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Os Direitos Humanos e Fundamentais como Elementos Operativos-Constitutivos do Estado Democrático de Direito no Brasil

Rogério Leal 


1. O Estado de Direito no Brasil: aspectos controvertidos;
2. Os princípios constitucionais: natureza e significados;
3. O Poder Judiciário no Brasil e os Direitos Humanos e Fundamentais;
4. Os Poderes/Deveres do Estado Democrático Brasileiro na proteção e implementação dos Direitos Humanos e Fundamentais.
1. O Estado de Direito no Brasil: aspectos controvertidos
Tem sido tradição, desde a formação da República Nacional até o Golpe Militar de 1964, que os movimentos políticos e constitucionalistas no Brasil se caracterizem pela formalização de interesses setoriais da Sociedade local, protegendo, como sempre, uma minoria bastante abastada.
De outro lado e mais contemporaneamente, da década de 1970 até os dias atuais, com a progressiva invasão do capital internacional no Brasil, opera-se uma crescente desnacionalização do poder político. Este capital estrangeiro, centrado na indústria, na mineração e no aproveitamento hidrelétrico, influencia, por intermédio de seus advogados enquistados na administração e no Congresso, na elaboração de normas de proteção de suas atividades e na formação da estrutura do Estado a seu favor.
Com tal modelo de industrialização e desenvolvimento, por sua vez, vem se consolidando, desde aquele período, um contingente de trabalhadores que tende a organizar-se em sindicatos, corporações ou partidos políticos. Suas reivindicações crescem em peso e em qualidade; exigem modificações na estrutura do Estado, postulando maior participação e denunciando os privilégios obtidos pelos setores mais poderosos, notadamente o capital estrangeiro.
Ademais, com o significativo avanço das forças populares ocorrido no início da década de 1970, a burguesia nacional, aliada às empresas multinacionais, corre o risco de perder, em eleições, o controle da estrutura do Estado. Tal fato, leva as forças políticas tradicionais, como empresários nacionais e estrangeiros, setores da indústria pesada, instituições financeiras, etc, comprometidas com Golpe Militar de 1964, a apoiarem, durante este período e até meados da década de 1980, um regime de força e restrições de Direitos Fundamentais.

Neste momento, podemos evidenciar que as estruturas do Estado Brasileiro permanecem centralizadas no poder da Presidência da República e nos organismos de informação das Forças Armadas, controlando todos os órgãos da administração federal, estadual e municipal, incluindo, de forma indireta, o Poder Legislativo e Judiciário; mantém-se leis repressivas e o comando da economia pelo capital internacional, através de uma dívida externa que as autoridades competentes não ousam questionar.
O que se quer sublinhar com estas reflexões é que, até a Constituição de 1988, boa parte da história política e constitucional brasileira, antes de forjar uma tradição democrática e popular na elaboração de seus comandos jurídicos, soube tão somente estabelecer pactos e compromissos com um grupo minoritário de indivíduos, detentores da maior parcela do mercado de produção e capitais.

Na verdade, as normas contidas nos textos constitucionais brasileiros (elas servem como um parâmetro de interpretação da organização social) até a carta de 1988, estabelecem pautas de comportamentos e condutas, fundamentalmente, para o cidadão. Nestes períodos, de forma visível e até radical, percebemos a drástica distância que pode existir entre Constituição e Sociedade, quando esta é construída a despeito das demandas populares, servindo apenas para delimitar o que pode e o que não pode ser feito pelo cidadão, impondo um tipo de vida e aceitação das estruturas políticas, econômicas e culturais vigentes.

Por um lado, como quer Lopes, o Congresso Constituinte que elabora a Constituição de 1988, não demonstra no próprio processo de construção da nova Carta, respeito à representação popular que a constitui, deixando de interagir com as reais e profundas demandas sociais. Por outro lado, o Congresso se utiliza de práticas fisiológicas e clintetistas, fazendo com que o jogo político continue significativamente dependente das negociações que se travam no âmbito do Executivo.

Em outras palavras, o impressionante descompasso entre uma Constituição que reconhece e assegura direitos e uma Sociedade na qual se reconhecem violações constantes e gravíssimas dos Direitos Humanos, tem causas diversas e uma história comum: a história de um Estado no qual o autoritarismo e a centralização do poder político dominou e continua a porejar nas mais diferentes estruturas do poder.
Por outro lado, entre avanços e recuos, a Constituinte consegue, pela insistência de poucos segmentos políticos, alinhavando compromissos em torno de temas ligados à grande parte da população brasileira, insculpir, no texto final, matérias de ampla abrangência social, contemplando vários Direitos Fundamentais que a modernidade relegou à Sociedade política.

Tais avanços formais, por si só, não são suficientes para viabilizar mudanças estruturais na forma de constituição e operacionalização do poder político nacional. Pode-se afirmar que, como referencial jurídico, a Carta de 1988 alargou significativamente a abrangência dos direitos e garantias fundamentais, e, desde o seu preâmbulo, prevê a edificação de um Estado Democrático de Direito no país com o objetivo de assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça, como valores supremos de uma Sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos.

Nos seus artigos introdutórios, a Constituição estabelece um conjunto de princípios que delimitam os fundamentos e os objetivos da República. Dentre estes, destacam-se a cidadania e a dignidade da pessoa humana. (art.1º e 3º).
Assim, construir uma Sociedade livre, justa e solidária, garantir o desenvolvimento nacional, erradicar a pobreza e a marginalização, reduzir as desigualdades sociais e regionais e promover o bem de todos sem preconceitos de origem, raça, cor, sexo, idade ou quaisquer outras formas de discriminação, constituem os objetivos fundamentais do Estado Brasileiro.

Pode-se perceber, daí, que o Congresso Constituinte optou por elevar ao condão de princípios, o resguardo do direito à dignidade humana, na medida em que, explicitamente, privilegia a temática dos Direitos Fundamentais, outorgando-lhes, ainda, a natureza de cláusula pétrea, nos termos do art. 60, parágrafo 4º, IV.
Cumpre analisarmos, agora, qual a natureza dos nominados princípios constitucionais insertos no ordenamento jurídico pátrio.

2. Os princípios constitucionais: natureza e significados
Tendo em conta a idéia de sistema jurídico como ordem global e de subsistemas, como ordens parciais, podemos dizer que os princípios, enquanto normas, desempenham a função de dar fundamento material e formal aos subprincípios e demais regras integrantes da sistemática normativa. Aqui se entende sistema como a totalidade do Direito Positivo, e subsistemas, como suas ramificações estrutural-normativas.
De tal sorte, como lembra Paulo Bonavides, os princípios estatuídos nas Constituições - agora princípios constitucionais -, postos no ponto mais alto da escala normativa, eles mesmos, sendo normas, se tornam, doravante, as normas supremas do ordenamento, servindo de pautas ou critérios, por excelência, para avaliação de todos os conteúdos constitucionais e infraconstitucionais. Acrescente-se que os princípios, desde sua constitucionalização, recebem, como instância máxima, status constitucional, rodeados do prestígio e da hegemonia que se confere às normas inseridas na Lei das leis. Com esta relevância adicional, os princípios se convertem, igualmente, em normas das normas.

Com outras palavras, princípios como estes fazem transparecer uma superlegalidade material e se tornam fonte primária do ordenamento. Esses princípios apresentam-se como efetivos valores elegidos pela comunidade política local e, enquanto tais, afiguram-se como a pedra de toque ou critério com que se aferem os conteúdos constitucionais em sua dimensão normativa mais elevada.
Mesmo considerando a existência do princípio da unidade da Constituição, vigente desde há muito na tradição constitucional do Ocidente, segundo o qual todas as suas normas apresentam o mesmo nível hierárquico, existem, para a moderna teoria constitucional, duas modalidades distintas de normas dentro da Carta Política:
(1) as denominadas normas-princípios e as
(2) normas-disposições (regras jurídicas), compondo um todo junto ao ordenamento jurídico.
As normas-princípios afiguram-se como mandamentos estruturais e indispensáveis à organização da regulação jurídica e ordenação social, ou, como quer Celso Mello, são disposições fundamentais que se irradiam sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critérios para sua exata compreensão e inteligência.
Estes princípios contêm valores políticos e sociais fundamentais ditados pela Sociedade, de forma explícita ou implícita, concretizados em diversas normas da Constituição ou cuja concretização a Constituição impõe.

A contemporânea teoria constitucional alemã, analisada no capítulo quarto e, sua versão portuguesa com Canotilho, também referida, dão conta de que os princípios são exigências de otimização abertas a várias concordâncias, ponderações, compromissos e conflitos, como os princípios do Estado Democrático de Direito, da igualdade, da liberdade, de proteção dos Direitos Humanos.

No âmbito, ainda, da cultura jurídica brasileira, pode-se citar, a título de ilustração argumentativa, o ensinamento de Carlos Maximiliano, para quem todo o conjunto de regras positivas representa sempre e apenas o resumo de um complexo de altos ditames, série de postulados que enfeixam princípios superiores. Constituem estes as idéias diretivas do hermeneuta, os pressupostos científicos da ordem jurídica.
José Afonso da Silva, reconhecido constitucionalista brasileiro, denomina os mandamentos jurídicos do Título I da Carta de 1988 como princípios político-constitucionais, eis que configuram decisões políticas fundamentais concretizadas em normas conformadoras do sistema constitucional positivo, e são, segundo Crisafulli, normas-princípio, isto é, normas fundamentais de que derivam logicamente (e em que, portanto, já se manifestam implicitamente) as normas particulares, regulando imediatamente relações específicas da vida social.

A lição de Canotilho é fundamental à matéria:
Na sua qualidade de princípios constitucionalmente estruturantes, os princípios fundamentais devem ser compreendidos na sua ligação concreta com uma determinada ordem jurídico-constitucional, historicamente situada....... embora não sejam princípios transcendentes, eles podem ser sempre tomados como dimensões paradigmáticas de uma ordem constitucional justa, à luz de critérios historicamente sedimentados.
Em outras palavras, significa dizer que os princípios constitucionais, por sua própria essência, evidenciam mais do que comandos generalíssimos estampados em normas, em normas da Constituição. Expressam opções políticas fundamentais, configuram eleição de valores éticos e sociais como fundantes de uma idéia de Estado e de Sociedade. Os princípios não expressam somente uma natureza jurídica, mas também política, ideológica e social, como, de resto, o Direito e as demais normas de qualquer sistema jurídico. Contudo, expressam uma natureza política, ideológica e social, normativamente predominante, cuja eficácia no plano da práxis jurídica deve se impor de forma altaneira e efetiva .

Nem poderíamos pensar de outra forma, especialmente se o objetivo do Direito é resolver as questões que nascem na Sociedade, mormente em razão de sua aplicação. Teorias não garantem por si só os direitos. Teorias que induzem à não-aplicação da Constituição (ou de qualquer norma jurídica ou princípio jurídico), mais atrapalham do que ajudam a alcançar os fins que nela se hospedam. O constituinte brasileiro dá a solução equilibrada para a questão da eficácia jurídica dos Direitos Humanos, catalogando-as nos Princípios Constitucionais e nos Direitos Fundamentais, bem como arrolando-as em outras regras jurídicas. Aos poderes constituídos incumbe cumpri-la e, se for o caso, propor o seu aperfeiçoamento. Julgar a norma constitucional ou indispor de vontade política para fazê-lo, é adversar a própria Constituição, pelo que se deve, singelamente, responsabilizar quem o fizer.

Sem cair na tentação positivista clássica, precisamos, neste debate, citar a contribuição de Ronald Dworkin. Entende o autor que é necessário reconhecer, no âmbito da argumentação jurídica em que se disputam direitos e obrigações jurídicas, a existência de standards (pautas) que funcionem como princípios (principles) ou políticas (policies), e não como regras jurídicas no sentido que o positivismo - seja o institucionalista de Hart, seja o de estatuição de Kelsen-lhes atribui.

Os princípios, assim, são referidos genericamente como conjuntos de normas outras que não regras jurídicas, incluída aí a noção de política, as quais dizem respeito a um tipo de norma cujo objetivo é o bem-estar geral da comunidade, no sentido do seu improvement (melhora) econômico, político e social. Esta idéia de princípio diz respeito, em Dworkin, a um tipo de norma cuja observação é um requisito de justiça ou eqüidade.
De tal sorte, deveriam os tribunais buscar princípios que, singular ou coletivamente, se constituíssem, antes, em diretrizes para a decisão judicial, do que na mera explicação das regras jurídicas existentes. Isto porque a zona em que os princípios penetram é mais que um mero sistema, relativamente, aberto de regras, pleno de ambigüidades, mas se refere a algo de maior substância e localizado no âmago da formação política e cultural de uma comunidade.

Dworkin afirma que enquanto a feitura da política judiciária (entendida esta como a ação dos juízes interpretando/criando normas jurídicas) ofende os princípios democráticos, as decisões baseadas sobre os direitos pré-existentes fundados em princípios são, significativamente, menos objetáveis, se é que são objetáveis.

Cuándo se le permite, entonces, a un juez, que cambie una norma jurídica existente? Los principios figuram de dos maneras en la respuesta. Primero, es necesario, aunque no suficiente, que el juez considere que el cambio favorecería algún princípio, que así viene a ser el que justifica el cambio. Pero cualquier principio no sirve para justificar un cambio, porque entonces ninguna norma estaría jamás a salvo. Debe haber algunos que cuentan más que otros.

A partir desta dicção, poderíamos dizer que os arts.1º, caput e incisos, 2º, 4º e 5º, caput e incisos, e 170 caput(parcialmente) e incisos, da CF/88, aparecem como princípios, enquanto os arts.3º, 4º,parágrafo único e 170 caput (parcialmente), aparecem como políticas .

Em ensaio sobre o tema, Vera Karam disserta:
Ao ser compreendida de forma mais aberta, a regra jurídica desmistifica-se, abandonando a onipotência que o positivismo jurídico lhe atribui e tornando-se uma fonte extraordinária de direitos morais. Assim, o ato judicatório será um ato político. Num caso difícil (hard case), o juiz se valerá de certos princípios - que podem ser desprendidos da regra jurídica -, para através dos mesmos, buscar os direitos morais das partes, pertinentes às suas pretensões. Este mecanismo, que vincula as questões práticas (relativas á tomada de decisões do juiz) às questões teóricas da concepção da regra jurídica, oferece uma resposta (através do direito) à Sociedade pela via da realização possível da justiça.

Dois aspectos, porém, precisam ser ressaltados neste particular:
(1) as regras jurídicas para Dworkin operam num esquema de tudo ou nada, isto é, o nexo entre fatos e conclusão jurídica, através de uma regra, é automático, importando tão somente aferir sobre sua validade ou não dentro do sistema;
(2) os princípios não estabelecem nexo direto entre os fatos e a conclusão jurídica, mas, geralmente, é necessário fazer, em instância intermediária, uma comparação entre os princípios encontrados e tratados. Esta comparação, por sua vez, não se resolve através da superveniência de um deles e a supressão do outro, mas ambos continuam a existir, ainda que só um prevaleça sobre o caso concreto.
Tal reflexão filosófica sobre os princípios, desenvolvida por Dworkin, vai encontrar em Robert Alexy significativo aprofundamento, em especial nos textos: Teoría de los Derechos Fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997; El concepto y la validez del derecho. Barcelona: Gedisa, 1998.
Sustenta o autor que, nos dias atuais, há uma tendência de se caracterizar o movimento constitucionalista contemporâneo - principalmente o alemão - a partir de uma teoria axiológica da Constituição, reconhecendo que o sistema jurídico possui valores objetivos, de natureza constitucional, que exercem um efeito de irradiação sobre todo o direito ordinário. A Constituição, através destes valores, proporciona um conteúdo substancial ao sistema jurídico.
Tais valores, já positivados no texto constitucional, por exemplo, conformam verdadeiros princípios constitucionais ou, como quer o autor.
Mandatos de optimización mientras que las regras tienen el carácter de mandatos definitivos. En tantos mandatos de optimización, los princípios son normas que ordenan que algo sea realizado en la mayor medida posible, de acuerdo com las poisibilidades jurídicas y fácticas.
O autor ainda defende a necessidade de se adotar um critério gradualista-quantitativo à análise dos princípios jurídicos que informam um determinado sistema, por meio do qual estes são entendidos como mandamentos de otimização. Neste sentido, um eventual conflito de regras jurídicas se resolve na dimensão da validade dentro do sistema, através de regras prévias e sistêmicas (critério da hierarquia, critério da norma mais nova, critério da norma mais especial), enquanto que a colisão de princípios tem como parâmetro de solução, a dimensão de valor (juízos de valor realizados pelo operador).
Quanto ao modo de solução de um conflito, se for entre regras, somente pode ser resolvido através de uma cláusula de exceção que remova o conflito, ou, pelo menos, se uma das regras for declarada nula. Juridicamente, segundo Alexy, uma norma vale ou não vale e, quando vale e é aplicável a um caso, isto significa que suas conseqüências jurídicas também valem .

Por outro lado, pode ocorrer por exemplo, que algo seja vedado por um princípio e permitido por outro e, neste caso, um deles deve recuar. Isso não significa, porém, que o princípio abdicado tenha se tornado nulo, nem que nele se introduza uma cláusula de exceção. O que ocorre, na verdade, é que em determinadas circunstâncias um princípio cede a outro, ou que, em situações distintas, a questão de prevalência pode se resolver de forma contrária. Aí estaremos diante da preponderância do princípio de maior peso.
A operacionalização desta preponderância dá-se através de um juízo de proporcionalidade em sentido amplo, ou a existência de seus elementos ou subprincípios: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.
Como bem alerta Oliveira Jr:
De modo que falar de DF hoje em dia é não só referir-se a normas programáticas de todos esses novos direitos, como também pensar em sua eficácia e efetividade. E a sua eficácia, segundo raciocínios anteriormente feitos, depende da efetividade dos canais procedimentais, assim como de uma proporcionalidade hermenêutica (como veremos mais adiante).
Na verdade, quando se tem um ou mais direitos fundamentais em jogo na solução de um caso concreto, devem eles sofrer uma ponderação em razão do bem ou valor que se pretenda tutelar. Esta relativização da aplicação de uma norma de direito fundamental traz ínsita a existência de várias possibilidades jurídicas de realização dos Direitos Humanos e Fundamentais.

Também a adequação e a necessidade são dedutíveis desse caráter principiológico das normas de Direitos Humanos e Fundamentais. Se é certo que a realização destes direitos supõe uma otimização não só de situações jurídicas, mas igualmente de situações fáticas, fica claro que a adequação dos meios aos fins, bem como a busca da maior idoneidade do meio para a realização ótima do fim, estão implícitas no processo, porque são elas que determinam, enfim, o resultado apto sob o aspecto da realidade possível.

Por óbvio, que o processo de demarcação de forças entre um princípio e outro, a ser aplicado ao caso concreto, não fica totalmente jogado à sorte e ao desejo dos atores jurídicos e sociais envolvidos no tema, mas é aferido, tanto em face do arbítrio de quem leva a cabo a interpretação, como em face de uma fundamentação vinculante e necessária. Tanto mais lícita, aceita, razoável e ponderável a ação jurídica quanto mais estiver estribada, racionalmente, em valores humanos e jurídicos já pacificados pelo tempo e pela história, tais como os Direitos Humanos e Fundamentais.
Torna-se fácil, em tal quadro, como uma das alternativas às diversas crises institucionais relatadas, a conclusão de que os princípios supra-referidos têm a função de delimitar os campos e possibilidades de interpretação e integração das demais normas constitucionais e infraconstitucionais, ou seja, qualquer criação, interpretação e aplicação de lei ou ato de governo, deve ter como fundamento o comando da norma que diz ser a República Federativa Brasileira um Estado Democrático de Direito, com objetivos claros a perseguir e tutelar (art.3º), o que significa estabelecer responsabilida-des e prioridades políticas interventivas em todos os campos das demandas sociais explícitas e reprimidas.

Neste sentido, por exemplo, a ordem econômica, no Brasil, deve assegurar, a todos, existência digna (art.170,CF/88), enquanto que a ordem social deve visar a realização da justiça social (art.193), e a educação, o preparo do indivíduo para o exercício da cidadania (art.205).

De outro lado, uma vez que a legitimidade do texto constitucional - e toda e qualquer ordem jurídica pátria tem seu sustentáculo principiológico e político neste Título I, pode-se também concluir que o plano de eficácia dos Poderes do Estado é medido pela busca, respeito e garantia dos Direitos Humanos ou Fundamentais, latu sensu, principalmente, após a promulgação, em nossa legislação interna, dos textos convencionais conhecidos como Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e a Convenção Interamericana de Direitos Humanos, consoante os Decretos nº592, de 06.07.1992 , e o de nº678, de 06.11.1992.

Tal raciocínio, agudizando nossas posturas, afasta a idéia de que o Constituinte de 1988 pretende instituir, kelsenianamente, um mero Estado de Legalidade, apenas formalmente ligado à Constituição, mas, ao contrário, sustentamos que ele faz crer que a ênfase dada pelos objetivos, fundamentos e princípios constitucionais à República Brasileira, é a de se constituir em um efetivo Estado Democrático, que, por sua vez, implica no reconhecimento da postura interventiva e constante do Poder Público à efetivação/concretização das normas constitucionais, como parte de seu poder/dever institucional.

A despeito disso e paradoxalmente, a história nacional tem nos mostrado que as normas jurídicas, inclusive as Constituições, veiculadas pelo Estado, têm sido impostas à comunidade, em nome de um pacto ou consenso meramente formal, cuja vigência, eficácia e validade não têm sido discutidas pelos seus destinatários, eis que tais categorias são lidas tão somente no âmbito intrasistêmico do processo legislativo formal e de sua adequação procedimental junto às instâncias oficiais de aplicação da norma jurídica. A Constituição, nesta ótica, tem se apresentado como sendo a expressão verbal da normatividade de uma dominação que, em verdade, é exercida para manter ou colocar no poder uma determinada elite.

Neste particular, cumpre evocar, com preocupação, que desde a sua promulgação, os presidentes eleitos, ao tomarem posse e prestarem juramento de cumprir a constituição, logo em seguida, têm-se declarados adversários da nossa Constituição em vigor. Dizem que a Constituição torna o país ingovernável. É como se cada Presidente que assumisse o governo quisesse elaborar uma Constituição para si, de acordo com os seus interesses, e desejasse transformar a Constituição num mero regimento interno de governo.

Um dos sinais mais evidentes disto, é a forma reducionista com que os tribunais superiores brasileiros vêm tratando do tema da interpretação jurídica, isto é:
(a) Súmula 400 do STF: estabelece que não se admite recurso extraordinário contra decisão que deu razoável interpretação à lei, ainda que não seja a melhor;
(b) Súmula 343 do STF: diz que não cabe ação rescisória por ofensa à literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda tiver se baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais, interdição que subsiste mesmo quando, posteriormente, a jurisprudência venha a se fixar em sentido contrário ao daquela decisão.
Ora, já demonstramos que não há texto tão claro que exclua por princípio a interpretação; antes pelo contrário, a clareza do texto é o resultado da própria interpretação, sendo artificioso pretender distinguir entre o ato de compreender e o de interpretar. Na realidade, interpretar um texto é explicitar o sentido que o leitor crê ter captado nele. A interpretação é um ato intelectual por meio do qual se faz explícita a compreensão.

3. O Poder Judiciário no Brasil e os Direitos Humanos e Fundamentais
Vimos, ao longo do terceiro capítulo de nosso trabalho, como a comunidade internacional em geral e o Brasil, em especial, vêm fortificando os instrumentos protetivos dos Direitos Humanos, agregando-se a eles vários Estados-Partes e novos membros com o passar do tempo, o que possibilita o amplo reconhecimento, ao menos formal, de tais prerrogativas.

Assim é que, nos últimos anos, o impacto de instrumentos internacionais de proteção dos Direitos Humanos é patente no ordenamento constitucional de diversos países. Na Constituição Portuguesa de 1976, vemos no seu art.16, 1 e 2 , a disposição de que os Direitos Fundamentais, nela consagrados, não excluem quaisquer outros constantes das leis e das regras aplicáveis de direito internacional, acrescentando que os preceitos constitucionais e legais relativos aos direitos fundamentais devem ser interpretados e integrados em harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem.
A Constituição Alemã, com emendas até 1983, dispõe, em seu art.25, que as normas gerais de Direito Internacional Público constituem parte integrante do direito federal, sobrepõem-se às leis e constituem fonte de direitos e obrigações para os habitantes do território federal. Tal disposição autoriza o entendimento de que o texto constitucional alemão engloba os direitos e obrigações consagrados nos instrumentos de proteção internacional dos Direitos Humanos.

Da mesma forma, a Constituição Espanhola de 1978 reconhece a importância dos tratados de Direitos Humanos, eis que submete a eventual denúncia de tratados sobre direitos e deveres fundamentais, ao requisito da prévia autorização ou aprovação do Poder Legislativo, nos termos de seus arts.92 e 94, cerceando, assim, eventual arbitrariedade do Executivo neste sentido.

Em razão destes exemplos, percebemos como os sistemas constitucionais deste final de século, encarecem o papel do Poder Judiciário, enquanto guardião dos direitos constitucionais e infraconstitucionais, como aquele que se dota de melhores condições para assegurar a eficácia jurídica dos Direitos Humanos e Fundamentais, especialmente quando se apresentar quadro de ameaça ou violação dos mesmos.
A jurisdição é, em si, um Direito Fundamental expresso tanto no plano internacional (art. 10, da Declaração dos Direitos do Homem, da ONU, de 1948), quanto no plano interno dos diferentes Estados (art. 5º, inciso XXXV, da Constituição da República do Brasil).
Se não houver jurisdição constitucional eficiente e mesmo, e cada vez mais, jurisdição internacional efetiva, todos os Direitos Humanos e Fundamentais tornar-se-ão vulneráveis e, enormemente, dependentes das eventuais condições das Sociedades, dos governos e dos governantes.

O Estado-Juiz passa, pois, a desempenhar um papel relevantíssimo na garantia efetiva e eficiente daqueles direitos, pois esses, diversamente de outros que são havidos nos diferentes sistemas aos particulares, não se põem a ressarcimento posterior ou reparação, mas são indisponíveis e inadiáveis em seu exercício: ou garante-se o direito à vida ou nada haverá, nem um dia vindouro, a se garantir; garante-se a liberdade, porque se tal segurança não se impuser de pronto, estará ela perdida naquele momento e não se lhe poderá repor.

Los jueces aparecen instalados en imaginario de la sociedad como ultima ratio, como garantes finales del funcionamento del sistema democrático. Desacreditado el sistema político que no parece funcionar sin altas cotas de corrupción; ensachada de manera cada vez más profunda la brecha entre representantes y representados; cercada la gobernabilidad por la lógica implacable de mercado y por la sobredeterminación de poderes transestatales y transnacionales, se há depositado, se diría, más por razones sistemáticas que de otra índole, una mayor expectativa en la perfomance del Poder Judicial que en la de los otros poderes de Estado.

Gostaríamos, agora, de avaliar como os tribunais jurídicos no país têm tratado esta temática, principalmente verificando de que forma seus operadores têm, efetivamente, dado aplicabilidade aos mecanismos legislativos e vinculantes já vigentes no território nacional, o que nos possibilitaria, sem dúvidas, o reforço de nossa tese sobre a imperiosa necessidade de mudar-se a perspectiva dos Direitos Humanos e Fundamentais como forma de, inclusive, viabilizarmos o Estado Democrático de Direito.
É preciso reconhecer, de pronto, que há uma série de fragilidades (em especial no campo da eficiência e da identidade) que estão a atingir o Poder Judiciário Brasileiro nos últimos tempos, tendo como um dos aspectos mais óbvios destas fragilidades, as que dizem respeito à crescente inefetividade desse poder, o que pode ser ilustrado pelo flagrante descompasso entre a procura e a oferta de serviços judiciais, em termos tanto quan-titativos quanto qualitativos.

Os tratados internacionais pactuados pelo Brasil, como vimos antes, sintonizados que estão com as concepções mais contemporâneas de direito, expondo e problematizando os conflitos coletivos e os que envolvem questões distributivas ou de natureza social, têm esbarrado numa cultura profissional dos operadores do direito em geral que se notabiliza por um excessivo individualismo e formalismo em sua visão de mundo , traduzido pela convicção de que a parte precede o todo, ou seja, de que os direitos do indivíduo estão acima dos direitos da comunidade.

Outra prova contundente da dificuldade de se outorgar, no país, um tratamento mais efetivo aos Direitos Humanos, é a postura adotada pelo país quanto ao conflito entre tratado e direito interno. Nesta seara, temos algumas situações dignas de registro:
(1) a Constituição Brasileira deixa claro que os tratados se encontram sujeitos ao controle de constitucionalidade;

(2) a relação entre tratados e leis internas de estatura infraconstitucional, no Brasil, é de garantir aos primeiros apenas tratamento paritário, tomadas, como paradigma, as leis nacionais e diplomas de grau equivalente.
Significa dizer que, ante a realidade do conflito entre tratado e lei posterior, esta, porque expressão última da vontade do legislador republicano, deve ter sua relevância garantida pela Jurisdição sem embargo das conseqüências do descumprimento do tratado, no plano internacional.

Noutro sentido, inexistindo na Carta Política Brasileira garantia de privilégio hierárquico do tratado internacional sobre as leis do Congresso, é inevitável que o Estado-Juiz deva garantir a autoridade da mais recente das normas, porque é paritária em sua estatura no ordenamento jurídico.

O próprio Supremo Tribunal Federal brasileiro, em reiteradas decisões, e dividindo opiniões de seus Ministros, tem evidenciado sua posição quanto ao fato de que os tratados internacionais que o país subscreve, mesmo os de Direitos Humanos, situam-se no mesmo patamar da legislação ordinária, e, em nome do manipulável tema da soberania do Estado em face de seu ordenamento jurídico, tais tratados não se sobrepõem à norma interna.

Ocorre que, como assevera Trindade, tal postura, além de contraditória frente ao desenrolar da história, é absolutamente indefensável, comprometendo, definitivamente, a responsabilidade do Estado no plano internacional.

Portanto, o tema da compatibilização necessária entre os Tratados e Convenções Internacionais dos Direitos Humanos e o direito interno é matéria das mais preocupantes no âmbito da efetivação destes direitos. Tanto é verdade que, quando da abertura da II Conferência Mundial de Direitos Humanos em Viena, junho de 1993, o então Secretário-Geral das Nações Unidas, B. Boutros-Ghali, sugeriu que par leur nature, les droits de l'homme abolissent la distinction traditionnelle entre l'ordre interne et l'ordre international. Ils sont créateurs d'une perméabilité juridique novelle. Il s'agit donc de ne les considérer, ni sous l'angle de la souverineté absolue, ni sous celui de l'ingérence politique. Mais, au contraire, il faut comprendre que les droits de l'homme impliquent la collaboration et la coordenation des États et des organisations internationales.
Na dicção de Faria, no âmbito do Estado-Juiz, não preparado técnica e doutrinariamente para compreender os aspectos substantivos dos pleitos a ele submetidos, a magistratura enfrenta dificuldades para interpretar os novos conceitos dos textos legais típicos da Sociedade industrial, principalmente os que estabelecem direitos coletivos, protegem os direitos difusos e dispensam tratamento preferencial aos segmentos economicamente desfavorecidos.
Tendo sido educada e organizada para atuar na perspectiva de uma justiça corretiva, a magistratura se revela contida, inibida e temerosa quando estimulada a atuar na dimensão de uma justiça distributiva. Por causa disso, os esforços modernizadores do legislador muitas vezes esbarram na insuficiente sensibilidade social e mesmo sociológica dos juízes.
Ao par disto, é perceptível como, em regra, a grande parte dos operadores do direito, têm dificuldade de se aproximarem dos temas que envolvem os Direitos Humanos e Fundamentais, ao mesmo tempo que se distanciam das normativas internacionais vigentes no país. Vejamos o seguinte caso jurisprudencial:
Agravo de Instrumento no 593032915 - 3o Câmara Cível - Viamão. PATRIO PODER. AÇÃO DE DESTITUIÇÃO. PROTEÇÃO AO MENOR OU ADOLESCENTE. AFASTAMENTO "IN LIMINE", DO PAI-AGRESSOR.
Havendo fortes indícios de agressões físicas e sexuais por parte do pai contra a filha menor, cabe o afastamento daquele do lar comum, forte no que dispõe o art. 130 do Estatuto da Criança e do Adolescente, liminarmente. Recurso provido, para determinar o afastamento do pai-agressor do lar comum, e não da vítima menor, como determinado no decisum a quo . Ministério Publico, agravante - A. D. L. S.. agravado.
ACÓRDÃO
A 8o Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, unanimemente, acorda em dar provimento ao agravo de instrumento. Custas ex lege. Participaram do julgamento, além do signatário, os Exmos. Srs. Des. João Andrades Carvalho, Presidente. e Dr. José Carlos Teixeira Giorgis. Porto Alegre, 03 de março de 1994. Eliseu Gomes Torres, Relator.
RELATÓRIO
Des. Eliseu Gomes Torres - Nos autos de ação de destituição do pátrio poder requerido pelo órgão ministerial contra A. D. L. S., aquele agrava de instrumento de decisão que indeferiu o afastamento do pai-agressor do lar conjugal - este praticou atos de violência contra a filha, inclusive abuso sexual, entendendo a magistrada a quo não ser o Juízo da Infância e da Juventude o competente para tal, aduzindo que dita determinação seria, em tese, decretação - de ofício - de separação de corpos do casal, sem que parte legitimada para tanto o requeresse - a esposa.
Refere a Dra. Promotora de Justiça (fls. 2/5) que a possibilidade da cautelar pleiteada encontra guarida no art. 130 do ECA. Ademais, sustenta que o problema existente entre pai e filha é distinto daquele existente entre os cônjuges.
Outrossim, informa que houve ajuizamento do pedido de separação de corpos no Juízo Civel, pela esposa de A. D., tendo sido deferido, liminarmente, o afastamento deste do lar conjugal (fl. 21).
As peças indicadas pelo agravante foram transladadas (fls. 10/18). O agravado foi citado por edital (certidão - fl. 22v.).
A MM. Juíza monocrática, conside-rando prejudicada a intimação do agravo, mantém a decisão atacada (fl. 22v.).
Subindo os autos a este Tribunal, com vista ao MP, o douto e diligente procurador de Justiça, Dr. Mário Romera, aponta vários enganos cometidos pela autoridade judiciária, em seu parecer de fis. 26 a 30. Entre outros, ao determinar a MM. Juíza o afastamento de E. da companhia de sua mãe, violou o direito de a criança ter assegurada a convivência familiar (art. 42 do ECA). Praticou constrangimento a julgadora, quando retirou da mãe a guarda da filha, sem o devido processo legal (arts. 165 e segs. do ECA). Ao final, manifesta-se o representante do parquet pelo provimento do recurso, a fim de ser decretado o afastamento do agressor da moradia comum.
O Relator originário do processo, Dr. Luiz Felípe Azevedo Gomes, diligencia, no sentido da remessa dos autos à origem, a fim de ser intimado o procurador do agravado ou seu curador especial, já que citado por edital (fl.30v.).
Diligência atendida, a curadora especial responde ao agravo (fl. 34), pugnando pela mantença do decisório hostilizado.
Retornando os autos a esta Corte, convém salientar que o apensamento determinado pela MM. Juiza à fl. 31, da ação de destituição de pátrio poder aos presentes autos, inocorreu, inobstante constar o seu procedimento certificado pelo Sr. Escrivão à fl. 31. in fine vem aos autos conclusos. É o relatório.
VOTO
Des. Eliseu Gomes Torres - Dou provimento ao agravo. O MP, através do seu órgão, com base nos arts. 2 do ECA e 395, I e III, do CC, intentou ação de perda de pátrio poder, contra o agravado, tendo em vista os noticiados atos de violência praticados à filha e, como espancamento e abuso sexual.
Face à gravidade dos atos de violência, pleiteou liminarmente o afastamento do agressor, ora agravado, da moradia comum, baseada no art. 130 do ECA, que prevê tal afastamento.
Entendeu a magistrada a quo, por isso a presente irresignação, não ser o juízo da infância e da juventude competente para determinar o afastamento de um dos cônjuges, do lar conjugal, que só poderia ser feito em ação com competente, na esfera civil, com o que autorizou o afastamento da criança-vitima do lar paterno, devendo ela ser confiada a pessoa idônea, parente ou não (fl. 17 e v.).
Efetivamente, a situação criada pelo despacho atacado não pode prosperar, vez que totalmente afastada da política de proteção ao menor insculpida no ECA.
Reza o art. 19 do ECA que: "Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária..." (Sílvio Rodrigues, comentando este artigo, in "Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado - Comentários Jurídicos e Sociais", Malheiros Editores, vários autores, à p. 83, alude que: "O artigo em comentário proclama alguns direitos da criança e do adolescente derivados daquela orientação constitucional. Diz que a criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio de sua família ou excepcionalmente em família substituta" (grifei).
Já os arts. 155 e 163 do ECA regulam a matéria pertinente aos autos principais donde se originou este recurso, em conjunto com o disposto nos arts. 392 a 395 do CC, qual seja a suspensão ou destituição do pátrio poder. Todos estes argumentos visam, precipuamente, assegurar ao menor ou adolescente a convivência familiar, desde que seus pais apresentem condições de exercer o pátrio poder.
Qualquer ato de violência, seja física, sexual ou psicológica, cometido pelos pais, contra o menor, pode e deve, de pronto, ser afastado, pelo Judiciário, mas sempre tendo o ponto de partida da situação do menor-vítima, que, por ser a parte mais fraca, é quem merece ser poupado, de maiores sofrimentos.
No decisum a quo, a Juíza monocrática se convenceu ser a ação principal, caso de, liminarmente, merecer suspensão do pátrio poder por parte do ora agravado, em relação à filha e, face à gravidade das acusações feitas na inicial da ação de perda do pátrio poder. No entretanto, negou o afastamento do ora agravado do lar comum, por ser medida afeta a esfera civil, autorizando, por seu turno, o afastamento da menor E. do lar paterno, devendo ser ela confiada a pessoa idônea, parente ou não.
Então, diante de fortes indícios da existência de atos de violência física (espancamentos) e sexual (estupro), praticados pelo pai contra a filha, conforme se vê do relato prestado pela própria menor (fls. 14 e 16) e confirmado pela sua mãe (fl. 16), é possível penalizar-se ainda mais esta criança, afastando do convívio da mãe?
Então uma criança que vem, há anos, sendo agredida violentamente pelo pai, pois há indícios suficientes a confirmarem esta afirmação, sendo vítima inclusive de crime hediondo (estupro), é quem deve ser afastada do lar familiar, que de há muito deixou de ser uma família na concepção máxima da palavra?
Pelo exposto, havendo indícios fortes de agressões físicas e sexuais por parte do agravado contra sua filha, a menor E., de apenas nove anos, cabe o afastamento daquele do lar comum, forte no que dispõe o art. 130 do ECA, conforme requerido pelo órgão ministerial, devendo ser desconstituída a decisão agravada, que nega tal afastamento. O voto é pelo provimento do agravo de instrumento, cassando-se a decisão hostilizada para determinar o afastamento, in limine, do agravado, do lar comum, até que a ação de perda do pátrio poder seja definitivamente julgada, tornando, em conseqüência, sem efeito a autorização de afastamento da menor E. P. S. do lar e sua entrega à pessoa idônea.
O Dr. José Carlos Teixeira Giorgis e o Des. João Andrades Carvalho - De acordo.
No caso sob exame, notamos com facilidade a falta de preparação do juízo monocrático prolator da decisão reformada, proferindo uma sentença que, taxativamente, foi de encontro aos interesses superiores da menor, vítima na lide, precarizando ainda mais o seu estado, causando-lhe profundos abalos psicológicos e emocionais, eis que praticamente inverteu os papéis de réu e vítima, determinando o afastamento de sua casa e deixando que nela ficasse o pai malfeitor.
Em nenhum momento fora lembrado, no feito, o que dispõe a Convenção sobre os Direitos da Criança de 1989, em especial em seu artigo 3º:
Artigo 3º : 
1. Em todas as medidas relativas às crianças, tomadas por instituições de bem estar social públicas ou privadas, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, terão consideração primordial os interesses superiores da criança.
2. Os Estados partes se comprometem a assegurar à criança a proteção e os cuidados necessários ao seu bem-estar, tendo em conta os direitos e deveres dos pais, dos tutores ou de outras pessoas legalmente responsáveis por ela e, para este propósito, tomarão todas as medidas legislativas e administrativas apropriadas.
O próprio juízo de primeiro grau jamais considerou as disposições nacionais e internacionais sobre a matéria, pois, desfocadamente, procurou tão somente preservar a união familiar, o instituto do casamento, que já se encontrava profundamente corrompido pelos fatos expostos.
De outro lado, podemos contar também com algumas decisões isoladas que, se não procuram fundamentar suas razões de decidir com base nos Direitos Humanos e Fundamentais, buscam outros princípios constitucionais como ensejadores de prestações jurisdicionais mais justas e coerentes com aquilo que vinhamos dizendo até este momento:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. CRIANÇA PORTADORA DE DISTROFIA MUSCULAR DO TIPO "DUCHENNE" - Inexistindo tratamento curativo para moléstia, de essência genética, no Brasil, o Estado tem o dever de prestar o atendimento clamado pelo menor. A mãe do menino contribuí de forma compulsória ao IPERGS, razão por que deve, a autarquia, fornecer a contraprestação necessitada. Agravo desprovido. Decisão unânime. (Agravo de Instrumento no 597017425 - 7o Câmara Cível - Rio Grande Rel. Des. Eliseu Gomes Torres - Julgado em 09-04-97).
MENOR. OBRIGAÇÃO DO ESTADO EM CUSTEAR TRATAMENTO MÉDICO. TRANSPLANTE DE MEDULA - O art. 227 da CF obriga o Poder Público a assegu-rar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, etc. Os arts. 4o e 11, no seu § 2, do ECA, estabelecem o mesmo dever, assegurando atendimento médi-co à criança e ao adolescente, incumbindo ao Poder Público fornecer gratuitamente àqueles que necessitarem os medicamentos, próteses e outros recursos para tratamento, habilitação ou reabilitação. Assim, deve ser mantida a sentença que condena o Estado a custear a importação da óssea a ser transplantada no menor, bem como as demais despesas atinentes. Por maioria, confirmaram a sentença em reexame necessário, vencido Relator, que anulava o processo. (Reexame Necessário no 596035428 - 8o Câmara Cível - Estrela - Rel. Des. Antônio Carlos Stangler Pereira - Julgado em 08-08-96).
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO PELO ESTADO DE MEDICAMENTOS EXCEPCIONAIS PARA PESSOAS NECESSITADAS NA FORMA DA LEI ESTADUAL No 9.908/93. PACIENTE PORTADOR DO VÍRUS HIV. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. GARANTIA CONSTITUCIONAL. OBRIGAÇÃO DO ESTADO DE FORNECER OS MEDICAMENTOS EXCEPCIONAIS DE USO FREQÜENTE E PERMANENTE - EPIVIR E INVIRASE - AOS NECESSITADOS - Todos têm o direito à vida e, assim, à saúde, constituindo obrigação inarredável do Estado assegurá-los, independentemente de qualquer vinculação do necessitado a sistema de seguridade social, na forma do disposto nos arts. 5o, caput, 6o, 196 e 203 da CF e da Lei Estadual no 9.908/93, porquanto a vida e a saúde constituem a fonte fundamental e primeira de todos os bens jurídicos. Segurança concedida. (mandado de Segurança no 596159988 - 1o Grupo de Câmaras Cíveis - Porto Alegre - Rel. Des. Salvador Horácio Vizzotto - julgado em 1o -11-96).
É de se lembrar que, corroborando tais decisões, ainda temos as disposições do art.12 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais - sequer tangenciadas no caso concreto - já referidos, e de que também o Brasil é signatário, asseverando que:
1. Os Estados-partes no presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa de desfrutar o mais elevado nível de saúde física e mental.
2. As medidas que os Estados partes no presente Pacto deverão adotar, com o fim de assegurar o pleno exercício desse direito, incluirão as medidas que se façam necessárias para assegurar:
1. A diminuição da mortinatalidade e da mortalidade infantil, bem como o desenvolvimento são das crianças.
2. A melhoria de todos os aspectos de higiene do trabalho e do meio ambiente.
3. A prevenção e o tratamento das doenças epidêmicas, endêmicas, profissionais e outras, bem como a luta contra essas doenças.
4. A criação de condições que assegurem a todos assistência médica e serviços médicos em caso de enfermidade.
Sabemos que há sempre uma certa especificidade das normas constitucionais frente à norma ordinária ora aplicada nestes casos concretos, eis que esta se aplica a um caso em específico e com um elevado grau de determinação material, e aquelas apresentam, na sua quase totalidade, uma estrutura mais abrangente, onde se encontram inclusive os Direitos Humanos e Fundamentais. Assim, o objeto da hermenêutica jurídica toma uma amplitude maior, cuja consistência e validade são controladas, submetendo-se o seu resultado a um critério de verdade que se sedimenta na justiça da decisão e de determinados procedimentos, definidos pelo próprio sistema jurídico, como visto nos casos apresentados.
Contudo, para que este critério de verdade seja legítimo e não arbitrário, o sistema jurídico estabelece um controle metodológico, quer do ponto de vista formal, quer do substancial. Formalmente, o critério de verdade é controlado através dos mecanismos processuais e das chamadas garantias fundamentais, tais como: o devido processo legal, a motivação das decisões, o duplo grau de jurisdição. Substancialmente, aquele procedimento é legitimado tendo como parâmetro os princípios contidos nas próprias leis e acolhidos e desenvolvidos na jurisprudência; os valores éticos reconhecidos na comunidade jurídica e insertos nos textos normativos positivados e os valores da própria comunidade em que participam os operadores jurídicos.
Em outras palavras,
Entre los criterios rectores de la actividad jurisdiccional en el Estado de derecho se da una constante e ineludible tensión: por un lado, el principio de legalidad somete a los jueces a la ley; por outro, la necesaria fundamentación moral de la decisión juridica exige no perder de vista las razones de justicia mediante las cuales la ley há de convertirse en derecho; y, por último, la soberanía popular y su expresión de que la justicia emana del pueblo parece exigir la remisión judicial, al menos en último término, a la voluntad del cuerpo social. Cómo resolver esa tensión es algo que deben afrontar los jueces en cada acto jurisdiccional.
Aqui se encontram os Direitos Humanos e Fundamentais como elementos racionais (axiológico-normativos) justificadores da Sociedade contemporânea, do próprio Estado e da Jurisdição.
4. Os Poderes/Deveres do Estado Democrático Brasileiro na proteção e implementação dos Direitos Humanos e Fundamentais
A Constituição Brasileira de 1988, assim como a lei fundamental de Bonn (1949), a Constituição Portuguesa (1976) e a Constituição Espanhola (1978), também outorgou significado especial aos Direitos Fundamentais, contemplados já em seu capítulo inicial, conferindo-lhes imediata eficácia (art 5°, §1°, CF), colocando uma cláusula de imutabilidade ou com a garantia de eternidade (cláusulas pétreas art 60, §4°, IV, CF), bem como determinou que uma emenda constitucional para abolir tais prerrogativas seja declarada inconstitucional pelo Poder Judiciário.
Assim, os Direitos Fundamentais são, na atual estrutura jurídica pátria, ao mesmo tempo, direitos subjetivos (outorgam aos titulares a possibilidade de impor os seus interesses em face dos órgãos obrigados) e elementos fundamentais da ordem constitucional objetiva (que são os que formam a base do ordenamento jurídico de um Estado de Direito Democrático). Estes direitos têm restrições limitadas e, tais limites, conforme a Constituição Federal, se referem tanto à necessidade da proteção de um núcleo essencial de direito fundamental, quanto à clareza, determinação, generalidade e proporcionalidade das restrições impostas.
O princípio da proteção do núcleo essencial que se destina a evitar o esvaziamento do conteúdo do direito fundamental, mediante estabelecimento de restrições descabidas ou desproporcionais, advém da supremacia da constituição e do significado destes direitos na estrutura constitucional dos países dotados de constituições rígidas, como o caso do Brasil.
Todavia, a simples existência deste núcleo essencial não se apresenta como suficiente para assegurar o pleno exercício e garantia dos Direitos Humanos e Fundamentais, enquanto direitos de defesa contra a intervenção indevida do Estado.
É de vermos, pois, que a Constituição Brasileira, de 1988, inclui em seu sistema instrumentos garantidores das instituições que conduzem ao aperfeiçoamento dos direitos que são por ela declarados e constituídos e, cuja inviolabilidade, ela assegura.
As normas garantidoras de uma Constituição estendem-se por todo o sistema normativo e nem sempre assim se rotulam, porque, muitas vezes, elas se contêm na própria base da organização e em seus princípios que se expressam ou ficam implícitos no ordenamento.
Concordando com Lúcia Mesquita, as garantias constitucionais dos Direitos Fundamentais, por exemplo, na Carta Política Nacional de 1988, estão:
a) no conjunto de instituições concebidas no sistema para realizar as condições sócio-econômicas e políticas aptas ao exercício daqueles direitos;
b) no conjunto de instituições que ordenam o poder e definem o seu limite a fim de que eles sejam resguardados de desbordamentos praticados pelos detentores dos cargos que o compõe;
c) no conjunto de procedimentos e institutos concebidos para que, em casos específicos, violações por abstenção ou por cometimento ocorridas contra aqueles direitos, tenham os seus titulares vias próprias, constitucionalmente estabelecidas, para a pronta restauração do seu respeito.
As garantias constitucionais dos Direitos Humanos e Fundamentais contidas nas instituições que conformam a organização sócio-econômica, política e cultural são postas, quer nos princípios formulados constitucionalmente (arts. 1º, 3º, 4º, 170, dentre outros, da Constituição de 1988), quer nos princípios que organizam o próprio poder e assim conformam uma Sociedade democrática e o modelo de democracia social.
Por sua vez, as garantias constitucionais dos Direitos Fundamentais que ordenam o poder e definem os limites do seu exercício para a realização dos princípios democráticos, são as que estão contidas no sistema positivo brasileiro, tendo por exemplo, o parágrafo único do art. 1º, no art. 2º; no art. 37; nos arts. 85, 93 e segs., dentre outros.
As garantias constitucionais estão contidas em procedimentos específicos e institutos concebidos para assegurar, em casos concretos e quando houver ameaça ou lesão aos Direitos Humanos e Fundamentais, que se restabeleçam, plena e eficazmente, os direitos comprometidos. É dessa natureza o princípio da juridicidade que informa, limita e legitima todos os atos do Estado: o da jurisdição, ele mesmo um dos Direitos Fundamentais por excelência, pelo exercício garantido do qual se manifestam outros, como o princípio da segurança jurídica, e de cuja eficiência depende, enormemente, o da garantia das liberdades e os que processualizam institutos voltados à garantia específica dos Direitos Fundamentais, tais como, o habeas corpus, o mandado de segurança e o mandado de injunção, o habeas data e a ação popular e o direito de petição.
Tais prerrogativas surgem como mecanismos específicos e próprios do sistema constitucional nacional, garantidores do que é firmado como Direito Fundamental.
Essas garantias instrumentais ou processuais específicas de cada sistema jurídico, têm sido reelaboradas para se adensarem no conteúdo permissivo de prevenção mais que ao mero restabelecimento ou restauração dos direitos violados. É que, diversamente do que ocorre com outros direitos ou, principalmente, com outras agressões que ao Direito impende resolver, os Direitos Humanos e Fundamentais, pela sua própria natureza, não podem aguardar para um deslinde que somente sobrevenha quando o bem jurídico que é a vida, a liberdade ou a segurança, por exemplo, estejam totalmente comprometidos.
Assim, as Constituições, como as normas de Direito Internacional relativas aos Direitos Humanos e Fundamentais, têm insistido, na necessidade de se terem resguardados tais direitos no plano mesmo da ameaça. A prevenção é o melhor cuidado a se tomar, juridicamente, nestes casos. Quanto mais eficientes forem os sistemas para dotarem os indivíduos e as instituições de instrumentos acautelatórios a fim de que ameaças sejam sustadas ou desfeitas, antes mesmo da prática prejudicial, tanto melhor atendidos estarão os objetivos dos ordenamentos jurídicos.
A Constituição da República Brasileira aperfeiçoou a qualidade dos instrumentos garantidores daqueles direitos ao estabelecer, no art. 5º, inciso XXXV, que a lei não poderá excluir da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direitos. A ameaça, antes tratamento de nível infraconstitucional e que se incluía apenas no cuidado legal de alguns institutos, passou a compor, no sistema de Direito Positivo Brasileiro, o direito à jurisdição, que somente pode ser considerada eficiente quando, acionado o Poder Judiciário, não permitir a concretização da lesão de cuja ameaça teve notícia e buscou evitar.
De qualquer sorte, toda e qualquer interpretação da norma jurídica constitucional ou infraconstitucional deve ter, como escopo primeiro, a criação de condições para que a norma interpretada tenha eficácia sempre no sentido da realização dos princípios e valores constitucionais e, principalmente, sempre, da ideologia constitucionalmente adotada. Neste passo, a hermenêutica, que entendemos necessária no âmbito da dogmática dos Direitos Humanos e Fundamentais no Brasil, deve acreditar que o Estado é que, prioritariamente, há de tornar-se obrigado a criar os pressupostos normativos e fáticos, necessários e imprescindíveis ao permanente exercício dos direitos constitucionalmente assegurados e, ao mesmo tempo, garantir, por seus mecanismos de tutela jurisdicional, que eventual titular de direito desta natureza, disponha de prestações implementadoras/efetivadoras deles.
Por certo, entendemos que a garantia da liberdade do exercício profissional ou da inviolabilidade do domicílio não garante pretensão ao trabalho ou à moradia, pois estas pretensões não exigem apenas ação legislativa, como também, medidas administrativas, políticas e econômicas. Contudo, não podemos aceitar a tese reducionista que afirma que eles estão voltados mais para a conformação do futuro do que para a preservação do status quo.
O que não podemos esquecer aqui, coerentes com o que até agora vimos, é que toda lei enseja interpretação, e o processo hermenêutico tem, sem dúvidas, relevância superior ao próprio processo de elaboração legislativa, uma vez que é através da interpretação da norma que esta será aplicada e inserida dentro de um contexto fático específico, sendo adequada a toda uma realidade histórica e aos valores dela decorrentes.
Assim, as questões políticas e as questões jurídicas consignam aspectos integrantes de uma mesma realidade, principalmente quando estão em jogo Direitos Humanos e Fundamentais, pois constituem duas dimensões incindíveis dos problemas constitucionais. Qualquer pretensão, no sentido de segregá-las, é cair na unilateralidade, prestigiando-se tão somente, um dos lados, quando, em verdade, urge qualificá-las em conjunto.
Por óbvio, aqueles direitos e os seus princípios basilares serão variáveis de acordo com o texto constitucional de cada realidade histórica, cultural e econômica de cada país. Em razão disso, uma Constituição Liberal limitar-se-á a declarar, no máximo, direitos individuais e direitos políticos, a partir de uma perspectiva teórica que consagra o abstencionismo estatal e considera, como garantia constitucional, a simples inserção de princípios do Direito no texto constitucional. De outro lado, temos as Constituições Sociais e as Socialistas, ampliando aquele leque de direitos fundamentais, abrangendo os direitos econômicos, sociais e culturais.
No Brasil, de qualquer sorte, as normas nacionais e internacionais de Direitos Humanos e Fundamentais possuem especificidades próprias, de maneira que o processo de interpretação e concretização de tais postulados normativos assumem peculiaridades. Por exemplo, as normas de Direitos Humanos e Fundamentais estão localizadas no topo da estrutura hierárquica do sistema jurídico, notabilizando-se pela linguagem com a qual se apresentam e por seu conteúdo de caráter político.
Apesar disto, em termos de realidade, a conseqüência mais direta do modelo de desenvolvimento brasileiro é a geração de uma distribuição desigual de direitos no país, não apenas do aspecto de renda, mas a uma distribuição de direitos mesmo: à educação, à saúde, ao trabalho digno, à habitação.
A instabilidade real de nossa economia serve como pano de fundo para esse caos. A violência, expressão máxima do cotidiano, está cada vez mais presente, e as crianças, estampadas nos discursos políticos como o futuro do país, choram ou se calam, atônitas, diante da agressão ou negligência. Muitas ficam com seqüelas pelo corpo, outras, não resistem e morrem; os culpados estão nas ruas, em repartições e, o mais assustador, ao lado delas, dividindo o mesmo teto.
Diante de tamanhas violações cotidianas dos Direitos Humanos e Fundamentais no Brasil, não temos mais espaço político e institucional para debater a origem liberal ou social destes direitos, mas urge compreender que tais prerrogativas e conquistas da civilização moderna universalizaram-se. Diante disto, a interpretação adequada desses direitos abre a possibilidade para não permanecerem isolados e disformes da realidade social vivenciada, e, como dissemos antes, a conjugação do programa normativo com o domínio normativo (espaço do empírico, do real) possibilita sejam eles, constantemente, ampliados , de maneira a tornar cada vez mais orgânico o texto constitucional.
Daí, porque, o constitucionalismo contemporâneo contribui decisivamente para a universalização dos Direitos Humanos e Fundamentais. A integração entre os sistemas constitucionais e o direito internacional faz-se inexorável nessa fase, particularmente para o aperfeiçoamento e garantia eficaz e eficiente destas prerrogativas. A única universalização possível de ser pensada e posta à conquista, a única mundialização buscada como ética e necessária no atual estágio da humanidade não é, primeiramente, a econômica, que produz novos feudos e velhos vassalos, novos senhores para os mesmos e velhos escravos, mas a dos Direitos Humanos e Fundamentais, que produz a solidariedade jurídica e faz espraiar a humanidade sobre todos os pontos da civilização.
Em tal quadro e situação, é preciso percebermos que de nada adianta contarmos com um sistema jurídico detentor de instrumentos que possam viabilizar os Direitos Humanos e Fundamentais, se grande parcela dos operadores jurídicos no Brasil, onde sequer os direitos individuais e as liberdades públicas primárias são garantidas à cidadania, os direitos sociais ou coletivos são reduzidos a extremos absolutamente insignificantes devido a supremacia dos primados econômicos sobre os políticos, o privado prevalace sobre o público, e os novos centros de poder, que aí são gerados, esvaziam, paulatinamente, os controles democráticos produzidos no âmbito do projeto estatal da modernidade por lhes falecerem elementos de informação e formação crítica, calam e mesmo renegam a existência de um conjunto de princípios e regras jurídicas que alcançam e mesmo protegem, formalmente, aqueles direitos.
Talvez os Direitos Humanos e Fundamentais de todas as gerações possíveis e imagináveis, sirvam como um novo paradigma à constituição de um pacto associativo que preserve e releve valores como a democracia, o pluralismo jurídico, a igualdade e a justiça social. Como alerta Faria:
Nas Sociedades divididas em classes e num mundo dividido em nações pobres e países ricos, os direitos humanos, encarados numa perspectiva essencialmente política, ou seja, como promessa emancipatória ou como palavra de ordem libertária, significam uma ameaça á ordem estabelecida.
Significa dizer da premência em emancipar estes direitos das concepções meramente jurisdicistas, em favor de práticas políticas comprometidas:
(1) com a reconstrução ética dos vínculos sociais;
(2) com a condição de dignidade humana a ser incorporada no universo normativo-constitucional;
(3) com a desalienação técnica das rotinas gerenciais da política;
(4) com a substituição dos cidadãos - servos - os sujeitos formais de direito que não dispõem de poder substantivo - por cidadãos plenos.
Isto implica instituirmos uma nova hermenêutica democrática dos Direitos Humanos e Fundamentais, com caráter eminentemente crítico. Crítico no sentido de denunciador de todos aqueles enunciados jurídicos que supõem obstáculos à participação efetiva dos cidadãos na vida política, econômica e cultural da comunidade; denunciador dos intentos de introduzir no sistema jurídico a defesa de interesses ou valores que não se coadunam com a autonomia do indivíduo e do cidadão, tal como tem consagrado a Constituição Brasileira de 1988.
Os pressupostos teóricos que informam esta hermenêutica crítica não têm o intento de forjar-se como uma nova Teoria ou Ciência do Direito, respeitando as características da coerência absoluta, a precisão matemática e indeclinável, a observância de regras de derivação lógica, mas está assentada na problematização de um modelo que não responde mais às demandas sociais complexas desta modernidade flagelada.
Nos valendo das reflexões de Warat e Pêpe , entendemos que podem ser assim definidos os contornos políticos e filosóficos desta hermenêutica:
(1) A partir de uma abordagem interdisciplinar, buscando elementos e instrumentos de análise na antropologia, sociologia, psicanálise, semiologia, filosofia, procura desvincular os efeitos sociais das falas e dos silêncios daquilo que somos induzidos a dizer ou interpretar a partir da cultura jurídica dominante;
(2) Procura trazer para dentro da abordagem jurídica dos fatos sociais a problematização da relação entre saber e poder, demonstrando como, fundamentalmente no plano ideológico e político, a partir de um discurso (jurídico) organizado em nome da verdade e da objetividade, descomplexificam-se os conflitos sociopolíticos, apresentados pela Teoria Positivista do Direito como simples relações individuais (atomizadas) harmonizáveis pela norma e ordenamento jurídico;
(3) Procura interrogar sobre o caráter emancipatório do Direito, tendo em vista a formação de uma Sociedade materialmente justa. Tal tarefa implica questionar a legitimidade dos comportamentos jurídicos dos operadores e das instituições de direito, com vistas a perquirir, constantemente, se tais comportamentos vão ao encontro deste ideal de Sociedade prevista na própria idéia de Estado Democrático de Direito;
(4) Procura fomentar a instituição de uma consciência participativa nos operadores do direito, permitindo a eles (juízes, advogados) o necessário e inevitável engajamento nos múltiplos processos decisórios (sentenças, ações judiciais) como fatores de mediação das demandas sociais, oportunizando uma nova relação entre técnica jurídica e prática política;
(5) Por fim, procura outorgar à filosofia do Direito um caráter de filosofia política do Direito, o que implica reconhecer e tomar como pressuposto que temas como democracia, totalitarismo, Direitos Humanos e Fundamentais, dentre outros, ocupou um lugar maior do que a discussão sobre os conceitos típicos e tradicionais do Direito.
Neste sentido, como quer Häberle, a hermenêutica precisa estar adequada à Sociedade pluralista ou à chamada Sociedade aberta, entendida como o conjunto integral dos elementos sociais, econômicos, culturais e políticos que integram determinada comunidade, reconhecendo, a partir daí, as tensões que a caracterizam e dimensionam seus conflitos.
Entretanto, sem cair em expectativas românticas, é preciso reconhecer que a universalização e a efetivação dos Direitos Humanos e Fundamentais requer, igualmente, tanto um freio no ímpeto da acumulação privada das riquezas - matéria de responsabilidade do Estado -, quanto uma disciplina bem mais vigorosa no controle dos sistemas abstratos da moeda e do poder econômico, como condição básica de proteção de nosso entorno.
Revela-se, assim, imprescindível conceber o Estado Democrático de Direito proclamado pelo texto constitucional brasileiro, principalmente em seu Título Primeiro, como a maior evidência de que se impõe a abolição fática da separação entre Sociedade e Estado, resultando daí, a exigência de que este Estado assuma a responsabilidade de transformar a ordem econômico-social, no sentido de viabilizar a efetivação material da idéia de democracia real, baseada no pressuposto da igualdade concreta e existencial.
Para tanto, o Estado Brasileiro tem, de sobra, poderes constitucionais e institucionais capazes de viabilizar as políticas públicas - em todos os quadrantes possíveis - necessárias à consecução e proteção dos Direitos Humanos e Fundamentais. Aliás, no preclaro ensinamento de Celso Antônio Bandeira de Mello, estes poderes estatais se apresentam muito mais como poderes instrumentais.
Servientes do dever de bem cumprir a finalidade a que estão indissoluvelmente atrelados. Logo, aquele que desempenha função tem, na realidade, deveres-poderes. Não poderes, simplesmente. Nem mesmo satisfaz configurá-los como poderes-deveres, nomenclatura divulgada a partir de Santi Romano. Com efeito, fácil é ver-se que a tônica reside na idéia de dever; não na de poder. Daí a conveniência de inverter os termos deste binômio para melhor vincar sua fisionomia e exibir com clareza que o poder se subordina ao cumprimento, no interesse alheio, de uma dada finalidade.
A função do conhecimento democrático e emancipador do Direito, aliado à função também social dos operadores jurídicos, reclama do Estado, em todos os seus vetores e poderes, mas principalmente do Poder Judiciário, a superação do caráter negativo dos Direitos Humanos e Fundamentais, que deixam, deste modo, de ser considerados como uma autolimitação do poder soberano do Estado, para reforçar o princípio da soberania popular, impondo a este conceber tais direitos como instrumentos jurídicos e políticos destinados a regular suas ações positivas na busca da implementação de uma verdadeira democracia.
Lutar pela universalização e pela efetivação dos Direitos Humanos e Fundamentais, enfim, significa, para o Brasil, formular, implementar e executar programas emancipatórios no âmbito dessas redes ou configurações de poder anteriormente vistas, cujos valores básicos residem no sentimento de civilidade - em que se fundamenta a idéia mesma de comunidade.
Este sentimento inaugura uma nova ética, não individualista e prisioneira de um projeto de mundo construído por mônadas laborais, mas a partir de uma ética que poderíamos denominar de solidária ou comunitária, fundada, por sua vez, em princípios/vetores inexoráveis, como:
(1) de que todos somos responsáveis por todos;
(2) de que é preciso pensar globalmente sim, porém, agir localmente;
(3) de que só se pode propagar uma idéia (ético-política) vivendo de acordo com ela;
(4) de que o processo de concretização e proteção dos Direitos Humanos e Fundamentais é também o objetivo de sua consolidação definitiva;
(5) de que os meios de atuação com os Direitos Humanos e Fundamentais sejam tão dignos quantos os fins a que pretendem alcançar;
(6) de que o que não for feito aqui e agora não cria um outro estado do mundo que é muito mais futuro do que presente.
De posse destes elementos e reflexões, acreditamos que se torna possível a constituição do tão proclamado Estado Democrático de Direito no Brasil, tendo nos Direitos Humanos e Fundamentais os parâmetros necessários e vinculantes à Sociedade e seus atores políticos e institucionais.


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