Clarence
Dias*
Introdução
Atualmente,
tornou-se comum, em qualquer pronunciamento, declaração ou resolução,
feitas tanto em âmbito internacional como regional, a reafirmação dos
conceitos de universalidade, indivisibilidade, interdependência e
inter-relacionabilidade dos direitos humanos. Há, virtualmente, um
consenso quase automático em torno desses termos. Nesse sentido, houve,
recentemente, um debate bastante contencioso durante o último segmento
de coordenação do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas (CESNU),
no âmbito da Revisão Viena + 5, com relação ao documento final e à
linguagem a ser utilizada nas Conclusões Acordadas. Expressões como
“direitos humanos convencionais (mainstreaming human rights)”,
“dimensionado de acordo com o sistema das Nações Unidas” e
“integração dos direitos humanos” às “atividades do sistema das
Nações Unidas”, não puderam fazer parte do documento final. Logo no
início do encontro, chegou-se, com certa facilidade, a um consenso nas
negociações relativas ao segundo parágrafo preambular do documento,
cujo texto é: “Os diretos humanos, como um todo, são universais,
indivisíveis, interdependentes e inter-relacionados. A comunidade
internacional deve tratar os direitos humanos globalmente, de forma
justa e equânime, com base nos mesmos princípios na mesma cadência e
com a mesma ênfase” (Minuta das Conclusões Acordadas, encaminhada
pelo Vice-Presidente do Conselho, Sua Excelência o Senhor Francesco
Paolo Fulci (Itália); E/1998/L.22, 28 de julho de 1998).
A
indivisibilidade dos direitos humanos é inquestionável nas negociações
intergovernamentais hoje em dia. Mas, seria esse consenso sobre o
conceito de indivisibilidade restrito apenas ao âmbito de uma retórica
vazia? Haveria realmente um consenso universal em torno do conceito de
indivisibilidade? Caso exista, o que esse consenso significaria em
termos conceituais - o que se entenderia, em termos mais simples, por
indivisibilidade? O que esse conceito ensejaria em termos pragmáticos?
Qual seria a situação presente no que se refere à prática do Estado
com relação à indivisibilidade? Haveria, atualmente, ameaças e
disputas em torno do conceito de indivisibilidade e, se houver, de onde
se originariam? Haveria interpretações populares do conceito de
indivisibilidade? Que passos deverão ser tomados no sentido de se
atingir plena realização da indivisibilidade dos direitos humanos?
Este
trabalho tem por objetivo discutir as questões mencionadas, assumindo,
porém, que o faz de forma exploratória, devido à escassez de
literatura sobre o assunto. Da mesma forma, assume as perspectivas do
hemisfério sul e não-governamentais, que se baseiam não somente na
experiência cinqüentenária do programa de direitos humanos das Nações
Unidas, mas também nas contribuições de movimentos populares de
direitos humanos dos países em desenvolvimento das longas e heróicas
lutas por justiça para as vítimas de abusos e usurpação desses
direitos.
Indivisibilidade: perspectivas históricas
A
Carta das Nações Unidas não contém qualquer menção explícita ao
conceito de indivisibilidade, apesar de, no seu preâmbulo, reafirmar a
“fé nos direitos humanos fundamentais, na dignidade e valor da pessoa
humana, nos direitos iguais dos homens e das mulheres, e das grandes e
pequenas nações”. O conceito de igualdade na linguagem preambular
refere-se não só à igualdade entre os direitos mas, principalmente,
à igualdade entre os sujeitos desses direitos, no que diz respeito
diretamente ao gozo dos mesmos. De maneira semelhante, o conceito de
“direitos humanos fundamentais” refere-se mais aos direitos como
fundamentais do que à noção de que seriam inerentes à natureza
humana.
O
conceito de indivisibilidade também não tem referência explícita na
Declaração Universal dos Direitos Humanos, mas ressoa, de forma implícita,
no preâmbulo dessa Declaração que proclama “libertação do terror
e da miséria” “como a mais alta aspiração de todas as pessoas”.
O
Pacto sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e o Pacto sobre
Direitos Civis e Políticos utilizam linguagens idênticas (nos preâmbulos
respectivos) ao determinarem o princípio de interdependência entre
todos os direitos humanos, quando enfatizam que “o ideal de seres
humanos livres, libertos do terror e da miséria, somente será atingido
se forem criadas condições para que cada um possa desfrutar tanto de
seus direitos econômicos, sociais e culturais, como dos direitos civis
e políticos”. O princípio de interdependência foi, talvez, o
precursor do conceito de indivisibilidade. O princípio de interdependência
surgiu, em parte, como um compromisso político necessário entre as
duas principais correntes ideológicas conflitantes, no ambiente da
Guerra Fria, fazendo com que fossem negociados dois Pactos
Internacionais, ao invés de apenas um Pacto holístico sobre os
direitos humanos. Porém, o princípio de interdependência reflete,
também, o fato de que os dois conjuntos de direitos não podem, quer em
termos lógicos, quer em termos práticos, manter-se completamente
isolados, em compartimentos estanques. Nesse sentido, enquanto a
liberdade de associação é reconhecida no Pacto sobre Direitos Civis e
Políticos, o direito à formação de organizações de classe
encontra-se no Pacto sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.
A
Proclamação de Teerã, adotada pela Conferência Internacional sobre
Direitos Humanos, de 13 de maio de 1968, faz menção explícita à
indivisibilidade: “Sendo os direitos humanos e as liberdades
fundamentais indivisíveis, a plena realização dos direitos políticos
e civis é impossível sem o gozo de direitos econômicos, sociais e
culturais. A conquista de avanços perenes na implementação dos
direitos humanos depende, tanto no plano interno como externo, de políticas
sólidas e efetivas de desenvolvimento econômico e social” (Proclamação
de Teerã, parágrafo 13). A Proclamação de Teerã não justifica nem
define o conceito de indivisibilidade. Nesse sentido, profere,
pragmaticamente, afirmação de que é “impossível” atingir-se
plenamente os direitos civis e políticos sem o gozo dos direitos econômicos,
sociais e culturais, e vice-versa. Foi importante calcar o princípio da
indivisibilidade sobre uma racionalidade pragmática que pudesse
transcender as ideologias políticas dominantes na época.
Voltando-se
para os acordos regionais de direitos humanos, é importante ressaltar
que a Convenção Européia (1950) trata, em termos gerais, somente de
direitos civis e políticos e, portanto, não faz referência à
indivisibilidade. A Carta Social Européia (1961), adotada em seguida,
traz mudanças na questão, que, de fato, são efetivadas na Ata Final
de Helsinque, adotada pela Conferência sobre Segurança e Cooperação
na Europa, de 1 de agosto de 1975. Essa última conclama os Estados
participantes a “promoverem e estimularem o exercício efetivo dos
direitos e liberdades civis, políticos, econômicos, sociais, culturais
e outros, que se originam, em sua totalidade, da dignidade
inerente ao ser humano e são essenciais para seu livre e pleno desenvolvimento”
(Seção VII, parágrafo segundo - destaque do autor). A Ata de
Helsinque, portanto, proporciona uma base tanto normativa como pragmática
para o conceito de indivisibilidade.
A
Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San Jose, Costa
Rica, 1969) reconhece em seu Preâmbulo que “os direitos essenciais do
homem não derivam do fato de sua nacionalidade pertencer a determinado
Estado, mas baseiam-se nos atributos da personalidade humana”, “o
ideal de seres humanos livres, libertos do terror e da miséria, somente
será atingido se forem criadas condições para que cada um possa gozar
de seus direitos econômicos, sociais e culturais, assim como dos
direitos civis e políticos”. O Protocolo Adicional à Convenção
Americana sobre Direitos Humanos na Área de Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais (Protocolo de San Salvador, adotado em 17 de
novembro de 1988) trata do conceito de indivisibilidade no seu preâmbulo:
“Considerando a forte relação existente entre os direitos econômicos,
sociais e culturais e os direitos civis e políticos, em que as
diferentes categorias de direitos constituem uma unidade indivisível,
baseada no reconhecimento da dignidade dos seres humanos, para os quais
é necessária permanente proteção e promoção, a fim de que sejam
plenamente realizados, e a violação de alguns direitos em favor de
outros não poderá nunca ser justificada”. O Protocolo de San
Salvador baseia a indivisibilidade no reconhecimento da dignidade
humana. Assim, não só reafirma o papel da indivisibilidade na plena
realização de todos os direitos, como também nega legitimidade às
concessões feitas em torno dos direitos humanos, em troca de outras
compensações - prática freqüentemente adotada pela escola asiática,
que abrange países como Cingapura, Malásia, China (mais recentemente),
e, até há pouco, a Indonésia.
A
Carta Africana sobre Direitos Humanos e dos Povos (Nairobi, 1981) expõe
as relações entre os dois conjuntos de direitos com maior
detalhamento, declarando em seu preâmbulo: “é essencial, de agora em
diante, prestar-se atenção especial ao direito ao desenvolvimento, no
sentido de que os direitos civis e políticos não podem estar
dissociados dos direitos econômicos, sociais e culturais, em seus
conceitos e universalidade, e que a satisfação desses direitos econômicos,
sociais e culturais sejam a garantia para o gozo dos direitos civis e
políticos”. O preâmbulo também explora as relações entre direitos
coletivos e individuais “reconhecendo, por um lado, que os direitos
humanos fundamentais originam-se dos atributos dos seres humanos, o que
justificaria sua proteção em nível nacional e internacional, e, por
outro lado, que a realidade e o respeito aos direitos dos povos deverá
necessariamente garantir os direitos humanos”. A Carta da África,
portanto, propõe um conceito de indivisibilidade que relaciona direitos
econômicos, sociais e culturais aos direitos civis e políticos; isso,
por sua vez, relaciona os direitos individuais aos coletivos e encara o
desenvolvimento como forma de consolidar a indivisibilidade.
A
região Ásia-Pacífico permanece a única a não possuir um acordo
regional sobre direitos humanos, porém, a Sexta Oficina sobre
Iniciativas Regionais para a Promoção e Proteção de Direitos Humanos
na Região da Ásia e Pacífico (Teerã, 1998) reafirma, em suas conclusões
“a universalidade, indivisibilidade e interdependência dos direitos
humanos”.
Dessa
forma, o conceito de indivisibilidade, 50 anos após a Declaração
Universal dos Direitos Humanos, encontra-se firmemente introduzidos nos
instrumentos legais de direitos regionais e internacionais. Vamos, então,
proceder a uma breve revisão das práticas das Nações Unidas (e de
seus Estados membros) com relação ao conceito de indivisibilidade.
Indivisibilidade: a prática das Nações
Unidas
Esta
primeira parte identificou várias formulações verbais relacionadas ao
conceito de indivisibilidade, conforme consta dos instrumentos jurídicos
regionais e internacionais. A partir dessas formulações, torna-se possível
examinar os diferentes significados atribuídos à palavra
indivisibilidade, e quais as conseqüências práticas de sua utilização.
Indivisibilidade
e a Natureza e Essência da Pessoa Humana
O
significado de indivisibilidade, em termos efetivos, afirma que os
direitos humanos e da pessoa humana (como apropriadamente formulado
nesta época de correção política, em contraste com os antigos
instrumentos de direitos humanos que se referiam aos “direitos do
homem”) são indivisíveis. Os direitos humanos são inerentes e
emanam da própria natureza humana. Conforme estabelecido no parágrafo
1 da Declaração e Programa de Ação de Viena (DPAV): “Os direitos
humanos e as liberdades fundamentais são inatas a todos os seres
humanos; a proteção e a promoção desses direitos é responsabilidade
primordial dos governos”. A indivisibilidade é uma relação mútua
uma vez que é precisamente o gozo dos direitos humanos que torna humana
a vida das pessoas [A. Caesar Espiritu, Law, Development and Human
Rights in ASEAN (Lei, Desenvolvimento e Direitos Humanos na ASEAN)
Friedrich-Naumann-Stiftung, Cingapura, 1986]. Posto de outra forma, os
direitos humanos existem para garantir o mais precioso de todos os
direitos: o direito de ser e permanecer humano [U. Baxi, Inhuman Wrongs
and Human Rights (Erros Desumanos e Direitos Humanos), pp. 1-17,
Har-Anand Publications, Nova Delhi, 1994]. As implicações práticas
dessa interpretação são inúmeras, principalmente com relação à
universalidade dos direitos humanos. Para que o conceito de
universalidade torne-se uma realidade existencial para todos, é necessário
que diversos grupos, aos quais o gozo dos direitos humanos ainda é
negado, assumam efetivamente o desafio de fazer prevalecer esses
direitos. As mulheres conseguiram, com êxito, reivindicar seus direitos
na Conferência das Nações Unidas sobre Direitos Humanos (Viena,
1993). Mas, conforme o DPAV sugere (na seção II B), diversos grupos,
incluídas as minorias, povos indígenas, imigrantes, crianças e
deficientes físicos, permanecem na luta para o reconhecimento de seus
direitos humanos. O conceito de indivisibilidade, conforme entendido
anteriormente, proporciona a esses grupos uma base normativa sólida
para que reafirmem o caráter “inato” desses direitos humanos.
A
Indivisibilidade no Âmbito e no Meio dos Direitos Humanos Universais
Este
significado de indivisibilidade tem, pelo menos, cinco dimensões:
Todos
os direitos humanos são iguais, ou seja, nenhum direito humano pode
reivindicar precedência sobre qualquer outro direito humano. Citando o
s palavras da DPAV (parágrafo 5), “Todos os direitos humanos são
universais, indivisíveis, interdependentes e inter-relacionados. A
comunidade internacional deve tratar os direitos humanos de forma
global, justa e equânime, com base nos mesmos princípios mesma medida
e com a mesma ênfase”. A Alta Comissária das Nações Unidas para os
Direitos Humanos (“HCHR”), Mary Robinson, no seu Relatório Interino
à Comissão sobre Direitos Humanos para a Revisão Viena + 5 enfatiza:
“A universalidade dos direitos humanos, com sua dimensão igualitária
e sua indivisibilidade atuando em mútuo reforço, deveria guiar todos
os setores da comunidade internacional no sentido de que tornem efetivas
as recomendações adotadas pela Conferência Mundial sobre Direitos
Humanos de Viena” (E?CN. 4/1998/104, 20 de fevereiro de 1998, p. 3).
As implicações práticas disso são claras. As pessoas encarregadas de
monitorar violações de direitos humanos não devem graduar a importância
dessas violações com base em argumentações de violações
fundamentais de direitos fundamentais. Toda e qualquer violação de
direitos humanos deve ser denunciada e separada.
É
dever dos Estados, “independentemente de seus sistemas políticos,
econômicos ou culturais, promover e proteger todos os direitos humanos
e liberdades fundamentais” (DPAV, parágrafo 5). Em termos práticos,
não basta focalizar os direitos humanos somente sob o ângulo das violações.
Os Estados devem cumprir seus papéis de protetores e promotores desses
direitos. Conforme estabelecido nas Conclusões Acordadas do segmento
ECOSOC da Revisão Viena + 5, os Estados e o sistema das Nações Unidas
devem adotar conduta holística, “abrangente e integrada com relação
à promoção e proteção dos direitos humanos” (E/1998/L23, 28 de
julho de 1998, p.2).
Não
poderá haver qualquer tipo de concessão para os direitos humanos.
Conforme repetidamente colocaram as ONGs asiáticas, reunidas na Comissão
Preparatória de Bangkok para a Conferência Mundial sobre Direitos
Humanos de Viena (1993): “Um conjunto de direitos não pode ser
negociado por outro”. “Os direitos econômicos só podem ser
preservados quando as pessoas puderem exercer seus direitos políticos e
civis”. “Nós criticamos os governos asiáticos por colocarem seus
próprios interesses à frente dos interesses do povo e por tentarem
reduzir a efetividade dessas normas de direitos humanos na tentativa de
encobrir seus fracassos em promover e proteger esses direitos” [Xiao
Qiang, em Evaluating the Vienna Declaration: Advancing the Human Rights
Agenda (Avaliando a Declaração de Viena: Avançando a Agenda de
Direitos Humanos), p. 15, Conference Proceedings, Center for the Study
of the Global South, Washington, D.C., 1993 n.º 6]. A questão não é
“pão ou liberdade” como muitos ditadores asiáticos querem nos
fazer acreditar. A questão, na verdade, seria: “quem, na sociedade,
possui quanto de cada? e por quê?” A respeito do assunto
“indivisibilidade”, a Força-Tarefa Judiciária do Sudeste Asiático
encaminhou o seguinte para a Comissão Preparatória de Bangkok: “As
críticas feitas à legislação internacional sobre direitos humanos,
por considerá-la excessivamente enfática aos direitos civis e políticos,
em detrimento dos direitos econômicos, sociais e culturais, são hipócritas.
Nesse caso, não há nada que impeça os governos de corrigirem esse
excesso de ênfase em nível nacional. Ambos os conjuntos de direitos
existem. Ambos os conjuntos de direitos possuem validade. Nos países da
SAARC, tem havido uma lamentável e obstinada resistência, por parte
dos governos, em reconhecer e implementar esses conjuntos de direitos -
para o detrimento de ambos. A Força-Tarefa convoca os governos da região
para remediarem essa situação, por meio de uma efetiva implementação
tanto de direitos econômicos, sociais e culturais, como de direitos
civis e políticos”(Bangkok, 1993, não publicado).
Não
poderá haver concessões entre desenvolvimento e direitos humanos.
Alguns governos da Ásia alegam que o desenvolvimento econômico deve
ter precedência sobre outros direitos, principalmente os civis e políticos.
O conceito de indivisibilidade rejeita, sem sombras de dúvida, essa
tese e a própria DPAV acentua, na sua reafirmação do direito ao
desenvolvimento, que “constitui direito universal e inalienável, e
parte integral dos direitos humanos fundamentais”, “na medida que o
desenvolvimento facilita o gozo de todos os direitos humanos, a falta de
desenvolvimento não pode ser pretexto para justificar qualquer
cerceamento dos direitos humanos internacionalmente reconhecidos” (DPAV,
seção I, parágrafo 10).
Por
causa da indivisibilidade dos direitos humanos, “a plena realização
dos direitos civis e políticos, sem o gozo dos direitos econômicos,
sociais e culturais, é impossível” (Proclamação de Teerã, parágrafo
13). Essa dimensão do conceito de indivisibilidade é uma extensão do
conceito de que todos os direitos são iguais. O conceito enfatiza a
necessidade de se promover a realização de todos os direitos: de todas
as pessoas e de todos os grupos. Aqui, uma vez mais, cabe citar trecho
do documento encaminhado pela Comissão Preparatória de Bangkok para a
Conferência Mundial sobre Direitos Humanos de Viena: “As críticas
feitas aos princípios internacionais correntes sobre os direitos
humanos, por considerá-la excessivamente enfática aos direitos civis e
políticos, em detrimento dos direitos econômicos, sociais e culturais,
são hipócritas. Nesse caso, não há nada que impeça os governos de
corrigirem esse excesso de ênfase em nível nacional. Se esses governos
não conseguiram fazer isso em nível nacional, suas críticas sobre o
assunto, em nível internacional, carecem de credibilidade. A Força-Tarefa
reconhece a importância e o papel tanto dos direitos individuais como
dos coletivos. Não haveria, portanto, qualquer hierarquia ou
superioridade entre esses dois conjuntos de direitos. Ambos são suscetíveis
de abusos quando exercidos. Nas situações de vida real, surgem sérias
complexidades e dificuldades com relação ao equilíbrio entre direitos
coletivos e individuais, assim como dos direitos entre coletivos e dos
direitos dentro de um coletivo. Em todos esses casos, torna-se vital que
o conflito seja resolvido pela aplicação dos princípios básicos de
direitos humanos de não-discriminação, não-opressão, e justiça”(Bangkok,
1993, não publicado).
É
importante também frisar que o termo indivisibilidade ocorre mais freqüentemente
como parte de uma descrição de direitos humanos como sendo
“universal, indivisível, interdependente e inter-relacionado”. O
conceito de indivisibilidade é visto como chave para o avanço não
somente da universalidade (conforme detalhado anteriormente) mas, também,
para o avanço dos princípios de interdependência e de
inter-relacionamento dos direitos humanos. Entretanto, enquanto 50 anos
de prática dos direitos humanos proporcionaram vários exemplos de
interdependência e de inter-relacionamento, a indivisibilidade parece
ter sido mais acelerada com infrações do que com a observância de
seus princípios. A indivisibilidade parece indicar algo que deveria ser
obtido em vez do que já existe. Nesse sentido, continua como objetivo a
ser perseguido e reafirmado, conforme mostram as revisões das práticas
das Nações Unidas e dos Estados.
O Programa de Direitos Humanos das Nações
Unidas
O
Programa de Direitos Humanos das Nações Unidas começou com a criação
da Comissão sobre Direitos Humanos e o Centro para Direitos Humanos. A
partir de sua implantação, e influenciado por proeminentes ONGs
internacionais (todas ocidentais) de direitos humanos, o programa
concentrou sua linha de ação no monitoramento das violações de
direitos humanos, focalizando, quase que exclusivamente, os direitos
civis e políticos. Assim, a despeito da proclamada mantida retórica, não
havia sequer nuanças de indivisibilidade nas atividades conduzidas no
âmbito do Programa. Esse quadro vem, ainda que gradualmente,
apresentando perceptíveis mudanças nos últimos anos, em todos os
aspectos do Programa. Os órgãos do sistema têm prestado maior atenção
aos direitos econômicos, sociais e culturais, desde a entrada em vigor
das Convenção sobre Direitos da Infância (“CRC”) e a Convenção
sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as
Mulheres (“CEDAW”). Ambas as Convenções citadas, juntamente com o
Pacto sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, adotam o princípio
de indivisibilidade, que se reflete nos órgãos criados no âmbito
desses tratados. A Comissão sobre Direitos Econômicos, Sociais e
Culturais, em particular, tem emitido Comentários e Recomendações
Gerais sobre assuntos tais como o impacto, sobre os direitos humanos,
das sanções e medidas unilaterais, e sobre a integração dos direitos
humanos à UNDAF (os organismos de desenvolvimento das Nações Unidas).
De
maneira semelhante, os Procedimentos e Mecanismos Especiais da Comissão
e da Subcomissão focalizavam, originalmente, de forma quase exclusiva,
os direitos civis e políticos. Hoje, focalizam ambos os conjuntos de
direitos (por exemplo, os Relatores Especiais sobre Direitos Humanos e
Meio Ambiente, sobre Pobreza Extrema, e sobre Pessoas Internamente Excluídas).
Isso também se verifica nos trabalhos da própria Comissão e Subcomissão,
e de seus Grupos de Trabalho (p. ex., os de direito ao desenvolvimento,
de minorias, de migrantes e de programas de ajuste estrutural); nos
trabalhos dos Serviços de Consultoria e do programa de Cooperação Técnica
do Centro de Direitos Humanos das Nações Unidas, agora denominado
Escritório do Alto Comissariado de Direitos Humanos (“EACDH”).
O programa de desenvolvimento das Nações
Unidas
Esse
Programa, também, não tratou das questões de direitos humanos ou, na
melhor das hipóteses, cuidou apenas de uma limitada gama de direitos
humanos relacionados, por exemplo, com eleições, administração da
justiça, aplicação de leis e do judiciário. Assim, os documentos do
PNUD, preparados para a Conferência Mundial de Viena e, cinco anos
depois, os da Revisão Viena+5, descrevendo as atividades do PNUD no
campo de direitos humanos, são quase idênticos, no tange às
atividades descritas. Isso, a despeito da recomendação da DPAV, ao
PNUD e outros, de que fosse adotada uma abordagem holística de direitos
humanos no desenvolvimento e que se aderisse ao princípio de
indivisibilidade. Esse procedimento, entretanto, vem mostrando sensíveis
mudanças para melhor, nos últimos anos. Primeiramente, a UNICEF passou
a adotar uma abordagem baseada em direitos enfocando a Convenção sobre
Direitos da Infância e trabalhando juntamente com a Comissão sobre
Direitos da Infância. Em novembro do ano passado, o PNUD adotou sua política
holística denominada “Integrando Direitos Humanos ao Desenvolvimento
Humano Sustentável” e está trabalhando rapidamente no sentido de
desenvolver uma abordagem baseada nos direitos humanos para seus
programas de desenvolvimento humano sustentável. A Divisão das Nações
Unidas para Assuntos Econômicos e Sociais (“DAES”) também está
adotando uma abordagem de direitos humanos, voltada, mais
particularmente, para o direito ao desenvolvimento. É evidente que
falta muito trabalho a ser feito para que o PNUD efetivamente promova e
proteja a totalidade dos direitos humanos, tanto no âmbito do
desenvolvimento como por meio desse. Mas, pelo menos um primeiro passo
foi dado pelo Programa que já reconhece, ainda que tardiamente, o princípio
da indivisibilidade.
Reforma do Sistema das Nações Unidas
O
Secretário-Geral Kofi Anan está em vias de implementar um plano,
visando à reorganização do sistema das Nações Unidas, que tornará
os direitos humanos tema de interseção em todas as atividades da
organização; atividades essas igualmente relacionadas com a manutenção
e construção da paz, bem como com assuntos humanitários, de
desenvolvimento, até as envolvidas com desenvolvimento, assuntos
humanitários, econômicos e sociais. A mudança possibilitará novas
oportunidades para se praticar o princípio da indivisibilidade,
priorizando os direitos humanos, por todo o sistema das Nações Unidas.
Em
avanço igualmente positivo no tocante à indivisibilidade, foi a nomeação
da Senhora Mary Robinson, na qualidade de Alta Comissária para Direitos
Humanos. Desde seu primeiro dia no novo cargo, ela vem enfatizando o
princípio de indivisibilidade, recomendando uma abordagem holística,
abrangente e integrada para a promoção e proteção de todos os
direitos humanos para todos. Recentemente, conforme já mencionado, a
comunidade internacional dos Estados membros passou. também, a adotar
essa abordagem (assim como o princípio de indivisibilidade estabelecido
nas Conclusões Acordadas do segmento ECOSOC da Revisão Viena+5).
Práticas dos Estados Membros
Apesar
de unanimemente reafirmarem a retórica da indivisibilidade (por
consenso e sem votação), os Estados membros das Nações Unidas
recusam-se a aceitar esse princípio na prática. Organizados em
diversos grupos, os Estados membros continuam a prática da seletividade
no tocante ao reconhecimento dos direitos humanos. Os EUA recusam-se a
reconhecer os direitos econômicos, sociais e culturais. O Vaticano,
juntamente com diversos Estados de orientação católica e islâmica,
recusam-se a reconhecer diversos direitos das mulheres, especialmente os
relativos à reprodução. O grupo dos Estados não-alinhados e, em
particular, o grupo dos asiáticos, relativizam a importância dos
direitos civis e políticos. Apesar da convocação feita pelo DPAV para
a ratificação universal dos tratados fundamentais de direitos humanos,
estamos muito longe de ratificar o Pacto sobre Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais, e os avanços nesse sentido, nos cinco anos que se
seguiram à Conferência de Viena, têm sido muito lentos. A distância
entre a retórica e realidade, no que diz respeito à indivisibilidade,
tem se mantido bastante significativa na prática dos Estados membros
das Nações Unidas, determinando crescente falta de credibilidade.
Ameaças e desafios ao princípio de
indivisibilidade e sua reafirmação
Ameaças
e desafios
A
seguir, analisamos as duas maiores ameaças à indivisibilidade: o
chamado desafio dos Valores Asiáticos e a opção do paradigma do
desenvolvimento.
O
desafio dos valores asiáticos
O
debate em torno dos “valores asiáticos” tem gerado muita fumaça
bem como um meio de vida, para um número considerável de acadêmicos
americanos e para um número relativamente menor de seus parceiros na Ásia.
Quando Lee Kuan Yew fez menção, pela primeira vez, de sua tese sobre
os valores asiáticos, pareceu ser muito fácil ignorar seus comentários,
considerando-os simplistas, pretensiosos, e fechados em seus próprios
interesses. A chamada escola de pensamento de Cingapura, então,
calcou-se nas seguintes convicções básicas:
§
Os valores asiáticos são significativamente diferentes dos
mantidos no ocidente. Os asiáticos dão ênfase à importância dos laços
familiares, à prioridade da comunidade sobre o indivíduo, e da
estabilidade social e ordem pública sobre o estilo ocidental de
democracia. Os valores aceitos no ocidente cultuam a liberdade de
expressão, a liberdade pessoal, os direitos dos indivíduos e a
democracia liberal.
§
As rápidas mudanças sociais e econômicas inerentes à
modernização trazem instabilidade, a menos que haja uma autoridade
firmemente estabelecida. A exuberância da democracia acarreta condições
de indisciplina e desordem que são inimigas do desenvolvimento.
§
Os líderes asiáticos agem corretamente quando colocam as
necessidades materiais dos seus povos à frente das liberdades pessoais
e direitos individuais.
§
As políticas participativas não devem ser impingidas às
sociedades asiáticas pelo Ocidente.
§
Os valores asiáticos e os impulsos culturais favorecem mais os
deveres que os direitos, as responsabilidades mais que as liberdades, o
desenvolvimento mais que a democracia liberal, e a estabilidade social
mais que o pluralismo político e cultural.
Quando
esses princípios foram enunciados por Lee Kuan Yew e, logo após, por
Mahatir Mohamed, muitos foram solidários aos problemas que eles
enfrentavam, na tentativa de moldar nações-estados a partir de
estruturas políticas frágeis, com profundos e complexos problemas
multirraciais. Mas, mesmo assim, não houve omissão com relação ao
autoritarismo desenvolvimentista. Foi o Presidente Ramos, das Filipinas,
quem prontamente relembrou a Lee Kuan Yew o que uma década desse
autoritarismo desenvolvimentista representou para seu país.
Tanto
Lee Kuan Yew como Mahatir Mohamed têm sido veementes críticos do
imperialismo ocidental, assim como da hipocrisia e do caráter dúbio da
política externa do Ocidente (principalmente dos EUA) praticada na Ásia.
Nesse sentido, apontam que condicionantes de direitos humanos têm sido
invocados de forma seletiva e arbitrária, e as ideologias econômicas e
políticas do Ocidente têm sido impostas como parte de uma agenda de
dominação ocidental da Ásia. A imprensa internacional chinesa saudou
recentemente Lee Kuan Yew como o “novo guerreiro asiático que revida
o Ocidente” e um acadêmico nipônico o descreveu como “um porta-voz
eloqüente que sabe replicar esses ocidentais arrogantes e presunçosos”.
Porém, a conjugação dos “valores asiáticos” com protestos contra
o imperialismo ocidental na Ásia, tem acarretado conseqüências
funestas. O Governo chinês, em seu White Paper de 1991, adotou a tese
da concessão entre direitos humanos e desenvolvimento, declarando que
“comer e se agasalhar devidamente são as demandas básicas do povo
chinês que, por muito tempo, sofreu com a fome e o frio”. O White
Paper prossegue desafiando a natureza internacional dos direitos
humanos, ao colocar que “a questão dos direitos humanos está
circunscrita, de modo geral, à soberania de cada Estado”. Em 1995, o
Governo chinês opôs-se firmemente “aos atos hegemônicos de
determinados países que possuem critérios dúbios para os direitos
humanos dos demais países impondo seus padrões a outros, ou
interferindo em suas questões internas, valendo-se dos direitos humanos
como pretexto”. Aqueles entre os governos asiáticos que apoiam a tese
de “valores asiáticos” defendem um argumento de que a iniciativa do
Ocidente de impor padrões universais de direitos humanos aos países em
desenvolvimento é uma forma dissimulada do imperialismo cultural bem
como uma tentativa de obstruir seu desenvolvimento. Recentemente, o
Primeiro Ministro Mahatir Mohamed chegou a propor que o 50º Aniversário
da Declaração Universal dos Direitos Humanos seja a ocasião para que
se reveja seus princípios, uma vez que suas origens e natureza são
ocidentais. Esse desafio à universalidade dos direitos humanos deve ser
discutido e revidado. Os “valores asiáticos”, que até há pouco não
passavam de incômoda divergência, agora ameaçam romper a corrente
global dos direitos humanos, que representa uma das maiores conquistas
deste século. [Para uma discussão detalhada sobre o desafio dos
“valores asiáticos” à universalidade e indivisibilidade dos
direitos humanos, ver Simon S. C. Tay, “Human Rights, Culture and the
Singapore Example” (“Direitos Humanos, Cultura e o Exemplo de
Cingapura”), in 41 McGill Law Journal: Special Issue on International
Human Rights Law (Edição Especial sobre a Legislação Interncional de
Direitos Humanos), pp 743-780, agosto de 1996.]
Os
princípios de universalidade e indivisibilidade são elementos
essenciais para o consenso global sobre direitos humanos, que foi alcançado
nos últimos 50 anos. É perigoso adotar-se uma postura cínica, pela
qual a dimensão internacional dos direitos humanos não seria mais que
uma máscara ideológica para encobrir a realpolitik dos EUA. A
solidariedade internacional para a promoção e proteção dos direitos
humanos, contra o domínio das mazelas desumanas, é exatamente o que
tentamos alcançar nesses 50 anos, desde a Declaração Universal dos
Direitos Humanos. Atualmente, indo além de fronteiras nacionais e de
culturas distintas, estamos nos esforçando para atingir a máxima
realização daquilo que é, para todos, o mais precioso direito: o
direito de sermos humanos.
A
guinada para o paradigma de desenvolvimento
O
direito do ser humano ao desenvolvimento representa a corporificação
do princípio da indivisibilidade. O direito ao desenvolvimento abarca
tanto os direitos econômicos, sociais e culturais, como os direitos
civis e políticos. Além disso, o direito ao desenvolvimento impõe que
a realização de todos os direitos humanos seja a razão essencial do
desenvolvimento. Entretanto, a realização do direito ao
desenvolvimento tem enfrentando enormes obstáculos ultimamente.
No
plano econômico, as dificuldades com dívida e com serviço da dívida
têm restringido seriamente os gastos governamentais com desenvolvimento
social e com a promoção de uma realização progressiva dos direitos
humanos. Os programas de ajuste estrutural estão causando sérios
impactos adversos sobre os direitos humanos, diante da inexistência de
salvaguardas efetivas. O ressurgimento do neoliberalismo econômico,
acompanhado das medidas de desregulamentação e privatização, vem
acarretando desemprego maciço, eliminação de postos de trabalho,
inflação desenfreada, consumismo licencioso por parte de uma minoria
privilegiada, e a busca implacável do lucro a qualquer custo, humano,
social ou ambiental. Iniciativas como a APEC estão sendo acalentadas
nos países desenvolvidos, com vistas a precipitarem mudanças de
paradigmas: do desenvolvimento através de ajuda para o de
desenvolvimento através do comércio e investimento. Essa tão
propalada mudança de paradigma, no entanto, despida de sua retórica de
“desenvolvimento pelas forças do mercado”, está longe de promover
desenvolvimento. Na verdade, promove a ganância e o egoísmo como nova
religião da globalização. Sob essa conduta, o desenvolvimento não é
mais direcionado para as prioridades nacionais de promover a realização
progressiva de direitos econômicos e, até mesmo, dos direitos humanos.
Pelo contrário, é conduzido pelas exigências do comércio e
investimento, e pelo desejo insaciável de se consumir cada vez mais. A
sustentabilidade ecológica é sacrificada pela implacável busca de
lucros. Os valores da economia caseira, conservação, manutenção e
compartilhamento estão sendo destruídos por impedirem o avanço do
consumo. O desenvolvimento não diz respeito mais ao ser; mas, sim, ao
ter. A revolução global das comunicações está sendo perversamente
empregada para promover a monocultura de consumismo global do estilo da
Coca-Cola. As corporações nacionais e internacionais são consideradas
as chaves para o desenvolvimento social. Tudo isso, porém, tem
resultado no ressurgimento do poder das corporações, em situação de
total descompromisso, na emergência dos monopólios do setor privado e
na erosão ou mesmo abdicação, por parte do Estado, de suas obrigações,
funções e responsabilidades, no sentido de promover o desenvolvimento
e a realização progressiva dos direitos humanos de suas populações.
Para muitos, até o direito à subsistência tem sido negado.
Essa
versão privatizada de desenvolvimento tem promovido a industrialização
acelerada, criando pólos poluidores, causando riscos à saúde e vítimas.
A urbanização desenfreada vem gerando mega-favelas, número crescente
de indigentes, e uma explosão da violência urbana. A exploração
madeireira se disfarça no reflorestamento. A pesca mecanizada em grande
escala e a aquacultura vêm ameaçando de extinção a pesca artesanal
da Ásia. Os projetos de desenvolvimento imobiliário (por exemplo, os
“shoppings” urbanos, os empreendimentos de lazer nas áreas rurais,
e os campos de golfe) vão confiscando a terra, destruindo comunidades e
desalojando populações. No setor rural, há um contínuo descaso, ou
pior uma insistente exploração. Um novo comércio de escravos na Ásia
abrange tráfico de mulheres, crianças, e a contínua exploração dos
migrantes trabalhadores. Essa é a realidade do desenvolvimento na Ásia.
Os
direitos econômicos, sociais e culturais são as primeiras vítimas
dessa realidade. Os direitos trabalhistas têm sofrido rápida erosão
em face dos acordos livres de trabalho, os quais colocam a liberalização
do comércio, do investimento e o direito das corporações de
realizarem seus negócios acima dos direitos à subsistência, ao
trabalho, e dos direitos individuais e coletivos dos trabalhadores.
Muitos países da Ásia, signatários de Convenções da OMT, acham que
as novas legislações econômicas internacionais, voltadas para o
desenvolvimento rápido, cuja disseminação vem sendo feita sob os auspícios
do GATT, OMC, APEC e dos acordos multilaterais sobre investimento da
OCDE (“MAI”), estão erodindo os direitos individuais e coletivos
estabelecidos em conformidade com aquelas mesmas Convenções. O mesmo
acontece com a legislação ambiental nacional e internacional dos países
asiáticos, que se vêem forçados a práticas insustentáveis de
exploração de seus recursos naturais, por causa das pressões do serviço
da dívida e dos desequilíbrios da balança comercial. A Comissão de
Direitos Humanos das Nações Unidas reconheceu, de forma clara, esses
problemas e realiza o respectivo acompanhamento anual, dentro do item de
sua agenda chamado “Direitos Humanos e Meio Ambiente”. É,
sobretudo, irônico que os países desenvolvidos reclamem que a falta de
leis eficazes referentes ao meio ambiente e aos direitos trabalhistas
nos países asiáticos proporcionem a esses últimos vantagens
comerciais. Mas, retórica de disputas comerciais à parte, a erosão da
universalidade e indivisibilidade dos direitos humanos está causando
profundos impactos negativos sobre a proteção e promoção dos
direitos humanos dos povos do mundo em desenvolvimento, além de criar
novas ondas de exploração, marginalização, discriminação e exclusão.
A perturbação social resultante se manifesta por si, pelo
ressurgimento do racismo, da xenofobia e dos conflitos étnicos -
exacerbados pela velocidade e por algumas práticas da globalização da
economia mundial, assim como pela mobilidade irrestrita do capital, do
comércio e dos investimentos.
A
reafirmação da indivisibilidade
Não
é surpreendente que, em vista da prática dos Estados descrita
anteriormente, a reafirmação do princípio da universalidade parta
primordialmente das ONGs atuantes na área de direitos humanos, assim
como dos grupos de vítimas em busca dos seus direitos e da retratação
das violações. As ONGs reunidas nos encontros preparatórios regionais
que antecederam a Conferência Mundial de Direitos Humanos reafirmaram
prontamente o princípio da indivisibilidade. A Declaração de Túnis
das ONGs africanas, de 6 de novembro de 1992 dá ênfase à
indivisibilidade e interdependência dos direitos econômicos, sociais e
culturais e dos direitos civis e políticos, princípios estabelecidos
nos instrumentos internacionais, principalmente na Carta Internacional
de Direitos Humanos e na Declaração sobre o Direito ao
Desenvolvimento” (parágrafo 9). A Declaração de Bangkok sobre
Direitos Humanos, de 27 de março de 1993 dedica uma seção inteira
(abrangendo 5 parágrafos) à indivisibilidade, em que coloca: “É
necessário que se adote um procedimento holístico e integrado com relação
aos direitos humanos. Nenhum conjunto de direitos deve ser utilizado na
Sarganha por outros. A Declaração de Quito das ONGs latino-americanas
e caribenhas, de 30 de maio de 1993, “ratifica a indivisibilidade, a
universalidade e a interdependência de todos os direitos humanos, e
reafirma o direito de todas as pessoas humanas ao gozo efetivo desses
princípios” (parágrafo 3). Reafirmação semelhante encontra-se na
Declaração de Atlanta, de 15 de janeiro de 1993 (parágrafo 1). Mas. a
prática das ONGs de direitos humanos não necessariamente reflete essa
indivisibilidade. Algumas das mais proeminentes ONGs internacionais de
direitos humanos possuem mandatos organizacionais que limitam suas ações
com relação aos direitos civis e políticos. Mesmo quando não há
limitação explícita nos seus mandatos institucionais, as ONGs
internacionais de direitos humanos têm, de maneira geral,
negligenciando os direitos econômicos, sociais e culturais. Esse
comportamento lamentável, entretanto, tem se modificado ultimamente.
Enquanto
a indivisibilidade sofre apenas uma negligência benigna, por parte das
ONGs internacionais de direitos humanos, a situação é pior nas mãos
dos violadores que tendem a impor uma “divisibilidade” às suas vítimas.
Nesse sentido, abusam de táticas de dividir para dominar, e forçam
acordos fartos em concessões. A seguir, examinaremos dois desses casos:
As Mulheres Lenientes da Ásia
Durante
a Segunda Guerra Mundial, o Exército Imperial japonês estabeleceu uma
vasta rede de “postos de leniência” onde seus soldados obrigavam
cerca de 100 a 200 mil mulheres filipinas e coreanas a concederem
favores sexuais. É inexplicável como tão gritante e flagrante violação
de direitos humanos tenha permanecido isenta de qualquer ato crítico
significativo, durante mais de 40 anos. Em 1988, no entanto, as organizações
de mulheres da Coréia pediram uma apuração para o caso. Em 1990, um
senador do Partido Socialista do Japão demandou uma ação por parte de
seu governo. A resposta a essa demanda foi imediata, no sentido de que
tanto o governo japonês como os militares estavam isentos de culpa, uma
vez que os postos de leniência haviam sido montados por “empresários
do setor privado”. Diante disso, as mulheres coreanas, vítimas dessas
violações, vieram a público e organizaram-se no sentido de exigirem
uma retratação, a construção de memorial, investigação profunda,
além de encaminharem um processo, em Tóquio, pedindo indenização
pelos danos causados. Como as provas começaram a se acumular, em 13 de
janeiro de 1992, pela primeira vez, o Secretário de Governo Kato,
expressou “profundo remorso” e admitiu que o exército de seu país
estava envolvido no caso. Em fevereiro de 1992, a questão foi levantada
pela Comissão das Nações Unidas para Direitos Humanos e, em maio
daquele ano, encaminhada ao Grupo de Trabalho sobre Formas Contemporâneas
de Escravidão. Em dezembro de 1992, realizou-se, em Tóquio, com ajuda
de ONGs, uma audiência pública. Com o acúmulo crescente de provas, o
Governo japonês formalizou um pedido de desculpas e admitiu seu
envolvimento.
A
posição do Governo japonês foi cotejada pelo relatório da Comissão
Internacional de Juristas.
§
Menciona que o objetivo das Nações Unidas, o qual está
claramente explicitado no Preâmbulo da Carta das Nações Unidas, é
proteger as gerações seguintes dos flagelos da guerra. As Nações
Unidas, nesse sentido, não são o órgão para discussão de questões
passadas de determinados países, principalmente as questões ocorridas
antes do estabelecimento da organização.
§
Alega que o mandato concedido ao Relator Especial sobre o Direito
a Restituições, Compensações e Reabilitações das Vítimas de Violações
Maciças dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais não inclui,
em suas competências, a de encaminhar recomendações para casos e
pedidos individuais de compensações.
§
Argumenta que o procedimento 1503 da Resolução 1991/104 da
Subcomissão sobre Prevenção à Discriminação e Proteção das
Minorias, não pode ser aplicada, como mecanismo de reparação ou
socorro, no caso dos pedidos de compensação por violações e perdas
em direitos humanos, de casos ocorridos durante a Segunda Guerra
Mundial.
§
Procura argumentar que essas petições, inclusive a questão das
compensações, já foram examinados pelo Japão, conjuntamente com os
países envolvidos, de acordo com os tratados bilaterais e multilaterais
de paz, e demais tratados relacionados.
O
Governo japonês procura traçar uma distinção entre questões legais
e questões morais. Pediu as desculpas devidas, mas recusa-se a
reconhecer a responsabilidade legal. Nesse sentido, estabeleceu o Fundo
para Reabilitação das Mulheres Lenientes como forma de caridade e não
como forma legal de restituição e compensação.[Ver Comfort Women:
an unfinished ordeal (Mulheres Lenientes: um tormento inacabado),
Relatório de uma Missão, Comissão Internacional de Juristas, Genebra
1994].
Há
sérias questões de princípio e direito internacional envolvidas no
caso, incluindo-se a responsabilidade do Estado, imputabilidade para
crimes de guerra e contra a humanidade, imputabilidade para impunidade,
ações individuais compensatórias, aplicação retroativa de leis,
estatuto de limitação. Do ponto de vista da legislação de direitos
humanos, o que está em jogo é o direito das pessoas à retratação e
restituição, e os direitos contidos no Artigo 15(2) do Pacto
Internacional sobre Direitos Civis e Políticos que diz: “Nada neste
artigo deverá prejudicar o julgamento e punição de qualquer pessoa,
por qualquer ato ou omissão que, à época em que foi cometido, era
considerado criminoso conforme os princípios legais reconhecidos pela
comunidade das nações”.
As
Mulheres Lenientes mantêm-se irredutíveis. Elas não aceitam concessões
e tampouco serão subornadas. As mulheres lenientes das Filipinas
encaminharam quatro reivindicações básicas ao Governo japonês:
§
pedido de desculpas ao povo filipino, especialmente para as
mulheres vítimas/sobreviventes e suas famílias;
§
pagamento de compensação adequada para as mulheres vítimas e
suas famílias;
§
incluir, nos livros escolares, referências sobre a realidade das
violações de direitos humanos das mulheres, que foram forçadas a
trabalhar como lenientes, reconhecendo que esse ato foi um crime de
guerra por parte do Japão, a fim de que guerras, militarismo e os
conseqüentes abusos contra as pessoas, especialmente mulheres e crianças,
não se repitam; e
§
admitir que os militares japoneses usaram de força e violência
para submeterem as mulheres lenientes, e que as afirmações em contrário,
proferidas pelo Governo japonês, são falsas.
Em
atitude semelhante, as mulheres lenientes da Coréia, encaminharam a
seguintes demandas:
§
governo japonês deveria tornar público o crime de Jungshindae,
ou seja, das mulheres lenientes;
§
governo japonês deverá apresentar desculpas formais;
§
governo japonês deverá erguer um monumento a essas vítimas;
§
governo japonês deverá pagar indenizações a essas vítimas ou
às suas carentes famílias;
§
crime de Jungshindae deverá ser incluído, de maneira clara, nos livros
escolares e de História do Japão; e
§
governo japonês deverá punir os culpados que ainda estejam
vivos hoje em dia.
As
mulheres lenientes mantêm-se firmemente comprometidas com o princípio
de indivisibilidade e recusam-se a fazer concessões dentro do sistema
de direitos humanos. O preço que continuam pagando por esses esforços
é terem negadas as compensações, justiça e reabilitação.
As Vítimas da Tragédia de Bhopal
As
vítimas da pior tragédia industrial do mundo vêm esperando, por mais
de uma década, algum tipo de resposta mais concreta às suas demandas
por justiça e responsabilidade, até agora, em vão. O número oficial
de vítimas fatais totaliza, hoje, 3.300 (as estimativas não-oficiais são
bem mais elevadas), tendo um número acima de 200.000 pessoas sido
expostas ao vazamento de gás da fábrica de pesticidas da Union Carbide,
o que resultou em danos graves para aproximadamente 60.000 pessoas, com
lesões totais e parciais. As mortes de vítimas continuam a ocorrer à
proporção de uma ou mais pessoas por dia.
As
reivindicações principais das vítimas refletem essa assustadora
destruição da vida humana e do bem-estar. Nesse sentido, incluem:
§
revisão pela Suprema Corte da ordem relativa ao acordo entre o
Governo indiano e a Union Carbide. A ordem é inconstitucional, ilegal e
imoral, devendo, portanto, ser suprimida. O litígio contra a Union
Carbide deve continuar até que as responsabilidades sejam apontadas, os
culpados punidos e as vítimas adequadamente recompensadas.
§
adoção imediata de ajuda provisória para todas as vítimas
seriamente afetadas pelo gás, de forma que suas necessidades de
alimentos, roupas, moradia e saúde sejam atendidas.
§
acompanhamento vitalício das condições de saúde de todas as
200.000 pessoas expostas ao gás da Carbide e assistência médica
completa àqueles que necessitarem.
§
reserva de ajuda para futuras vítimas, inclusive aquelas ainda não
conhecidas. (Número crescente de dados indicam tendência de ocorrerem
sérios problemas de saúde com as crianças de pais atingidos pelo gás,
mesmo posteriormente ao desastre.)
§
construção de moradias decentes e saneamento ambiental adequado
para as vítimas cujos sistemas imunológicos foram abalados pelo gás
da Carbide.
§
reabilitação vocacional e empregos para aqueles que se tornaram
deficientes físicos pelo gás, mas que ainda possam trabalhar.
§
estabelecimento de uma junta nacional voltada para ajuda e
reabilitação, que será composta de representantes das organizações
de vítimas, especialistas solidários à população de Bhopal e voluntários
com experiência no caso.
§
indenização em dinheiro pela dor e sofrimento das vítimas,
sendo parcelas maiores para os sobreviventes relacionados àqueles que
morreram ou ficaram seriamente inválidos, e parcelas menores para os
que foram menos afetados. (Caso os 470 milhões de dólares estipulados
pelo acordo de fevereiro fossem utilizados integralmente para indenizar
as vítimas, nada restando para as providências acima relacionadas,
esse valor só permitiria a modesta parcela de 2.350 dólares para cada
uma das 200.000 pessoas expostas ao gás).
§
divulgação completa de todos os resultados de anos de pesquisa,
pela Union Carbide, sobre os efeitos do isocianato de metila, o
principal gás que vazou das unidades de fabricação, assim como dos
outros produtos de sua decomposição que também vazaram, e das formas
apropriadas para o tratamento daqueles que se expuseram aos gases.
§
admissão da responsabilidade e divulgação completa do que
realmente ocorreu na Union Carbide, e, em caso de recusa, um processo de
responsabilidade que determine, em termos definitivos, os fatos
relacionados ao vazamento de gás e as causas de sua ocorrência.
§
responsabilização dos culpados por esse horrível desastre,
incluindo-se altos escalões da Union Carbide India Ltd., e da matriz
norte-americana.
Da
mesma forma que no caso das mulheres lenientes, as vítimas de Bhopal
recusam-se a negociar o princípio de indivisibilidade e a fazerem
concessões com relação a seus direitos. [Ver Findings and
Judgement (Conclusões e Julgamentos), Permanent Peoples’ Tribunal
on Industrial Hazards and Human Rights (Tribunal Popular Permanente
sobre Acidentes Industriais e Direitos Humanos), quarta sessão e sessão
final, Londres, 1994]. Da mesma forma que no caso das mulheres
lenientes, eles também têm enfrentado inúmeras dificuldades e injustiças,
por causa da lacuna entre a retórica e a prática, que caracteriza o
princípio da indivisibilidade, na legislação internacional dos
direitos humanos.
Considerações Finais
Durante
os últimos 50 anos, grande parte dos trabalhos sobre direitos humanos
voltaram-se para o monitoramento das violações, tomando-se, como base,
a proclamação da indivisibilidade desses direitos. Da mesma forma,
revestem-se de importância, as ações que enfatizam a proteção e a
prevenção de violações dos direitos humanos. Somente assim poderemos
alcançar a consolidação do princípio da indivisibilidade. Somente
assim poderemos corrigir determinadas práticas atuais, desenvolvidas em
sentido oposto ao princípio da indivisibilidade, antes que produzam
danos aos direitos humanos. A reforma em curso das Nações Unidas,
objetivando priorizar os direitos humanos em todas as atividades da
organização, constitui, certamente, um passo na direção correta.
Mas, se estivermos realmente empenhados em implantar o princípio da
indivisibilidade, precisamos do reconhecimento e respeito universais
para todos os direitos humanos; precisamos nos posicionar firmemente
contra qualquer tentativa de se deixar impunes os violadores desses
direitos; da mesma forma, precisamos, sem sombra de dúvida, rejeitar
qualquer negociação com relação aos direitos humanos. Somente assim
a universalidade e indivisibilidade dos direitos humanos deixarão os
domínios da retórica para existirem nos domínios da realidade.
Bibliografia Selecionada
A
literatura referente à indivisibilidade dos direitos humanos é
virtualmente inexistente. Abaixo estão alguns trabalhos selecionados
sobre conceitos relacionados, tais como universalidade e interdependência.
Philip
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Respecting Economic and Social Rights", 12 Yale Journal of
International Law, p. 396 (1987).
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Barbara
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Global Challenge (Martinus Nijhoff, Netherlands, 1992).
Bibliografia
Adicional de Fontes Asiáticas de Direitos Humanos
Já
que a acadêmicos do Terceiro Mundo encontram dificuldade em assegurar o
acesso aos textos asiáticos sobre direito, direitos humanos e
desenvolvimento sócio-político, esta curta nota bibliográfica indica
algumas poucas publicações elaboradas na região asiática.
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