Com esta edição, o boletim eletrônico Correio Tecido Social, lançado
no ar pela primeira vez em outubro de 2003, alcança
seu número 100, que comemoramos com a inauguração da nossa
página web no endereço http://www.dhnet.org.br/redebrasil/tecidosocial/index.htm, onde por agora
só se encontra a informação sobre o que são este projeto
de comunicação e a Rede Estadual de Direitos Humanos - RN,
mas que em breve conterá todas as matérias das passadas
edições livremente consultáveis. Em plena sintonia com o
caráter glocal
da Rede Estadual de Direitos Humanos do Rio Grande do Norte
e de Tecido Social, cujo espírito é projetar para o mundo as
realidades locais e para estas as globais em uma troca continua,
constante e enriquecedora que é ao mesmo tempo de informações,
experiências, formas de expressão, visões do mundo e universos
simbólicos, nesta edição de aniversário, ao mesmo tempo
em que relatamos nossa participação na Conferência
Internacional Democracia, Participação Cidadã e Federalismo que está discutindo
em Brasília os possíveis caminhos para se alcançar uma
efetiva participação popular nos processos políticos,
econômicos e sociais, descrevemos repercussões das
Caravanas de Direitos Humanos que atravessaram nosso Estado
na primeira metade deste ano e contamos - em inglês - a
realidade do pequeno município de Carnaubais, na região
do Vale do Açu, em pleno semi-árido potiguar, para que a luta
tenaz e incansável da sociedade civil carnabauense pela transparência
pública e a justiça social passe a fazer parte do universo
global das alternativas possíveis ao sistema existente.
Do global...
Intensos debates caracterizam o
primeiro dia da Conferência Internacional Democracia, Participação Cidadã
e Federalismo, começada ontem em Brasília
com a inauguração de Lula
Por Antonino Condorelli
Na quinta-feira 2 de dezembro começou em Brasília, no
hotel Bluee Tree Alvorada, a Conferência Internacional Democracia, Participação Cidadã e Federalismo, organizada pelo Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e a Presidência
da República do Brasil.
Através da Conferência, o PNUD terminou os trabalhos
de análise da situação democrática na América Latina começados
com o relatório Democracia na América Latina: rumo a uma democracia
de cidadãs e cidadãos.
O objetivo do encontro foi discutir os problemas
que enfrenta hoje em dia, no continente, esta forma de organização
política da sociedade e apontar possíveis caminhos para
uma efetiva participação da cidadania nos processos econômicos,
sociais e políticos.
Um representante da Rede Estadual de Direitos Humanos
do Rio Grande do Norte, o editor-chefe de Tecido
Social, esteve entre os convidados que participaram
do evento, o que ressalta a percepção clara que o PNUD tem
da importância e o papel decisivo que as redes sociais locais
desenvolvem - e desenvolverão cada vez mais - na discussão
sobre como re-pensar a democracia em sentido participativo
e na execução de ações para concretizá-la.
Uma percepção reiterada por Elena Martínez, Diretora
Regional para América Latina e Caribe do PNUD, no ato de
abertura da conferência, que teve lugar às 9:00 da manhã
da quinta-feira e do qual participou o Presidente da
República do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva.
No discurso de inauguração do evento, Martínez destacou
que o local e o regional são os espaços mais adequados para
construir uma integração social que tenha como eixo uma
perspectiva de identidade, uma identidade ao mesmo tempo
forte e plural, que abranja diferenças, em permanente construção,
A descentralização regional é, segundo Martínez, o caminho
para a integração global, porque deste jeito esta vai se
fundar na pluralidade e não no unilateralismo econômico
e cultural.
No discurso de Lula a integração regional também teve
especial destaque. O Presidente anunciou que no próximo
dia 7 de novembro, em Cuzco, Peru, será inaugurada a Comunidade
Sudamericana das Nações, impulsionada pelos governos que
mais apostaram na integração continental como alternativa
à dependência dos países mais ricos – especialmente, os
de Brasil e Argentina – e que representará o embrião de
uma união econômica, política e cultural das nações da América
do Sul.
A Comunidade estará baseada na cooperação econômica (entre
outros aspetos, para o investimento em infra-estrutura:
construção de rodovias, aeroportos, etc., criação de estradas
e linhas aéreas diretas direitas entre pólos da região não
comunicados, etc.) e na promoção da democracia como elemento
comum da identidade latino-americana. Nas palavras de Lula,
com este primeiro passo para a integração continental “o
antigo sonho de Simón Bolívar está virando realidade”.
Outro passo decisivo para a integração dos países latino-americanos,
afirmou o Presidente, se dará até final de 2006, quando
nascerá o Parlamento do Mercosul, embrião de um futuro Parlamento
Latino-Americano com poderes para aprovar leis cujo cumprimento
deverá ser obrigatório por parte dos Estados nacionais.
Na sua intervenção, Lula lembrou que o relatório do PNUD
mostra que cerca da metade da população da América Latina
trocaria a democracia por um regime autoritário se este
resolvesse seus problemas sociais. Um sinal extremamente
preocupante que, porém, segundo o Presidente não deve ser
interpretado como uma simples rejeição da democracia, mas
como rejeição “à desigualdade e à miséria”, ou seja, “à
falta de democracia
real na vida destas pessoas”.
O desenvolvimento, afirmou Lula, “é uma mudança da sociedade
que liberta seu potencial econômico distribuindo as oportunidades
de maneira eqüitativa”. Não há dilema entre desenvolvimento
e democracia, segundo o Presidente: “O que há é o oposto,
uma estreita e forte interdependência”.
A inauguração da conferência continuou com uma palestra
de Dante Caputo, coordenador do projeto Democracia na América
Latina, na Argentina. Caputo comentou os dados contidos
no relatório do PNUD e, entre outros pontos, ressaltou que
a organização do Estado democrático tem como fundamento
a passagem do individuo como “portador de direitos”
a cidadão que os possui concretamente na
vida de todo dia. “A democracia”, afirmou”,
“propõe que os cidadãos exerçam efetivamente seus direitos,
não apenas que lhes sejam reconhecidos”.
O alarmante dado sobre o rechaço do regime democrático
contido no relatório, segundo Caputo, se debe a que desde
que substituíram as ditaduras militares, há 20 anos, todas
as democracias da América Latina não reduziram de maneira
significativa as desigualdades
e, mesmo quando conseguiram baixar drasticamente os níveis
de pobreza como fez o Chile, não acompanharam a diminuição
da miséria com q redução das diferenças entre os extremos
sociais, que só se agudizaram.
“Democracia significa a liberdade e igualdade”, afirmou.
“Porém, na América Latina a segunda palavra nunca se associou
ao conceito de democracia, o que acabou tornando inexistente
a também a primeira”.
Como a democracia é uma forma de organização do poder
com o fim de tornar os direitos efetivos, o que é preciso
após uma década de modelo neoliberal que reduziu o papel
do Estado nos processos econômicos e sociais ao mínimo,
segundo Caputo, é reconstruir o poder do Estado, ou seja,
pensar uma nova forma de poder democrático e participativo.
E isso, concluiu, pressupõe a reconstrução de uma ideologia
de finalidades, o suficientemente forte como para mover
à sociedade inteira.
Depois da abertura, os trabalhos da conferência prosseguiram
com a discussão do primeiro painel, intitulado Desenvolvimento Nacional, Integração Regional
e Democracia, com as intervenções de Mario Telo, da
Universidade Livre de Bruxelas (Bélgica), de Marco Aurélio
García, da Assessoria Especial da Presidência da República,
e do Ministro-Chefe da Secretaria de Coordenação Política
e Assuntos Institucionais do Brasil, Aldo Rebelo.
Neste primeiro painel, foram abordadas as questões da
autonomia do Estado nacional democrático no contexto de
um mundo globalizado, já que – como acontece no resto do
mundo – os países latino-americanos enfrentam hoje o dilema
de ter que tomar decisões nacionais e realizar escolhas
regionais impostas por forças econômicas externas a eles
ou procurar maneiras de se contrapor e estas, o que torna
cada vez mais necessária a integração continental para ter poder suficiente para decidir
autonomamente o rumo que queremos tomar.
O segundo painel do primeiro dia da conferência se intitulou
Democracia e Participação
Social e contou com as intervenções de Margareth Keck,
professora da Universidade Jonhs Hopkins (Estados Unidos);
Chacho Alvarez, ex-Vice-Presidente da Argentina; Maria Vitória
Benevides, da Universidade de São Paulo; e Luiz Dulci, Ministro-Chefe
da Secretaria Geral da Presidência da República do Brasil.
Neste painel foram exploradas as potencialidades para
se fortalecer a democracia através da introdução de mecanismos
participativos, uma discussão que envolveu os níveis de
governo local, sub-nacional, nacional e supra-nacional.
Neste contexto, o Brasil tem sido um dos países líderes
na introdução de inovações sociais participativas tais como
o orçamento participativo, a criação de conselhos municipais
e o planejamento transparente.
Veja
também:
- ENTREVISTA Dante
Caputo - Coordinador del proyecto Democracia en América
Latina, Argentina - "Para que la democracia no pierda
su legitimidad, hay que destruir el mecanismo que en América
Latina la vincula a pobreza y desigualdad"
- Carnaubais, Rio Grande
do Norte: 21st Century Feudalism in Northeast Brazil
- Carta da Comissão
da Cidadania de Carnaubais ao prefeito eleito
<
Voltar