Texto da palestra proferida durante
o painel “ Como assegurar o direito à informação e à
democratização dos meios de comunicação?”, dia 27 de
janeiro, Eixo III
Roberto Savio*
O tema do debate de hoje é sobre
os meios de comunicação, um debate que já vem de longa data. É
possível que a maioria dos que aqui se encontram não saiba o que
foi o debate sobre a Nova Ordem da Informação, que começou na década
de 60 e terminou abruptamente, em 1981, com a chegada de Reagan à
presidência dos Estados Unidos. Contudo, ao longo de sete anos, a
comunidade internacional debateu o assunto de forma acalorada. O
debate tratava do fato de que, em 1976, quatro agências de notícias
transnacionais veiculavam 94% das informações, o que se julgava
representar um desequilíbrio Norte-Sul. Um grande esforço foi
feito, por parte dos países do Terceiro Mundo, no sentido de
reivindicar uma redistribuição diferente do fluxo das informações.
Devo esclarecer que, depois 25 anos, nos vemos diante de uma nova
internacional da informação muito mais radical, ampla e
importante do que aquela que envolveu o debate realizado na década
de 70.
O atual processo de uma nova ordem
da informação é imposto pelo mercado, e não como um
instrumento de cooperação internacional, nem como resultado de
um debate entre os participantes do mundo da informação. Esta
nova ordem da informação caracteriza-se por alguns elementos. Em
primeiro lugar, cresceu de forma marcante o peso do Norte em relação
ao Sul. É claro que não podemos voltar à tecnologia antiga, mas
a nova tecnologia, mais o desequilíbrio do fluxo de informação,
mais a propriedade dos meios de comunicação encontram-se
concentrados, em 92%, nos países industrializados. Existe um
processo de concentração que reduz, ano após ano, o número de
jornais e meios de comunicação disponíveis. E surgiu um
elemento novo muito importante: pela primeira vez, houve uma união
entre os fabricantes de hardware, ou seja, os agentes físicos,
com os de software, ou seja, os provedores de conteúdo. A fusão
da Warner com a American On Line coloca um problema muito
concreto, pois os valores que estão por traz deste sistema, e de
seu conteúdo, são obviamente valores que representam a
perspectiva dos países capitalistas e industrializados.
Essa nova ordem multiplicou-se
vertiginosamente graças à capacidade que as novas tecnologias
oferecem e passamos do mundo da informação – onde alguns
profissionais, como os jornalistas, transmitiam dados para vários
receptores através do jornal, televisão e rádio – para uma
sociedade de comunicação. Isto muda radicalmente as regras do
jogo e é sobre isso que vamos falar. A sociedade civil, que é
formada por todos nós que estamos aqui, pode ser o ator, ou
representar os novos atores da comunicação pois o que acontece,
basicamente, é que a divisão entre a produção e o uso das notícias
desapareceu totalmente.
As Nações Unidas mudaram
radicalmente as regras do jogo quando houve a conferência de
Pequim, das mulheres. Após um grande intercambio, antes da conferência,
as mulheres chegaram e, em poucas horas, puderam assumir o
controle da conferência pois tinham um nível de preparação
muito superior ao dos delegados governamentais. Essa capacidade de
comunicação já fora criada anteriormente, quando o Tribunal
Internacional de Haia aprovou o tratado contra o uso de minas
pessoais e contra os crimes de genocídio, o que permitiu à
sociedade civil ser um ator de importância cada vez maior na
governabilidade internacional.
Temos aqui um escritor
norte-americano muito conhecido, Normal Solomon, que teve um papel
muito importante na desmistificação dos meios de informação,
demonstrando que, na verdade, eles são movidos exclusivamente por
critérios comerciais e político-ideológicos. Recomendo que
conheçam o seu trabalho porque é uma análise crítica do
sistema por dentro, muito viva, muito bem documentada. Considero
um privilégio tê-lo aqui entre nós. A partir do sistema de
informação que o Solomon representa, passaremos para o sistema
de comunicação, para as novas tecnologias. De que formas as
novas tecnologias permitem uma participação maior dos cidadãos,
e de que forma o sistema de comunicação vai permitir, dentro do
atual processo de globalização, o acesso do cidadão ao sistema
de informação e comunicação?
Temos conosco Timothy Ney, que começou
a sua carreira profissional no campo dos produtores cinematográficos
independentes e hoje se encontra entre os que estão criando um
novo software com o objetivo de oferecer acesso mais rápido e
mais forte ao exercício da cidadania no mundo da comunicação.
Depois destas apresentações –
uma sobre a informação e outra sobre a comunicação –
receberemos uma distinta professora e jornalista da Escola de
Comunicação da Universidade de São Paulo, Regina Festa. Ela é
catedrática e teve um papel muito atuante no mundo dos atores.
Pertenceu a duas organizações: foi presidente da Vidazimut, uma
ONG que depois se ampliou criando uma estrutura mundial, reunindo
produtores de vídeo e áudio que estão fora do sistema comercial
propriamente dito mas que têm a capacidade de penetrar, digamos,
no mundo “normal” do sistema de televisão. E também é
membro da MARC, uma das networks que nasceu, que é a
Associação Mundial de Rádios Comunitárias. Ela também
pertence à Agência Nacional dos Direitos da Infância, um
trabalho muito importante que está sendo realizado em relação
ao trabalho infantil. Ela alia a condição de catedrática à
experiência que teve em cada uma destas instituições.
E concluiremos com a senhora Aruna
Roy, da Índia, que não é uma pessoa do mundo da informação e
comunicação. Aruna realiza um trabalho a nível local, em uma área
rural da Índia de tradições muito marcantes, e conseguiu
organizar um processo político com o objetivo de exigir uma
transparência maior por parte das autoridades em relação aos
cidadãos. Lutou pela informação como um direito do cidadão,
para que ele pudesse se conscientizar do seu mundo, do seu
processo e de sua comunidade. Esse trabalho que Aruna está
realizando faz parte de um projeto muito maior, uma campanha
nacional pelo direito dos cidadãos, na Índia.
Falou-se aqui muito de
governabilidade global e eu acho que um dos temas que deveríamos
começar a debater é o da governabilidade da globalização.
Nesse sentido, a informação e a comunicação, enquanto pontos
de partida, são assuntos muito importantes para todos nós.
Reprodução editada da gravação
da palestra proferida, sem revisão final do expositor.
Roberto Sávio* é italiano,
Diretor da Agência de notícias italianas IPS
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