procurador-Geral;
Alguns
Ministérios Públicos criaram grupos especiais de atuação no controle externo
da atividade policial. São eles: Alagoas, Amazonas, Ceará, Distrito Federal
e Territórios, Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraíba, Paraná,
Rio Grande do Sul e São Paulo.
A
elaboração de um rol de atividades elementares que devem ser desenvolvidas
para que se efetive o exercício do controle externo da polícia pelo Ministério
Público parte de dois enfoques: a necessidade/possibilidade de adoção
de medidas pelos próprios Ministérios Públicos e a padronização de determinados
procedimentos e instrumentos de controle, que deverá ser proporcionada
pela Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP).
Embora
a SENASP não tenha, a princípio, o Ministério Público como grande parceiro
na implementação do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), lugar que
é ocupado pelas Secretarias de Segurança dos Estados, entendemos que o
Ministério Público deveria se tornar parceiro privilegiado na implementação
do Sistema, tamanha é sua possibilidade de atuação.
As
parcerias possíveis entre SENASP e Ministério Público não necessariamente
envolvem recursos financeiros, e a padronização de modelos e procedimentos
é, por vezes, demanda dos próprios Ministérios Públicos que, evidentemente,
devem ter sua autonomia e independência absolutamente preservadas.
Com
essas medidas e com a utilização de outros instrumentos de controle, o
Ministério Público poderá melhorar significativamente sua ação controladora
sobre a qualidade e os resultados do trabalho policial, bem além da mera
verificação da observância de prazos ou da regularidade do preenchimento
de livros e registros burocráticos.
^
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7.
Instrumentos Importantes para o Controle Externo
Considerando
a noção ampla de controle adotada, pensamos que, de imediato, se poderia
ir mais além e realizar um esforço nacional, coordenado pela SENASP, para
colocar à disposição das instituições controladoras, especialmente Ministério
Público e Ouvidorias de Polícia, instrumentos indispensáveis, tais como:
A)
Instrumentos de Controles Normativos:
-
Acesso a toda legislação policial: Polícia Federal, Polícias Estaduais
e Guardas Municipais;
-
Leis orgânicas e regulamentos disciplinares;
-
Normas internas e procedimentais.
B)
Instrumentos de Controles Administrativos e Materiais:
-
Dados dobre organização administrativa, atribuições e competências;
-
Localização, movimentação e distribuição numérica e territorial dos
recursos humanos;
-
Números do efetivo, cargos e patentes e lotação por unidades;
-
Antecedentes funcionais e criminais dos funcionários policiais.
-
Controle das armas dos policiais (da corporação, próprias e depositadas).
C)
Instrumentos de Controles Operacionais por Regiões, Departamentos e Municípios:
-
Número de ocorrências e inquéritos policiais instaurados;
-
Dados estatísticos criminais;
-
Número de policiais mortos e feridos em atividade;
-
Número de mortos e feridos por ação da polícia.
D)
Instrumentos de Controle de Instrução Probatória e Pericial:
E)
Instrumentos de Controle de Armas de Fogo:
- Acesso
a bancos de dados sobre registros, furtos, roubos, perdas e extravios
de armas de fogo e munições;
-
Controle dos registros de apreensões, armazenamento e remessas de armas
ao Poder Judiciário;
F)
Instrumentos de Controle do Uso da Força:
-
Registro e acompanhamento sistemático de todos os inquéritos referentes
a casos de homicídios ou ferimentos decorrentes de ação policial;
-
Investigação e instrução obrigatória, com laudos periciais, provas
documentais e depoimentos de testemunhas, em todos os casos de atuação
policial com resultado morte ou ferimento grave;
-
Dados comparativos de ações com resultados letais, por unidades, departamentos
e batalhões;
-
Cadastro dos policiais com maior número de ações letais e das ocorrências
de que participaram.
G)
Acesso a Bancos de Dados de Dados Produzidos por Outros Órgãos Públicos:
-
Banco de dados estadual sobre ocorrências e estatísticas criminais.
-
INFOSEG (CNH/armas/veículos/antecedentes).
-
Banco de dados estadual sobre registros de armas de fogo.
-
Banco de dados estadual sobre registros de veículos.
-
Sistemas estaduais de antecedentes criminais.
-
DATA SUS.
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8.
Controle Externo e Relação com Outros Programas
Controle
Externo e Segurança Municipal
A
participação da população na elaboração e implementação da política de
segurança pública e o exercício do controle social sobre o desempenho
dos órgãos policiais têm muito mais probabilidade de se concretizar, se
os cidadãos locais tiverem amplo acesso às informações sobre:
-
Os tipos de delitos mais praticados no município.
-
Identificação e antecedentes dos policiais locais.
-
Como os policiais estão autorizados a proceder em situações específicas:
abordagens, revistas, detenções, desocupações judiciais, uso de armas.
-
Quais os policiais mais problemáticos no tratamento com a população:
abusos de poder, agressões físicas e verbais, uso indevido ou temerário
de armas de fogo, mortes ou ferimentos causados.
-
Desempenho da polícia local em comparação com outros municípios ou localidades
próximas.
-
Que medidas adotar como prevenção para reduzir a criminalidade e aumentar
a segurança pública.
^
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Controle
Externo e Perícia
Uma
das maiores dificuldades para o efetivo controle da ação policial reside
na falta de laudos periciais em grande número de inquéritos, até mesmo
em casos em que o exame pericial é obrigatório (art. 158 do CPP). Como
coibir isso?
-
Nos casos de homicídio, fazer constar obrigatoriamente dos laudos:
-
Se houve ou não preservação do local.
-
Quantidade, distância e direção dos disparos.
-
Nos casos de mortes em decorrência de ação policial, além das observações
acima fazer constar obrigatoriamente:
-
Dia e hora do fato.
-
Local da ocorrência (logradouro público, local ermo, mal iluminado).
-
Hora em que a perícia foi convocada e por quem.
-
Se a morte ocorreu durante flagrante, perseguição ou blitz.
^
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Controle
Externo e Formação dos Policiais
·
Elaboração e divulgação de material didático específico sobre os documentos
da ONU: Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação
da Lei e Os Princípios Básicos sobre o Uso da Força e Armas de Fogo pelos
Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei.
^
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Referências
Bibliográficas
ACLU.
Fighting Police Abuse: a community action manual. Disponível no
endereço http://www.aclu.org/PolicePractices/PolicePractices.cfm?ID=5009&c=25
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BAYLEY,
David H. Padrões de Policiamento. EDUSP. São Paulo. 2001.
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das Ouvidorias Públicas no Brasil. in A Ouvidoria na Esfera
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2000.
CAVASSANI,
Sônia Maria Côrrea. A Utilização da Violência na Atividade Policial:
da insanidade coletiva à loucura solitária. Dissertação de mestrado.
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LEMGRUBER,
Julita et alii. Quem Vigia os Vigias? Editora Record. Rio de Janeiro.
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www.brazil.ox.ac.uk/workingpapers/Macaulay33.pdf
MARQUES,
Carlos Alexandre. Controle Externo da Atividade Policial: natureza
e mecanismos de exercício. Disponível no endereço http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=1598
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Laurindo Dias. Direito, Ideologia e gestão da violência. Tese de
doutorado. USP. São Paulo. 1997.
PINHEIRO,
Paulo Sérgio. Violência e Cultura. in Direito, Cidadania e participação.
São Paulo. 1991.
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