A demissão de
Andrea Calabi, presidente do BNDES, revela a força do
ministro da Fazenda Pedro Malan no governo FHC. É o que
pensa a cientista política Maria Victória Benevides,
professora da Universidade de São Paulo. Em entrevista ao
Correio, Maria Victória comentou a crise na base governista
e analisou o quadro eleitoral para as eleições municipais
deste ano. Leia a seguir os principais trechos da
entrevista.
Correio:
Como a senhora analisa a demissão de Andrea Calabi,
presidente do BNDES? Tem alguma relação com a disputa que
tem sido travada entre PSDB e PFL?
Maria Victória
Benevides: Na minha
visão, a saída do presidente do BNDES representa um reforço
ao grupo do ministro Pedro Malan e acho que este fato terá
reflexo na disputa para a presidência em 2002, pois
significa que o presidente Fernando Henrique Cardoso se
colocou ao lado de Malan, em detrimento do ministro José
Serra. Mas não creio que a demissão de Calabi tenha sido
fruto da disputa travada há duas semanas entre PFL e PSDB.
Neste caso, acho que a reorganização dos blocos de
partidos da base aliada foi uma demonstração de força do
presidente e do tucanato imperial —uma reação ao PFL e
em especial ao senador Antonio Carlos Magalhães.
Correio:
Há risco de um rompimento definitivo entre os partidos
da base governista?
Maria Victória
Benevides: A briga não
foi nenhuma tragédia para a aliança entre tucanos e
pefelistas. Na verdade, esse tipo de disputa é típico da
velhíssima forma de fazer política das oligarquias
brasileiras, em que as alianças são feitas e rompidas em
função de interesses imediatos. Foi o que ocorreu há duas
semanas, quando estava em jogo a indicação da presidência
da Câmara e do Senado pelo bloco que tivesse a maioria.
Correio:
Ou seja, em outra oportunidade, a base vota junto...
Maria Victória
Benevides: Sem dúvida.
Aliás, eu não vejo nenhuma diferença entre o
comportamento dos tucanos e dos pefelistas no Congresso ou
no que tange os grandes problemas nacionais. Eles têm
exatamente as mesmas posições.
Correio:
Mas há quem pense —e o senador Roberto Freire tem sido
o maior porta-voz da idéia— que parte do PSDB não está
sintonizado com o PFL e poderia eventualmente participar de
uma frente de centro-esquerda. Como a senhora vê essa hipótese?
Maria Victória
Benevides: Gostaria
muito de acreditar nisso, mas infelizmente não acredito.
Primeiro, uma frente só com o PPS da esquerda é algo muito
estranho. Depois, acho que existem diferenças entre o
ministro José Serra, o governador Mário Covas e o
presidente Fernando Henrique, mas essas diferenças, embora
importantes, são pequenas. No que tange as grandes questões
nacionais —reforma agrária, privatizações,
desnacionalização da economia etc—, eles apresentam
propostas parecidas. É uma diferença de grau.
Correio:
Neste ano, teremos eleições municipais no país. Como a
senhora está vendo o quadro eleitoral? As eleições terão
caráter local ou as grandes questões e a crise brasileira
estarão na pauta do pleito de outubro?
Maria Victória
Benevides: As duas
coisas não são excludentes. É difícil imaginar que em
pequenas cidades do nordeste brasileiro, por exemplo, as
questões locais não sejam predominantes. Nas grandes
cidades e capitais, os temas nacionais certamente estarão
presentes, mesclados com problemas locais.
Correio:
Como a senhora está vendo a divisão das esquerdas em
diversas cidades onde havia uma expectativa de que
disputassem unidas, como Porto Alegre, Rio de Janeiro e São
Paulo?
Maria Victória
Benevides: Acho péssima
a divisão das esquerdas. É preciso lembrar que as
esquerdas têm uma rejeição grande na sociedade
brasileira. Se houver polarização, há sempre a chance de
um candidato de centro ou de direita crescer, ainda que não
seja um nome de grande expressão, e reverter um quadro que,
até agora, aponta o favoritismo dos candidatos da oposição.
Claro que há exceções: em várias cidades, esta rejeição
não existe mais em função do grande sucesso
administrativo da gestão de esquerda. É o caso de Porto
Alegre, mais conhecido, ou de Catanduva, no interior de São
Paulo. Lá, o prefeito só perde se houver uma grande tragédia.
Correio:
Nos últimos meses, foram lançadas duas pré-candidaturas
de mulheres para disputar a presidência da República em
2002 —de Roseana Sarney, pelo PFL, e de Angela Amim, pelo
PPB. As mulheres estão realmente com mais espaço na política
brasileira?
Maria Victória
Benevides: Sem dúvida,
esta é uma grande novidade. A idéia de que a mulher não
deve ocupar cargos executivos está diminuindo e, no imaginário
dos brasileiros, a mulher aparece como alguém mais
trabalhadora e menos corrupta. Isto explica o lançamento de
tantas candidatas.
Correio:
A governadora do Maranhão, na sua avaliação, tem
chances reais de disputar a presidência?
Maria Victória
Benevides: Eu não
tenho nenhuma afinidade com a Roseana, jamais votaria nela,
mas acho muito engraçado que a coloquem na posição de
possível vice numa chapa com o José Serra. Ela já tem
muito mais intenção de votos do que ele... É uma
candidata viável, pois foi a primeira governadora do Maranhão,
conversa de igual para igual com o presidente da República
e com os demais governadores. Tudo isto pesa no imaginário
do povo.
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