Militantes
Brasileiros dos Direitos Humanos
Joćo
Baptista Herkenhoff
Crimes Hediondos
Em
face da superlotação dos presídios,
que se observa presentemente no Brasil, o Ministro
da Justiça propõe a revogação
da “Lei dos Crimes Hediondos”.
A
proposta governamental repõe em debate
o acerto ou desacerto do tratamento adotado
pelo legislador para reprimir certos crimes
de extrema gravidade.
A
nosso ver, não são os tipos penais,
por si só, que tornam um crime hediondo.
Além do tipo penal, as circunstâncias
em que o crime foi cometido é que darão
ao crime o caráter de hediondo.
Um
crime grave, embora continue grave, pode perder
o caráter de hediondez, em face de determinadas
circunstâncias atenuantes.
Um
crime menos grave pode, em sentido inverso,
assumir extrema gravidade em razão de
circunstâncias agravantes.
Cabe
ao juiz a missão de individualizar a
pena. A individualização da pena,
na sentença, e do cumprimento da pena,
durante a execução, é justamente
a descida da abstração da lei
para a concretude das situações
com as quais o magistrado se defronta.
A
lei dos crimes hediondos seguiu princípio
oposto a este. Determinou que certos crimes
sejam considerados hediondos, independente de
qualquer circunstância e à margem
do critério do julgador.
A
individualização da pena foi um
progresso do Direito conquistado no evolver
da História. Não resultou do capricho
deste ou daquele legislador, mas de um avanço
da cultura humana, no campo do Direito, da Criminologia,
da Antropologia, da Sociologia.
A
lei dos crimes hediondos derruba o princípio
da individualização da pena e
representa um retrocesso científico.
O
Poder Judiciário, devidamente provocado,
tem entendido que “a lei dos crimes hediondos”
não fere a Constituição
Federal. No próximo dia 26, o Supremo
Tribunal Federal deverá examinar, em
caráter concludente, se a lei é
ou não inconstitucional.
Creio
que a lei dos crimes hediondos agride frontalmente
a Constituição, pois que esta,
no item 46 do artigo 5º, estabelece textualmente
que a lei regulará a individualização
da pena.
Oponho-me
à lei dos crimes hediondos, não
pelo motivo colocado pelo Ministro da Justiça
(superlotação dos presídios),
mas porque a lei em si consagra, a meu ver,
um tratamento científico errôneo
da matéria, além de ser flagrantemente
inconstitucional.
João
Baptista Herkenhoff é Livre-Docente da
Universidade Federal do Espírito Santo,
Juiz de Direito aposentado e escritor. E-mail:
jbherkenhoff@uol.com.br
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