Movimento
Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho
Se, de uma
forma geral, a aplicação do Direito Internacional
Público assenta nos mecanismos de
controlo interestadual, já a especificidade do
DIH se prende com a existência da
Cruz Vermelha Internacional. Os elementos constitutivos
do Movimento Internacional da Cruz
Vermelha e do Crescente Vermelho são
associações essencialmente com
origem na iniciativa privada, mas a sua acção
tem seguramente pertinência em relação ao
Direito Internacional, nomeadamente aquando
das conferências internacionais da Cruz
Vermelha.
1.INSTITUIÇÕES
DA CRUZ
VERMELHA INTERNACIONAL
Comité
Internacional da Cruz Vermelha
O Comité
não consiste numa organização internacional,
mas antes numa organização humanitária
cujos corpos dirigentes são de nacionalidade
suíça. O órgão supremo da instituição
é um Comité composto por um número
máximo de 25 membros eleitos por cooptação e escolhidos entre
personalidades helvéticas que possuam simultaneamente uma experiência
dos problemas internacionais e uma ligação à causa humanitária.
O seu Presidente é eleito no seio do Comité por um mandato
de quatro anos renovável. O Conselho
Executivo, composto por sete membros,
é um órgão permanente encarregue da gestão corrente dos
assuntos. A 19 de Março de 1993 foi concluído um acordo de
sede entre o Conselho Federal e o C.I.C.V.,
com vista a afirmar o seu carácter
autónomo e de associação de direito privado suíço em
relação à Confederação
Helvética. Este acordo reconhece a personalidade jurídica
internacional do C.I.C.V. e as suas atribuições, enuncia os
privilégios e imunidades de que beneficiam
a instituição e os seus agentes e
prevê um procedimento arbitral de regulamento de diferendos.
É evidente
que o C.I.C.V. não é uma simples associação privada regida
pelos artigos 60. o e seguintes do Código
Civil Suíço, já que foi investido numa
missão internacional, que decorre em simultâneo das Convenções
e dos Protocolos e da prática mais que
centenária do C.I.C.V. para exercer
as suas actividades humanitárias no território das Partes
no conflito, com o seu consentimento. A sua
personalidade jurídica internacional
prende-se também com as relações de natureza quase
diplomática que o Comité mantém com os Estados e as
organizações internacionais, e com
os acordos que concluiu com estes e
que têm uma natureza próxima dos tratados. Foram assinados mais
de 50 acordos de sede com os Estados que
reconhecem ao C.I.C.V. personalidade
jurídica de direito interno e que lhe conferem um regime
de privilégios e imunidades, frequentemente definidos por uma
simples remissão à Convenção de Viena de 1961.
A
personalidade jurídica internacional funcional do C.I.C.V.,
reconhecida implicitamente pelas
Nações Unidas na resolução 45-6, de 16
de Outubro de 1990, e que conferiu àquele organismo a qualidade
de observador na Assembleia Geral, permite
que o C.I.C.V. possua os direitos
necessários ao exercício da sua missão, nomeadamente
32 Direito
Internacional umanitário.
o direito de
contratar, adquirir, alienar bens móveis e imóveis, comparecer
em juízo e ainda o direito de legação.
Sociedades
Nacionais da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho
As Sociedades
Nacionais são O.N.G.’s nacionais cujas actividades variam
consoante o país em que se encontrem sediadas e podem consistir
na prestação de serviços de saúde e de
assistência social ou no desenvolvimento
de programas para a juventude.
Em tempo de
guerra, as Sociedades Nacionais intervêm
enquanto auxiliares dos serviços
sanitários das forças armadas, tratando dos militares doentes
e feridos, ajudando os prisioneiros de
guerra, os internados e os refugiados.
As Sociedades
Nacionais da Cruz Vermelha e do Crescente Verme-lho devem
ser reconhecidas pelos Estados e respeitar os princípios fundamentais
do Movimento para obterem o reconhecimento inter-nacional do
C.I.C.V. Depois de preencherem estas condições, as Sociedades
Nacionais são agrupadas no seio da Federação Interna-cional.
Federação
Internacional das Sociedades Nacionais
da Cruz
Vermelha e do Crescente Vermelho
Fundada em
1919 por iniciativa de Henry Davison (presidente do Comité
de Guerra da Cruz Vermelha Americana), trata-se de uma O.N.G.
internacional cuja missão genérica é de facilitar e fazer
progredir a ação humanitária das
Sociedades Nacionais, nomeadamente em
favor das populações mais vulneráveis.
Através de
um acordo celebrado a 20 de Outubro de 1989 entre o C.I.C.R.
e a Federação, as competências de ambas as instituições foram
definidas da seguinte forma: a Federação
coordena as acções inter-nacionais de
socorro às vítimas de catástrofes naturais, aos refugiados
e às pessoas deslocadas fora das zonas de
conflitos.
Por seu lado
o C.I.C.R. assegura a direcção geral da
acção internacional da Cruz Vermelha
e do Crescente Vermelho dentro das zonas de conflito.
Movimento
Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho 33.
2.CONFERÊNCIA
INTERNACIONAL DA
CRUZ VERMELHA
O C.I.C.R.,
as Sociedades Nacionais e a Federação formam a Cruz Vermelha
Internacional, que é dirigida pela Conferência Internacional
da Cruz Vermelha, organismo de natureza
híbrida que se reúne, em princípio,
de quatro em quatro anos e que inclui, para além das
instituições privadas da Cruz
Vermelha, os Estados Partes nas Convenções de
Genebra. As delegações do C.I.C.V., das Sociedades Nacionais
e da Federação estão igualmente habilitadas a participar
nas deliberações e nas votações,
dispondo cada delegação de um voto.
A
Conferência adapta resoluções que concretizam a sua ação ou
posições sobre qualquer problema
que apresente um interesse para o Movimento, tal
como a saúde e o bem-estar social, os direitos humanos, a
assistência humanitária, o desenvolvimento do Direito
Humanitário e as ações a favor da
paz. O valor jurídico destas resoluções é
variável , já que consistem por um lado em regras obrigatórias
no que concerne ao direito interno da
Organização e por outro em simples
recomendações quando são dirigidas aos membros da Cruz Vermelha
Internacional ou aos Estados com vista a impor um determinado
comportamento, o que tem sido frequentemente
o caso, por exemplo em matéria de
CANI, tendo em conta as lacunas e insufi-ciências dos
textos jurídicos. Porém, estas resoluções têm mesmo assim
um certo efeito obrigatório, porque mesmo que os Estados não
sejam obrigados a aceitar a resolução e a
aplicá-la, devem pelo menos tomar
nota da mesma e analisá-la de boa fé.
A Cruz
Vermelha está definitivamente investida de uma verdadeira missão
de serviço púbico internacional: contribui para a proteção
e assistência das vítimas de conflitos
armados, bem como para o desenvolvimento do
DIH. A Conferência, que consiste numa pessoa jurídica de
direito privado e não numa instituição especializada ou órgão
subsidiário das Nações Unidas,
soube sempre evitar a politização,
mantendo desta forma a confiança dos
Estados na sua neutralidade.
Bugnion (Fr.):«Le
droit de la Croix--Rouge »,R.I.C.R.,1995,pp.535-566(em
português:«O Direito da CruzVermelha »).
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