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     Polícia e Direitos Humanos: 
        do Antagonismo ao Protagonismo
 Guia para membros de ONGs que 
        desejam criar programas
   ALGUMAS CONSIDERAÇÕES FINAIS SOBRE 
         AS SUAS RELAÇÕES COM AS AUTORIDADES POLICIAIS:
 I - NÃO INTERFIRA EM ASSUNTOS INTERNOS: 
          Você verá que, à medida em que as relações de trabalho 
        vão se aprofundando, você passa a dominar melhor o complexo universo que 
        é a polícia.   Resista à tentação de começar a 
        dar palpites ou conselhos em temas que não estejam diretamente ligados 
        à educação da cidadania policial. Mesmo que você seja um especialista 
        em administração, ou um Consultor de Qualidade Total, ou um            
        pós-graduado em Marketing, ou simplesmente um entendido em generalidades, 
        deixe que a polícia resolva os problemas da polícia.   Meta-se apenas naquilo para a qual foi aceito, ou 
        seja, "Educação para os Direitos Humanos" . Principalmente, 
        a qualquer custo, mesmo que lhe perguntem, não cometa o erro de opinar 
        sobre listas de promoções ou nomeações de pessoal para cargos de responsabilidade 
        (exceto quando tratar-se de alguém que possa obstacularizar o seu trabalho 
        de parceria na área educacional).   II - NÃO ESTIMULE CONFLITOS INTERNOS Não seja massa de manobra e não 
        se meta em brigas alheias. A polícia já tem suficientes problemas 
        internos de relacionamento e não precisa de você para agravar o quadro. 
        Não dê ou tire a razão a ninguém. Se alguém tentar impedir seu trabalho 
        de Educação para os Direitos Humanos, queixe-se à pessoa certa: o superior 
        (o Diretor da Academia, o Chefe de Polícia, o Comandante Geral, o Secretário 
        de Estado ou, se necessário, o Governador ou o Presidente). Se não resolver, 
        pegue seu material didático e vá embora. Não alimente e nem dê ouvidos a 
        fofocas. Faça que não escutou comentários sobre a vida privada 
        de quem quer que seja. A polícia é uma instituição bem informada e, como 
        em qualquer outra, há gente que usa essas informações em conflitos interpessoais. 
        Você não tem tempo a perder com isso e não lhe interessa saber. Deixe claro que seu negócio é a 
        cidadania.   III - ESTEJA PRONTO PARA EXPÔR (NO 
        BOM SENTIDO) A SUA ONG:   Muito bem: você está dentro da Academia de Polícia 
        e se reúne regularmente com as autoridades policiais. Você visita a Chefia 
        ou o Comando e eventualmente é convidado para conhecer alguma delegacia 
        ou um quartel. Esteja pronto para a contrapartida. Não queira esconder 
        a sua ONG da polícia. Supere a paranóia dos tempos da ditadura. Você não 
        tem nada a esconder e os policiais devem ser bem-vindos à sede de sua 
        Organização. Receba-os gentilmente,  cônscio das responsabilidades 
        que eles têm para com a sociedade e do importante papel que representam 
        na promoção dos Direitos Humanos.   Em Porto Alegre, a cidade onde vivo, temos um escritório 
        da Anistia Internacional onde recebemos muitos policiais. Eles chegam, 
        pela primeira vez, bastante temerosos. Esperam ser maltratados quando 
        ainda não nos conhecem suficientemente. Ao contrário, são fraternalmente 
        acolhidos, podem circular livremente e pesquisar em nosso material. Somente 
        isto basta para que muitos modifiquem a visão que tinham das Organizações 
        de Direitos Humanos e para que, mais tarde, em seminários na Academia, 
        defendam rigorosamente o trabalho da Anistia . Há mesmo alguns que se 
        encantam por nossos projetos  e 
        acabam filiando-se ao Movimento.   IV - FAVOREÇA A TROCA DE EXPERIÊNCIAS: 
          É natural que, no quadro de um tipo tão novo de 
        ação, os responsáveis policiais sintam algum nível de insegurança. Para 
        que não se creiam sozinhos, favoreça a troca de experiências com 
        policiais de outros Estados ou países que estejam avançando na mesma direção. 
        A abertura ao mundo exterior enriquece o universo de experiências institucionais 
        e consolida melhor os processos.   Em 1992, levamos à Holanda uma equipe de autoridades 
        policiais brasileiras. O convívio mais estreito com os membros da Anistia, 
        durante a viagem, aprofundou os laços de confiabilidade. Além disto, aqueles 
        policiais sentiram-se, com justiça, reconhecidos e valorizados, bem como 
        tiveram a oportunidade de intercambiar informações preciosas em diversos 
        campos de sua atividade. Como resultado, em seu retorno, os projetos em 
        andamento firmaram-se com mais vigor  
        e novas atividades foram acrescentadas.    
         V - ELOGIE SEMPRE 
        QUE ACHAR MERECIDO:    Não tenha medo de elogiar a polícia. 
        Não receie que seus companheiros pensem que você está passando para o 
        "lado de lá".  Lembre-se de que só há um lado em todas as suas atividades, 
        o dos direitos humanos, e que o que você deseja é partilhar sem reservas esse 
        lado com seus novos companheiros policiais. Sempre que achar méritos em 
        alguma  atitude ou atividade, 
        elogie. Você estará reforçando práticas positivas 
        e contribuindo para a sua multiplicação.   VI - DIVULGUE O SEU TRABALHO COM A 
        POLÍCIA:    Não tema ver-se nas páginas policiais. 
        Não receie ter sua imagem associada à polícia. Se você foi criterioso 
        para começar e sustentar a parceria, confie. Não mantenha um campo 
        de reservas. Se a polícia está sendo correta como associada, se está sendo 
        ética na relação com você, se está crescendo em qualidade, lembre-se de 
        que ela terá então conquistado o direito de usufruir de maior consideração 
        pública. Seja exigente, mas não purista. Se os que se somaram a você estão 
        fazendo um trabalho sério, "prá valer", por que evitar que "capitalizem 
        pontos" em termos de imagem?   Contudo, se você ainda tem dúvidas, se ainda teme 
        ver sua credibilidade utilizada, é melhor rever os acordos que andou fazendo 
        e talvez cair fora.   Tenha em mente que as boas notícias, assim como 
        as más, são contagiosas e é provável que, ao saber de verdadeiras boas 
        novas, outros policiais animem-se a fazer parte do seu trabalho. 
          Se você tem certeza da importância 
        do que está realizando, o natural é que sinta orgulho por isto. 
          VII - NÃO PERMITA QUE DESCONFIANÇAS 
        SE ACUMULEM:   Não se iluda. A relação com polícia traz as marcas 
        de um passado difícil. É uma relação complexa. As cicatrizes às vezes 
        sangram por qualquer motivo. Não permita que isto se acumule e atrapalhe 
        uma bela ação. Quando surgirem dúvidas, desconfianças, 
        mal entendidos, procure logo o seu parceiro de trabalho, ou a autoridade 
        responsável, e esclareça de forma racional e objetiva. Elimine o poder 
        das fantasias. Recorde-se de seu compromisso maior, com a causa 
        da cidadania, e supere os pequenos desentendimentos que, avolumados, são 
        a causa dos rompimentos da maior parte dos processos de associação humana. 
        Seja diligente, zeloso, transparente e franco. Não deixe que pairem incertezas 
        a seu respeito e reafirme a sua confiança se pretende continuar com a 
        parceria. Deixe claros os seus objetivos, peça 
        o mesmo de seus associados, e não terá razões para arrependimentos. 
          VIII - SUPERE O 
        PERFECCIONISMO:   Não seja ingênuo. Sua parceria com 
        a polícia não vai transformá-la em uma instituição irrepreensível. 
        Não há instituições irrepreensíveis. Você deve esperar uma sensível melhora 
        a médio e longo prazos (como em qualquer processo educacional eficiente),  
        mas não a perfeição.   Se à primeira violação de Direitos Humanos você 
        vai se desencantar e dizer "foi tudo uma farsa, fui enganado", 
        então é melhor nem começar. Algum nível de  violações, lamentavelmente, vai 
        continuar se manifestando. As ONGs devem permanecer denunciando os abusos 
        e os maus policiais, sem abrir mão da atuação preventiva. Somente esta 
        ação casada poderá levar a uma mudança significativa do quadro, a médio 
        e longo espaço de tempo.   Saiba dos inevitáveis percalços e não desanime quando 
        ocorrerem. Deixe isso claro também a seus parceiros policiais.  
         IX - AVALIE PERIODICAMENTE SEU TRABALHO 
        E REAVALIE A CONJUNTURA:      
                  
            Não deixe de pensar sobre os resultados 
        práticos de sua ação. Evidentemente, é o único parâmetro válido para indicar 
        a necessidade de continuar ou mudar os rumos. Cuide, porém, para 
        não ser muito apressado. Você não está "fabricando parafusos". 
        Está ajudando a construir consciências.   Reavalie, também, periodicamente, a conjuntura. 
        O Governo pode mudar, o perfil das autoridades policiais também. Sua Organização 
        pode sofrer alterações substanciais. Pense dez vezes antes de tomar uma 
        decisão tão  grave como esta 
        mas, se concluir que não há mais um mínimo de segurança para manter o 
        processo em bom andamento, não hesite em retirar-se e em esperar um momento 
        mais apropriado. No entanto, não o faça diante da primeira crise. Você 
        terá que enfrentar várias. Seja conseqüente em todas as suas decisões. 
          Como regra geral, tenha fé e invista. Normalmente, 
        respeitados todos os critérios anteriormente apresentados, será uma fórmula 
        infalível de sucesso.   < 
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