Por que contra
os EUA
Leonardo
Boff
Mais importante do que saber quem
praticou os perversos atos de terror nos Estados Unidos é
identificar as causas que levaram a tais expressões de demência.
As causas seguramente não se restringem aos EUA mas, de certa
forma, alcançam toda a cultura ocidental, com sua história de
colonialismo, de imperialismo e de terror levados a todos os
quadrantes da Terra. As conseqüências traumatizam as vítimas
até os dias de hoje.
Queremos
transcrever as palavras de um bispo norte-americano que expressa
o que muitos seguramente sentem. Seu nome é Robert Bowman,
bispo de Melbourne Beach, Florida. Antes, fora piloto de caças
militares e realizara 101 missões de combate durante a guerra
do Vietnam. Fez-se depois padre católico e finalmente bispo.
Há pouco tempo,
escreveu uma carta aberta ao presidente Clinton, por ocasião
dos bombardeios de Nairóbi e Dar es Salaam, onde as embaixadas
norte-americanas haviam sido atacadas pelo terrorismo. Seus
termos podem ser aplicados com mais razão a George W. Bush e à
guerra que coordena contra os talibãs no Afeganistão.
''O senhor disse
que somos alvos de ataques porque defendemos a democracia, a
liberdade e os direitos humanos. Que piada!
Somos alvos de
terroristas porque, em boa parte do mundo, nosso governo defende
a ditadura, a escravidão e a exploração humana. Somos alvos
de terroristas porque nos odeiam. E nos odeiam porque nosso
governo faz coisas odiosas.
Em quantos países
agentes de nosso governo destituíram líderes escolhidos pelo
povo, trocando-os por ditaduras militares fantoches, que queriam
vender seu povo para sociedades multinacionais norte-americanas!
Fizemos isso no
Irã, quando os fuzileiros navais norte-americanos e a CIA
destituíram Mossadegh porque ele queria nacionalizar a indústria
do petróleo. Nós o trocamos pelo Xá e armamos, formamos e
pagamos sua odiada guarda nacional Savak, que arrasou e cometeu
brutalidades contra o povo do Irã. E tudo isso para proteger os
interesses financeiros de nossas companhias petrolíferas.
Podemos achar estranho que haja no Irã que nos odeie?
O mesmo fizemos
no Chile e no Vietnam. Mais recentemente, tentamos fazer no
Iraque. Quantas vezes não o fizemos na Nicarágua e no resto
das repúblicas ''das bananas'' da América Latina? Muitas vezes
expulsamos líderes populares que queriam a divisão das
riquezas da terra entre as pessoas que nela trabalham. Nós os
substituímos por tiramos criminosos para que vendessem seu povo
e para que a riqueza da terra fosse levada pela Domino Sugar,
United Fruit Company, Folgers e Chiquita Banana.
País após país,
nosso governo se opôs à democracia, sufocou a liberdade e
violou os direitos do ser humano. Essa é a causa pela qual nos
odeiam em todo o mundo. Essa é a razão de sermos alvos dos
terroristas.
Em vez de enviar
nossos filhos e filhas pelo mundo inteiro para matar árabes e,
assim, termos o petróleo que há sob sua terra, deveríamos
enviá-los para reconstruir sua infra-estrutura, beneficiá-los
com água potável e alimentar as crianças em perigo de morrer
de fome.
Em vez de treinar
terroristas e esquadrões da morte, deveríamos fechar a Escuela
de las Americas. Em vez de patrocinarmos a rebelião, a
desestabilização, o assassinato e o terror no mundo inteiro,
deveríamos abolir o atual formato da CIA e dar dinheiro para as
agências de ajuda.
Essa é a
verdade, senhor presidente. Isso é o que o povo norte-americano
deve compreender.''
O texto,
publicado no National Catholic Reporter, está em português
na Agenda Latino-Americana 2001, página 181).
Não é com mais
terrorismo que se combate o terrorismo. Mas com a coragem de
colocar o dedo na ferida e de introduzir formas cooperativas de
relações internacionais, ao invés opressoras. Então o
terrorismo perderá sua motivação e sua equivocada razão de
ser.
Leonardo Boff
é teólogo e escritor