Gênese
dos
Direitos Humanos
Volume I
João Baptista
Herkenhoff
HISTÓRIA
DOS DIREITOS HUMANOS NO BRASIL
13.
A Constituição de 1934 e os Direitos Humanos
A
Revolução Constitucionalista de 1932 e a voz dos que se levantaram
contra a prepotência precipitaram a convocação da Assembléia
Constituinte, em 1933.
Vencidos no
embate das armas os paulistas foram historicamente vencedores. Graças a
sua resistência. o arbítrio de 193o teve de ceder.
Antecipando
os trabalhos da Constituinte, um projeto de Constituição foi elaborado
por uma Comissão que veio a ficar conhecida como Comissão do Itamarati.
Recebeu esse nome, como fruto do uso, porque se reunia ao Palácio do
Itamarati.
A
Comissão do Itamarati foi nomeada pelo Governo Provisório. Dela faziam
parte figuras destacadas do mundo político e jurídico do pais como Afrânio
MeIo Franco, Carlos Maximiliano, José Américo de Almeida, Temístocles
Cavalcanti e João Mangabeira. Este último exerceu um singular papel de
vanguarda advogando, na Comissão do Itamarati, as teses mais avançadas
para sua época.
O
anteprojeto constitucional foi bastante discutido no interior da Assembléia
Constituinte. For criada uma Comissão Constitucional. Nomearam-se
relatores parciais que se encarregaram de estudar os diversos capítulos
do anteprojeto elaborado pela Comissão do Itamarati. Foi escolhida uma
Comissão de Revisão, para dar acabamentos ao texto, antes que fosse
votado pela Assembléia Constituinte.
A
participação popular foi, entretanto, bastante reduzida. Um dos motivos
dessa carência de participação foi a censura à imprensa. Esta vigorou
durante todo o período de funcionamento da Constituinte.
Apesar
dessa censura extremamente deplorável, a Constituição de 1934
restabeleceu as franquias liberais, suprimidas pelo período autoritário
que se seguiu à Revolução de 1930. As franquias foram mesmo ampliadas.
14.
Franquias liberais da Constituição de 1934
A Constituição
de 1934:
-
determinou
que a lei não prejudicaria o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;
-
explicitou
o principio da igualdade perante a lei, estatuindo que não haveria
privilégios, nem distinções, por motivo de nascimento, sexo, raça,
profissão própria ou dos pais, riqueza, classe social, crença
religiosa ou idéias políticas;
-
permitiu a
aquisição de personalidade jurídica, pelas associações
religiosas, e introduziu a assistência religiosa facultativa nos
estabelecimentos oficiais;
-
instituiu
a obrigatoriedade de comunicação imediata de qualquer prisão ou
detenção ao juiz competente para que a relaxasse. se ilegal.
promovendo a responsabilidade da autoridade co-autora;
-
manteve
o habeas-corpus, para proteção da liberdade pessoal, e instituiu o
mandado de segurança, para defesa do direito, certo e incontestável,
ameaçado ou violado por ato manifesta incute inconstitucional ou
ilegal de qualquer autoridade;
-
vedou a
pena de caráter perpétuo;
-
proibiu a
prisão por dividas, multas ou custas;
-
impediu a
extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião e, em
qualquer caso, a de brasileiros;
-
criou a
assistência judiciária para os necessitados;
-
determinou
ás autoridades a expedição de certidões requeridas, para defesa de
direitos individuais ou para esclarecimento dos cidadãos a respeito
dos negócios públicos;
-
isentou de
imposto o escritor, o jornalista e o professor;
-
atribuiu a
todo cidadão legitimidade para pleitear a declaração de utilidade
ou anulação dos atos lesivos do patrimônio da União, dos Estados
ou dos Municípios.
15.
A Constituição de 1934 e a proteção social do
trabalhador
A par das
garantias individuais, a Constituição de 1934, inovando no Direito
brasileiro, estatuiu normas de proteção social do trabalhador. Para esse
fim, esposou os seguintes princípios:
-
proibição
de diferença de salário para um mesmo trabalho, por motivo de idade,
sexo, nacionalidade ou estado civil;
-
salário
mínimo capaz de satisfazer à necessidades normais do trabalhador.
-
limitação
do trabalho a oito horas diárias, só prorrogáveis nos casos
previstos pela lei;
-
proibição
de trabalho a menores de 14 anos, de trabalho noturno a menores de 16
anos e em indústrias insalubres a menores de 18 anos e a mulheres;
-
repouso
semanal, de preferência aos domingos;
-
férias
anuais remuneradas;
-
indenização
ao trabalhador dispensado sem justa causa;
-
assistência
médica sanitária ao trabalhador;
-
assistência
médica à gestante, assegurada a ela descanso antes e depois do
parto, sem prejuízo do salário e do emprego;
-
instituição
de previdência, mediante contribuição igual da União, do
empregador e do empregado, a favor da velhice, da invalidez, da
maternidade e nos casos de acidentes de trabalho ou de morte;
-
regulamentação
do exercício de todas as profissões;
-
reconhecimento
das convenções coletivas de trabalho;
-
obrigatoriedade
de ministrarem as empresas, localizadas fora dos centros escolares,
ensino primário gratuito, desde que nelas trabalhassem mais de 50
pessoas, havendo, pelo menos, 10 analfabetos;
-
criação
da Justiça do Trabalho, vinculada ao Poder Executivo.
16.
A Constituição de 1934 e os Direitos Culturais
Também
cuidou a Constituição de 1934 dos direitos culturais, sufragando os
seguintes princípios, dentre outros:
-
direito
de todos à educação, com a determinação de que esta
desenvolvesse, num espírito brasileiro, a consciência da
solidariedade humana;
-
obrigatoriedade
e gratuidade do ensino primário, inclusive para os adultos, e tendência
à gratuidade do ensino ulterior ao primário;
-
ensino
religioso facultativo, respeitada a confissão do aluno;
-
liberdade
de ensino e garantia da cátedra.
17.
Visão geral da Constituição de 1934
Juízo
bastante positivo sobre a Constituição de 1934 é lavrado por Paulo
Bonavides e Paes de Andrade. Pensam esses autores que essa Constituição
guiava o pensamento da sociedade e a ação do Governo para um programa de
leis cujo valor maior recaia no bem comum.
Instituindo
a Justiça Eleitoral (art. 82 e seguintes) e o voto secreto (art. 52, 1º),
abrindo os horizontes do constitucionalismo brasileiro para os direitos
econômicos, sociais e culturais (art. 115 e seguintes, art. 148 e
seguintes), creio que a Constituição de 1934 representaria a abertura de
nova fase na vida do pais, não fosse a sua breve vida e a sua substituição
pela Carta reacionária de 1937.
A
Constituição de 1934, - que respeitou os Direitos Humanos -, vigorou até
a introdução do Estado Novo, a 10 de novembro de 1937, ou seja, durante
mais de 3 anos.
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