Tecido
Social
Correio Eletrônico da Rede Estadual de Direitos Humanos
- RN
N.
013 – 24/11/03
TRANSGÊNICOS
E MÍDIA
Reproduzimos
um artigo sobre a maneira grosseira e superficial com que a
revista Veja, na edição da última semana de outubro, tratou o tema dos
transgênicos em uma tentativa totalmente ideológica e sem nenhuma
base sólida (tanto científica quanto econômico-social) de promover
a liberalização destes produtos no Brasil.
Transgênicos: Veja que mentira!
A
reportagem especial "Transgênicos, os grãos que assustam",
publicada na última edição da revista Veja, apresenta uma série
de incorreções e omissões que induzem o leitor a concluir que
a transgenia só oferece benefícios e que todos os grupos contrários
à liberação de tais organismos sem as devidas avaliações de
riscos à saúde e ao meio ambiente são irracionais, passionais
e inimigos do progresso.
O
Idec, entidade que há 16 anos atua de forma coerente e responsável
pela preservação dos direitos do consumidor, fundamentalmente
dos relacionados à saúde e à segurança, repudia o teor da referida
reportagem.
Ao
contrário do que relata a revista, a comunidade científica está
extremamente dividida em relação aos riscos e benefícios dos
OGMs. O jornal britânico The Guardian publicou recentemente
os resultados de um dos maiores estudos de campo já realizados
sobre os efeitos de organismos transgênicos ao meio ambiente.
O estudo é taxativo: em dois casos (canola e beterraba) dos
três estudados, os transgênicos se mostraram prejudiciais ao
meio ambiente. No caso do milho, terceiro produto estudado,
há discussões sobre os resultados obtidos. Veja ignorou este
e outros estudos importantes, que justificam o princípio da
precaução.
Veja
ignorou em todo o texto os direitos básicos dos consumidores
à informação e à escolha. Em nenhum momento abordou a questão
da rotulagem.
Como
forma de apresentar os transgênicos como única alternativa para
combater a fome no mundo, Veja compara a transgenia à "revolução
verde", que na década de 60 teria evitado que dezenas de
milhões de indianos, paquistaneses e chineses morressem de desnutrição.
Não é verdade. Os fracassos da Revolução Verde são muito conhecidos:
degradação ambiental, contaminação de alimentos, concentração
de mercado e pobreza. E mais: a fome aumentou e já atinge 800
milhões de pessoas em todo o mundo, inclusive indianos, paquistaneses,
chineses e brasileiros. Como bem deveria saber Veja, atualmente
se produz comida suficiente para alimentar os pouco mais de
6 bilhões de habitantes no mundo. O problema não está na produtividade
agrícola, nem nas deficiências da produção em relação à demanda
de alimentos, mas no sistema econômico, onde consumidores não
têm acesso aos alimentos básicos. Ao contrário, Veja deveria
mencionar que as empresas de biotecnologia já dispõem do "terminator",
ferramenta genética patenteada que, aplicada às sementes, fará
com que as plantas produzam grãos estéreis, obrigando que os
agricultores (e nações) comprem sementes em todas as safras.
A
revista traça um paralelo jocoso entre a liberação dos transgênicos
e a "Revolta da Vacina", episódio em que, equivocadamente,
a sociedade se rebelou contra a campanha de vacinação promovida
pelo sanitarista Oswaldo Cruz. Esqueceu, porém, de mencionar
episódios como o ocorrido com a Talidomida, medicamento responsável
por uma geração de pessoas com deformidade, os agrotóxicos organoclorados
e várias drogas veterinárias, que são cancerígenos, que passaram
por análises superficiais e tiveram que ser mais tarde proibidas,
com um prejuízo irreparável para a sociedade.
Veja
relata que nos Estados Unidos "há três órgãos federais
regulamentando a produção de safras e alimentos geneticamente
modificados. Entre eles está o FDA, departamento que analisa
os níveis de toxicidade e potencial alergênico dos grãos para
só então autorizá-los a entrar no mercado. Segue-se para os
transgênicos o mesmo processo de verificação usado na aprovação
de remédios".
Não
é verdade. Nos Estados Unidos, os alimentos transgênicos são
desregulamentados e são tratados como se fossem alimentos convencionais
e, por isso, não são feitas as análises de risco similares a
medicamentos, aditivos ou agrotóxicos. A FDA foi processada
pela superficialidade com que tratava os alimentos transgênicos,
sendo reveladas 44 mil cópias de documentos que comprometeram
a credibilidade da Agência (ver www.biointegrity.org).
Além
disso, ao comparar alimentos transgênicos com medicamentos,
Veja desconsiderou aspectos básicos que os diferenciam:
1-
A autorização de um medicamento passa por diversas fases, que
podem durar décadas, e ao serem liberados têm um protocolo de
monitoramento de reações adversas, que, não raras vezes, identifica
problemas e leva esses produtos a serem proibidos ou restritos.
Os transgênicos, até agora, são rapidamente aprovados para comercialização
e não têm qualquer monitoramento pós-comercialização.
2-
Medicamentos chegam ao consumidor de forma altamente purificada,
mas os alimentos transgênicos são consumidos por completo, incorporando
não apenas a modificação genética, mas também quaisquer substâncias
formadas nas alterações resultantes diretamente da manipulação
genética, ou, indiretamente, devido a efeitos não esperados
ou, ainda, devido a mudanças em práticas agrícolas (aumento
do uso de agrotóxicos) ou condições ambientais decorrentes das
características do novo produto;
3-
O medicamento é utilizado, geralmente, em uma pessoa doente,
sem muitas alternativas terapêuticas e, portanto, há algum nível
de aceitação de risco, inclusive o imprevisível, como as reações
alérgicas. O alimento é geralmente consumido por pessoas saudáveis,
que não aceitam riscos previsíveis ou imprevisíveis, pois têm
outras opções alimentares sem risco.
4-
O medicamento é acompanhado de extensa informação sobre as características
do produto e seus riscos e benefícios. Já o alimento transgênico,
até o momento, não é acompanhado de nenhuma orientação ou rotulagem
completa.
Apesar
de ridicularizar a preocupação dos chamados "opositores
ideológicos" dos transgênicos com o aspecto econômico da
questão, Veja evidencia que, mesmo não apresentando vantagens
ao consumidor ("Na Europa, o óleo produzido com soja transgênica
está um pouco mais barato que o da versão não transgênica. Ainda
assim, não é possível afirmar se o preço menor se deve aos ganhos
de produtividade ligados à transgenia ou a uma política de preços
favoráveis para tentar contornar uma eventual resistência do
consumidor."), "a biotecnologia tem-se revelado um
bom negócio para as companhias. Um cálculo feito pela Universidade
de Iowa, nos EUA, chegou à conclusão de que, em 1999, o plantio
de soja transgênica resultou em um excedente de 2,7 bilhões
de reais em toda a cadeia. A maior parte desse dinheiro, 55%,
ficou com a Monsanto; os outros 45% foram distribuídos pelos
milhares de fazendeiros que plantaram as sementes modificadas".
Conclusão: o aspecto econômico deve considerado apenas pelas
empresas. O consumidor deve se contentar apenas os riscos. Além
disso, a definição da rentabilidade como parâmetro de validação
dessa tecnologia é extremamente perigoso, pois poderá estimular
cultivos como o da maconha, atividade também ilegal, mas inegavelmente
rentável para todos os elos da cadeia produtiva.
Veja
apregoou que as empresas oferecem lucros de 25% a mais para
os agricultores que aderirem aos transgênicos. A propaganda
é desmentida pelos próprios agricultores: A FAEP - Federação
de Agricultura do Estado do Paraná informa que esta diferença
é de no máximo 10% para a soja RR e pode ser anulada pela produtividade
menor. No Rio Grande do Sul, a produtividade da última safra,
que foi em grande parte transgênica, foi de 2,6 toneladas por
hectare. Na Argentina, que tem solo muito mais fértil, o resultado
foi 2,8. No Paraná, que não teve soja transgênica (menos de
5%), a produtividade foi de 3,0 toneladas por hectare. Além
disso, os agricultores terão de pagar royalties e sofrerão rejeição
do produto transgênico pelos consumidores/importadores de outros
países.
Além
disso, também não informou que houve aumento de quase três vezes
no uso de glifosato no estado do Rio Grande do Sul, segundo
dados do Ibama, com todos os impactos previsíveis para a saúde
dos trabalhadores e para o meio ambiente, entre outros.
Veja
se "esqueceu" de informar que com a soja transgênica
teremos um aumento de resíduos de glifosato nos alimentos e
nas águas de abastecimento, devido ao uso em quantidade muito
maior dessa substância na agricultura. Em setembro de 1998,
praticamente, na mesma semana em que o parecer favorável da
CTNBio para a liberação da soja RR era divulgado, o Ministério
da Saúde aumentou 100 vezes o limite de resíduos desse veneno
nos produtos à base de soja (Portaria 764, de 24 de setembro
de 1998). Ou seja, de 0,2 partes por milhão para 20 partes por
milhão, constituindo-se em uma conseqüência danosa para os consumidores.
Após a contestação feita por vários órgãos, inclusive o Idec,
outra portaria foi publicada, estipulando em 2 ppm o limite
de glifosato na soja, ainda assim, dez vezes mais. Em setembro
de 2003, a ANVISA corrigiu a monografia e voltou aos 0,2 ppm.
Com a liberação de plantio da soja transgênica e, se for liberado
o Glifosato para uso na parte aérea da planta (o que ainda é
proibido), como ficarão os limites? Não temos dúvidas que a
empresa Monsanto irá pressionar para que sejam elevados os limites
do herbicida na nossa comida.
Veja
criticou o currículo de assessores da ministra do meio ambiente.
Porém, calou-se sobre a inacreditável trajetória do americano
Michael Taylor, descrita no livro "Seeds of Deception",
publicado em 2003 (Yes! Books), pelo jornalista Jeffrey M.Smith.
O advogado atuou no escritório King and Spaulding ajudando a
Monsanto a preparar projetos utilizados pelo lobby da biotecnologia
para direcionar a regulamentação da política dos transgênicos
no país. Após desempenhar esse trabalho, Taylor passou a ocupar
um cargo no FDA, criado especialmente para ele, tornando-se
o funcionário mais influente no processo de regulamentação dos
transgênicos dentro da agência.
Para
não fugir ao "script" das matérias que fazem apologia
aos transgênicos, descreve alimentos que vão combater a hepatite
B, cólera e diabetes, mas não comprova onde estão disponíveis
para nós, consumidores, essas "novidades". Até agora,
só fomos apresentados à soja com mais glifosato e milho-inseticida.
Também
esqueceu de mencionar o episódio do tomate transgênico, que
prometia durar mais, mas acabou retirado do mercado nos Estados
Unidos, possivelmente, por um problema de palatabilidade.
Veja
fundamenta suas informações em "pesquisas publicadas e
revisadas", cujas fontes não são reveladas. Talvez, isso
confirme o que afirmam dois pesquisadores espanhóis, José L.
Domingo Roig e Mercedes Gómez Arnáiz, no estudo "RIESGOS
SOBRE LA SALUD DE LOS ALIMENTOS MODIFICADOS GENÉTICAMENTE UNA
REVISION BIBLIOGRAFICA", publicado na Revista Española
de Salud Pública - v.74 n.3 - 05/06.2000: "Fato é que não
foram realizados estudos experimentais suficientes sobre os
potenciais efeitos adversos dos alimentos transgênicos para
justificar sua segurança". Os autores encontraram apenas
seis estudos experimentais originais publicados e chamam atenção
para a ausência de referências correspondentes a estudos ou
avaliações nutricionais, toxicológicas e imunológicas relacionadas
a esses alimentos, com caráter experimental. E concluiram:
"(...)
podem-se estabelecer algumas conclusões referentes ao conhecimento
do estado atual dos potenciais efeitos adversos sobre a saúde
por parte dos alimentos geneticamente modificados. Assim, apesar
de as manifestações nos meios de comunicação, levadas a cabo
por representantes das empresas de biotecnologia que se dedicam
à elaboração dos alimentos geneticamente modificados, indicarem
que, de acordo com seus estudos, o consumo de alimentos geneticamente
modificados já comercializados ou em vias de o serem não implica
riscos para a saúde humana, diante da ausência de publicações
de experimentos originais, o manifestado pelas ditas empresas
converte-se em mero ato de fé, pelo fato de os resultados não
terem podido ser devidamente julgados ou comprovados pela comunidade
científica internacional. Tal como temos indicado, até a presente
data, nas bases de dados Medline e Toxline compila-se apenas
cifra muito reduzida de artigos correspondentes a estudos experimentais
diretamente relacionados com o tema que é objeto desta revisão.
Nenhum deles pertence a companhias do setor biotecnológico ou
foi desenvolvido em agências ou organismos reguladores (...)"
No
livro "Seeds of deception", de Jeffrey M. Smith, o
autor indica que apenas 10 estudos sobre o uso de alimentos
transgênicos em animais foram publicados, sendo que apenas dois
são independentes. Um encontrou danos no sistema imunológico
e em órgãos vitais, bem como e uma condição potencialmente pré-cancerígena.
E quando o cientista procurou alertar o público sobre isso,
ele perdeu seu emprego e foi silenciado com ameaças de processos
judiciais. Outros dois estudos, da mesma forma, mostraram evidencia
de uma condição potencialmente pré-cancerígena. O autor menciona
ainda que estudos não publicados revelam que cobaias alimentadas
com transgênicos desenvolveram lesões estomacais e que 7 em
40 morreram no prazo de duas semanas.
Para
sacramentar como verdade absoluta os benefícios dos transgênicos,
a revista enunciou, em 10 itens, supostas verdades e mentiras
sobre os OGMs. Leia abaixo os comentários do Idec sobre cada
item:
1-
Alergia
Veja: A ingestão do grão transgênico pode provocar mais alergias
do que a versão natural?
O corpo humano cria anticorpos contra elementos estranhos, como
bactérias, vírus e pó. Cerca de 2% dos adultos e 7% das crianças
desenvolvem anticorpos contra proteínas presentes em alimentos,
em geral soja, leite, ovos, peixes e frutos do mar. A lista
de alimentos apontados como fonte alergênica contém mais de
180 itens não transgênicos. Como a transgenia envolve a troca
ou adição de proteínas, os experimentos laboratoriais podem
chegar a espécies que provocam, sim, novas alergias. Justamente
em função disso, os fabricantes testam exaustivamente as sementes
e destroem as espécies que causam alergia após a aplicação de
testes. Recentemente, uma pesquisa com sementes de feijão realizada
no Brasil foi encerrada depois que o laboratório descobriu -
e anunciou - ter chegado a uma espécie alergênica. Para analisar
a possibilidade de falhas no processo, cientistas independentes,
não envolvidos com a produção de transgênicos, estudaram a segurança
dos alimentos que, depois de testados e aprovados, foram colocados
no mercado. Não se identificou o surgimento de alergias adicionais.
Detectaram-se casos de alergia a grãos transgênicos apenas entre
alérgicos ao grão comum.
Comentário
do Idec: De fato, embora insuficientes, os testes de alergenicidade
têm sido feitos, mas isso não evita que possam ocorrer acidentes,
como o ocorrido com o milho Starlink, no qual o milho transgênico
que deveria ser utilizado somente para alimentação animal, por
ser alérgico a pessoas, acabou indo para consumo humano em alimentos
a base de milho. Centenas de marcas de alimentos a base desse
milho foram retiradas das prateleiras nos EUA. Não reportar
esse caso, que envolveu uma questão de alergia, foi um dos maiores
erros da reportagem.
2-
Fracasso
Veja: Qual é o destino dos grãos experimentais quando as pesquisas
com transgênicos fracassam e resultam em espécies que podem
produzir alergias?
As experiências com genes são feitas sob rigorosa fiscalização,
e apenas as espécies seguras deixam o laboratório. No caso dos
clones, 97 de cada 100 experiências acabam abortadas porque
os animais gerados são deformados. O mesmo vale para os transgênicos.
Em meados dos anos 90, a Embrapa tentou produzir um feijão que
tinha o gene da castanha-do-pará. Esse gene estimulava a produção
de aminoácidos que faltavam ao feijão, deixando o alimento mais
nutritivo. No entanto, descobriu-se que o gene podia causar
alergia em quem o ingerisse, e o experimento foi abandonado.
No ano passado, tentativas feitas na Inglaterra para tornar
batatas resistentes a um determinado inseto também fracassaram,
porque a planta passou a ser vulnerável a outros insetos. Em
todos esses casos, a produção dos laboratórios foi destruída,
em geral incinerada.
Comentário
do Idec: Aqui também poderia ter sido relatado o caso Starlink
e outros fracassos da engenharia genética, como o caso do salmão
transgênico proibido por colocar em risco a espécie natural,
o dos porcos transgênicos abatidos para consumo e o do suplemento
alimentar triptofano, entre outros.
3-
Câncer
Veja: Passaram-se décadas até que se estabelecesse uma relação
de causa e efeito entre o cigarro e o câncer. Por que acreditar
que os transgênicos não oferecem risco nessa área?
A fumaça do cigarro contém quase 5.000 substâncias, das quais
sessenta são consideradas cancerígenas. Sabe-se que o cigarro
é responsável por 90% dos casos de câncer de pulmão e por 35%
dos vários outros tipos. Tais dados foram produzidos em estudos
variados preparados pela comunidade científica. E é essa mesma
comunidade científica que informa que até o momento não foram
identificados casos de câncer provocados por transgênicos. Entre
o início das pesquisas de um grão transgênico e o lançamento
desse grão no mercado na forma de produto são gastos em média
seis anos em estudos - equivalentes ao tempo consumido na pesquisa
de novos medicamentos. Cientistas independentes garantem que
o prazo é suficiente para estudar detalhadamente as espécies,
avaliar seus impactos no ambiente e investigar eventuais riscos
à saúde.
Comentário
do Idec: A comparação com o cigarro é absolutamente incompreensível.
Ao contrário do que é dito no final, ainda não foram feitos
os estudos de avaliação do impacto ambiental e de riscos à saúde.
Vários cientistas apontam para o risco do uso do vírus do mosaico
da couve-flor, usado em muitos alimentos transgênicos, causar
câncer. O Dr. Stanley Ewen, consultor em histopatologia da Aberdeen
Royal Infirmary, por exemplo, afirma que o vírus mosaico da
couve-flor utilizado em alimentos transgênicos pode aumentar
os riscos de câncer de cólon e de estômago. Conforme foi mencionado
anteriormente, o escritor Jeffrey M. Smith, apresenta em seu
livro casos de danos à saúde já relatados.
4-
DNA
Veja: Os alimentos modificados são feitos com pedaços de DNA
que não pertencem à semente original, muitas vezes retirados
de vírus e bactérias. Tais "corpos estranhos" não
podem fazer mal ao homem?
Podem, mas a chance estatística é a que tem uma pessoa de ser
atingida por um raio ao atravessar um campo de futebol numa
tarde de chuva. Ou seja, trata-se de hipótese cientificamente
possível, mas estatisticamente improvável. Uma vez ingerido,
o DNA da planta transgênica é decomposto no processo de digestão
da mesma maneira que o DNA de uma planta convencional. Se ele
não for digerido, há a possibilidade de que seja incorporado
de alguma forma pelo corpo humano e desenvolva alguma doença.
A mesma possibilidade de ser atingido por um raio, afirmam os
estudiosos.
Comentário
do Idec: As conclusões e a comparação com o raio são simplistas.
A propósito, lendo atentamente, usando-se o mesmo raciocínio
da revista, comer transgênico tem o mesmo risco de ser atingido
por um raio. Alguém se arrisca a fazer isso três ou mais vezes
por dia?
5-
Antibiótico
Veja: Alguns transgênicos recebem genes de bactérias resistentes
a antibióticos. Quando esses alimentos são ingeridos, as bactérias
presentes no corpo humano não vão se tornar resistentes aos
antibióticos e impedir o combate a uma doença?
Avicultores e pecuaristas utilizam antibióticos regularmente
para evitar que os animais desenvolvam certas doenças que, ao
atingir o sistema imunológico, prejudicam o ritmo de engorda.
Há vários estudos mostrando o efeito no corpo humano da ingestão
de carne cujo animal foi tratado com antibiótico. Calcula-se
que as pessoas tenham no corpo 200 vezes mais bactérias do que
o total de seres humanos nascidos desde o surgimento do homem.
O que se sabe é que o antibiótico, se utilizado de forma incorreta
ou descontrolada, pode aumentar a resistência de algumas dessas
bactérias. Em caso de doença, reduz-se a gama de antibióticos
que atuem de forma eficaz contra a bactéria causadora do mal.
É diferente com os transgênicos. Os grãos transgênicos possuem
um gene resistente a um antibiótico, e não o antibiótico em
si. É o contrário dos animais, cuja carne contém os antibióticos
que receberam durante o período de engorda. O risco de as bactérias
presentes no sistema digestivo se tornarem mais resistentes
ao se combinar com o gene da planta transgênica é outra hipótese
científica de efeito estatístico irrelevante. Em sete anos de
consumo em larga escala de alimentos transgênicos, principalmente
soja, milho e canola, nunca foi registrado um só caso de doença
relacionada ao produto geneticamente modificado.
Comentário
do Idec: Mais uma vez a revista usa um fundamento não científico
para justificar que nem um caso foi registrado de resistência
a antibióticos relacionado a transgênicos. Deveria dizer que
não é feito qualquer monitoramento para este ou qualquer outro
problema com os transgênicos. A revista deixa de informar que
o Codex Alimentarius, órgão da FAO e OMS, em 2003 desaconselhou
o uso de genes marcadores de resistência a antibióticos e que,
na gestão dos riscos, recomenda o reconhecimento e o uso de
medidas apropriadas em relação às incertezas científicas, a
rotulagem dos produtos, o rastreamento dos produtos, o monitoramento
pós-mercado, entre outros aspectos.
6-
Mutação
Veja: Para a produção de transgênicos são usadas cadeias de
DNA que não existem na natureza. A ingestão de alimentos geneticamente
modificados não pode alterar a cadeia de DNA do próprio homem?
Os ecologistas muitas vezes se referem ao mal da vaca louca
como se fosse um caso pertinente à discussão a respeito de alimentos
modificados. Naquele episódio, o rebanho bovino, exclusivamente
vegetariano, foi alimentado por criadores europeus com rações
preparadas com restos de outros animais. O uso de animais doentes
para alimentar os sadios gerou uma epidemia que levou à morte
200.000 animais somente na Inglaterra. O causador seria uma
proteína mutante dos animais, capaz de provocar a degeneração
do tecido cerebral. Embora a história seja assustadora, não
há nenhuma relação entre uma coisa e outra. Primeiro, a ração
dos bois não era resultado de modificação genética, mas de simples
mistura. Depois, o DNA das plantas transgênicas em geral não
é modificado de forma aleatória, mas controlada. No processo
digestivo, o DNA do transgênico é fragmentado, da mesma forma
que o DNA presente em pêlos de ratos e restos de baratas identificados
em diversos alimentos convencionais, até mesmo em orgânicos.
Comentário
do Idec: O caso da vaca louca é tratado como uma questão alheia
aos transgênicos. Do ponto da saúde pública, esse caso evidencia
uma lição a ser aprendida: NUNCA REALIZAR ANÁLISE SUPERFICIAL
DE RISCOS Á SAÚDE antes de adotar novas técnicas. Ademais, esse
também é um excelente exemplo para mostrar que os consumidores
têm razão em sua percepção de que nem tudo lhes é contado sobre
a segurança dos alimentos.
7-
Ebola
Veja: Qual o risco de uma semente transgênica em fase de teste
ser roubada do laboratório e contaminar a natureza?
Na Inglaterra, em 1978, uma amostra do vírus da varíola vazou
no laboratório de uma universidade, contaminando uma pesquisadora.
Nos Estados Unidos, o Centro para Controle e Prevenção de Doenças
(CDC) é um órgão do governo que estuda vírus e desenvolve vacinas.
Na sede de Atlanta estão guardados em cofres-fortes frascos
com alguns dos mais temíveis vírus, entre eles o da varíola
e o ebola. Muito já se escreveu sobre as terríveis conseqüências
para a humanidade se ocorresse ali um acidente ou um atentado.
E no caso dos laboratórios que pesquisam os transgênicos, não
é possível acontecer a mesma coisa? Uma semente não pode escapar
e contaminar a natureza? Na fase em que as sementes são "batizadas"
com genes de microrganismos, o trabalho é interno, feito em
laboratório. Elas são inicialmente plantadas em ambientes fechados.
Numa etapa seguinte, após vários testes, as sementes são plantadas
em fazendas experimentais, totalmente monitoradas para evitar
acidentes. Elas são mantidas a uma distância muito grande de
outra plantação convencional ou de ambientes selvagens. Em tese,
uma dessas sementes ou o pólen podem se espalhar pelo ambiente.
Mas aqui novamente a estatística trabalha a favor da ciência.
A probabilidade de proliferação de uma planta fora da lavoura
é de 0,1%, segundo estudo divulgado neste ano pelo governo inglês.
Comentário
do Idec: A fiscalização dos experimentos é falha. Isto já foi
reconhecido no Brasil, pelas autoridade do Ministério da Agricultura,
e em outros países.
8-
Vento
Veja: Se o vento espalhar sementes de uma lavoura transgênica,
outras espécies naturais não podem sofrer mutações perigosas?
O que se constatou até o momento é que, em alguns casos, ervas
daninhas se cruzam com as plantas transgênicas e adquirem suas
características, como a resistência a um inseticida ou a herbicidas.
No Canadá, onde há liberdade total para o plantio de determinadas
variedades de canola tolerantes a herbicidas, há casos de ervas
daninhas que adquiriram a mesma característica. Os cientistas
avisam que a capacidade de gerar espécies resistentes a herbicidas
não é exclusiva dos transgênicos. Nos últimos quarenta anos,
surgiram em todo o mundo cerca de 120 espécies de plantas não
transgênicas resistentes a herbicidas. Todas proliferaram apenas
nas lavouras, não em ambiente selvagem.
Comentário
do Idec: O risco da contaminação transgênica, levando à resistência
a herbicidas por plantas, é absolutamente minimizado na matéria.
A pesquisa da revista foi superficial, pois já existem trabalhos
científicos sobre este tema.
9-
Solo
Veja: As plantas liberam DNA no solo, pelas raízes. Os cientistas
já pesquisaram qual é o efeito do acúmulo de DNA modificado
no solo?
A maior parte do DNA é destruída durante o processo de decomposição
natural da planta, mas há uma pequena possibilidade de que seus
genes sejam incorporados por microrganismos que vivam ao redor
de sua raiz. Ou seja, as bactérias que habitam o solo podem
adquirir os genes das plantas, sejam elas transgênicas ou não
transgênicas. No caso dos alimentos modificados, que muitas
vezes recebem o gene de uma bactéria, a dúvida é o que poderia
acontecer se os genes adquiridos pela bactéria que mora no solo
forem justamente aqueles que pertenciam a outra bactéria. Os
estudos realizados em lavouras sugerem que o efeito desse processo
tende a ser insignificante para o microrganismo, mas os cientistas
recomendam que o fenômeno deve ser analisado com mais profundidade.
Comentário
do Idec: É o único item da reportagem que reconhece a necessidade
de mais pesquisas, mas deixa de abordar o impacto negativo do
uso de agrotóxicos em maior quantidade nas culturas transgênicas
resistentes a eles. O glifosato é um exemplo e deveria ser citado.
10-
Fauna
Veja: Há indício de que algum animal, seja ele grande ou pequeno,
como um inseto, possa sofrer em função dos transgênicos?
Os estudos sobre o efeito dos transgênicos na fauna apontaram
para duas conclusões. A primeira identificou que, em algumas
plantações de grãos modificados, a população de minhocas, mariposas
e outros insetos registrou uma pequena redução. No que diz respeito
a eventuais conseqüências em outros animais que se alimentaram
de sementes transgênicas, não se descobriu até o momento nenhuma
alteração no mapa genético original nem mesmo a ocorrência de
alguma doença.
Comentário
do Idec: A revista não cita importante pesquisa divulgada no
início deste mês, que demonstrou que duas das três plantações
experimentais, autorizadas pelo governo da Grã-Bretanha, de
organismos geneticamente modificados (OGM), semente de uva para
óleo e beterraba para fabricação de açúcar, são mais danosas
ao meio ambiente, inclusive para os insetos, do que as culturas
tradicionais.
Fonte:
IDEC
Veja
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