Ótima
Aventura dos Santos
Sociólogo
português levanta a platéia em conferência ao apresentar
propostas concretas à democracia
Marcelo Medeiros
O sociólogo
Boaventura Sousa dos Santos mostrou na conferência sobre
Democracia Participativa – realizada na manhã do dia 4 - porque
é hoje o maior intelectual português ao lado do escritor José
Saramago. Outros conferencistas criticaram a democracia
representativa e falaram sobre suas experências na execução do
orçamento participativo. Santos, porém, foi o único a falar em
soluções.
O italiano Giampiero Rasimelli, da Associação de Recreação e
Cultura Italiana (ARCI), iniciou a conferência afirmando que a
democracia participativa é um valioso instrumento para fugir do
poder centralizado e
institucional, além de ser fundamental para inserir a população
no
processo político. A participação popular serve ainda, de
acordo com Rasimelli, para controlar gastos governamentais e,
dessa forma, atingir os objetivos de qualquer democracia. "A
participação popular é um fim e não só um meio",
lembrou.
As críticas à democracia representativa ficaram por conta do
indiano RVG Menon. "Democracia representativa é apenas votar
periodicamente?", perguntou. A resposta foi que para os
governos sim, mas para a população não e por isso a
representatividade deve ser revista. Citando Ghandi, afirmou que
uma produção centralizada gera uma democracia centralizada.
"A centralização é uma violência e não há socialismo
que resolva isso", disse para em seguida propor um modo de
produção local, que embasaria uma forma de governo
participativa. Para o indiano, a democracia deve ir além da atuação
das organizações não-governamentais e da sociedade civil
organizada. Sua sugestão foi reformular todo o sistema
educacional, segundo ele autoritário, fornecendo bases para a
participação em todas as instâncias da vida.
Seu compatriota Vinod Raina, do All India People´s Science
Movement, compartilhou suas experiências na participação do
governo de um estado indiano que abriu espaço para a participação
popular. Além disso, criticou aqueles que só reclamam e não
colaboram na construção do novo. "Se a pessoa não for
parte da solução, é parte do problema", afirmou.
Rajab Budabbus, da Universidade de Guiné, também se concentrou
nas críticas ao liberalismo. Segundo ele, a democracia vigente é
uma forma de privatização e isso traz desemprego e violência,
principalmente para o Terceiro Mundo.
O ex-prefeito de Porto Alegre Raul Pont se concentrou na experiência
de sua gestão. Em sua fala, houve espaço para um pedido de
melhor distribuição da arrecadação de impostos (somente 14% é
destinado aos municípios) e para esclarecimentos sobre o orçamento
participativo. Pont disse que ele serve para atender as reivindicações
básicas da população e estimular a mobilização das pessoas. A
questão democrática, para o ex-prefeito, é central no combate
à política neoliberal, que privilegia o centralismo.
Em seguida, Boaventura Santos inovou ao sugerir 15 propostas para
uma melhor democracia. "O objetivo do Fórum não é só
discutir, mas também propor", disse. Entre as idéias
apresentadas está a defesa da "demodiversidade", ou
seja, uma luta por democracias diferenciadas em cada localidade,
respeitando as diferenças, mas tendo como base a igualdade. A
frase "o direito à diferença quando a igualdade te oprime e
o direito à igualdade se a diferença te oprime", fechou a
exposição dessa proposta com muitos aplausos.
A "densidade" das democracias também foi comentada.
Para o português, há baixas e altas densidades democráticas. As
primeiras possuem pouca participação popular, enquanto as
segundas são aquelas onde a população participa ativamente do
governo e procura se ampliar sempre,além de lutar contra
discriminações. Uma das formas de participação é o orçamento,
que deve ser fiscalizado pela sociedade, assim como as ONGs que
recebem dinheiro público.
Santos, sempre crítico, fez ainda um pedido de maior democratização
do Fórum Social Mundial, que segundo ele, conta com poucos
participantes asiáticos e africanos e um estímulo ao saber –
"não há democracia como prática se não há como
saber", disse. A afirmação de que a luta pela democracia
participativa não deve ter fim, pois só assim o mundo será
modificado, fez a platéia se levantar para aplaudir o português
durante um bom tempo. Aplausos merecidos para uma bela apresentação.
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