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Reflexos do Tribunal Penal 
Internacional no Brasil

Oscar Vilhena Vieira explica e debate as principais conseqüências da instalação da Corte Internacional sobre o Direito brasileiro

Ricardo Maffeis Martins*

O Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo (TACRIM) organizou, na última semana, uma palestra com o tema "O Tribunal Penal Internacional e os reflexos no Direito brasileiro". Para discursar sobre a matéria, foi escolhido o secretário executivo do Ilanud (Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para Prevenção do Delito e Tratamento do Delinqüente), Oscar Vilhena Vieira, doutor pela USP, professor da PUC-SP e procurador do estado.

Oscar Vilhena começou sua palestra explicando que, como os Estados não possuem capacidade para impor suas leis sobre os demais Estados, uma vez que todos se encontram em igualdade no tocante à soberania (e a Carta da ONU impede a supremacia de um Estado sobre outro), começaram a ser criados órgãos supranacionais, como as Cortes Européia e Americana de Direitos Humanos, ambas com atuação sempre subsidiária à dos próprios Estados.

Um dado alarmante foi apresentado pelo expositor: de 1945 até hoje existiram 250 conflitos armados no mundo, com aproximadamente 120 milhões de mortos. "A maioria não foi morta pelo 'inimigo', mas por seus próprios Estados", relatou, exemplificando com os conflitos da ex-Iugoslávia e de Ruanda.

Neste século, marcado pelas grandes violações aos direitos humanos (como guerras e ditaduras), não há muitos mecanismos jurídicos para resolvê-los, por isso foram criados tribunais como os de Nuremberg, da ex-Iugoslávia e de Ruanda. "O problema é que são tribunais dos vencedores, que atuam sem imparcialidade, e vinculados ao Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU)", afirmou o palestrante. E questionou: "Por que não existem tribunais para o Camboja, Vietnã ou Afeganistão, por exemplo?" A resposta é fácil: O poder político dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU é muito grande e são eles que decidem que tribunais criar.

As vantagens do Tribunal Penal Internacional

Para resolver este problema é que foi criado, pelo Tratado de Roma de 1998, a Corte Penal Internacional, com muitas diferenças em relação aos tribunais anteriores. A primeira grande vantagem do Tribunal Internacional é que ele é autônomo, não vinculado ao Conselho de Segurança e com o mesmo status da Corte Internacional de Justiça de Haia.

Trata-se ainda de um tribunal de caráter permanente e não de um órgão criado pelos vencedores para um revide contra os países derrotados. Sua competência está definida no artigo 5o do Tratado de Roma: para crimes de guerra, crimes contra a humanidade e crimes de agressão, expressamente tipificados pelo tratado (apesar de muitos já estarem definidos também em outros tratados internacionais).

Estados que sejam ou não parte nos conflitos poderão postular junto ao Tribunal Penal Internacional, que terá uma atuação subsidiária, somente agindo quando os órgãos judiciários locais não puderem atuar com independência ou simplesmente não agirem. Será ainda criado um Ministério Público internacional. No dizer do secretário executivo do Ilanud, é "uma verdadeira reversão no sentido de soberania, uma tentativa de constitucionalização da ordem internacional".

Os problemas para o Direito brasileiro

Oscar Vilhena Vieira também apontou as principais dificuldades pelas quais o Direito nacional poderá passar com a ratificação do Tratado em nosso ordenamento jurídico.

O primeiro problema a ser enfrentado é que as autoridades brasileiras (que são as que teoricamente cometeriam os crimes previstos no Tratado de Roma) já têm um tribunal constitucionalmente competente para julgá-las (o presidente da República, por exemplo, é julgado pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Senado Federal, de acordo com a natureza do crime cometido). Esta questão é facilmente resolvida, uma vez que a jurisdição do tribunal é subsidiária.

Problema maior existe em relação à obrigatoriedade de extraditar a pessoa que será julgada pelo Tribunal. A Constituição Federal proíbe expressamente a extradição de brasileiros (art. 5o, inciso LI), só permitida para o brasileiro naturalizado e nos casos que especifica. A solução mais simples seria uma ratificação com reservas, mas o Tratado de Roma não admite reservas, ou se ratifica integralmente ou não se ratifica, o que gera nítida incompatibilidade entre a Carta Maior brasileira e o Tratado de Roma.

Outra questão a ser resolvida é a impossibilidade de pena de caráter perpétuo prevista no ordenamento jurídico nacional (CF, art. 5o, inciso XLVII, "b"). Uma das punições previstas no Tratado é justamente a prisão perpétua.

E o que piora ainda mais a situação: estes dois últimos dispositivos estão inseridos entre as garantias individuais, tendo natureza jurídica de cláusula pétrea, não podendo ser alteradas nem por emendas constitucionais.

As saídas possíveis

Existe alguma solução jurídica perfeita para estes problemas? Na visão de Oscar Vilhena Vieira, não. Na palestra, o professor apontou o que seriam algumas saídas, sem todavia definir uma delas como a mais correta.

Na impossibilidade de elaboração de uma reserva quanto à extradição de nacionais ou à prisão perpétua, Vilhena sugere que o Brasil coloque, ao ratificar o Tratado de Roma, algumas "cláusulas interpretativas", a exemplo do comumente feito pelos Estados Unidos da América. Assim, o problema é transferido para o Tribunal, que decidirá se aceita ou não tais cláusulas. "A tendência é não haver problemas, afinal o objetivo é obter o maior número possível de assinaturas", explicou.

Diretamente ligado ao problema da extradição, Vilhena apresentou uma possível interpretação que permitiria a ratificação do Tratado: "pode-se dizer que não é exatamente uma extradição, mas sim uma entrega. Na prática, são institutos iguais, mas com o nome de entrega não haveria ofensa à Constituição." A diferenciação residiria em que extradição é para um outro país soberano, o que não ocorre. A entrega só seria possível para o Tribunal Penal Internacional.

Por fim, a outra hipótese apresentada é a de uma Emenda Constitucional que fizesse um "tangenciamento na interpretação do art. 5º da CF. Para tanto, precisaríamos da conivência do Supremo Tribunal Federal, que é o guardião da Constituição". Explicou ainda o palestrante que as cláusulas pétreas devem vincular-se à racionalidade, uma vez que o objetivo tanto do art. 5o da Constituição quanto da Corte Penal Internacional é o mesmo, a defesa dos direitos humanos.

Questionado a respeito da problemática do Tribunal Penal Internacional, que para agir teria que "passar um atestado" da falência do sistema jurídico de um país soberano, Vilhena afirmou que o efeito poderia ser positivo, pois, para evitar o vexame de perder sua jurisdição, os países trabalhariam no sentido de fazer com que seus Poderes Judiciários funcionassem.

Mostrando como a questão é delicada, Oscar Vilhena lembrou do perigo já ressaltado pelo juiz da Corte de Haia, Francisco Rezek, em entrevista a Carta Maior: "deve-se evitar uma tentativa de colonização pelos direitos humanos", concluiu.

 

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