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               Direitos
              Humanos – Uma Idéia, muitas Vozes 
              João Baptista
              Herkenhoff
               Décima
              quarta parte - Capítulo 48
              
              
              
               
              DIREITOS HUMANOS E JUSTIÇA
              
               
              NAS RELAÇÕES ECONÔMICAS INTERNACIONAIS
               
                
              A Questão dos
              Direitos Humanos no Hemisfério Sul
              
              
              1.
              Uma abordagem específica, sem prejuízo da pertinência da
              abordagem geral
              
              
              
               
              Nos
              países do que tradicionalmente se chamou “Terceiro Mundo”,
              sem prejuízo da validade de certas análises universais, os
              Direitos Humanos exigem também a análise por uma perspectiva própria.
              
               
              Um
              livro produzido na América Latina, no Brasil, não se poderia
              furtar ao enfrentamento do tema. E o que tentaremos fazer.
              
              
              
               
              2.
              Os mecanismos injustos do comércio exterior. As desvantagens
              sofridas pelos países do Terceiro Mundo
              
              
              
               
              O
              Terceiro Mundo ou Hemisfério dos pobres (Hemisfério Sul), pela
              grande maioria dos países que o integram, caracteriza-se por ser
              exportador de produtos primários e importador de produtos
              industrializados. Os produtos primários são vendidos a baixo preço.
              Os produtos industrializados são caros. A balança de pagamentos,
              em consequência, é, em regra, desfavorável aos países pobres.
              
               
              Mesmo
              quando o país exporta produtos industrializados, como é o caso
              do Brasil, sua situação de dependência é mantida por força de
              mecanismos injustos de comércio internacional e pelo império do
              dólar como medida de valor.
              
              
              
               
              3. Balança comercial: o caso brasileiro
              
              
              
               
              O
              Brasil é um país rico que muito produz e muito exporta.
              Entretanto, como acontecia com os antigos lavradores das fazendas
              brasileiras (quando não havia legislação trabalhista), estamos
              sempre devendo. Nossa dívida é eterna.
              
               
              Num
              pronunciamento feito em 1985, na Suíça, o Cardeal Paulo Evaristo
              Arns declarava que, nos dois anos precedentes, a balança
              comercial brasileira apresentara um superávit de um bilhão de dólares
              por mês. Mas esse dinheiro, observava o Cardeal, servira
              unicamente para pagar os juros da dívida. Não podemos continuar
              assim, arrematava.
              
              
              
               
              4. A atualidade do problema
              
              
              
               
              De
              tal forma a questão da injustiça das regras do comércio
              exterior e a questão da opressiva dívida externa dos países do
              Hemisfério Sul é omitida, pela grande imprensa, que pode parecer
              ao observador desavisado que este assunto ficou para trás, matéria
              resolvida, problema arquivado.
              
               
              Raramente,
              articulistas se ocupam do tema. Mas a dívida externa continua a
              oprimir as nações supostamente devedoras, inclusive o Brasil.
              
               
              Em
              artigo publicado em 23 de março de 1998, na Tribuna da Imprensa,
              Conrado Pereira denuncia que o Governo Federal desviou 632 milhões
              de dólares do Fundo de Marinha Mercante (FMM) para abater a dívida
              externa brasileira. Os recursos do FMM são originários da cobrança
              do adicional de 25% sobre o valor do frete das importações
              brasileiras. O presidente da Confederação Nacional dos Transportes
              Aquaviários condenou a medida, por sua ilegalidade e por ser
              contrária aos interesses do país. O valor do desvio é
              equivalente a 0,63% da dívida externa total de 188 bilhões 452
              milhões de dólares, segundo dados do Banco Central.
              
               
              O
              jornalista Hélio Fernandes observou que nunca seria possível
              pagar uma “divida externa”, que cresce geometricamente, com
              exportações que crescem apenas aritmeticamente. O resultado é
              que os banqueiros, que nos impuseram a divida, estão agora
              comprando as grandes empresas nacionais (usinas siderúrgicas,
              centrais hidroelétricas, Vale do Rio Doce) usando os “dólares
              podres” do endividamento externo, com grande prejuízo para o
              Brasil (artigo publicadoem2l e22demarçode 1998).
              
               
              Fazendo
              coro ao pronunciamento do Cardeal Arns, que é de 1985, Angélica
              Wiederhecker, em matéria publicada no Jornal do Brasil, edição
              de 30 de março de 1998, mostra que a situação, na sua essência,
              não mudou. Escreve Angélica Wiederhecker:
              
               
              “O
              governo federal já consumiu R$ 17,44 bilhões em receita de
              privatização no abatimento da dívida pública desde o inicio
              efetivo do Programa Nacional de Privatização, em 1991, até o
              ano passado. O montante, registrado em levantamento do Ministério
              da Fazenda sobre os resultados do programa, nos últimos sete
              anos, pouco contribuiu para amenizar o crescimento da dívida da
              União. Somente no ano de 1997, o Tesouro Nacional amargou uma
              conta de juros nominais (incluída a inflação) de R$ 26,7 bilhões.
              
               
              Este
              total é bem superior ao resultado global da venda de empresas
              estatais federais ao longo do período compreendido entre 1991 e
              1997, que foi de R$ 22,59 bilhões. A maior parte deste montante
              foi utilizada para abater dívida (R$ 92,01%).
              
               
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