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Cidadania e Impunidade

É urgente desenvolver e implementar políticas públicas contra a violência

 

Nelson Pellegrino

é deputado federal (PT-BA) e presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal.

 

A impunidade é, para nós que trabalhamos cotidiana­mente com as inúmeras violações de direitos humanos, a principal causa da violência e do aumento da criminalidade. A certeza de que o crime vai ficar impune encoraja delinquentes a continuar na escalada do crime.

Nos desvãos criados pela ausência do Estado, o crime propicia prestígio, poder econômico e liderança, O siste­ma penal repressivo não é capaz de inibir a ação, cada vez mais organizada e audaciosa, de organizações criminosas. É necessário levantarmos propostas eficientes de políticas públicas capazes de acabar com essa realidade.

A grande vítima de toda esta impunidade é a própria sociedade, que se encontra atônita e amedrontada. O ci­dadão tem seus direitos violados duplamente: primeiro, pela ação inescrupulosa das organizações criminosas e, em segundo lugar, porque acaba por ser vitima do próprio Estado, que vem se apresentando inoperante e incompeten­te para as investigações.

Toda a pessoa humana tem direito à segurança indivi­dual. É dever do Estado garantir esse direito. Para isso, o aparelho estatal deve se capacitar para atuar contra as grandes organizações criminosas, contra o crime do colarinho branco, contra o sistema financeiro e tributário e a economia popular; crimes que envolvem grandes traficantes, políticos e empresários.

São esses os criminosos que devem estar atrás das gra­des e não os pequenos que furtam comida como um últi­mo ato de desespero, ou o usuário de droga que porta pe­quena quantidade de tóxico porque é dependente químico e doente; carece, portanto, de tratamento e não de pri­vação da sua liberdade, corno em regra acontece.

Realmente, há muitas distorções no nosso sistema pe­nal. Muitos dos que estão hoje nas cadeias deveriam estar nas ruas, trabalhando e convivendo com plenos direitos de cidadania, e muitos dos que estão soltos deveriam es­tar reclusos porque são danosos para a sociedade. São os grandes poderosos do crime que, cada vez mais, sofisticam suas ardilosas técnicas voltadas para acumularem poder econômico. Corrompem políticos e funcionários públicos, contaminando as instituições públicas de todos Os pode­res da Federação.

É verdade que o crime desafia as nossas instituições policiais e do Poder Judiciário. O crime se transnacionalizou, se globalizou, principalmente nos países mais empobrecidos. O avanço do narcotráfico nesses países e assustador. Em grande parte, porque é crescente o empobrecimento dessas populações. O narcotráfico se tor­nou uma economia viável para esses países. Milhares de pessoas vivem as custas do crime organizado e do tráfico.

Precisamos, urgentemente, de uma nova segurança pu­blica. lnfelizmente, as nossas polícias estão desaparelhadas, dispondo de menos recursos do que dispõe o crime organizado. Não temos uma polícia técnica, investigativa e eficiente para combater os crimes de informática, financeiros, tributários etc.

Em muitos Estados da federação, os delegados de polí­cia não são bacharéis em Direito, sendo nomeados por prefeitos. Grande parte dessas corporações têm a tortura como o único meio para conseguir uma prova, que é forjada e ilícita. E mais fácil para o policial obter a prova de confissão, mesmo que ela seja ilícita, do que fazer uma compe­tente investigação. Fia uma exigência de inquérito polici­al, que torna esse processo ainda mais anacrônico, buro­cratizado e cartorial.

As policias militares são desequipadas para o policia­mento ostensivo. Seus membros são mal remunerados e há desassistência de toda a ordem. Ela ainda é treinada para ser violenta, arbitrária, incapaz de assegurar aos cidadãos os direitos mais fundamentais.

E verdade que há muitos que enobrecem essas corporações. São policiais que sabem do seu real papel de zelar pela ordem pública e garantir a cidadania. Com es­ses profissionais, queremos, cada vez mais estreitar laços de parceria na luta pela impunidade e atenção total aos direitos humanos.

Lutamos por reformas na nossa legislação penal e pro­cessual penal. A começar pela Lei 9.455/97, a chamada lei que tipificou o crime de tortura. Esta lei significou marco importante para cessar a cultura da tortura como método de investigação. Mas, há tempos, temos dito que e lei não aplicada. A começar pelas denúncias de que pretere clas­sificar como crime de lesão corporal em vez de tortura. Até hoje, não há nenhuma condenação por crime de tortu­ra nesse país.

O Ministério Público, por sua vez, também peca quando não pratica o controle da atividade policial constitucio­nalmente garantido a esta instituição. Muitas vezes, os membros do Ministério Público não acompanham as investigações, e, seguidamente, apresentam denúncias ge­néricas, inaptas, sem passar pelo filtro da formalidade le­gal. A consequência é o engavetamento dessas peças pro­cessuais.

Calcula-se que apenas 2% dos registros policiais virem ações penais. O resto morre na própria fase policial ou posteriormente, na fase de apresentação da denúncia.

O próprio Poder Judiciário, frequentemente, contribui a impunidade. Isso ocorre quando o juiz procrastina, não cumpre prazos, aceita inquéritos e denuncias mal feitos, causa infindáveis violações aos direitos humanos e não é punido. Urge que se regulamente o Controle Externo do Poder Judiciário incluído na Reforma do Poder Judiciário, cuja PEC encontra-se tramitando no Senado Federal . A própria CPI do Judiciário demonstrou diverso casos, em que juizes corruptos cometeram crimes e até estão impunes.

Porém, o baluarte da impunidade é a imunidade parlamentar. Em nada se justifica a necessidade do parlamentar não responder e ser réu em processos comuns judici­ais. Esse privilégio incentiva grandes poderosos de redes organizadíssimas de crimes a adquirirem mandato somen­te com o intuito de obter impunidade.

Precisamos acabar em definitivo com esta forma de imu­nidade parlamentar. E urgente uma grande mobilização dos movimentos populares e sociais, para a aprovação, no Congresso, da Proposta de Emenda à Constituição 34/95, que limita a imunidade parlamentar aos atos relacionados efetivamente ao exercício do mandato. A Comissão de Di­reitos Humanos tem se empenhado nesta luta e quer o apoio de todos para atingir esse objetivo.

O foro privilegiado para determinadas categorias pro­fissionais também é incompatível com os postulados fun­damentais da democracia e dos direitos humanos. Principalmente, quando se trata de crimes praticados por poli­ciais. Não podemos aceitar que policial investigue polici­al. Se o policial praticou crime comum deve ser julgado pela justiça comum e não julgado pela justiça militar.

Queremos que determinados crimes, como os pratica­dos por grupos de extermínio, os que envolvem torturas, chacinas, crimes políticos sejam investigados pela Polícia Federal e julgados pela Justiça Federal.

Uma outra medida para acabar com a impunidade é a mudança da legislação penal. Hoje, temos mais de mil ti­pos penais. Isso é um absurdo. Há crime para tudo, todos com penas privativas de liberdade. As penas alternativas ou restritivas de direito e multa abarcam poucos crimes. Precisamos reformar a parte especial do Código Penal. Consideramos essa reforma mais necessária até do que a parte geral que já tramita no Congresso Nacional.

Achamos, também, que as regras processuais penais devem sofrer alterações. Não é possível que grande quan­tidade de crimes acabe sendo prescrita, antes de haver sen­tença transitada em julgado. Isso provoca numerosos ca­sos de impunidade porque as decisões judiciais se limitam a reconhecer a extinção da punibilidade. Houve o cri­me, mas seu autor não poderá ser punido, porque as instituições que deveriam fazer a persecução penal foram len­tas u incompetentes.

Queremos um novo processo penal, mais aberto à intervenção das entidadescivis e sociais. Acreditamos que entidades de direitos humanos podem se preparar para ser parte nos processos judiciais e perseverar pela puni­ção dos culpados.

Um exemplo de impunidade neste país tem sido o tra­balho escravo. Apesar de todos os instrumentos internaci­onais e nacionais de proteção, essa realidade ainda é uma grave violação de direitos humanos. Citamos, Corno exem­plo, o caso da Fazenda Brasil Verde, no sul do Pará. Diver­sos órgãos vêm fiscalizando a referida fazenda e têm cons­tatado que o trabalho escravo continua, apesar da questão já estar sub judice.

Acompanhamos um outro caso sério de impunidade: a execução do jovem Hugo de Souza Gonçalves, de 15 anos de idade, na cidade do Paranoá, no Distrito Federal. Este jovem, em 18 de dezembro de 1997, foi executado por po­licias militares que desferiram tiros de arma de fogo na sua cabeça. Até hoje, este crime está impune.

O caso envolvendo o assassinato da líder Margarida Maria Alves, presidenta do Sindicato dos Trabalhadores Rurais dos Trabalhadores Rurais de Alagoa Grande (PB), é outro exemplo de impunidade. O crime ocorreu em 12 de agosto de 1983 e prescreverá daqui a dois anos. Nas investigações, chegou-se aos mandantes do crime, José Buarque de Gusmão Neto e Agnaldo Veloso Borges, latifundiários da região. Mas o julgamento foi adiado simplesmente por seis vezes. Lutamos para que o II Tribunal do júri da Comarca de João Pessoa (PB), enfim paute o julgamento do mandante do crime. Poderíamos dar mui­tos outros exemplos de casos que continuam impunes. Vivemos décadas de impunidade.

Por isso, a criação de um Sistema Nacional de Proteção e Garantia dos Direitos Humanos é fundamental. Precisamos, urgentemente, que os direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais efetivamente garantidos por instrumentos jurídicos e políticos.

Outrossim, este Sistema Nacional deve estreitar a rela­ção com o sistema internacional de proteção dos direitos humanos da ONU e da OEA. Precisamos que os mecanis­mos de acesso nessas instancias sejam postos à disposição de todos os cidadãos, inclusive através do direito indivi­dual de petição.

 

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