História
dos Direitos Humanos no Brasil
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1982
I
Encontro Nacional de Direitos Humanos do
MNDH
1982, Petrópolis-RJ
Núcleo
Boqueirão-Santos— SP
Centro
de Defesa dos Direitos Humanos (CDDH)
SUA
PROPOSTA, SUA HISTÓRIA: UM
BALANÇO DE UM ANO DE ATIVIDADES
O
Centro de Defesa dos Direitos Humanos –
Núcleo Boqueirão-Santos,
nasceu a partir de encontros que um grupo
de sete pessoas passou a manter aos sábados
á tarde, na Igreja dos Passos. Animava-os
a perspectiva de realizar um trabalho concreto
de participação e ação na comunidade. Todos
sentiam a necessidade de realizar algo,
a partir do bairro, irradiando-se pela cidade
e pela região.
Após
algumas reuniões, chegou-se á conclusão
de que a melhor forma de materializar este
trabalho seria organizar um Centro de Defesa
dos Direitos Humanos. Nascia então o CDDH-Boqueirão,
uma associação que, logo a principio, manifestava-se
sem vinculo ã religião (para não reduzir
sua capacidade de aglutinação) nem a partidos
políticos (embora reconhecesse o caráter
político, não-partidário, de toda sua atividade).
O
manifesto de lançamento do Centro destacava:
«O CDDIH propõe-se a uma luta constante
e incessante pela valorização do homem (...)
Lutamos
ao lado do povo, na busca de seus direitos.
Não bastam, porém, palavras ou propósitos
ê necessário a ação. Ação consequente e
consciente que nos propomos a levar, ocupando
todos os espaços, atuando sempre pela liberdade,
pela justiça e pela dignidade do homem».
O
Centro foi lançado oficialmente em setembro
de 1980, com a realização de um Ciclo de
Palestras, que foi aberto por José Gregori,
atual presidente da Comissão Justiça e Paz
de São Paulo, que em memorável imite falou
sobre “Os Direitos Humanos” para cerca de
500 pessoas que lotaram a Igreja dos Passos.
Dentro
desse ciclo, abordou-se ainda os Direitos
Humanos e a Liberdade Sindical>, com
a presença de diversos líderes sindicais
da Baixada Santista, “Os Direitos Humanos
e a Política”, com Esmeraldo Tarquinio,
e “Os Direitos Humanos e a Participação
da Comunidade”, com o padre Javier Mateo
Arana, vigário da Igreja dos Passos.
Iniciou-se,
então, a atividade organizada do CDDH. Foi
instituído um plantão semanal para atendimento
de casos de violação de direitos humanos.
Tal plantão vem funcionando ininterruptamente,
às 4ª-feiras, a partir de 19 horas, e foram
inúmeras as pessoas que procuraram o Centro.
Violências, perseguições, direitos trabalhistas
não respeitados, até desequilíbrios psicológicos
foram trazidos ao plantão das 4ª-feiras.
O
CDDH propõe-se, porém, a registrar e encaminhar
os casos que lhe são apresentados. Não procura
ter uma visão “assistencialista”, de socorro
direto às pessoas; ao contrário, preocupa-o
o painel social que é construído a partir
das denúncias que lhe são trazidas. Na
assistência jurídica, o Centro tem contado
com o valioso apoio da OAB — subsecção de
Santos.
O
caso mais destacado que passou pelo plantão
diz respeito ao desaparecimento de Nivaldo
dos Santos, morador de São Vicente, SP.
Sua mãe procurou o plantão do CDDH para
denunciar a prisão e desaparecimento do
filho, ocorrido em agosto de 1980. O Centro
passou, então, a atuar no caso, assessorado
pela OAB. Foi apurado que o rapaz, juntamente
com um companheiro, Cosme das Neves, havia
sido realmente preso pela Policia Militar
e encaminhado para a Delegacia de São Vicente.
Lã não constava, porém, qualquer registro
de sua presença, nem de seu companheiro,
embora testemunhas confirmassem sua prisão
e declarassem ter presenciado violências
físicas nos dois rapazes. Infrutíferas foram
as buscas nas delegacias e presídios da
Baixada Santista. Denunciado o desaparecimento
ao promotor público, foi instaurada sindicância
no Fórum de São Vicente, ainda em andamento.
Testemunhas foram chamadas, inclusive um
dos companheiros de cela na Delegacia que
confirmou ao promotor tê-los visto presos
naquela Época.
O
Centro, após as providências jurídico-legais,
ainda denunciou publicamente aos jornais
locais o desaparecimento e suas circunstâncias,
dando um balanço das investigações feitas
e dos fatos apurados.
*
* *
O
Centro buscou também discutir amplamente
seus Estatutos, para que representassem,
de unia maneira real, seus objetivos e sua
forma de organização e atividade. Foi definido
que os objetivos do Centro eram os de conscientizar
a população, buscando trazê-la ã participação
organizada. Estabeleceu-se que o CDDH atuaria
a partir do bairro do Boqueirão, procurando
irradiar sua atividade em toda a cidade,
incentivando a formação de outros núcleos
de defesa dos direitos humanos nos demais
bairros.
O
Centro de Defesa dos Direitos Humanos —núcleo
Boqueirão definiu ainda sua organização
interna baseada em departamentos, sendo
inicialmente criados:
a)
departamento cultural;
b)
departamento do plantão semanal;
c)
departamento de publicidade e relações públicas;
d)
departamento jurídico.
O
Estatuto está registrado e a organização
interna será implantada a partir da admissão
de novos associados, para o que ampla campanha
de filiação será desencadeada.
OUTRAS
ATIVIDADES DO CDDH EM SEU 1º ANO
1.
Posicionamento, por meio de notas à imprensa,
em diversas situações e acontecimentos,
como quando do adiamento das eleições de
1980 e da demissão de professores do curso
de Psicologia da Faculdade de Filosofia
da SVSL.
2.
Promoção especial de sessão de lançamento
do filme “OS ANOS JK”, de Silvio Tendler,
em outubro de 1980.
3.
Participação na Campanha de Solidariedade
ao povo de El Salvador, ao lado de diversas
entidades nacionais, entre elas o Secretariado
Nacional de Justiça e Não Violência e o
CBS: Comitê Brasileiro de Solidariedade
aos Povos da América Latina.
Dentro
da campanha, o CDDH promoveu missa em homenagem
ao 1º aniversário da morte do arcebispo
de San Salvador, D. Oscar Romero, celebrada
por O. David Picão, bispo de Santos, e ato
público, ocorrido em 1º de abril de 1981.
Neste ato estiveram presentes Mário Carvalho
de Jesus, presidente do Secretariado Nacional
de Justiça e Não Violência, Paulo Schilling,
representante da CBS, Sérgio Sérvulo da
Cunha, presidente da OAB — subsecção de
Santos, e Pedro Gomes Sampaio, presidente
do Sindicato dos Trabalhadores em Petróleo
da Baixada Santista.
4.
O Centro manifestou-se solidário ao povo
argentino, em carta enviada a Adolfo Perez
EsquiveI, prêmio Nobel da Paz de 1980,
em face do recrudescimento das perseguições
e violações dos direitos humanos provocadas
pela crise econômica recente. Nesta ocasião
enviou ainda carta de protesto ao cônsul
da Argentina em Santos, que recusou-se a
protocolar seu recebimento.
5.
O CDDH promoveu, em junho de 81, debate
público com o estudante cego da Faculdade
de Medicina de Santos, Jesuino Araújo, sobre
Os Problemas do Deficiente Visual na Educação
e no Trabalho. Participaram do debate a
Associação dos Deficientes Físicos da Baixada
Santista e a Associação dos Médicos de
Santos.
6.
O Centro inscreveu-se como participante
do Simpósio Internacional sobre a Amazônia,
a realizar-se em outubro de 81 no Rio de
Janeiro. Ao lado do Centro dos Estudantes,
Movimento de Cultura Popular e Sociedade
de Defesa da Amazônia, o Centro representará
a cidade de Santos, e colaborará em atividades
relacionadas com a defesa e preservação
da Amazônia.
PERSPECTIVAS
DO CENTRO
O
Centro busca hoje consolidar seu trabalho
a partir da dinamização de suas atividades.
Para tal, necessita ampliar o número de
seus participantes, permitindo assim a
atuação organizada em várias frentes.
O
CDDH buscará atuar intensamente no bairro
do Boqueirão, trazendo para ele os problemas
nacionais, dentro do esforço de conscientização
da população do bairro. Buscará ainda ouvir
a população, descobrir suas reivindicações,
carências e problemas, e nesse sentido,
atuar como organismo vivo de defesa e luta
pelos direitos de todos.
Atividades
culturais como palestras, debates, cursos,
encontros e festas populares estão na pauta
dos trabalhos para os próximos meses. Além
disso, o Centro buscará sempre atuar ao
lado da Igreja, da Sociedade Amigos do Bairro,
dos Sindicatos, e de todas as associações
populares de Santos e da região, apoiando
e promovendo a lufa pela defesa intransigente
dos direitos fundamentais do homem.
PROGRAMAÇÃO
COMEMORATIVA DO 1º ANO DE ATIVIDADES DO
CDDH
Para
marcar a data, e continuar seu trabalho
de conscientização e discussão, além da
ampliação de seus membros, o Centro promoverá
um ciclo de debates sobre problemas sociais,
culturais e políticos. Diversas personalidades
de diferentes áreas estão sendo convidadas,
buscando dar um caráter amplo nas discussões.
O
Ciclo será inaugurado em 1º de agosto próximo
com o debate: «A SITUAÇÃO E OS PROBLEMAS
DO DEFICIENTE MENTAL».
A
programação, ainda provisória, sujeita a
alterações, está anexa a este documento.
Setembro
de 1981
—
A situação e os Problemas do Deficiente
Mental.
—
A Igreja e a situação brasileira.
—
A participação da mulher na sociedade brasileira.
—
A autonomia política de Santos e as eleições
de 82.
—
A crise do ensino no Brasil.
—
A situação dos presídios.
—
Festa pela Paz Mundial.
—
Festa popular com culto ecumênico, teatro
de fantoches, artesanato, cinema, feira
verde e livros. Ato público e show musical.
—
Participação no caso dos posseiros
da Bertioga com visita ao local e levantamento
da situação dos posseiros do sítio de ltapanhaú.
—
Ação na imprensa e nos organismos da comunidade
para denúncia da situação dos mesmos, vítimas
de violências e agressões para expulsá-los.
—
Carta aberta ao Deputado Herbert Levy, principal
responsável pelo «despejo» reivindicando
paralisação das ações existentes.
—
Acompanhamento jurídico da questão.
—
Junto a outras entidades participamos de
Ato Público em Vila Parise, Cubatão, SP.
DENÚNCIA
DO DESAPARECIMENTO DE NIVALDO DOS SANTOS
Em
19 de agosto de 1980, ás 15,35 horas, Nivaldo
dos Santos, brasileiro, 27 anos de idade,
residente à Rua Senador Nereu Ramos n0
4, Parque Bitaru, São Vicente, foi
preso pela Polícia Militar do Estado de
São Paulo, em companhia de Cosme Gomes das
Neves, na esquina das ruas Alexandria e
Monte Belvedere, Vila Margarida, São Vicente.
A prisão foi efetuada pela RP 606, sendo
ambos conduzidos e deixados na Delegacia
de Polícia de São Vicente, ficando lá á
disposição da Investigação, conforme o
talão de ocorrência n9 031,
da 4~ Cia. da PM.
Desde
esta data, ou seja, há 4 meses, os dois
indivíduos continuam desaparecidos.
A
mãe de Nivaldo dos Santos, dona Maria dos
Santos, foi informada da detenção de seu
filho três dias após a prisão, por testemunhas
que presenciaram o tato. Não tomou, porém,
providências imediatas, já que seu filho
fora preso anteriormente e liberado dias
após. Vale destacar que Nivaldo dos Santos
já tivera algumas passagens policiais,
mas não respondera a processo algum ou tivera
cometido quaisquer crimes ou delitos de
gravidade.
Quinze
dias após sua prisão, dona Maria encaminhou-se
á Delegacia de Policia de São Vicente para
informar-se da situação do filho. Na Delegacia,
porém, foi informada que seu filho não estivera
lá naquela data, nem seu nome constava
em qualquer registro da época. Orientada
pelo delegado de policia local, dona Maria
procurou a delegacia de Praia Grande, delegacia
de Santos, delegacia de Cubatão, bem como
o presidio de Samaritá. Foram infrutíferas,
porém, suas buscas. Não existia qualquer
informação acerca de Nivaldo dos Santos.
Dona
Maria recebeu, então, informações claras
a respeito da presença de seu filho na Delegacia
de São Vicente. Várias testemunhas relataram-lhe
ter visto seu filho preso, bem como Cosme,
e mais: afirmaram terem visto seta filho
sofrer agressões físicas na Delegacia, tendo
sido retirado de lá 3 dias após, algemado
ao companheiro Cosme. Uma das testemunhas,
preso na época, chegou a receber de Nivaldo
um recado para ser transmitido á sua família:
que o tirassem urgentemente de lá, uma vez
que não suportaria mais outra sessão de
espancamento. Tal mensagem, porém, só foi
transmitida quando da saída da prisão desta
testemunha, cerca de um mês após o desaparecimento
de Nivaldo.
Dona
Maria procurou então o promotor público
de São Vicente, dr. Octávio Borba Vasconcellos,
que a encaminhou por escrito ao delegado
de São Vicente, solicitando esclarecimentos
sobre o caso. Tudo porém foi em vão. As
semanas foram se passando sem qualquer noticia
de Nivaldo. Segundo informações do pai do
outro preso, Cosme Gomes das Neves, tal
elemento também se acha desaparecido deste
aquela data. A família, contudo, não tomou
providências concretas a respeito.
Em
19 de novembro de 1980, dona Maria dos Santos
e seta filho Oswaldo dos Santos procuraram
o plantão do Centro de Defesa dos Direitos
Humanos núcleo do Boqueirão, em Santos,
e expuseram o caso. O Centro, então, contactou
com a Ordem dos Advogados do Brasil, subseção
de Santos, que passou a atuar também no
caso.
O
CDDH procurou, a essa altura, o promotor
Octávio Borba Vasconcellos que, diante dos
fatos, instaurou sindicância sobre o caso,
tomando dias após o depoimento de d. Maria
dos Santos, bem como intimou a depor as
testemunhas que viram Nivaldo preso na Delegacia
de São Vicente.
A
Ordem dos Advogados indicou o advogado Paulo
Sergio Pimentel Silveira para acompanhamento
do caso, além da participação do dr. Luiz
Carlos Alves de Souza, contactado pela família
de Nivaldo dos Santos.
Os
fatos acima dão a este caso configuração
de flagrante violação dos direitos humanos,
já que estamos diante do desaparecimento
arbitrário cercado de violências, de um
ser humano.
Assim
sendo, ao dar conhecimento público do caso,
o Centro de Defesa dos Direitos Humanos
—
núcleo do Boqueirão aliado á Ordem dos Advogados
do Brasil subseção de Santos, vem solicitar
explicações e apuração dos fatos com informações
claras acerca do paradeiro de Nivaldo dos
Santos, além de garantia á família e ás
testemunhas de total segurança durante as
averiguações que estão se processando.
Santos,
18 de dezembro de 1980
^
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