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Insurreição Comunista de 1935
em Natal e Rio Grande do Norte

A Insurreição Comunista de 1935 – Natal, o primeiro Ato da Tragédia
Homero de Oliveira Costa

 

 

 

 

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Capitulo III
A Insurreição de novembro de 1935

3.1 - Natal

1935. Natal era uma pequena cidade com aproximadamente 40 mil habitantes (20). O movimento comercial era concentrado em dois bairros: a cidade alta, no centro e o da ribeira, onde se localizava o cais do porto, na Av Tavares de Lira.

A cidade tinha um considerável movimento portuário, sendo frequente a presença de navios estrangeiros que levavam para a Europa algodão e sal, além de navios brasileiros, de cargas e de passageiros.. Haviam três companhias de navegação em Natal, todas na ribeira : a Companhia Carbonífera Riograndense(rua Chile, 102),com linha regular, quinzenalmente, de Porto Alegre ao Maranhão(através dos cargueiros “Porto Alegre”,”Piratini”, “Butiá”, “Chuy”, “Herval”, “Taqui”e “Tambaú”) que passavam em Natal.; a Companhia Nacional de Navegação Costeira(rua Frei Miguelinho, 116) e a Companhia de Navegação Lloyd Brasileira(Rua Dr. Barata, 220).

Além disso, havia o Serviço Aero Condor (cargas, passageiros e correio) com um voo semanal e o Serviço Aero London-Lufthansa, que anunciava voos Brasil /Europa em 4 dias, todas as 5as. feiras. Os voos regulares eram os hidro-aviões da Panair, que pousava no rio potengi(usava-se o termo “aquatizou”- “aquatizou às 14 horas o avião horário da Panair”...) perto do cais Tavares de Lira ( a Panair dispunha de lanchas e de um flutuante onde as pessoas esperavam os embarques e desembarques). Quando eram as autoridades que chegavam, como era os casos, por exemplo, de politicos ou do Interventor, seus correligionários organizavam recepções no cais, com bandas de música, discursos etc.

Após o fechamento do comércio, o movimento se concentrava no cruzamento das avenidas Rio Branco e João Pessoa, no centro da cidade e no bairro da ribeira, onde ficavam alguns cafés muito frequentados , como o “café Cova da Onça”(Rua Tavares de Lira) Esse movimento geralmente crescia após as 21 horas, com o término das sessões de cinema.

Natal tinha na época três cinemas: O Royal Cinema, “o Cinema da elite”(Empresa irmãos Cavalcante)que ficava na rua Vigário Bartolomeu, esquina com a rua Ulisses Caldas no centro da cidade, onde além das sessões cinematográficas, apresentava-se uma orquestra, (considerada de excelente qualidade); o Cine Teatro São Pedro, “o Cinema de Natal”, no bairro do Alecrim( este Cinema divulgava só exibir filmes da Metro, United Paramount, Universal, Fox e Programs Art e Broadway) e o Politheama, na praça Augusto Severo, no bairro da ribeira, próximo ao Teatro Carlos Gomes(depois, Alberto Maranhão. ). Inaugurado em 2 de dezembro de l911, era o 2º cinema que surgia na cidade- ( o lº foi o “cinema de Natal” de l909 e funcionava no teatro Carlos Gomes - que alías de l928 a 1932 passa a se chamar “cine teatro Carlos Gomes” com sessões regulares de cinema ). O Polytheama era o mais moderno: além de uma sala de exibições tinha ainda uma sala de jogos(bilhar), bar e sorveteria. Os filmes exibidos na cidade eram quase simultaneamente as grandes produções da Metro, United, Paramount, Universal, Fox e Propaganda Art e Broadway que haviam estreado no sul do país. Aos domingos tinha os “ matinês” e “ vesperais” e até mesmo uma “sessão das moças” e no jornal “a República” havia uma coluna chamada “palcos e telas” (sem periodicidade regular) com sinopses dos filmes em cartaz e uma outra, mais irregular, com o nome “cinema” de crítica cinematográfica.(21)

Em julho de l935 Mário Câmara institui através de um decreto, pela primeira vez, um cinema educativo em Natal, que seria dirigido pelo Departamento de Educação. Ainda foram exibidos alguns filmes no salão do orfanato João Maria, com a presença do próprio Mario Câmara. No entanto, essa iniciativa não teve continuidade no governo que o sucedeu.

O bairro mais importante da cidade era o da ribeira onde se concentrava o comércio mais variado. Era o bairro das grandes lojas, casas comerciais , empresas e bancos. E também dos melhores hotéis : Hotel Avenida, Hotel dos Leões, Hotel Internacional ( na rua Chile). Era também onde ficava o teatro Carlos Gomes(inaugurado em l906) , o jornal oficial “A República” , o escritório de duas companhias francesas de aviação : a Compangnie Gerale Area Postale e a Latecoére e um dos pontos mais frequentados pela elite da cidade : O café Cova da Onça., em especial os partidários do Partido Popular(José Augusto, quando governador ,costumava frequentá-lo após o expediente). E era também o bairro que, durante décadas, se concentravam os desfiles do carnaval.

O transporte coletivo era o bonde elétrico, inaugurado em 2 de outubro de l911(em l909 foi inaugurado, com grande festa, o bonde puxado a burro ,o “ferro carril” que tinha como trajeto a Rua Dr. barata na ribeira, até a praça padre João Maria, na cidade alta.), Neste ano chegam também à Natal a luz elétrica e o telefone.

No centro da cidade, semanalmente, a banda de música do 21º BC dava concertos ao ar livre, atraindo um bom número de pessoas e citado na imprensa como “o elegante footing da Av. Rio Branco”. Eram destaques os cafés Magestic , o “petit bar” e o “grande ponto” frequentado pela intelectualidade e as elites.

Circulavam quatro jornais: “A República” - órgão oficial do governo; “ A Razão”,do Partido Popular; “A ordem” de orientação católica(e integralista)fundado em 14 de julho de l935 e “O Jornal”, fundado em 6 de agosto de 1931, pertecente a João Café Filho. Afora esses, havia também os de duração efêmera como “O Feitiço”um semanário que foi anunciado no dia 29 de março de l935 formado por um grupo de intelectuais para “defender a arte e as letras potiguares” contando com a colaboração “dos melhores poetas e prosadores contemporâneos”, entre os quais Luis da Câmara Cascudo e o poeta Jorge Fernandes. Circulou também neste ano, com periodicidade irregular, um vespertino chamado “ O Debate”, criado em 5 de julho de l934, dirigido por Antonio Alves e de apoio ao Interventor Mário Câmara.

Havia na cidade apenas uma biblioteca pública , com 9.69l volumes, um teatro, dois arquivos públicos (um estadual e um municipal) precariamente organizados e uma livraria, a “Cosmopolita” localizada no bairro da ribeira( as Casa Pernambucanas e a Casa Gondim, entre outras coisas, também vendiam livros e sempre anunciavam nos jornais à chegada em Natal de livros lançados no sul do país. No inicio de 1935 por exemplo, anunciará por vários dias a chegada dos livros “A Selva”de Ferreira de Castro e “Alma Bravia”de Policarpo Feitosa). Embora ao que tudo indica a venda de livros nâo fossem expressivas e tampouco grande e diversificado o estoque de livros, após os acontecimentos de novembro de l935, João Medeiros Filho, o chefe de policia da época, dirá que “a bem dizer, a verdadeira propaganda comunista começou neste Estado no Governo do Sr. Mário Câmara(...) as livrarias outra literatura não exibiam em suas vitrines senão a de Lenine, Stalin, Tolstoi , Marx, Engels, Kropotkin, Bakunin, Owen,etc (Medeiros Filho,1937,p. 45)

A difusão da literatura marxista provavelmente não era tão expressiva como se sugere. A própria direção local do Partido Comunista pouco conhecia de marxismo(até porque eram raros os livros) e por ocasião da repressão ao movimento de novembro de l935, na qual foram realizadas centenas de prisões, muitas das quais com invasão policial nas casas de indiciados em processos, é insiginificante o número de livros apreendidos e, dos listados nos autos dos processos, não há praticamente literatura marxista(22).

No que diz respeito a educação, o índice de analfabetismo era expressivo. Em l920, o censo escolar havia revelado que 8l% dos 547 mil habitantes do Estado eram constituintes de analfabetos. Na década de l930 o índice continua praticamente inalterado. Em l933, por exemplo, por ocasião das eleições para a Assembléia Constituinte, a população do Estado era de 764.57l habitantes, sendo que apenas l8.959 puderam se inscrever para votar. Em l934 menos de 2% dos 22 mil jovens em idade escolarizável, tinham acesso a escola. No censo de l940, o indice de analfabetismo continua praticamente o mesmo (80% da população) e algo em torno de 90% das crianças em idade escolar, continuavam não tendo acesso a escola.

Do ponto de vista econ^mico, o ano de l935 será grande safras de algodão e sal, que batem o record de produção , significando um crescimento nas exportações (23) e o exercício financeiro de l935 termina com um saldo em cofre de quase três mil contos de reis (24)

Em relação a indústria, praticamente não havia, a não ser pequenos estabelecimentos. Os dados existentes quanto a produção industrial de 1936 revelam que das 245 fábricas existentes no Estado, a maioria, 151, era constituida de calçados e 77 era fabriquetas de bebidas , empregando um numero muito pequeno de trabalhadores. Dessas ,126 ficavam em Natal, 89 das quais tinham até 6 empregados e 37 fábricas com 6 a 12 empregados. Em 1943,por exemplo, haviam sido cadastradas 155 empresas, sendo a maioria, 45, constituida de oficinas mecânicas e 29 alfaiatarias e o restante de pequenas fábricas como as de sabão, por exemplo, com uma média de 5 empregados.Esses dados são importantes porque revelam que a classe operária no Estado era pouco numerosa, considerado o conjunto da população economicamente ativa.

Em termos populacionais, até 1935 o crescimento de Natal é pouco significativo. O processo de concentração da população nas cidades mais importantes, como Natal e Mossoró, foi muito lento. Em 1870 quando o algodão se torna o principal produto de exportação do Rio Grande do Norte, em substituição a cana-de-açucar, Natal tinha 8.909 habitantes. Em 1900 passa para 16.059 habitantes. Nas duas primeiras décadas do século, o crescimento também não é tão empressivo, em 20 anos, ou seja, em 1920, a população era de 30.696 habitantes e representava cerca de 5% da população do Estado. Crescimento significativo só se dará a partir de 1940, com um crescimento populacional muito superior a média do Nordeste (25)

Quanto a segurança pública havia, em 1935, a Policia Militar, o 21 ªBatalhão de Caçadores e a Guarda Civil. Não há registro nos arquivos pesquisados quanto aos respectivos contingentes. Pelos dados de 1933, a Policia Militar tinha 18 oficiais e 348 praças. A Guarda-Civil tinha um Inspetor (ou comandante), 12 graduados e 408 guardas, sendo na época, o 6º maior contingente das Guardas Civis do Brasil. Com exceção do 21 BC, cabia ao Interventor indicar os respectivos comandantes.


Notas

20 - O Departamento Estadual de estatística do Rio Grande do Norte não dispõe de dados precisos sobre o ano de 1935. Os dados de população são aproximações tendo em conta os censos de l920 e 1940, que dão, para a cidade de Natal, respectivamente, 30.606 e 55.ll9 habitantes.

21 - Um bom trabalho de pesquisa sobre a história do cinema em Natal foi feito pelo jornalista Anchieta Fernandes “Écran Natalense”(Capitulos da História do cinema em Natal), de onde tirei boa parte das informações sobre os cinemas de Natal.

22 - No proceso No. 2 do Tribunal de Segurança Nacional relativo aos acontecimentos de novembro de l935 no Rio Grande do Norte, num dos relatórios policiais consta uma relação de aproximadamente 30 livros que foram apreendidos pela policia. Se se pudesse falar em literatura marxista quem talvez tivesse o maior acervo no Estado eram os irmãos Reginaldo(Jonas, Raimundo e Lauro) em Mossoró, que além de documentos e livros enviados pela direção do partido, no Rio de Janeiro, ainda os adquiriam numa pequena livraria pertencente a Lauro Escócia que por sua vez comprava dos viajantes que chegavam ao porto da vizinha cidade de Areia Branca, que na época, junto com Natal, eram portos importantes para o escoamento da produção do sal e algodão do Estado, inclusive para a Europa, não sendo raro portanto a presença de navios estrangeiros. Desde de l934, quando Mario Câmara cria a Agência da Companhia Carbonífera, esses portos passam a ser intinerário dos navios que faziam o trajeto de Porto Alegre(RS) à São Luis(MA)

23 - O Rio Grande do Norte, do ponto de vista econômico, era um dos menos desenvolvidos do país, caindo na obscuridade desde a queda(gradual) da cultura açucareira depois do século XVIII. A abolição da escravatura e as secas que se seguiram contribuiram ainda mais para a queda de sua produção. No inicio do século XX, amplia-se a plantação do algodão, que passa a ser o principal produto da economia regional nas décadas seguintes. No inicio de l930 a produção sofre uma brutal queda em função dos acontecimentos de l929(queda da bolsa de Nova York,etc) e só a partir de l935, tem inicio, com uma safra record, um aumento expressivo da produção e exportação do algodão.

24 - Relatório do interventor Mario Camara refrente aos anos de 1933-1935. Arquivo Publico do Estado do Rio Grande do Norte , Natal/RN

25 - Um dos fatores explicativos desse crescimento foi o fato de Natal ter sido uma importante base de operações norte-americanas(o acordo foi asinado em Natal, com a presença dos presidentes do Brasil e dos Estados Unidos) que trouxe, além de um grande contingente de militares, a construção de aeropoto, estradas, etc.

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