Juristas
denunciam FHC por
crime de responsabilidade
O jurista Dalmo Dallari,
ex-diretor e professor titular da Faculdade de Direito da USP,
apresentou denúncia contra FHC por crime de responsabilidade,
que, se for acatada pela Câmara dos Deputados, pode resultar em
processo de impedimento. Junto com os também juristas Fábio
Konder Comparato, Godofredo da Silva Telles Jr., Celso Antônio
Bandeira e Paulo Bonavides, Dallari quer saber por que o
presidente liberou recursos da União para vinte deputados
retirarem as assinaturas do requerimento pela instalação da CPI
da Corrupção, e, em entrevista ao PÚBLICO, justifica a sua
iniciativa alegando que a atitude de FHC desrespeita a Constituição
e a Lei.
PÚBLICO. O que os motivou a
apresentar a denúncia contra FHC?
Dalmo Dallari. Nós todos vimos, pela
imprensa, que o governo federal negociou com vinte deputados
federais a retirada das suas assinaturas do requerimento pela
instalação da CPI da Corrupção, oferecendo em troca a liberação
de recursos orçamentários para os seus respectivos redutos
eleitorais. Além de se tratar de um procedimento condenável, sob
o ponto de vista ético, essa atitude constitui um grande
desrespeito à Constituição Federal e à Lei, uma vez que, com
isso, o presidente da República interfere diretamente na
autonomia de um dos três poderes constituídos — no caso, a do
legislativo federal.
P. Mas FHC alega que a ação se
baseia em noticiários jornalísticos...
DD. Ele teria razão se a informação
fosse isolada, mas, afora a liberação de verbas ter sido notícia
na imprensa, na Internet, vê-se que ela ocorreu justamente às vésperas
da apresentação do pedido de instalação da CPI.
P. Em que pé está a denúncia por
crime de responsabilidade? DD. A Lei n.o 1.079, de 10 de abril de
1950, que trata dessa questão, e o Regimento Interno da Câmara
dos Deputados dizem que essa denúncia deve ser apresentada à
mesa diretora da casa, e o seu presidente — no caso, o deputado
federal Aécio Neves (PSDB-MG) — deve apresentar um parecer, que
tanto pode recomendar pelo arquivamento da denúncia quanto pela
abertura do processo no Plenário da Câmara; no entanto, qualquer
que seja a sua decisão, ela é passível de recurso ao Plenário.
Como o deputado deu parecer favorável ao arquivamento da denúncia,
já apresentamos um recurso contra a decisão, que deverá ser
discutido e votado pelo conjunto dos deputados.
P. Ainda na aprovação da emenda
da reeleição, na qual tinha interesse direto, FHC não foi
acusado de utilizar o mesmo expediente?
DD. Sim. Na época, a imprensa
denunciou alguns deputados e o valor das negociações; o PFL
expulsou dois deputados e Sérgio Motta, então ministro das
Comunicações, foi identificado como principal articulador.
P. FHC, a todo momento, interfere
na autonomia dos demais poderes: no Legislativo, comprando votos e
abusando de medidas provisórias; no Judiciário, o Supremo
Tribunal Federal não contribui para isso?
DD. A nossa suprema corte, é verdade,
tem contribuído para isso, e por diferentes razões. Uma delas é
o fato de, na casa, haver um ministro — Nelson Jobim, que foi
deputado federal pelo PMDB do Rio Grande do Sul — que se
comporta como se o papel que lhe coubesse fosse o de líder do
governo no STF. Há processos que não interessa ao Executivo
federal que sejam votados e que, justamente em virtude dos pedidos
de vistas desse ministro, estão há três anos em tramitação.
P. O presidente, além de revelar
desrespeito à Lei, não revela, também, um abandono dos princípios
que formaram o sociólogo FHC?
DD. As atitudes demonstram isso de
forma definitiva. É por isso que o seu governo ostenta baixos índices
de popularidade e que, dificilmente, o seu partido vai ter sucesso
nas próximas eleições.
P. O fato do servidor público
federal estar há sete anos sem reajuste mostra que o governo não
se preocupa com as demandas sociais?
DD. A política resulta do acordo do
governo com o FMI — que também desrespeita as normas, pois a
Constituição exige que seja aprovado pelo Congresso — e
evidencia o seu descompromisso com o cidadão.
(Entrevista a Flávio Loureiro)
|