Comitê
Estadual pela Verdade, Memória e
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Ditadura
Militar de 1964 no Rio Grande do Norte
Glênio
Fernandes de Sá
Repressão no RN
Textos
Memorial
do Guerrilheiro Glênio Sá,
Cidadão Natalense 01
Memorial
do Guerrilheiro Glênio Sá,
Cidadão Natalense 02
Memorial
do Guerrilheiro Glênio Sá,
Cidadão Natalense 03
Memorial
do Guerrilheiro Glênio Sá,
Cidadão Natalense 04
Memorial
do Guerrilheiro Glênio Sá,
Cidadão Natalense 05
Memorial
do Guerrilheiro Glênio Sá,
Cidadão Natalense
18
DE MARÇO DE 2012 - 9H20
Por
Walter Medeiros*
Último
dia do ano de 1999. Uma jovem repórter
percorre os arredores da Torre de TV de
Brasília. Olhar atento, ela observa
cada pessoa, dos turistas aos hippyes, principalmente
olhando para os seus braços esquerdos
e mãos direitas. Procurava alguém
que tivesse um cordão amarrado no
braço esquerdo e uma Bíblia
na mão direita. Aproximava-se da
meia-noite. Em menos de uma hora chegaria
o ano 2000, que tanto trabalho deu para
entenderem tratar-se do último ano
do Século XX e não o início
do novo século. Ela procurava não
dar na vista, mas olhava para todos que
encontrava, preocupada em não deixar
de enxergar ninguém. Se aquela pessoa
que procurava estivesse no local ela não
poderia deixar de localizá-la.
O
frio era grande, mas ela era acostumada
com aquelas temperaturas do cerrado e sempre
saía de casa com o agasalho certo;
não teria nenhum problema. Não
tinha perigo de deixar de ver a pessoa que
procurava, se ela estivesse no local, pois
ela conhecia cada canto da torre. Estava
acostumada a fazer reportagens e visitas
ao local, às vezes até para
almoçar no seu restaurante. Ou mesmo
para levar amigos de outros estados a fazerem
compras na tradicional feirinha do local.
Havia uma ansiedade muito grande, pois o
encontro com aquela pessoa poderia ser emocionante.
Ela queria saber aonde e como teria sido
a vida da outra pessoa nos últimos
26 anos.
A
ansiedade aumentava na medida em que aproximava-se
da meia-noite. Seria a passagem do ano e
início do reveillon de Brasília.
Através de um pequeno televisor a
pilha, ela vira de relance festejos da chegada
do ano em outras partes do mundo. Na solidão
de sua missão jornalística,
via a beleza dos fogos de artifício
iluminando o céu da sua amada cidade.
Correu do seu rosto uma lágrima.
Era a emoção da chegada do
ano 2000, a frustração por
não ter encontrado a pessoa que esperava
e o calor anônimo das pessoas que
a cumprimentavam e desejavam “Feliz
Ano Novo!” e “Feliz Ano 2000!”.
Não encontrou o homem do cordão
no braço e a Bíblia na mão.
Mesmo assim aproveitou aquele ambiente que
viu e juntou dados para uma matéria,
na qual contaria o que tinha ido fazer na
Torre de TV naquela hora e revelaria para
seus leitores tudo que sabia a respeito
do homem que fora esperar.
A
imprensa nacional atentou para o encontro
marcado por Glênio Sá, ex-guerrilheiro
do Araguaia, com um ex-companheiro de cela.
Eles combinaram que passariam o réveillon
juntos na Torre de TV de Brasília.
Um jornal da cidade registrou a história
em grande reportagem com a chamada: “Torre
de TV: local em que dois ex-presos do regime
militar marcaram um encontro 25 anos atrás
para comemorar a liberdade”. Glênio
sobreviveu ao regime militar, sem dedurar
ninguém, mas não pôde
contar ao amigo sobre a nova etapa da sua
vida, quando reestruturou o Partido Comunista
do Brasil (PCdoB) em Natal, casou-se, teve
um casal de filhos, acreditava na revolução.
Não conseguiu encontrar o amigo para
falar de coisas boas. Seus contatos resumiram-se
ao período da prisão, havia
tantos anos.
Enquanto
Glênio estava preso por motivos políticos,
o outro fora parar no Pelotão de
Investigações Criminais (PIC),
no Setor Militar Urbano acusado de desviar
armas do Exército. Era um recruta,
preso num cela vizinha. Ninguém sabia
o seu nome. Constava que era paranaense
e fazia contato com o vizinho de cela, apavorado
com os gritos vindos das sessões
de tortura. A Torre de TV era a única
vista externa que os dois tinham a partir
da prisão. Eles subiam numa pia para
contemplá-la, enquanto sonhavam com
a liberdade.
A
forma de se identificarem depois de tantos
anos seria usar um cordão amarrado
no braço esquerdo e conduzir uma
Bíblia na mão direita. Mesmo
Glênio tendo vivido fora de atividades
religiosas, demonstrava grande respeito
pelas Igrejas e o uso da Bíblia no
encontro não seria totalmente despropositado,
pois o seu amigo era evangélico.
Todos estavam atentos no dia. Mas Glênio
não poderia estar lá. Seu
amigo também não foi ao encontro.
Talvez jamais saibamos porquê. A jornalista
lançou um olhar no infinito, para
onde mandava em pensamento suas homenagens
a Glênio e dava por encerrada a busca
pelo encontro que o tempo e a vida desfizeram.
*Jornalista
^
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Memorial
do Guerrilheiro Glênio Sá –
Cidadão Natalense - II
19
DE MARÇO DE 2012 - 7H30
Por
Walter Medeiros*
Uma
das fortes lembranças que guardo
de Glênio Sá é de uma
semana que passamos com as famílias
em Pititinga e, na beira da praia, passos
lentos, ele disse que uma barreira roxa
do caminho trazia-lhe de volta uma lembrança
muito emocionante da juventude. E começou
a cantar uma música de Gilberto Gil
que marcou seu tempo de secundarista em
Fortaleza. - "O dinheiro que eu lhe
dei, p'ro tamborim..." - Você
não conhece essa música? –
perguntou-me. - Conheço. Um sambinha
gostoso. Mas nunca ouvi a letra. - É
assim... Tentou rememorar, mas não
conseguiu completamente.
Outra
forte lembrança vem de uma noite
de 1976, na qual, por acaso, conheci o amigo,
futuro cunhado da minha mulher e vizinho.
Foi no Braseiro, um bar da orla marítima
de Natal, um dos pontos preferidos pelos
estudantes universitários para conversar
sobre política, mesmo cientes de
que eram sempre observados por policiais
disfarçados. Naquela noite, como
que num desabafo incontido, o ex-guerrilheiro
contou parte da sua história a três
companheiros. Desde as lutas como secundarista,
em Fortaleza, até a vida clandestina
no Norte, a peregrinação pelas
prisões e a libertação.
Ele trabalhava pela implantação
do Partido, cujos documentos reconstituía
através de citações
ouvidas nas transmissões da Rádio
Tirana, da Albânia ou de algum registro
em jornais alternativos.
Minha
chegada à Universidade se deu em
1974. Fazia o curso de Direito, que dividia
um bloco com o Curso de Serviço Social.
Aos poucos os alunos reestruturavam suas
entidades dentro do que permitia o Decreto
477, uma norma que proibia estudante de
se manifestar e fazer política partidária.
O campus era coalhado de policiais disfarçados
nas salas de aula e corredores. Qualquer
assunto político, para eles, comprometia
a segurança nacional e era motivo
para o estudante ser chamado a depor na
Assessoria de Segurança e Informação
- ASI.
Era,
porém intrínseco o sentimento
de revolta pela falta de liberdade de expressão
no país, onde havia também
uma Lei de Segurança Nacional que
proibia a imprensa de divulgar informações
que não passassem pela censura. Alguns
jornais tentavam levar uma mensagem democrática,
mas eram perseguidos e empastelados freqüentemente.
Os estudantes sentiam prazer, apesar do
medo, em ajudar jornais chamados de alternativos,
como o Movimento, Em Tempo e EX, que noticiavam
fatos não divulgados pelos jornais
convencionais.
Reunidos
num aparelho que funcionava no quarto dos
fundos de uma casa, Glênio, eu e Graça
sintonizávamos a Rádio Tirana,
da Albânia. Em meio à audição,
o guerrilheiro lembrou dos tempos em que
não sabia ainda qual seria seu destino.
E começou, emocionado, a falar sobre
suas lembranças. Recordou que em
maio de 1969 era estudante e foi preso no
Crato, porque estava tentando junto aos
meus colegas rearticular a União
de Estudantes. A prisão foi divulgada
no Correio do Ceará, quando ele foi
recambiado para Fortaleza. O jornal dizia
que ele tentava fazer uma rearticulação
subversiva. Dizia também que tinha
participado de uma reunião secreta,
na qual fizera severas críticas ao
regime e ao mesmo tempo conclamara a participação
de uma representação da região
caririense em uma reunião grande
que seria realizada em Fortaleza, em fins
daquele mês.
A
primeira prisão tinha sido tão
marcante, que ele lembrava mais detalhes
da notícia, a qual chamava a sua
participação de manobras.
A notícia dizia ainda que ele tinha
distribuído boletins considerados
subversivos pelas autoridades. Ele esteve
preso na Delegacia Especial daquela cidade,
do Crato – relembrava. Lembrava também
que somente no outro dia prestou depoimento,
sendo ouvido oficialmente pela Polícia
Federal. Eles achavam que o seu depoimento
poderia determinar a efetivação
de novas prisões, inclusive dos demais
que participaram do encontro secreto. Glênio
ficou recolhido a um dos xadrezes da Polícia
Militar, em Fortaleza, e no dia seguinte
saiu outra notícia no jornal. Desde
1968 ele participava ativamente do movimento
estudantil secundarista. Foi preso outra
vez, depois de liberado, em 1969.
*Jornalista
^
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Memorial
do Guerrilheiro Glênio Sá –
Cidadão Natalense - III
20 DE MARÇO
DE 2012 - 0H12
Na
próximo dia 23, a Câmara Municipal
do Natal, por iniciativa do vereador George
Câmara (PCdoB), concederá o
título de cidadão natalense
in memorian a Glênio Sá, guerrilheiro
do Araguaia, responsável pela reconstrução
do PCdoB no RN e principal dirigente estadual
entre os anos de 1985 e 1990, quando foi
vítima de um acidente automobilístico
durante sua campanha a senador. Durante
toda esta semana, reproduziremos na íntegra
a série de artigos do jornalista
Walter Medeiros.
Glênio Sá, guerrilheiro do
Araguaia
Por Walter Medeiros*
Sempre
que falava sobre sua vida de lutas, Glênio
Sá não podia evitar que transparecesse
forte emoção, pois era como
que reviver cada momento dramático
da sua vida. Numa das nossas conversas dos
anos 80, ele relatou que em 1970 partiu
para São Paulo e depois se engajou
no então clandestino Partido Comunista
do Brasil – PC do B, indo atuar no
sul do Estado do Pará. Participou
da Guerrilha do Araguaia, onde foi recebido
por João Amazonas e dedicou-se ao
trabalho no campo. Num momento de infortúnio,
ele buscava tratamento para malária,
mas foi delatado e findou preso pelo Exército,
que ocupava vastas áreas da região.
Passou, então, um novo período
de prisão, no qual esteve em vários
quartéis.
“Fui
torturado e submetido a diversos outros
atos desumanos, entre eles a permanência
em cela solitária, na qual sequer
podia ficar em pé”, revelava.
Os companheiros ouviam aquela surpreendente
narrativa sem pestanejar e cheios de curiosidade
pelas informações. Até
porque nenhuma notícia sobre a Guerrilha
do Araguaia havia chegado a público
pela imprensa brasileira; tinham conhecimento
apenas de um registro numa nota do jornal
“O Estado de S. Paulo” sobre
um movimento no Sul do Pará. Qualquer
informação a respeito do assunto
era censurada. Glênio situava no tempo
cada momento, e contou como sua família
tomou conhecimento do seu estado, já
que pensava que ele estava estudando em
São Paulo, mesmo com a ausência
de notícias. Jamais imaginava o que
havia ocorrido e estava ocorrendo.
Em
16 de junho de 1973 uma jovem chamada Divina,
residente no interior de Goiás, escreveu
uma carta dirigida à Farmácia
Minan, para a sua Família, no município
potiguar de Caraúbas. A carta era
datada de 16/06/73. Dizia mais ou menos
assim: “O motivo desta é comunicar-lhe
que seu filho se encontra preso no setor
dos militares no Pique (PIC) em Brasília.
Querendo maiores informações,
procure-me. Estou comunicando ao senhor
pelo fato de meu pai estar preso junto a
ele. Então ele pediu-nos que escrevesse
avisando a vocês. Se vocês receberem
esta carta responda-me. Seu filho Glênio
pede que vocês compareçam em
breve”. Ela pedia que acusassem o
recebimento, porque naquela época
ninguém tinha certeza de que a correspondência
chegava.
Glênio
contava que algumas providências foram
adotadas pela família, que conseguiu
localizá-lo em seu cárcere,
e com quem manteve correspondência
enquanto tomava as medidas jurídicas
cabíveis. A localização
do preso se deu graças a um pedido
do Senador Dinarte Mariz. Daquela correspondência
Glênio lembrava bem uma carta da sua
mãe, Dona Mimosa, enviada de Fortaleza,
em 24.08.74, a qual foi censurada. E prometeu
mostrar depois o documento, com o carimbo
da censura. Vivenciadas todas estas atribulações,
em 10 de setembro de 1974 Glênio voltou
para Fortaleza depois de identificado pela
advogada Eva Ribeiro Monteiro, que conduzia
documento lacônico registrando sua
prisão:
“MINISTÉRIO
DO EXÉRCITO - COMANDO DO I EXÉRCITO
– CHEFIA DE POLÍCIA - DECLARAÇÃO
- Declaro que o portador da presente, GLÊNIO
FERNANDES DE SÁ, esteve à
disposição do I Exército,
achando-se atualmente liberado, podendo
deslocar-se para FORTALEZA, sua cidade natal.
Rio, GB, 05 de Setembro de 1974 (a.) MILTON
BARBOSA DOS SANTOS – Ten Cel - CHEFE
DE POLÍCIA DO I EXÉRCITO”.
Glênio
voltou ao convívio da família
em setembro de 1974, mudando-se em seguida
para Natal, onde prestou vestibular e começou
a cursar Geologia na Universidade Federal
do Rio Grande do Norte - UFRN. Retomou contato
com o movimento estudantil, onde foi dirigente
do Centro Acadêmico de Ciências
Exatas, e liderou a reestruturação
do Partido Comunista do Brasil. Era uma
pessoa extremamente disciplinada e organizada,
com a agenda sempre preenchida por eventos,
estudos e outros afazeres. Acima de tudo,
entretanto, era clara a dedicação
24 horas de cada dia à militância
política.
*Jornalista
^
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Memorial
do Guerrilheiro Glênio Sá –
Cidadão Natalense - IV
21
DE MARÇO DE 2012 - 7H25
Nesta
quarta-feira, 21, reproduzimos a quarta
parte da série de artigos escritos
pelo jornalista Walter Medeiros em homenagem
ao guerrilheiro do Araguaia Glênio
Sá, que no próximo dia 23
receberá o título de Cidadão
Natalense in memorian. Uma iniciativa do
vereador George Câmara (PCdoB), e
integra as comemorações dos
90 anos do PCdoB.
Glênio Sá
Walter Medeiros*
A
têmpera revolucionária de Glênio
fazia-o buscar incessantemente a reimplantação
do Partido na região, através
dos contatos possíveis. Noites, madrugadas
e dias afora ele tentava reconstituir os
documentos, entre eles os Estatutos, ao
mesmo tempo em que procurava participar
dos raros eventos democráticos que
eram programados. Corajosamente, fundou,
juntamente com outros militantes políticos,
no início de 1980, no bairro de Igapó,
uma Sociedade de Defesa dos Direitos Humanos
- SDDH.
A
SDDH foi a forma encontrada para aglutinar
as pessoas e organizar as reivindicações
populares, que eram muitas. Mesmo localizada
em Igapó, a entidade tinha um trabalho
abrangente e seus representantes tornavam-se
propagadores das idéias libertárias
que tomavam corpo a cada dia. Além
do que se tratava de uma associação
criada e registrada dentro de todas as exigências
da legislação civil.
Tratava-se
de uma entidade democrática e comprometida
com a luta dos setores populares, que reunia
um grupo considerável de pessoas
e discutia os assuntos políticos
do momento. A primeira grande luta da sociedade
foi contra a poluição provocada
por uma fábrica de diatomita –
Diafil - que afetava os moradores do bairro.
Manifestações, atos e ações
de protesto contavam com a participação
de operários, donas de casa, clubes
de mães e de jovens, estudantes e
profissionais liberais.
Daquele
movimento surgiu a necessidade de reproduzir
documentos, algo proibitivo à época;
as gráficas eram ambientes muito
visados pela repressão. Optaram,
então, por fazer um jornalzinho mimeografado,
num mimeógrafo a álcool que
adquiriram disfarçadamente na Loja
Sosic e que era capaz de fazer 50 cópias,
em tinta azul, datilografando folhas de
stêncil.
Havia
uma movimentação revolucionária,
onde as exigências por democracia
aumentavam e o povo clamava por uma Constituinte
que substituísse o autoritarismo
da Emenda Constitucional Nº 1, chamada
de Constituição de 1967. Era
conseqüência da experiência
dos anti-candidatos Ulisses Guimarães
e Barbosa Lima Sobrinho, para Presidente
e Vice-Presidente da República e
outros momentos de luta nos meios partidários
e estudantis, uma vez que os sindicatos
quase não participavam de atividades
que entrassem em confronto com a ditadura.
Algum
contato feito pelos partidos clandestinos
eram avaliados muito cuidadosamente, pois
podiam tratar-se de ciladas da repressão.
Tempo em que até as informações
tinham que ser decoradas e não anotadas,
para não deixar pistas. Um dos amigos
comentava sobre a dificuldade que teve para
transmitir uma mensagem a um dos seus camaradas,
um endereço em Paris, que decorou
completamente. E o camarada que recebeu
a informação também
decorou. Ninguém podia se arriscar.
Depois
de retomado o contato com o Partido, periodicamente
recebiam a visita de membros do Comitê
Central, que traziam documentos e informações,
além de realizar reuniões
completas para atualizar a todos. Eram antigos
camaradas, que traziam grandes experiências
da luta revolucionária e novos militantes,
que estavam exercendo funções
importantes na política nacional
ou regional. As reuniões eram sempre
um período de total tensão.
O aparelho tinha que ser mantido na mais
perfeita camuflagem e o sigilo sobre a presença
do representante nacional era total. Nada
podia ser revelado nem mesmo aos familiares
que não estivessem envolvidos com
o Partido, pois tratava-se de questão
de vida ou morte.
*Jornalista
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Memorial
do Guerrilheiro Glênio Sá –
Cidadão Natalense - V
22
DE MARÇO DE 2012 - 8H04
Reproduzimos
nesta quinta a quarta parte da série
de seis artigos escritos pelo jornalista
Walter Medeiros em homenagem ao guerrilheiro
do Araguaia Glênio Sá, que
no próximo dia 23 receberá
o título de Cidadão Natalense
in memorian. Uma iniciativa do vereador
George Câmara (PCdoB), e integra as
comemorações dos 90 anos do
PCdoB.
Walter
Medeiros*
Em
fins dos anos setenta e início dos
anos oitenta a organização
das entidades sindicais podia ser considerada
o assunto mais importante para os trabalhadores
brasileiros. Os movimentos reivindicatórios
surgiam e se expandiam, principalmente nos
sindicatos paulistas, servindo como ponto
inicial de uma série de lutas operárias
no país, culminando com a convergência
de interesses pela conquista de novas condições
de trabalho e pela representação
nacional única.
Interrompida
pelo golpe militar de 1964, a experiência
do Comando Geral dos Trabalhadores –
CGT e demais organizações
populares haviam sido tolhidas de qualquer
possibilidade de atuação.
Os sindicatos sofreram intervenção,
milhares de dirigentes foram presos e perseguidos.
Mas desde 1977, com a chamada “distensão”,
renascera a idéia e a busca da organização
unitária geral, depois que os empresários
promoveram, naquele ano, a 1ª Conferência
Nacional das Classes Produtoras –
CONCLAP.
Glênio
trazia sempre as informações
necessárias à compreensão
do estabelecimento de novos níveis
de organização, acompanhando
atentamente cada evento da área.
Assim, analisava todos os resultados do
3º Congresso Nacional dos Trabalhadores
Rurais, em Brasília; da Conferência
Nacional das Classes Trabalhadoras –
CONCLAT, realizada em agosto de 1980, em
São Paulo; e a decisão dos
5.247 delegados representantes de 1.126
entidades sindicais pela escolha de uma
comissão pró-Central Única
dos Trabalhadores – Pró-CUT.
O
movimento evoluiu e Glênio Sá
era figura sempre presente e influente na
articulação, que mobilizou
sociedades de amigos de bairros, movimento
de mulheres, movimento contra a carestia,
pastoral operária, pastoral da juventude,
associações de servidores
públicos, de estudantes e de professores,
além de partidos políticos
de oposição e dos sindicatos
de trabalhadores. Onde havia espaço,
estava ele levando a sua palavra de luta,
admirada e seguida cada vez por mais pessoas
que decidiam acompanhá-lo.
Em
meio a toda aquela efervescência,
onde as atividades e decisões eram
sempre tomadas em cima de fatos novos e
muitos deles em situações
nunca antes vivenciadas, surgia uma grande
questão, que já apontava para
a futura legalização dos partidos
clandestinos. Num fim de semana mais agitado
para o ritmo de trabalho que levavam, Glênio
e seus camaradas receberam a visita de mais
um emissário do Comitê Central
do PC do B, que tratava da pressa em criar
um partido operário que fosse legalizado,
a fim de reunir aquelas massas esquerdistas
e participar das eleições.
A
sugestão era de que se chamasse PP
– Partido Popular, que seria uma forma
ampla de aglutinar as massas, a partir do
próprio nome. Havia uma vibração
natural pelas novas possibilidades de militância
e pela sigla de fácil propagação:
PP. Mas o esforço não deu
resultado. Poucos dias depois, políticos
tradicionais anteciparam-se e fundaram um
partido com o mesmo nome, embora reunindo
setores da elite. Chegou até a ser
apelidado de “partido dos banqueiros”.
Naquela mesma ocasião surgia o Partido
dos Trabalhadores – PT. Em razão
destes acontecimentos, as demais forças
populares apressaram-se na busca de alternativas
que representassem os anseios daquele momento.
*Jornalista
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