Fred Hubner Fred Hubner·
É tão simples como isso. A gente acreditou que a democracia estava aí, já que anistia houve, e que portanto poderíamos fazer um disco do Julião pra todo o mundo ouvir. Mas não. Não estamos. Só quem comprar é que vai poder ouvi-lo. Os outros não. Nem pelo rádio, nem pela TV.
Tudo começou quando Julião, continuando a ser poeta, escreveu uns versos e neles colocou a chama de quem lutou pela igualdade e liberdade, estes dois princípios perigosos da democracia. Concluímos que dava um disco e o texto merecia uma viola. Chamamos o mano Chico Mário pra tocar. Fomos ao estúdio e em 2 horas tudo estava pronto: "Julião, verso e viola". Maria fez a capa. Faltava quem ajudasse nas finanças. Apareceu o Barreto para bancar os primeiros 500 discos. Ainda faltavam, então, os trâmites legais.
Na crença de que iríamos apenas praticar um ato ultrapassado, de rotina, enviamos o texto para a Censura Federal. Depois de um mês, foi devolvido com uma palavra curta e grossa: Vetado! A "instituição" vetou página por página, mas o veto veio anônimo, ninguém pôs o nome. '
Já havíamos chamado o poeta e o violeiro, agora fazia falta o advogado. O Adalberto fez o recurso para o Conselho Superior de Censura. E agora nos faltava um bom conselheiro. Ganhamos o Dr. Ricardo Cravo Albin, é claro, na defesa do disco e do direito de Julião, como poeta, ser por todos conhecido, já que anistia houve e democracia parece que havia.
Na reunião de 11 de fevereiro, da memória do passado surgiu o medo. O medo da liberdade.
A decisão foi então o limite do possível, quando a liberdade só é permitida no espaço de nós mesmos, escondido das ruas e das praças e portanto do povo.
Um representante do poder disse então a razão de seu voto negativo: "a irradiação dos poemas pode reavivar certas coisas que é hora de esquecer. Quem quiser que oiça em casa".
Assim, que a poesia continua, como sempre e como pode, através de nós e de todos os que seguirem esta música, hoje censurada, amanhã pelo povo liberada.
Por tudo isso o Disco Independente é uma bela aventura.
Betinho
- Os direitos da Mulher
- O sindicato é a estrela
- Por que sou nacionalista
Viola - Francisco Mário
Capa e fotos - Maria Nakano
Gravação e mixagem - Toninho Barbosa
Produção - Herbert de Souza
DISCO INDEPENDENTE
Selo Libertas, Março de 1981