Militantes
Brasileiros dos Direitos Humanos
João Baptista Herkenhoff
Mulheres no banco dos réus,
sob o olhar de um juiz
Libertação de uma
empregada doméstica, que estava presa porque
furtara do seu patrão o dinheiro necessário
para comprar uma passagem de trem, de Vitória
à vizinha cidade mineira de Governador
Valadares.
Despacho
do Juiz João Baptista Herkenhoff (Vitória,
ES).
“Considerando
o pequeno valor do furto;
considerando
o minúsculo prejuízo sofrido pela
vítima que, a rigor, se o Cristo não
tivesse passado inutilmente por esta Terra, em
vez de procurar a Polícia por causa de
150 cruzeiros, teria facilitado a ida da acusada
para Governador Valadares, ainda mais que a acusada
havia revelado sua inadaptação a
esta capital;
considerando
que a acusada é quase uma menor, pois mal
transpôs o limite cronológico da
irresponsabilidade penal;
considerando
que o Estado processa uma empregada doméstica
que lesa seu patrão em 150 cruzeiros, mas
não processa os patrões que lesam
seus empregados, que lhes negam salário,
que lhes furtam os mais sagrados direitos;
considerando
que o cárcere é fator criminogênico
e que não se pode tolerar que autores de
pequenos delitos sejam encarcerados para, nessa
universidade do crime, adquirir, aí sim,
intensa periculosidade social;
RELAXO
a prisão de Neuza F., determinando que
saia deste Palácio da Justiça em
liberdade.
Lamento
que a Justiça não esteja equipada
para que o caso fosse entregue a uma assistente
social que acompanhasse esta moça e a ajudasse
a retomar o curso de sua jovem vida. Se assistente
social não tenho, tenho o verbo e acredito
no poder do verbo porque o Verbo se fez carne
e habitou entre nós. Invoco o poder deste
verbo, dirijo a Deus este verbo e peço
ao Cristo, que está presente nesta sala,
por Neuza F. Que sua lágrima, derramada
nesta audiência, como a lágrima de
Madalena, seja recolhida pelo Nazareno.”
Despacho
dado em audiência, no dia 25 de março
de 1976, no processo n. 3.721, da 3a. Vara Criminal
de Vitória. Publicado pelo jornal “A
Gazeta”, de Vitória, na edição
de 26 de março de 1976. |