Desaparecidos
Jair Krischke (presidente MJDH)
"Hay
quienes imaginan el olvido como un depósito desierto
una cosecha de la nada. Y sin embargo el olvido
está lleno de memoria"
Mario Benedetti
Recente
deliberação da Comissão de Direitos Humanos das
Nações Unidas abriu caminho para um perito independente
elaborar o projeto da "Convenção Internacional
sobre a Desaparição Forçada de Pessoas".
A proposta deverá ser posteriormente encaminhada
a um grupo de trabalho a ser criado com a específica
atribuição de apresentar, em um futuro próximo,
um texto final e de consenso para sua adoção em
definitivo como tratado internacional.
Mesmo
que as desaparições forçadas tenham sido reconhecidas
pelo Direito Internacional consuetudinário - direito
fundado nos costumes -, através do "Estatuto
de Roma", da Corte Penal Internacional e
dos Tribunais Internacionais "Ad hoc"
da ex-Iugoslavia e de Ruanda, como
um delito internacional específico, lamentavelmente
ainda não existe um tratado integral de proteção.
Assim,
pela adoção de um instrumento juridicamente vinculante
(ou seja, definição de uma legislação própria),
como, por exemplo, uma Convenção, estará sendo
dada relevância devida à preocupação internacional
que se relaciona com uma das formas mais atrozes
de violentar a vida e a dignidade humana:
DESAPARIÇÃO
Essa Convenção também será o instrumento efetivo
de proteção que permitirá a milhares de vítimas
em todo o mundo enfrentar seu estado de indefinição
jurídica.
A importância do referido projeto fundamenta-se
na necessidade de responder adequadamente às "desaparições
forçadas" que continuam a ocorrer em todas
as regiões do mundo, por múltiplas motivações,
sendo ainda agora um problema sem solução.
É
preciso destacar também a importância da integralidade
do projeto, que deverá abranger DIREITOS e ASPECTOS
DE PROTEÇÃO E PREVENÇÃO fundamentalmente necessários
para o tratamento adequado do problema, e que
não se equaciona tão somente com a tipificação
do delito, como é o caso do "Estatuto de
Roma".
Exemplo:
1 - O Direito à Verdade
Particularmente próprio das "desaparições
forçadas", tem sido de difícil aplicação
por parte dos Estados e não está garantido em
nenhuma Convenção. A não resolução desse legítimo
direito das vítimas, dos familiares, ou dos que
de alguma forma foram afetados, tem
levado a novas e importantes crises as chamadas
"democracias de transição", demonstrando
cabalmente que as soluções autoritárias adotadas
para "resolver" os referidos crimes
nada mais fizeram do que postergá-los.
2 - O Direito a ser igual frente à Lei e a
de ser protegido por ela
Este direito tem sido negado sistematicamente
às vítimas pelos sistemas de administração da
Justiça. Eles invariavelmente atuam de maneira
discriminatória no que diz respeito às vítimas
das "desaparições forçadas" e de seus
familiares, tanto nas ditaduras como nas democracias.
Esta discriminação tem sido estimulada porque
as ações ajuizadas acabam sendo inviabilizadas
por Leis de "Anistia", de "Obediência
Devida" ou de "Caducidad"* - todas
de caráter ilimitado e propostas pelo Poder Executivo,
o que acaba por inviabilizar a aplicação em juízo
da igualdade de condições entre as vítimas e seus
algozes.
No mundo todo, a quase total impunidade resultante
do ineficiente tratamento dispensado às "desaparições
forçadas" evidencia a pouca importância até
hoje destinada às vítimas, acabando por desequilibrar
a balança da JUSTIÇA, favorecendo com ilimitados
benefícios e direitos aos algozes, em detrimento
da equidade necessária.
*Caducidad = caduca o direito/dever do Estado
em punir
3
- O Direito ao corpo do desaparecido
Este direito, próprio das "desaparições forçadas",
não está regulamentado de nenhuma
maneira, em nível universal, por qualquer Convenção.
São raras as referências jurisprudenciais em Direito
Internacional Humanitário, e inexistentes nas
legislações internas.
Este
direito é reiteradamente negado aos familiares
dos desaparecidos, minimizado como pouco importante
e totalmente ausente das medidas políticas estatais
que tratam do tema nos países onde tenham ocorrido
as "desaparições forçadas".
O
direito ao corpo e a pranteá-lo complementam o
direito à VERDADE e é parte integrante da JUSTIÇA
e da REPARAÇÃO MORAL tão necessárias ao restabelecimento
dos direitos e dos afetos.
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