Marilena
Chaui
Professora
Universitária e autora de livros de filosofia
Sartre
disse, certa vez, que não conhecia coisa mais triste do
que os provérbios. De fato, os provérbios constituem a
chamada cultura popular ou o senso-comum de uma
sociedade, por meio dos quais ela exprime, de maneira
extremamente sintética, suas opiniões sobre a vida, o
mundo, os seres humanos, as divindades, o bem e o mal, o
justo e o injusto, a verdade e a ilusão. E, essas opiniões
são pessimistas, ou melhor, moralistas:
. condenam a ambição
Quem tudo quer, tudo perde
Mais vale um pássaro na mão do que dois voando
. condenam o individualismo
Uma andorinha não faz verão
A união faz a força
. desconfiam dos outros
Dize-me com quem andas e te direi quem és
. elogiam a paciência
Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura
Devagar se vai ao longe
. condenam a imprevidência
Quem semeia ventos colhe tempestades
Em casa de ferreiro, espeto de pau
. elogiam a moderação
Nem tanto ao mar nem tanto à terra
. desconfiam das aparências
Nem tudo o que reluz é ouro
. desconfiam da linguagem
Quem conta um conto dez conta
Falar é prata, calar é ouro
Em boca fechada não entra mosca
. condenam a preguiça
Deus ajuda a quem cedo madruga
Ajuda-te e o céu te ajudará
Os provérbios
exprimem o senso-comum social e são preconceitos
cristalizados sob a forma de prudência ou de virtude
moral.
O que é o
senso-comum? Um conjunto de crenças, valores, saberes e
atitudes que julgamos naturais porque, transmitidos de
geração a geração, sem questionamentos, nos dizem
como são e o que valem as coisas e os seres humanos,
como devemos avaliá-los e julgá-los. O senso-comum é
a realidade como transparência: nele tudo está
explicado e em seu devido lugar.
As características
mais marcantes do senso-comum podem ser resumidas às
seguintes:
1.
subjetivismo: exprime sentimentos e opiniões
individuais e de grupos, variando com as condições em
que vivem, mas tomadas como se fossem universais, isto
é, verdadeiras em todos os tempos e lugares
2.
ajuizador: coisas, pessoas, situações são
imediatamente avaliados e julgados em conformidade com o
modo que cada um as percebe ou como o grupo ou a classe
social as percebe
3. heterogêneo:
diferencia coisas, fatos e pessoas por percebê-los como
diversos entre si (por exemplo, julgamos diferente um
corpo que cai e uma pluma que flutua no ar), mas sem
indagar se são realmente diferentes ou se é apenas a
aparência que os diferencia
4.
individualizador: isto é, cada coisa, fato ou pessoa
aparece como algo isolado e autônomo, como se não
tivesse história, passado, um contexto no qual faz
sentido; por isso, cada juízo do senso-comum é sempre
um absoluto: “é isto”, “é assim”
5.
generalizador: como conseqüência da maneira como
separa e junta coisas, fatos, pessoas, tende a reunir
numa só idéia ou numa única opinião coisas, pessoas
e fatos julgados semelhantes, sem indagar se a semelhança
não seria aparente. Assim, diferencia sem indagar sobre
a diferença e reúne sem indagar sobre a semelhança
6.
causalista: para organizar o que separou ou o que
reuniu, tende a estabelecer relações de causa e efeito
entre as coisas, as pessoas ou os fatos - aqui, os provérbios são a melhor expressão, pois neles
aparece justamente a noção de causalidade: onde há
fumaça há fogo, quem tudo quer tudo perde, dize-me com
quem andas e te direi quem és, quem sai na chuva é
para se molhar.
O
senso-comum é a crença jamais questionada de que a
realidade existe tal como é: as cores, os sons, os
sabores existem tais como os percebemos, o tempo passa e
pode ser medido por relógios e calendários, o espaço
é feito de lugares (alto, baixo, perto, longe, frente,
atrás) e pode ser percorrido e medido em distâncias, a
família é uma realidade natural criada pela Natureza
para a sobrevivência da espécie, a raça é uma
realidade natural produzida pela diferença de climas e
de alimentação, fazendo com que haja raças superiores
e inferiores, a mulher é um ser sensível, intuitivo e
frágil, destinado à maternidade e à casa, o homem é
um ser racional, forte, destinado ao trabalho e à vida
pública, o trabalho honesto é uma virtude, mas a
preguiça e o roubo são imorais e crimes, os ricos são
imorais e infelizes, mas os pobres são virtuosos e
felizes com o pouco que lhes foi dado ( quem tudo
quer tudo perde), os instruídos são competentes e
devem dirigir os demais no trabalho e na política, os não-instruídos
são incompetentes e devem ser dirigidos, só é pobre
quem quer, pois há trabalho honesto para todo mundo,
mas os ricos são espertalhões e sem vergonha, por isso
dize-me com quem andas e te direi quem és. Quando
o senso-comum se cristaliza como modo de pensar e de
sentir de uma sociedade, forma o sistema dos
preconceitos.
Preconceito,
como a palavra indica, é uma idéia anterior à formação
de um conceito. O preconceito é a idéia preconcebida,
anterior portanto, ao trabalho de concepção ou
conceitualização realizado pelo pensamento. As quatro
marcas mais significativas do preconceito são:
1. não se
surpreende nem se admira com a regularidade, a constância
e a repetição das coisas, nem, ao contrário, com a
diferença e singularidade delas; admira-se apenas com
aquilo que é julgado único, extraordinário, novo e
que, imediatamente, é inserido no quadro de idéias e
juízos preconcebidos, encarregados de dar sentido ao
nunca visto, nunca dito ou nunca pensado. O preconceito
exige que tudo seja familiar, próximo, compreensível
imediatamente e transparente, isto é, inteiramente
penetrado por nossas opiniões, e indubitável. Não
tolera o complexo, o opaco, o ainda não compreendido
2. exprime
sentimentos de medo, angústia, insegurança diante do
desconhecido e o conjura (ou esconjura) transformando
tais sentimentos em idéias certas sobre as coisas, os
fatos e as pessoas, criando os estereótipos, isto é,
modelos gerais de coisas, fatos e pessoas por meio dos
quais julga tudo quanto ainda não havia visto
3. propenso
a admirar o que não compreende, mas aterrorizando-se
com isso, e, portanto, propenso a reduzir o desconhecido
ao já conhecido e indubitável, o preconceito é o obstáculo
maior ao conhecimento e à transformação. Ignorante, o
preconceito é conservador. Não existe nada mais
conservador do que o preconceito de ser moderno, como
veremos mais adiante.
4. o
preconceito é intrinsecamente contraditório: ama o
velho e deseja o novo, confia nas aparências mas teme
que tudo o que reluz não seja ouro, elogia a
honestidade mas inveja a riqueza, teme a sexualidade mas
deseja a pornografia, afirma a igualdade entre os
humanos mas é racista e sexista, desconfia das artes
mas não cessa de consumi-las, desconfia da política
mas não cessa de repeti-la.
Porque o
preconceito julga-se senhor de uma realidade
transparente que, na verdade é opaca e
oculta medos e angústias, dúvidas e incertezas,
a filosofia sempre lançou-se contra ele, considerando-o
o obstáculo maior a todo pensamento e a toda ação ética
e política. Assim, Platão combateu as sombras da opinião
que obscurecem a luz das idéias verdadeiras; Cícero e
Descartes afirmaram que nascemos com a luz natural da
razão que logo é quase apagada pelas amas de leite,
pelos preceptores, professores e pelos livros; Kant
dissera que o lema da Ilustração ou do Iluminismo
deveria ser : “ousa saber!”, a vitória da razão
esclarecida contra a ignorância dos preconceitos. De
modo geral, os filósofos sempre consideraram as paixões
a causa principal dos preconceitos, mas foi o filósofo
Espinosa quem melhor determinou essa causa e descreveu
seus efeitos.
Espinosa
localizou a origem dos preconceitos em duas paixões: o
medo e a esperança
- medo de que males ocorram e bens não aconteçam,
esperança de que males não ocorram e bens aconteçam.
Por que o medo e a esperança? Por que, de todas as
nossas paixões, são essas duas as que mais
profundamente exprimem nosso sentimento de desamparo
diante do tempo e do mundo, nossa impossibilidade de
controlar o curso dos acontecimentos e de dominar fatos
e pessoas. A angústia diante do imprevisível e do
inesperado, escreve Espinosa, leva os homens a
desconfiar da razão e a confiar na superstição: começam
acreditando em presságios e horóscopos, inventam
deuses cuja vontade caprichosa rege arbitrariamente o
curso do mundo, passam a adorar um único Deus que
julgam ser legislador e bom monarca do universo,
imaginam que os governantes são os representantes dessa
divindade e se submetem ao poder e à vontade dos
dominantes porque acreditam ser esta a vontade do deus
que, vendo-os submissos e obedientes aos poderes da
terra escolhidos por ele, beneficiará aos homens,
diminuindo-lhes o medo e alimentado-lhes a esperança,
se não nesta
vida, pelo menos na outra. Dessa maneira, Espinosa
articula preconceito e dominação sócio-política. Os
homens aceitam servir para serem servidos. E combaterão
até à morte na defesa das opiniões dos dominantes,
passando ao ferro e ao fogo todos os que ousarem
contradizê-las em nome de um conhecimento racional
verdadeiro. Eles o fazem porque as opiniões dos
dominantes formam um sistema explicativo para o mundo e
as ações, livrando-os dos medos e dando-lhes esperanças
de recompensas para o bons e castigos para os maus.
Assim, o preconceito, que se origina em cada um de nós
sob a forma de paixões, cristaliza-se em senso-comum
social e em prática política. O preconceito é, pois,
uma das armas mais potentes para o exercício da dominação,
pois o dominado a deseja interiormente e não sabe viver
sem ela porque ela se tornou a forma da segurança num
mundo, enfim, tornado transparente. Tudo em seu devido
lugar, com o devido respeito.
A esse
movimento de passagem do preconceito a senso-comum
social e dominação política, Marx deu o nome de
ideologia, indo buscar sua causa mais abaixo das paixões
do medo e da esperança, nas formas assumidas pelas
condições materiais de existência dos humanos, isto
é, na divisão social do trabalho e na divisão social
das classes. A ideologia é a maneira como os interesses
dos dominantes organiza a realidade de maneira a tornar
naturais e aceitáveis naturalmente a exploração econômica
e a dominação política. Justamente porque a ideologia
é o ponto de vista dos dominantes para a sociedade
inteira, é que o preconceito só pode ser contraditório,
como dissemos anteriormente. De fato, as pessoas vivem
em suas classes sociais e estas, pelo seu modo de se
relacionar com a realidade social, determinam idéias,
opiniões, sentimentos específicos dessa classe; como,
porém, as idéias, opiniões e sentimentos dominantes
da sociedade são os de sua classe dominante,
transmitidos por meio da educação e dos meios de
informação e comunicação, é evidente que todos
aceitam o ponto de vista dominante, entrando em contradição
com as idéias e valores de sua própria classe social
-- a pluralidade de preconceitos das diferentes
classes sociais é substituida por um único
preconceito, isto é, por uma única ideologia, a da
classe dominante.
Eu
gostaria, agora, de exemplificar o modo de operação do
preconceito-ideologia tomando suas opiniões fortemente
presentes na sociedade brasileira contemporânea: a idéia
que nossa sociedade não é violenta e a idéia
que estamos, finalmente, nos tornando modernos.
A violência
do preconceito da não-violência
Um dos
preconceitos mais arraigados em nossa sociedade é o de
que “o povo brasileiro é pacífico e não-violento
por natureza”, preconceito cuja origem é antiquíssima,
datando da época da descoberta da América, quando os
descobridores julgaram haver encontrado o Paraíso
Terrestre e descreveram as novas terras como primavera
eterna e habitadas por homens e mulheres em estado de
inocência. É dessa “Visão do Paraíso” que provém
a imagem do Brasil como “país abençoado por Deus”
e do povo brasileiro como cordial, generoso, pacífico,
sem preconceitos de classe, raça e credo.
Diante
dessa imagem, como encarar a violência real existente
no país? Exatamente não a encarando, mas absorvendo-a
no preconceito da não-violência. Para isso, existem
tres mecanismos diretos e tres procedimentos indiretos.
Mecanismos
diretos:
1.
mecanismo da exclusão: afirma-se que a nação
brasileira é não-violenta e que os brasileiros não são
violentos, portanto, se houver violência, é praticada
por gente que não faz parte da nação, mesmo que
nascida e registrada no Brasil. Em outras palavras, o
preconceito produz a divisão entre “nós,
brasileiros” e “eles, os violentos”, excluindo
esses últimos, de direito, da nação pacífica;
2.
mecanismo da distinção entre o essencial e o
acidental: por essência ou por natureza o povo
brasileiro é não-violento, portanto, a violência é
algo acidental, ou como se diz muito exatamente, é
“um surto”, “uma onda”, “uma epidemia”. A
violência é um acontecimento episódico na superfície
do social que não afeta sua essência não-violenta;
3.
mecanismo das máscaras: como o preconceito da não-violência
opera com a separação entre o “nós” e o
“eles”, cada um do “nós” pode, acidentalmente,
estar entre “eles”. Como toda violência está
referida e reduzida a um aspecto episódico visível, e
nunca às estruturas invisíveis da sociedade
brasileira, todas essas manifestações episódicas são
consideradas homogêneas, isto é, são generalizadas
pelo preconceito, de maneira que são considerados
iguais ou de mesmo sentido o quebra-quebra de tres e ônibus
e um linchamento; o medo dos operários de serem mortos
nas ruas e o executivo da multinacional que cerca a casa
com fios elétricos, guardas, cães e aparelhos eletrônicos;
a dissolução de uma passeata com gás lacrimogêneo e
motoqueiros fazendo “cavalo de pau” numa avenida;
levas de flagelados pela seca buscando alimento nas
cidades e bandos de justiceiros pagos para eliminar
supostos bandidos; a prostituição e escravização de
meninas e a
ação policial exterminando crianças de rua
- em todos esses casos, “nós, não
violentos” usamos a violência para combater “eles,
os violentos”, mas o fazemos porque a violência é
passageira. Além dessa primeira máscara, existem
outras mais sutis: o paternalismo branco que mascara a
discriminação racial, o elogio da fragilidade feminina
para mascarar o machismo, a afirmação da caráter
natural e sagrado da família para mascarar
torturas de crianças, estupros das filhas, surras nas
esposas, violência física e psíquica contra os
membros da família tidos como “desviantes” sexuais.
E, finalmente, aquelas máscaras são o preconceito em
seu estado puro: a favelada, mãe irresponsável que
gera a criança de rua naturalmente delinqüente e
perversa; a menina estuprada porque só há estupro se
houver desejo dele; o migrante nordestino que só serve
para destruir a ordem, beleza e limpeza das cidades; o
sindicalista, que antes era o subversivo e hoje o
corporatista; o desempregado que não é senão um
preguiçoso. Enfim, todas formas estruturais de violência
são mascaradas pela atribuição da culpa à vítima.
A esse
procedimentos, vem acrescentar os mecanismos indiretos
de reforço ao preconceito da não-violência:
1.
mecanismo jurídico: a violência fica circunscrita ao
crime e a um tipo fundamental de crime, aquele contra a
propriedade: roubo, latrocínio e homicídio entendido
como crime contra propriedade da vida. De modo geral, a
violência fica circunscrita às formas mais visíveis
da delinqüência, como é o caso do tráfico de drogas.
Mas porque se refere primordialmente ao ataque à
propriedade privada, as ocupações de terra pelos
sem-terra recebe o nome de invasão e é tratada pelas
“forças da ordem”. Assim, o mecanismo jurídico
localiza a violência em duas personagens: o bandido e o
pobre. Por esse motivo, toda política de Direitos
Humanos no Brasil é vista como defesa do bandido contra
a vítima e do delinqüente pobre contra as pessoas
honestas.
2.
mecanismo informativo: a violência é tratada como episódio
de massa e recebe o nome de “chacina” e
“massacre” porque o número de envolvidos é grande
e o de mortos e feridos também. O mecanismo informativo
localiza a violência como episódio sangrento na superfície
do social e o atribui a abusos de autoridade por parte
das “forças da ordem”, sem que nunca se examine a
estrutura social que trouxe à tona, sob a forma do episódio
sangrento, as causas sociais invisíveis que o explicam.
3.
mecanismo sociológico: a violência é explicada como
um caso de anomia social (anomia, palavra grega que
significa perda do poder da norma e da lei, ausência de
norma social respeitada por todos). O sociólogo afirma
que a sociedade é um conjunto harmônico de ações e
funções integradas pelas normas e regras (que governam
os costumes) e pelas leis (que arbitram valores éticos e políticos).
A anomia é vista como um momento acidental no qual as
antigas normas e leis perdem a força integradora e
deixam vir à tona os conflitos sociais e políticos, as
contradições econômicas e políticas. Esses conflitos
e essas contradições não são considerados
constitutivos do próprio social, mas uma anomalia que
se expressa como violência passageira, até que novas
normas e leis cumpram a função integradora e
harmonizadora. Dessa maneira, o preconceito da não-violência,
falando a linguagem da sociologia, diz que a violência
é o momento de relação entre o arcaico e o moderno,
cujo conflito será superado por
“as reformas” que modernizem os costumes
sociais e políticos.
O
preconceito do moderno
Vimos que
uma das marcas do preconceito é a generalização e
homogeneização de coisas, fatos, acontecimentos e
pessoas diferentes, por vezes opostos e contraditórios.
Vimos também que é próprio do preconceito
“amarrar” as contradições, as aparências e o
invisível, em sínteses imediatamente compreensíveis,
como é o caso dos provérbios. Mas esse tipo de síntese
também pode ser feita por palavras, que, como dizem os
franceses, são “palavras valises”, isto é, servem
para dizer tudo porque não dizem absolutamente nada. É
o caso do uso, atualmente corrente no Brasil, da palavra
mágica “Moderno”, empregada no lugar de uma série
imensa de problemas e questões que não são discutidos
porque se dá por estabelecido que a mera menção da
palavra “moderno” as explica e determina a maneira
de solucioná-los. Essa palavra, cujo uso é antigo, mas
cujo significado político apareceu no século XVIII, na
luta da Revolução Burguesa contra o Antigo Regime, é,
hoje, no Brasil, empregada para reunir coisas que pouco
tem em comum, senão o fato de serem ditas
“modernas”: aviltamento de salários, privatização
de serviços públicos, enfraquecimento do movimento
sindical, eliminação de direitos sociais mínimos
tidos como privilégios, justificar a eliminação dos
chamados encargos sociais para diminuir o desemprego
atribuindo a eles a culpa pelo desemprego.
No
entanto, sob essa aparente miscelânea, a palavra
“moderno” esconde o sentido principal no qual reside
verdadeiramente o preconceito, qual seja, a crença
quase religiosa na justiça e racionalidade do mercado
capitalista. Em outras palavras, a idéia liberal, velha
de 200 anos, de que a cidadania se define pela liberdade
de mercado e não pelos direitos sociais e políticos.
Esse preconceito, que, afinal, data do século XVIII, explica porque, em nome da
modernidade, entregam-se recursos estatais a banqueiros
corruptos e falidos e aos latifundiários e usineiros,
ao mesmo tempo em que a violência contra os sem-terra
pode ser qualificada de conflito entre o arcaico e o
moderno, o arcaico, evidentemente, sendo a reforma agrária,
e o moderno os banqueiros,
latifundiários e usineiros. Ou seja, a
modernidade política é pensada como afastamento dos
conflitos distributivos do campo político, mas, no caso
brasileiro, como inclusão, neste campo, do retorno ao
capital daquilo que não foi realmente produzido pelo
capital. Assim, o que impressiona, na versão brasileira
do preconceito do moderno é a maneira como justifica o
apoio às práticas mais retrógradas e violentas de
nossa sociedade. Como se vê, o preconceito do moderno não
é senão a forma mais nova do conservadorismo. Ou, como
dissera Lampedusa em “O Leopardo”, é preciso mudar
para que tudo fique como está.
Percepção
Aguda
P:
Qual deveria ser o papel das chamadas pessoas
esclarecidas no combate ao moralismo do senso comum?
Eu
acho que há vários caminhos. Eu acho que há um
caminho como esse, que é o da multiplicação. Simpósios
como esse tem a função de serem multiplicadores, quer
dizer, a expectativa é que cada um que participa possa
multiplicar aquilo de que ele participa. Então essa é
uma via.
Outra
é a atuação no interior dos movimentos sociais. Uma
outra é a atuação no interior dos partidos políticos.
Tem que se agir lá dentro. Mas a via que evidentemente
eu considero prioritária é a educação. Tem que mexer
na escola. É lá que você tem que mexer. Então você
tem que mexer na formação dos professores de primeiro,
segundo e terceiro grau. Você tem que mexer na produção
do material didático, e você tem que mexer na relação
dos alunos e das famílias com uma educação
efetivamente voltada para a cidadania e para a
liberdade. Eu acho que se não se mexer no sistema
educacional brasileiro, você vai rodar, rodar, rodar em
círculos. Esse sistema educacional tem que estar
diretamente vinculado, em função das condições
atuais, à uma mexida muito grande nas telecomunicações.
Você tem que operar nos dois campos: tem que operar com
a telecomunicação e com o sistema educacional. E a
forma ideal será quando você puder fazer isso, operar
de modo articulado, através da escola e através das
telecomunicações.
Para
você atingir um país, da proporção como é o nosso,
uma sociedade numerosa como a nossa, e com os problemas
que ela tem, você tem que atuar na base, portanto você
tem que atuar na escola e você tem que atuar na maneira
como a informação circula e a comunicação se
realiza, e portanto no sistema de telecomunicações.
Sem uma mudança nas leis da telecomunicação, sem uma
mudança na forma de fazer televisão e rádio no
Brasil, e sem na outra ponta, uma reforma da educação
para valer, você não mexe em nenhum preconceito.
Nenhum, nenhum, nenhum...
P:
O que legitima o privilégio daqueles que ficam em
prisão especial, simplesmente por possuir um diploma
universitário? Esta é uma espécie de preconceito?
Isso
é não uma espécie, é preconceito em estado puro e
está ligado aqui ao que na minha exposição eu chamei
a discriminação entre os instruídos e os não-instruídos,
porque é exatamente uma discriminação de classe. No
Brasil é uma discriminação de classe, na medida em
que a escolaridade no Brasil é privilégio de classe.
Então é evidente que a idéia da prisão especial para
os diplomados é uma aberração, em qualquer parte do
universo, menos aqui. Por que que aqui é natural?
Porque aqui todo mundo é doutor, aqui é a terra do
“Você sabe com quem você está falando?”. Então
se é normal eu dizer" você sabe com quem está
falando?", é claro que se eu for presa, eu vou
para uma cela especial, eu sou doutora, economicamente,
academicamente, eu tenho todos, mas todos os requisitos
para não ser tratada como uma pessoa comum.
Eu
tenho um amigo norte-americano que diz o seguinte:
“quando você está numa briga para valer nos Estados
Unidos, eu pergunto para o outro: "quem você pensa
que você é?" Ou seja, nós somos iguais, nós
somos cidadãos, temos os mesmos direitos, portanto você
está fazendo isso que você está falando, portanto
quem você pensa que você é? E nós não, nós somos
“você sabe quem eu sou?” Quer dizer, é uma coisa
autoritária, discriminadora e é interessante.
Interessante porque nos lugares onde você devia ter
alguns direitos garantidos por percepção da diferença,
lá você não tem. Por exemplo, lugar para gestante no
ônibus, no metrô, lugar para os idosos, todas as
formas de garantir aos deficientes físicos o acesso à
qualquer lugar, e a gente nem percebe. Nem percebe o
jeito que as escadas são, do jeito que os elevadores são,
do jeito que as guias das calçadas são, e do jeito que
é o degrau do ônibus. Não há deficiente físico no
Brasil que possa ser uma pessoa válida, quando os
deficientes físicos são válidos no mundo inteiro. E a
gente nem percebe. Então do mesmo modo que não há
nenhuma garantia de direito ao deficiente físico, há o
privilégio para o prisioneiro universitário.
Eu
costumo dizer que uma das dificuldades maiores para que
um dia se institua uma democracia no Brasil está no
fato de que a divisão social no Brasil passa por um
lugar que é anterior a formulação mesma da idéia de
direito ou de direitos. Você tem num extremo a carência
e no outro extremo o privilégio. A marca da carência
é que ela é sempre específica. Eu tenho carência de
escola, o outro tem carência de condução, outro tem
carência de hospital, outro tem outras carências. É
quase impossível transformar uma carência num
interesse comum, generalizá-la num interesse comum, e
é impossível fazer do privilégio um interesse comum.
Ora o que é um direito? Um direito é algo que tem
alcance universal. Se eu não universalizo alguma coisa,
ela não é um direito. Ora no Brasil nós não
atingimos o estágio ainda nem de generalizar carências
para que elas sejam interesse comuns, que elas possam
depois se universalizar em direitos. E também não
quebramos os privilégios, para revelá-los como privilégios
e portanto destruí-los como tais.
Se
a democracia é a cidadania definida por direitos, não
há democracia no país, porque o que você tem é de um
lado a carência, e do outro lado o privilégio, aí está
a esfera dos direitos que não conseguem se constituir.
Não é uma brincadeira de mau gosto esse ataque aos
poucos direitos sociais que o estado brasileiro
garantia? De um estado que nunca chegou a ser um estado
do bem-estar social, porque para ser um estado do
bem-estar social teria sido preciso existência de
garantia de direitos. Então eu diria que o caso do
universitário com prisão especial equivale ao caso do
deficiente físico sem nenhuma possibilidade de realizar
os seus direitos, por exemplo. São os dois
contrapontos, a ausência de direitos e a presença de
privilégios. Esse é o país da não-violência?
P:
Se o tema é preconceito, então eu quero saber qual
o motivo que determina o racismo? Por que existe tanto
preconceito racial?
No
caso do Brasil o racismo é uma ideologia nascida no século
dezenove. É a partir do século dezenove que é
elaborada com pretensões científicas a noção de raça.
Essa elaboração está ligada à consolidação do Império
Britânico. É na hora que o Império Britânico tem que
justificar ideologicamente o seu exercício imperialista
que essa teoria é elaborada. Ela coincide com o
instante também, em que você tem a abolição da
escravatura nos Estados Unidos, e logo depois, em outras
partes das Américas que significa, no caso específico,
a entrada dos negros no mercado capitalista de trabalho.
Então seja do lado da justificativa do Império Britânico,
para ter o domínio sobre os hindus, sobre os africanos,
sobre os asiáticos, enfim, todo o Império Britânico,
a justificativa do Império é dada por seu caráter
"civilizatório", na medida que a raça branca
ocidental é superior às outras, e vai civilizá-las. E
no caso das Américas, a ideologia racista,
cientificamente elaborada, está ligada à maneira de
impedir à entrada dos negros no mercado de trabalho e o
uso de mão-de-obra exclusivamente branca.
No
caso do Brasil está ligada à todo processo de imigração.
Então, você não tem a origem do preconceito, sem
condições sociais e condições materiais determinando
a origem dele. O que as condições fazem é que elas se
apresentam para os sujeitos sociais, sob a forma de
sentimentos, sob a forma de paixões, de medos, de
inseguranças, sob a forma de dominação e isto é que
é elaborado para que haja uma explicação e uma
justificativa. Então a explicação é o preconceito, e
a justificativa é a ideologia. Você nunca tem um
preconceito sem causa, e a causa, via de regra, é uma
causa econômica e social, ou uma causa social e política
P:
Estereótipo não é preconceito, ele é conhecido,
sabido, manipulado. Então o preconceito é montado em
cima de uma conhecida e bem conhecida pseudo-verdade.
Então é um conceito, e não um pré-conceito. Está
certo ou errado?
Olha,
não é um conceito. Não é um conceito pelo seguinte:
um conceito é uma elaboração teórica, racional, a
partir de um conjunto de perguntas, eu vou dizer algumas
delas, um certo
conjunto
de perguntas, e o estabelecimento de um conjunto de critérios
para avaliar a racionalidade, a coerência, a verdade da
resposta encontrada à pergunta, e essa resposta é que
é o conceito. Deixa eu dar um bom exemplo. Vamos pegar
um exemplo simplérrimo, para não avançar muito na
nossa hora. Eu vejo o Sol, menor do que a Terra, e eu
vejo o Sol todos os dias fazer um movimento de leste
para oeste. Dessa visão, eu elaboro um sistema, um
sistema explicativo do mundo chamado Sistema Geocêntrico.
Qual é o meu critério? O meu critério é o critério
da minha percepção. Na minha percepção a Terra está
imóvel, o Sol se move e como eu vejo que ele faz um
arco no céu, eu deduzo que ele faz um movimento
circular. Vejo também toda noite, constelações,
estrelas, astros, fazendo movimentos e eu digo: estão
todos, cada um num círculo, fazendo movimento circular
em torno da Terra imóvel. Isso se cristaliza, isso se
torna o senso comum social. Se você perguntar qual
é a comprovação que você tem de que o sistema
é geocêntrico, eu tenho três constatações: eu vejo
que estamos imóveis, eu vejo que o Sol se move e eu
vejo que o movimento é um semicírculo, portanto a
totalidade do movimento é circular. Aí aparecem Copérnico,
Keppler, Galileu e começam a fazer perguntas. A
primeira pergunta é se o movimento que o Sol realiza não
poderia ser um movimento aparente, e aí eles vão
estabelecer uma série de critérios para fazer essa
afirmação. Depois eles fazem um estudo das variações
das estações do ano: "olha é muito possível que
a Terra gire em torno de um eixo, que ela esteja
levemente inclinada". Cálculos matemáticos aqui,
cálculos matemáticos lá, estudo da velocidade da luz,
estudo do movimento uniformemente variado, estudo disso,
estudo daquilo, cálculos, modelos. Depois vem o Keppler,
ele diz: "olha, não, é evidente, a Terra se move
em torno do Sol, o qual também se move, os outros
planetas se movem, isto não tem uma forma circular, por
tais e tais cálculos matemáticos, e por tais e tais e
tais razões, têm uma forma elíptica". Para
resumir a brincadeira: o sistema geocêntrico é um
sistema inteirinho baseado na percepção direta que nós
temos das coisas. O
Sistema Héliocêntrico não é baseado
praticamente em nenhuma observação empírica, quase
nenhuma. Ele é baseado em cálculos matemáticos, equações,
que depois orientam o modo como a experiência vai ser
feita. Então a diferença entre preconceito e o
conceito é: o
preconceito é aquilo que se forma como conclusão da
experiência direta e imediata que nós temos das
coisas, o conceito é a idéia que se forma, a partir do
momento em que nós questionamos as coisas, em que nós
estabelecemos critérios para fazer perguntas, critérios
para fazer as respostas, formas de conferir as respostas
que foram oferecidas. O preconceito é portanto algo que
não inclui o trabalho do pensamento. O pensamento
simplesmente organiza, reúne, sintetiza os dados
imediatos da experiência. O conceito é um trabalho
intelectual, é um trabalho de pensamento. Ele é um
trabalho que visa chegar à uma verdade. O preconceito
parte da idéia de que ele é verdadeiro. Aqui é o
contrário, é porque se procura a verdade, é necessário
todo um caminho de interrogações, e de critérios de
pensamento, para chegar a um conceito. Então não são
a mesma coisa.
P:
Gostaria que a Senhora abordasse o tema da tortura
nas delegacias aos presos comuns, isto sob a conivência
de autoridades e da sociedade, em prol da manutenção
da ordem, sob dois aspectos: a do torturado e a do
torturador.
Olha,
eu faço parte da comissão Teotônio Vivela, que nasceu
justamente na luta contra a tortura nas prisões, nos
asilos, nos manicômios. A manutenção da tortura dos
presos comuns está ligada de um lado, à falta, à
inexistência de uma política efetiva de direitos
humanos, que se consagre não apenas em leis, mas que se
consagre em punições pela transgressão das leis. Você
não chega nunca lá. Você não consegue instrumentos
que sejam compreensíveis para o transgressor da punição
que ele tem que receber. Como portanto não há nenhum
instrumento legal, e há uma ideologia social, e toda a
montagem feita pela mídia em torno do bandido, as
torturas aos presos comuns não tem como serem evitadas.
Você denuncia aqui, mudam-se as pessoas ali e se
resolve o problema, tudo aquilo foi deslocado para outro
lugar, e sobretudo porque, há uma conivência da
sociedade com isso.
A
sociedade acha que tem que haver a tortura, ela
concorda, há um senso comum social à favor disso, e
que é alimentado não só pela ideologia da defesa da vítima
contra o bandido, mas peloo banho sistemático do
fascismo do enlatado norte-americano. Toda a série
Charles Bronson, toda a série Rambo, toda a série Van
Dame, todas essas séries da justiça com as próprias mãos.
São séries de afirmação do valor nenhum dos
direitos, do valor nenhum da lei, do desastre que é o
processo judiciário, lá e aqui. E a idéia de que você
tem que resolver sozinho é o policial que tortura quem
está resolvendo para mim. Está resolvendo, porque
precisa levar em conta o seguinte: é obvio que no nível
individual, cada um de nós tem o direito à vingança,
não ponha a menor dúvida que cada um de nós, como
indivíduo, tem o direito à vingança.
Só
que cada um de nós como indivíduo não pode exercer a
vingança. É para isso que se criou o Estado, é para
isso que se criaram as leis, então em vez de nós
querermos que essa vingança seja individualmente
realizada, por nós ou para nós, nós temos que lutar
pela mudança do Judiciário no Brasil, pela mudança de
todas as coisas relativas à justiça. E em vez dessa
luta, como a tortura do preso comum, por exemplo, como o
caso do linchamento, como o caso do justiceiro, como o
caso da morte das crianças pelas costas, com tudo isso
que é o nosso cotidiano, aparece como solução
imediata a resposta direta a um desejo natural e normal
de vingança, que cada um de nós tem. Então as
verdadeiras questões nunca são discutidas. Então a
tortura ao preso comum se insere nesse campo mais amplo,
de coisas não discutidas.
P:
A Senhora expôs nas entrelinhas que existe o estado
de violência latente no seio da sociedade brasileira. O
que, na sua opinião, poderia ser feito, em linhas
gerais, para reverter esta dramática situação, no
sentido de restabelecer e resgatar os princípios
fundamentais da humanidade?
Eu
queria deixar claro que eu não falei de violência
latente, o que eu estou tentando dizer, é uma violência
presente. Presente. Deixa eu dar alguns exemplos do que
eu estou chamando de violência, que talvez não tenha
ficado muito claro. Eu considero uma violência, nos prédios
que tem elevador, ter um elevador chamado social e um
elevador chamado de serviço. Isso é uma violência.
Isso é uma discriminação de classe. E em geral, o
elevador de serviços é para os negros também. Eu
considero isso uma violência. Eu considero o fato do
motorista, parar em cima da faixa de pedestre, um ato de
violência, e que ele atravessa a faixa no farol
vermelho, um ato de violência. O modo como os
motoristas de ônibus brecam é um ato de violência.
Então não tem violência latente no Brasil. A violência
está saltando em cada poro de cada ação cotidiana de
cada um de nós. O que há é o preconceito da não-violência,
que nos faz considerar que tudo isso é natural, é
normal e que isso não é violência. Que a violência
é a chacina. Que violência é a chacina e o massacre
de massa. É aí que a gente coloca a violência. É o
tráfico de drogas e morte em larga escala.
"Morreram menos de vinte, não é violência".
Precisa ter no mínimo vinte mortos e de preferência
alguns pelas costas. Estou chamando de violência,
dizer-se com a maior simplicidade de espírito: “um
preto muito bom, porque ele tem alma branca”, “uma
mulher formidável, doce, frágil, generosa, ai, tão
feminina”. Mas dá uns tabefes em quem diz que você
é tão “feminina”, porque isso que está sendo dito
é de um machismo, de um sexismo absolutamente
gigantesco, porque está dizendo que você é incapaz de
pensar. Se você é sensitiva, e intuitiva porque você
não raciocina, você sente e não pensa. É uma bruta
discriminação, é um bruta preconceito, é uma violência
enorme que é feita às mulheres, todo dia.
Todo dia, Então eu queria deixar claro que eu não
falei em violência latente, eu estoe dizendo que a
sociedade brasileira é uma das sociedades mais
violentas que eu conheço. Esse é o primeiro ponto.
Agora, por causa disso, foi que a minha ênfase foi na
direção da luta por direitos. E de considerar de uma
lado, a dramaticidade dessa luta, porque lutar por
direitos pressupõe que carências e privilégios já
foram superados, que você está na fase de interesses
comuns, que tem que ser transformados em direitos
universais. Mas nós não chegamos nem nos interesses
comuns... É preciso fugir, como o diabo foge da cruz,
da definição da cidadania pela liberdade como competição
no
mercado. Então, se você não definir a cidadania pelos
direitos sociais e não investir nos direitos sociais,
eu acho que a gente deixa a sociedade brasileira como o
Conde de Lampeduza disse que era para ficar. Muda, muda,
muda, para ficar como está.
Eu
diria que o investimento maior, por um lado, como quebra
dos preconceitos, em educação e telecomunicações. E
do outro, como ação política, a luta pela cidadania,
sob a forma dos direitos sociais. Obrigado
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