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A população civil 

Para além de alguns artigos do Regulamento de Haia que, indirectamente, garantiam uma protecção mínima aos civis em tempo de guerra, o essencial do Direito Humanitário anterior a 1949 tinha por objecto a protecção dos militares. A principal contribuição das Convenções de Genebra foi, assim, conceder garantias ao conjunto da população civil, garantias essas que viriam a ser reforçadas pela codificação adicional de 1977.

A população civil é definida pelo Direito Internacional Humanitário de forma negativa 2 : trata-se de pessoas que não fazem parte das forças armadas, ficando pois excluídos os combatentes e membros das forças armadas 3 . A par da protecção conferida à população civil no seu conjunto e aos elementos da população civil contra os métodos e meios de guerra 4 , estes últimos são ainda protegidos contra o arbítrio do inimigo. O campo de aplicação rationae personae da quarta Con-venção protege as pessoas civis que se encon-

Artigos 23.o alíneas g)e h), 43.o a 47.o e 50.o a 53.o .

2 Artigo 50.o §1 P I. 3 Respectivamente,artigo 4.o §A C III e 43.o P I.Em caso de dúvida, uma pessoa será considerada civil. Esta categoria é também extensível ao jornalista em missão perigosa (e não ao correspondente de guerra), que deverá beneficiar da protecção conferida às pessoas civis (artigo 79.o P I). 4 Vide capítulos 8 e 9

..tram em poder de uma das partes no conflito ou de uma Potência ocupante de que não sejam súbditas 5 .

1.AS PESSOAS EM PODER DE UMA PARTE NO CONFLITO

São aquelas que se encontram no território dos Estados beligerantes e são de nacionalidade estrangeira ou apátridas, à exceção dos cidadãos de um Estado não vinculado pela Convenção ou de um Estado neutro ou co-beligerante que possua uma representação diplomática normal no território em questão. De uma forma geral, essas pessoas beneficiam de um tratamento humano, constituído como princípio de base da quarta Convenção; por outro lado, determinadas categorias de pessoas beneficiam de um tratamento específico.

As garantias fundamentais de um tratamento humano

O artigo 27. o da quarta Convenção constitui a pedra angular que garante o respeito, em todas as circunstâncias, dos direitos fundamentais da pessoa: a qualidade de inimigo não justifica que se prive alguém do seu direito à integridade física, moral e intelectual, do respeito da sua honra, dos seus direitos familiares, das suas convicções e práticas religiosas e mesmo dos seus hábitos e costumes. A isto acresce a obrigação de garantir a essas pessoas um tratamento humano, através de garantias mais específicas: interdição da coacção física ou moral, dos castigos corporais, da tortura, das mutilações, das experiências médicas ou científicas injustificadas, das penas colectivas, das medidas de terrorismo, da pilhagem ou de represálias contra as pessoas ou os seus bens e da tomada de reféns 6 .

A obrigação de respeito dos direitos fundamentais e da garantia de um tratamento humano foi consideravelmente alargada pelos Protocolos Adicionais.

O artigo 75. o do primeiro Protocolo, espécie de miniconvenção de direitos humanos, garante tal protecção a todas as pessoas

120 Direito Internacional umanitário

5 Artigo 4.o §1 C IV.

6 Artigos 31.o a 34.o C IV e artigo 3.o comum

..excluídas do campo de aplicação rationae personae da quarta Convenção: cidadãos das Partes no conflito ou de Estados não vinculados pela Convenção, mercenários, sabotadores, espiões. Este artigo – um dos mais longos do Protocolo – representa um progresso significativo no domínio do Direito Internacional Humanitário, uma vez que enuncia normas mínimas de protecção (entendidas por alguns como o «núcleo duro» dos direitos humanos) aplicáveis no decorrer de um conflito armado internacional, período durante o qual com frequência os direitos e liberdades podem ser suspensos.

Depois de confirmar todas as interdições enunciadas pela quarta Convenção, o artigo 75. o enumera as garantias judiciárias e as regras relativas às pessoas privadas de liberdade, que se inspiram largamente no Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Polí-ticos: direitos de defesa, não retroactividade da lei penal, norma non bis in idem, interdição da responsabilidade penal colectiva, presunção de inocência, publicidade dos debates e possibilidade de recurso. Relativamente ao segundo Protocolo, ele reforça os princípios estabelecidos no artigo 3. o comum, alargando a protecção a todas as pessoas que não participam ou deixaram de participar nas hostili-dades, estejam ou não privadas de liberdade 7 . O artigo 5. o enuncia os direitos das pessoas privadas de liberdade, que consistem essen-cialmente na garantia de condições de reclusão decentes, exigindo que os detentores lhes garantam meios de subsistência na mesma medida que os concedidos à população local 8 , e recomendando que lhes seja assegurado um mínimo de segurança e de humanidade:

locais de internamento fora das zonas de combate, locais separados para homens e mulheres, protecção da respectiva saúde e integridade física, possibilidade de correspondência com o exterior. O artigo 6. o estabelece as garantias processuais nos processos penais por infrac-ções relacionadas com o conflito armado.

Estas garantias judiciais, que dizem respeito

A população civil 121

7 Artigo 4.o P II.

8 Os conflitos internos desenrolam-se a maior parte das vezes em regiões onde a população experimenta já condições de vida difíceis

..tanto à instrução como ao julgamento, repetem, no essencial, as dis-posições do artigo 75. o do primeiro Protocolo.

As garantias específicas concedidas a determinadas pessoas

Alguns elementos da população civil beneficiam de protecção especial.

a)As mulheres

A par da proteção concedida às mulheres membros das forças armadas 9 , é-lhes garantida uma proteção especial enquanto membros da população civil. Esta proteção funciona a dois níveis 10 :

Em primeiro lugar, contra os abusos da Parte no conflito em poder da qual se encontram: a mulher é particularmente protegida contra todos os ataques à sua honra e nomeadamente contra a violação, a prostituição e os atentados ao pudor 11 . Por outro lado, a mulher estrangeira em território de uma Parte no conflito beneficia de um tratamento preferencial em termos de alimentação, cuidados médi-cos e assistência social 12 , ao passo que a mulher privada de liberdade deverá ser mantida em local separado do dos homens, beneficiando de medidas particula-res caso esteja grávida ou seja mãe de uma criança de tenra idade 13 , categoria de mulheres relativamente às quais uma condenação à pena de morte não deverá ser executada 14 .

Em segundo lugar, a mulher é ainda espe-cialmente protegida contra os efeitos das hos-tilidades.

Ela não deverá, naturalmente, como qualquer elemento da população civil, ser objecto de ataques mas, para além disso, a mulher grávida ou parturiente é assimilada aos feridos ou doentes beneficiando enquanto tal, ou enquanto mulher que amamenta ou mãe de criança menor de sete anos, de aco-

Direito Internacional umanitário

9 Protecção que visa essencialmente o tratamento que lhes é prestado enquanto prisioneiras de guerra (vide nomeadamente os artigos 14.o §2,29.o §2,49.o §1 e anexo à terceira Convenção (I,A.3.f e B.7),bem como o artigo 76.o §2 do primeiro Protocolo e,relativamente à detenção no contexto de um conflito armado não internacional,o artigo 5.o §2 alínea a)do P II. 10 Krill (F.),«La protection de la femme dans le Droit international humanitaire » (em português:«A protecção da mulher no direito internacional humanitário »),RICR,1985. 11 Artigo 27.o §2 C IV,75o e 76.o P I e 4.o P II. 12 Artigo 38.o C IV. 13 Artigos 75.o §5 e 76.o §2 P I, 85.o e 97.o §4 C IV.

14 Artigos 76.o §3 P I e 6.o §4 P II

..lhimento nas zonas sanitárias e de socorro prioritárias em víveres, vestuário e medicamentos. 

b)As crianças

A protecção das crianças em período de conflito armado funciona também a dois níveis.

Temos, por um lado, aquela que o Direito Internacional Humanitário concede às crianças combatentes: limitação do fenómeno das crianças soldados que não devem ser recrutadas nem participar directa-mente nas hostilidades caso sejam menores de quinze anos 15 , pro-tecção das crianças prisioneiras às quais, caso não possuam o estatuto de prisioneiro de guerra, se deve conceder tal tratamento uma vez que não existe limite de idade para dele beneficiar, ou garan-tir um tratamento privilegiado em razão da sua idade 16 .

Por outro lado, a criança é protegida enquanto vítima dos conflitos armados. A par da protecção geral concedida a todos aqueles que não participam nas hostilidades, o direito de Genebra estabeleceu uma protecção especial: no total, vinte e cinco artigos protegem directa ou indirectamente as crianças:

A protecção directa e pessoal da criança tem por base três disposi-ções: desde logo, a intangibilidade do seu estatuto pessoal 17 que impede a Potência ocupante de modificar a nacionalidade ou o estado civil da criança; depois, o tratamento preferencial em termos de assistência alimentar e médica, tendo em conta a sua dependên-cia face aos adultos, as suas particulares necessidades alimentares em virtude da respectiva idade e a maior vulnerabilidade a certas doenças 18 ; por último, as garantias espe-cificas para as crianças detidas, presas ou internadas: locais separados dos adultos, espaços especiais para jogos e desporto, inter-dição de executar uma condenação à morte 19 .

A população civil 123

15 Artigos 77.o §2 P I e 4.o §3, alínea c)P II.

16 Artigos 16.o C III;45.o §3,75.o §§4 a 7 e 77.o P I;4.o §3,alínea c)P II.

17 Artigo 50.o §2 C IV. 18 Artigos 23.o 1,50.o §5 e 89.o §5 C IV,8.o a)e 78.o P I e 4.o ,n.o 3 P II.

19 Respectivamente,artigos 77.o §4

P I,94.o §3 C IV,77.o §5 P I e 6.o §4 P II

..Indirectamente, as crianças beneficiam de uma protecção que se revela indispensável tendo em conta o género de conflitos que actual-mente as afectam e em resultado dos quais sofrem menos devido à violência exterior à qual se habituam ou aos perigos objectivos de que mal se apercebem do que à destruição do seu ambiente familiar e social. Esta protecção indirecta traduz-se no reagrupamento das famílias momentaneamente separadas, preservando a unidade fami-liar 20 e na salvaguarda do ambiente sócio-cultural da criança, devendo a Potência ocupante facilitar o bom funcionamento dos estabeleci-mentos destinados à educação das crianças 21 .

Um projecto de Protocolo Facultativo à Convenção das Nações Uni-das sobre os Direitos da Criança de 26 de Janeiro de 1990, encontra-- se actualmente a ser estudado pela Comissão dos Direitos do Homem, defendendo o CICV que este Protocolo se aplique a todas as situações de conflitos armados, interdite todas as formas de recrutamento de crianças menores de 18 anos e todo o tipo de par-ticipação nas hostilidades e ainda que a incorporação de crianças menores de 15 anos nas forças armadas e a sua participação nas hos-tilidades passem a ser consideradas como crime de guerra 22 .

c)Os estrangeiros

Este termo é entendido numa acepção muito precisa: trata-se de civis em território inimigo. Condenados à escravatura no tempo dos romanos, prisioneiros de guerra mais tarde, os civis que se encon-travam em território inimigo foram internados em massa durante as duas Guerras Mundiais, uma vez que todos os cidadãos do Estado inimigo constituíam um potencial soldado inimigo. A Convenção de 1949 adoptou a seguinte solução de com-promisso 23 : os estrangeiros têm o direito de deixar o território no início ou no decorrer das hostilidades, mas o Estado em cujo território

124 Direito Internacional umanitário

20 Artigos 74.o P I e 4.o §3, alínea b)P II.

21 Artigos 24.o e 50.o §3 CIV,78.o PI e 4.o §3,alínea a)P II.

22 RICR,Março de 1998,pp.111de seguintes.

23 Artigo 38.o C IV

..se encontram pode retê-los caso se trate de civis mobilizáveis ou se a sua partida for incompatível com a segurança do Estado ou mesmo com os seus «interesses nacionais».

Enquanto as pessoas se encontrarem impedidas de sair, beneficiam de uma protecção de cariz essencialmente humanitário, nomeada-mente do direito a cuidados de saúde, ao exercício da sua religião, à assistência social e ao trabalho, desde que esta actividade não con-tribua directamente para o esforço de guerra 24 . Mas a mais severa das medidas a que as autoridades podem recorrer é o internamento ou a prisão domiciliária caso os estrangeiros representem uma ameaça à segurança do Estado (caso dos espiões). Em caso de internamento, deverão ser respeitadas uma série de garantias processuais e mais de cinquenta artigos 25 regulam o tratamento dos internados de forma muito semelhante à que é aplicável aos prisioneiros de guerra.

d)Os refugiados

Estes constituem uma categoria especial de estrangeiros cuja situa-ção é frequentemente preocupante. O Direito Internacional Huma-nitário dá-nos uma definição muito ampla do conceito de refugiado: 

refugiado em fuga por receio de perseguições no sentido do artigo 1. o da Convenção de Genebra de 1 de Julho de 1951 N.T. , refugiado de guerra ou pessoa deslocada. O refugiado é protegido enquanto pessoa civil, quer como estrangeiro em território de uma Parte no conflito quer como habitante de um território ocupado 26 .

Mas, a par desta protecção, idêntica àquela que é reconhecida aos restantes civis, o refugiado beneficia da protecção específica cons-tante do artigo 73. o do primeiro Protocolo. Esta disposição visa as pessoas que, antes do início das hostilidades, forem consideradas refu-giadas  apátridas nos termos dos instru-mentos internacionais pertinentes aceites pelas Partes ou da legislação nacional do Estado de acolhimento ou residência. São-lhes

A população civil 125

24 Artigos 38.o ,39.o e 40.o C IV.

25 Artigos 79.o a 135.o C IV. N.T.Portugal aderiu a esta Convenção a 22 de Dezembro de 1960 e formulou uma declaração a 13 de Julho de 1976.

26 Artigos 4.o §1,44.o e 70.o , n.o 2 C IV

..concedidas as seguintes garantias: um refugiado de nacionalidade inimiga não poderá ser transferido para o país de onde fugiu por receio de perseguições; o refugiado que se encontre em poder da Potência ocupante da qual tenha fugido não poderá ser preso, processado ou condenado pelas autoridades dessa Potência com base nos factos que hajam justificado a concessão de asilo 27 . Assim, o Direito Internacional Humanitário faz prevalecer as opiniões de um indivíduo sobre o seu estatuto objectivo de cidadão inimigo ou cidadão da Potência de ocu-pação. Os restantes refugiados ou apátridas beneficiam da protec-ção garantida pelo artigo 74. o do primeiro Protocolo ou artigo 4. o §1 da Convenção IV, segundo os casos. Esta protecção é, em princípio, assegurada pelo CICV às pessoas deslocadas no interior de um país em guerra e pelo ACNUR aos refu-giados num país de primeiro acolhimento ou de asilo.

2.AS PESSOAS QUE SE ENCONTRAM EM TERRITÓRIO OCUPADO

Trata-se do conjunto de pessoas, à excepção dos nacionais da Potên-cia ocupante, que se encontram nos territórios ocupados. A ocupa-ção de guerra não constitui uma subjugação: é uma situação provisória que não implica o desaparecimento do Estado ocupado pelo que a soberania deste, mesmo afectada, subsiste e o seu Governo, mesmo se em exílio, tem o direito de prosseguir as hostilidades. Além disso, o Direito Internacional Humanitário considera que a ocupação de guerra não tem qualquer efeito em termos de transferência de sobe-rania 28 , sendo necessário resolver o problema da repartição de poder entre o Estado ocupante e o Estado ocupado. O primeiro deverá tomar as medidas necessárias para assegurar a manutenção da ordem pública e da segurança e o segundo proteger a sua a população con-tra o eventual arbítrio das forças de ocupação.

Uma vez que os padrões mínimos de protecção estabelecidos pela quarta Convenção de Haia se haviam revelado totalmente ineficazes durante as duas Guer-ras Mundiais, as Convenções de Genebra defi-

Direito Internacional umanitário

27 Respectivamente,artigos 45.o

§4 e 70.o §2 C IV.

28 Artigo 47.o C IV

..niram normas muito mais precisas tentando impedir, através do Direito, a repetição das barbáries ocorridas durante a Segunda Guerra Mundial. Estas regras consistem na imposição de obrigações ou interdições ao ocupante, por forma a garantir à população civil uma vida tão próxima quanto possível do normal em tempo de paz.

As obrigações do ocupante

Podem ser reagrupadas em torno de quatro aspectos. Em primeiro lugar, a Potência ocupante deverá facilitar o bom funcionamento dos estabelecimentos destinados aos cuidados e à educação das crian-ças ou, se as instituições locais forem inadequadas, assegurar a manutenção e a educação daquelas 29 . Depois, deverá assegurar o cui-dado dos estabelecimentos e serviços médicos e hospitalares e garantir a saúde e higiene públicas 30 . Para além disso, a Potência de ocupação deverá permitir que os ministros dos diferentes cultos pres-tem assistência espiritual aos membros das suas comunidades reli-giosas e que as instituições de socorro levem a cabo acções de socorro individuais e colectivas sempre que a população esteja insuficientemente abastecida 31 . Por fim, a Potência de ocupação deverá manter em vigor a legislação penal do território ocupado e assegurar que os tribunais encarregados de a aplicar permaneçam em funções, excepto se tal constituir uma ameaça à sua segurança; a legis-lação penal promulgada pelo ocupante deverá ser publicada e ofe-recer todas as garantias de um processo equitativo (não retroactividade, proporcionalidade das penas, dedução da detenção preventiva, limitações à aplicação da pena de morte, recurso gracioso …).

Evidentemente, as medidas tomadas pelo Estado ocupante deixam de produzir efeitos com o fim da ocupação.

As interdições

O ocupante está sujeito a diversas interdições que se podem agrupar em torno de dois eixos

A população civil 127

29 Artigo 50.o §1 C IV.

30 Artigo 56.o C IV.

31 Artigos 55.o e 58.o a 63.o C IV

..fundamentais. Por um lado, aquelas que visam garantir o respeito dos direitos da pessoa em poder de uma Parte no conflito, ou seja, as garantias fundamentais de um tratamento humano; por outro, as que visam assegurar a ligação e os vínculos existentes entre a popu-lação do Estado ocupado e este último, a saber: proibição da trans-ferência, deportação ou implantação das pessoas protegidas fora do território ocupado, quer em massa quer individualmente 32 ; proibi-ção do alistamento das crianças em organizações ou formações dependentes do Estado ocupante ou de obrigar a população do Estado ocupado a servir nas forças armadas do Estado ocupante 33 .

Assim, a quarta Convenção estabelece regras mais precisas relati-vamente à protecção conferida aos civis dos territórios ocupados. Infe-lizmente, quando um Estado estabelece uma presença militar no território de um outro, tenta quase sempre demonstrar a legalidade dessa presença, começando por negar a existência de ocupação e, con-sequentemente, a aplicabilidade da quarta Convenção: foi essa a tese da Argentina na questão das Malvinas-Falkland, da União Soviética no Afeganistão, da Síria e de Israel no Líbano, do Iraque no Koweit.

Torna-se, assim, necessário encontrar mecanismos que permitam que um Estado ocupante aplique a quarta Convenção sem que o princí-pio do estoppel os obrigue a renunciar à sua posição de princípio sobre a legalidade da respectiva presença militar em território estrangeiro.

Esta separação é, aliás, possível graças ao artigo 4. o do primeiro Pro-tocolo, que afirma que a aplicação das quatro Convenções e do pri-meiro  Protocolo não tem efeitos sobre o estatuto jurídico das Partes e, nomeadamente, que o estatuto jurídico do território ocupado não é afectado. Da mesma forma que o artigo 3. o comum para os CANI, as disposições das Convenções são exclusiva-mente humanitárias e não conferem a qualquer das Partes imunidade nem reconhecimento da autoridade 34 .

32 Artigo 49.o C IV.

33 Artigos 50.o §2 e 51.o C IV.

34 Com.,P I,p.72.

 

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