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EDUCAÇÃO PARA A TOLERÂNCIA:
OU A BUSCA DO HUMANO

 

Rosa Emília Salamanca
Maria Cristina de Vargas
Wilson Tolosa
Gérman Niño

 

         Nossa proposta neste artigo é apresentar uma discussão sobre a educação para a tolerância. Inicialmente, abordaremos brevemente o papel da educação nos processos de sustentação e transformação das condições sociais, econômicas, políticas e culturais. Na sequência, analisaremos as diferentes concepções que, em termos de desenvolvimento, temos em nossos países e sua incidência na realização plena de nossa gente. Ainda, localizaremos dentro desta problemática o papel do conflito na dinâmica pessoal e social. Concluiremos com nossa apreciação em torno das condições que deveria ter a educação para a tolerância, seu marco conceitual e os espaços para seu desenvolvimento.

 

-         Educação e Sociedade.

Para adiantar este trabalho é necessário estabelecer a condição e o papel que a educação desempenha na dinâmica social.

A educação tem o papel de transmitir as idéias, princípios, normas e valores que constituem a identidade e cultura de uma nação, de uma comunidade, e que seu desempenho está explicitamente ligado à socialização dos indivíduos em seu contexto. Isto implica reconhecer que a educação não se restringe à escola, mas, ao contrário, é vivida em múltiplos espaços de nossas vidas, em nossas relações de parceria, de família, na escola, nas relações comunitárias e nos espaços da vida pública.

Se nossa educação está imersa na dinâmica que os indivíduos têm em seu contexto particular, ela não está alheia, portanto, a seus problemas e soluções, devendo buscar sua explicação dentre as contradições que a sociedade manifesta e das quais não se pode escapar. Esta condição lhe confere seu caráter essencialmente humano e político.

O problema da educação é um fator determinante na mudança social. Porém, existe a tendência de considerá-la à margem da dinâmica do mundo do real, pelas mesmas circunstâncias em que ela tem se desenvolvido historicamente.

Então, a educação assume umas características, fundamentalmente, do tipo ideológico, onde o conhecimento é separado das bases reais e materiais da existência dos indivíduos em seu relacionamento social, sua situação de classe, gênero, etnia, etc. Ela aliena, desta forma, a possibilidade do conhecimento como construção - desconstrução - construção coletiva, onde o referencial básico deve ser a busca de um viver melhor, no marco de uma cultura particular.

     Descontextualizar os processos educativos com o objetivo fundamental de fazer deles espaços de difusão e adequação tecnológica (mediante a implementação de métodos do tipo autoritário e vertical funcionam ao aparato produtivo, de desconhecimento do fator humano inerente a todo processo de comunicação), vai configurando, de uma maneira lenta e tolerada, referenciais particulares nos indivíduos onde o outro/a é assumido/a na interação social, com os mesmos parâmetros sob os quais foi desenvolvido seu “processo educativo”. Contudo, não é intenção, e , ademais, tampouco é suficiente colocar que os métodos e práticas educativas ultrapassadas são as causadoras deste fenômeno, ainda que realmente elas tenham uma alta cota de responsabilidade nas práticas intolerantes dos cidadãos.

Por esta razão, podemos que a educação tem um importante compromisso a assumir na construção das idéias e das características de relação que as pessoas geram em nossas sociedades, assim como na permanência ou mudança das condições sociais, econômicas, políticas e culturais. É justamente aqui que está sua responsabilidade e a impossibilidade de desligá-la de seu contorno. Assim, adentraremos um pouco nos diferentes fatores que incidem no vir a ser de nossa existência.

 

A CONSTRUÇÃO DO SOCIAL: A ETERNA BUSCA

 

         Indagar sobre desenvolvimento é ter um sonho, uma utopia como resposta. O desenvolvimento resulta da relação entre a vida interior de cada pessoa e as forças externas que determinam a existência desta. Aspirações individual e social que percorrem a história, confundem-se com um bem supremo, com a felicidade a que tendem nossas ações e projetos. Hoje podemos chamar este sentimento como o Bem-estar, ou seja, a causa final das atividades dos seres humanos, o fim supremo da vida.

         A idéia de bem-estar envolve um processo de desenvolvimento social, em uma relação de dupla via em que esse bem-estar individual é a base do desenvolvimento social e vice-versa, o modelo de desenvolvimento social influi diretamente na definição do bem-estar individual.

         Este bem-estar que não resulta de nenhum ato divino; implica na eleição de objetivos, está arraigado na construção do mundo real, concebendo a vida como produto da socialização e experiência individual, incluindo dentre outros: valores, objetivos, formas de vida, diferentes culturas, projetos por alcançar, fins e meios. Significa dizer: o bem-estar faz parte de nossos sonhos e esperanças possíveis. Seu compromisso é a busca e aquisição de bens satisfatórios às aspirações e necessidades.

         A extrema valoração em se adquirir esses bens deu margem a questionamentos sobre crenças tais como a de que o crescimento econômico é bom para a humanidade, o que supostamente é certo. “O problema surgiu quando o “bom” se converteu em sinônimo de “mais e mais” (...) obsessão esta que gerou em nosso conceito de justiça social, especialmente sob o capitalismo. A justiça social confunfiu-se com o próprio crescimento”. (Man Neef, 1982. Pg.59).

         As mudanças abriram campo para a reorganização de forças sociais e de poder, brindando a possibilidade de acesso a novos cenários, ainda que os efeitos não tenham sido equitativos e nem comuns para a população em geral, dado que as condições sociais para o desempenho nesses campos não serem as melhores. Por um lado, como ponte dos principais benefícios, encontram-se os grupos econômicos que fortaleceram sua posição de poder; por outro, encontram-se os trabalhadores assalariados (privados ou públicos) para quem os efeitos tem sido negativos com a perda de oportunidade no mercado de trabalho (trabalho formal), produto das novas exigências do modelo econômico.

         Assim, dia a dia, existe maior concentração de bens materiais em uns poucos, frente a insatisfação das necessidades da população em geral, refletindo em efeitos negativos como: o avançado crescimento do trabalho informal, o regresso da exportação de produtos de origem primária (matérias primas) e o aumento da dívida social, produto do crescimento de pobres na América Latina.

         Do contexto anterior, surgem novas problemáticas sociais, que, de acordo com sua causalidade, dimensão e composição, restam validez à soluções postas (desenvolvimento e neoliberalismo), desde as perspectivas tradicionais reducionistas, onde se concebe o êxito em relação com o aumento da abundância econômica. Para o comum da população, isso “não só é inalcançável, como espiritualmente é insatisfatório” (Ikeda e Toynbee, 1992). Isto leva à impossibilidade de impor soluções para a dívida social, só em termos de pobreza e necessidades básicas insatisfeitas, pois os efeitos dos modelos econômicos implantados  tem repercutido, entre outros, na estrutura cultural de nossas sociedades. Exemplo disso, está no caso de narcotráfico e da violência generalizada. Ademais, nos encontramos frente a uma crise de modelos econômicos de desenvolvimento, pois os hoje existentes dificilmente podem se contrapor à complexa situação atual da política social.

         De acordo com esta realidade, é importante pensar na decisão entre desenvolvimento e crescimento; identificar os adjetivos do desenvolvimento e assinalar as diferenças com os mecanismos para alcançá-los. E, mais do que tudo isso, compreender que para alcançar a equidade, é necessário entender a integridade do ser humano, buscando formas que possibilitem o desenvolvimento e o bem-estar de seu ser em plenitude desde uma perspectiva de satisfação e não da maximização da eficácia.

         Falar em bem-estar e desenvolvimento individual corresponde a criação de condições, nas quais cada ser humano tenha a oportunidade de construir sua “personalidade”, entendida como a relação particular e dinâmica de sua capacidade de pensar, sentir e construir realidades. Este compromisso individual e, depois coletivo, implica em reconhecer o modo em que estabelecemos nossa relação com o meio natural e outros seres humanos, possibilitando a apropriação individual sobre as possíveis soluções à carências, bem como, a participação ativa no processo de alcançar os desenvolvimentos individual e social. Igualmente, esta mudança conceitual impulsionou a valorização de outros recursos pessoais, possibilitando o acesso ao bem-estar integral por parte de um número maior de pessoas de setores reconhecidos como economicamente inativos, como de crianças, pessoas da terceira idade e donos de casa.

         A diferença das necessidades próprias à condição humana, a satisfação ou o bem-estar são criados culturalmente. Portanto, a qualidade de vida proporcionada às pessoas por um modelo de desenvolvimento, depende do tipo de bem-estar implantado por este. O sucesso do bem-estar individual está sujeito ao processo social e ao individual. E este é um ponto por onde podemos iniciar um processo de mudança, reeducando na valorização dos recursos e os desejos individuais em face destes, permitindo a atualização das necessidades humanas.

         O processo de desenvolvimento como todo processo humano originou-se dentre profundas contradições, obedece confrontos de interesses de diversas índoles. Não existe uma idéia única a seu respeito. Cada sociedade e cultura tem sua própria concepção de desenvolvimento de bem-estar, o que nos leva a refletir sobre o fato de que o desenvolvimento não tem um caráter neutro, mas sim, é uma resposta comum a múltiplos interesses.

          Na idéia de desenvolvimento, revela-se claramente o tipo de relações que temos e o que aspiramos ter com o meio ambiente que nos rodeia, bem como os que internamente desenvolvem-se entre os seres humanos; é a construção dos imaginários que, como sociedade, temos e/ou queremos, a partir de uma perspectiva integral.

 

2- A PARTICIPAÇÃO: UMA POSSIBILIDADE DE INTERVENÇÃO E OS FATORES QUE INCIDEM NO DESENVOLVIMENTO

 

         Ainda que a possibilidade de bem-estar e de felicidade tem se esquivado para a grande maioria das populações mundiais, elas continuam sendo nossos objetivos últimos. Isto evidencia a necessidade de nos centrarmos no impulso da participação, que leva a definir o bem-estar pretendido.

         Ignorar o bem-estar a que todo ser humano tem direito é muito diferente do que defender ou participar do desenvolvimento junto àqueles que, a partir do mercado, definem o bem-estar dos outros.

         Queremos chegar a ser iguais na diferença. Queremos que desenvolvimento não seja igual à destruição. Queremos que desenvolvimento, evolução, felicidade e sabedoria cheguem a comer juntos na mesma mesa.

         Como nos coloca Consuelo Corredor: “Penso que em nossos países um objetivo fundamental, segundo nosso ponto de vista, deve ser o propósito explícito e prioritário do alcance da igualdade. Creio que a igualdade, se é um fim do desenvolvimento, as demais políticas e estratégias, por consequência, deveriam orientar-se claramente à consecussão da igualdade. Nesta perspectiva de busca da igualdade, creio haver muitos esforços, não só a nível de América Latina. Porém, gostaria de destacar o aporte de Amargia Senn, e deve ser, quando ele nos propõe que o importante e o fundamental não é o que a gente tem, mas basicamente, a pergunta deve ser:

         Que tipo de vida está tendo e o que está logrando SER e FAZER ?

         E nesta medida fizermo-nos com que o verbo TER perde importância frente ao verbo SER e FAZER.

         Este ser e poder fazer define, então, que os seres humanos são CLIENTES do desenvolvimento. Somos, ou melhor, devemos ser atores permanentes do mesmo. Porém, para ele devemos chegar a participar nos 2 níveis de decisão. Ali onde se define que é importante, onde se deve investir, como se deve investir e em quem se deve investir.

         Chegar é fácil, participar é o difícil. Por que? Porque estamos falando da responsabilidade de participar na construção permanente de um modelo ou modelos de desenvolvimento que tenham um princípio básico: o ser humano deve controlar seu desenvolvimento (evolução, sabedoria), não é o desenvolvimento (Ter, poder) o que deve controlar o ser humano.

         O mercado está se convertendo em amo e senhor do mundo, o capital é a nova religião dos nossos templos.

         Porém, a esta religião só se pode contrapor o ser humano: no, que, decididamente, a partir dos valores da solidariedade, de respeito, da cooperação, pode chegar à utilização dos recursos que estejam a nosso alcance para parar este gigantesco monstro. É a luta definitiva por poder SER na discussão que TODOS e TODOS sonhamos.

         Nós, seres humanos necessitamos de, relativamente, pouco para podermos sobreviver, mas de muito para podermos nos desenvolver em todas as dimensões e com todas as capacidades que a natureza nos brindou.

         Se acharmos os indicadores formais nos perguntaríamos: Contamos ou não com um lugar para viver? Contamos com comida para nos alimentarmos? Contamos com roupa para que no frio nos aqueçamos? Se é assim, não é muito o que nos diferencia de outros animais. Entretanto, se perguntamos: Quantos moramos na mesma casa? Que qualidade de habitação temos, se reconhecem e reconhecemos as necessidades e os direitos das diferentes pessoas que dormem sob o mesmo teto? Aí as coisas começam a mudar. Esta casa conta com água potável? Que tipo de energia utilizamos para cozinhar, de onde sai esta energia? Esta energia que hoje utilizamos, seria possível continuar usando no futuro? Quer dizer, podemos começar a romper este círculo com a pergunta, com a certeza de que se esteja respeitando em nossa integridade humana; e resistindo a que se continue nos desrespeitando porque o modelo necessita sacrifícios.

         Portanto, o desenvolvimento deve ser um FATO HUMANO, fruto de uma inter-relação entre os fatores econômicos, sociais, políticos, culturais e ambientais. Faz parte do passado, presente e futuro das sociedades e responde as particularidades de cada lugar. Tem a missão básica de satisfazer os interesses materiais e espirituais de cada um, em termos de liberdade, e a igualdade em dignidade e direitos que temos como seres humanos, promovendo o progresso social para elevar o nível de qualidade de vida dentro de um conceito mais amplo de liberdade.

         Em palavras de Patrício Portocarrero: “é concebido como um veículo de mudança social no econômico, institucional, político, social e pessoal, que para ser válido deve conter, em si, o princípio de sua própria continuidade, que é contar com o compromisso e consenso dos que trabalham por ele.

         Esta auto-sustentabilidade do desenvolvimento, baseado no consenso, implica o reconhecimento do caráter democrático que acompanha esta visão, onde somos nós os/as que devemos definir o que queremos. Nesta medida, qualquer política ou programa deve remeter-se aos grupos interessados, deixando de ser receptores passivos e convertendo-se em protagonistas ativos individuais e coletivos. Trata-se da prática de ir definindo a organização social, ir construindo a sociedade que se quer, de ir também conhecendo nossos limites que, para ampliar-se, deveriam nos impulsionar à reflexão sobre as alianças correspondentes em cada momento, sobre os setores que coincidem conosco. Por último, o modelo encarregado de nos ligarmos a tendências macro, ou de pressionar por determinadas políticas, econômicas e sociais que, fazendo evidente a necessidade de um compromisso político, possa potencializar nossos objetivos e multiplicar nossos resultados.

         Conseguir que, como grupos beneficiários, se compartilhe seriamente a responsabilidade no processo referido, não só abre caminhos a propostas sociais como propicia a transformação dos beneficiários, constituindo, em si e por si, um exemplo de relação democrática que se concretiza através do processo de identificação do problema, busca de resposta e eleição de caminhos para o bem-estar.

         De alguma forma, esta via de caráter participativo supõe, em diversos sentidos, uma noção educativa diferente do que é o desenvolvimento e sua prática. Nela há uma proposta de comunicação entre classes, etnias, idades e gêneros. Ainda, ao incidir nas potencialidades integrais dos seres humanos, esta proposta centraliza-se não só no que os cidadãos podem Ter ou aceder, como no que possam SER.

Esta visão educativa do desenvolvimento exige uma atitude de busca, de inter-relação entre sujeitos diferentes que olham a realidade com olhos alertas e sensíveis, que recolhem experiência em sua história e em sua prática, subjetiva e objetiva, que lhes permitem modificar qualquer tipo de discriminação ou desigualdade, que dificulte o pleno desenvolvimento do elemento mais importante de uma sociedade: O CAPITAL SOCIAL HUMANO.

         Entender o Desenvolvimento em seus múltiplos aspectos, não é mais que reivindicar a complexidade do social e a necessidade de identificar todas aquelas relações e suas contradições baseados na desigualdade e no menosprezo ao “outro/outra” como sujeito ativo, capaz de controlar e atuar sobre seu destino.

         Proponhamos trabalhar para transformar condicionantes que limitam o desenvolvimento das pessoas, priorizando em cada espaço, a urgência de mudança ou de ação sobre um ou alguns deles. Porém, em qualquer dos casos supõe uma vontade política consciente individual e coletiva que promova a mudança e maior comunicação entre os seres humanos e suas diferenças.

        

A CONVIVÊNCIA: O RETO DO FUTURO

 

É necessário, inicialmente, estabelecer a estreita relação existente entre Desenvolvimento, Democracia e Conflito, afirmando que é impossível conceber alguns deles de maneira independente. Convém considerar as características que estes elementos adquirem nas diversas sociedades, dependendo do grau de satisfação material e espiritual que as pessoas alcançam dentro delas.  Poderíamos estabelecer que, na medida em que uma nação limita as possibilidades de expressão democrática e o horizonte de um desenvolvimento humano equitativo e perdurável, essa nação carrega tendências à manifestação não construtiva de conflito, ou seja, tendências à violência e à prostração dos povos, que é outra forma de violência. Contrariamente, onde a participação da cidadania propicia os espaços de diálogo, harmonização e  desenvolvimento é um esforço de todos, desde sua conceituação à sua prática, o conflito tem maiores possibilidades de transformar-se, de converter-se em conflitos construtivos que beneficiam a população.

Por outro lado, é claro que as dificuldades apresentadas ao nível global para a integração de interesses dos diversos setores sociais, representam um espaço às manifestações de intolerância, tanto em níveis de oportunidades num sistema de competitividade desigual; isso põe em jogo a sobrevivência dos indivíduos nas diferentes esferas sociais como: domínio, “status”, força de trabalho, educação, etc..., ocorrências estas de caráter permanente. Falamos aqui das profundas relações de desigualdade e iniquidade que se expressam nas classes sociais, setorizadas nas relações de gênero e etnia nos países do terceiro mundo. Desde o micro ao macro. Não é possível abordar o tema da tolerância sem partir necessariamente  de sua premissa fundamental: a diferença e o conflito. Onde manifesta a contradição, manifesta-se o conflito, a vida. Onde ele cessa,  ela morre. O conflito é a manifestação da confrontação das diferenças, fonte de mudança, de progresso, de movimento, do inesperado, do nunca compreendido, o não aceitado porém sempre presente, onipresente.

Na cotidianidade, quando o cidadão ou a cidadã aborda o conflito (ou é abordado por ele) , usualmente o assume como o impasse problemático a resolver - o negativo. Sempre o conflito é despojado da relação dialética que implica sua natureza e a qual faz dele um ente vivo que nasce, cresce, se transforma. Pelo conflito existe a tendência generalizada como reação imediata dos seres humanos a unilateralizar de maneira subjetiva o valor da contradição, e a eliminação desta não como objetivação de sujeitos ou circunstâncias postos em uma relação concreta (com interesses e mediações). Senão, contrariamente, subtraindo-se da vitalidade do movimento do real, ou, pelo menos, pretendendo subtrair-se dele. Podemos afirmar que, culturalmente, estamos condicionados para buscar eliminar a contradição pretendendo alcançar o equilíbrio. Porém ele, não como resultado de um conhecimento do fenômeno e sua superação dialética; mais que isso, como possibilidade de retornar à estabilidade perdida. O retorno ao ovo, ao paraíso, à seguridade garantida do conhecido e imutável, como diria Estanislao Zuleta.

Definitivamente, o estudo do conflito e o papel que ele joga dentro da dinâmica social, cultural, política e econômica está no centro da discussão sobre a tolerância e intolerância, na medida em que esta é uma expressão muito concreta, através da qual indivíduos ou coletividades dão saída à situação que consideram perigosa, a qual é causada pelo outro, o outro, o diferente, o que não faz parte do meu, o externo e inclusive o desconhecido.

Não logramos interpretar o mundo, a vida, o movimento e sua contradição dialética, como parte integral do permanente devir. Transmutou-se a qualidade e a quantidade. Quando pensamos no quantitativo não o assumimos como expressão de qualidade em magnitude, senão como algo que simplesmente é de maneira independente e autônoma, e nos esquecemos que um em verdade, sensivelmente não é possível sem o outro.

Esta lógica, plana, automática, é a que nos orienta à eliminação tácita e explícita do outro/a nos diferentes marcos de referência no social, mediante os mesmos procedimentos que nossa estruturação mental operacionaliza as diversas categorias com  as quais constrói o “conhecimento positivo”.

Esquecemos que os pares dialéticos são inerentes ao desenvolvimento da vida: o masculino e o feminino, o dia e a noite, o frio e o calor, o um e o outro, e que, definitivamente, o um é no outro, como o outro é no um. E que, o resultado da eliminação de algum deles é a eliminação essencial do outro. Para nos referirmos ao tratamento dos conflitos (e para ele o manejo dos termos de linguagem é muito condizente), falamos de solucionar um conflito ou resolução de conflitos. Esta terminologia não é casual e reflete de forma clara a intencionalidade dos contraditores de dar por terminado, cancelar/cessar a contradição, o objetivo é a restauração da harmonia perdida, a recuperação do espaço ou a posição em disputa.

Temos desenvolvido uma lógica matemática que operacionaliza os atos da vida como se eles fossem matéria morta (contável), suscetível de ser manipulado com o simplismo da causalidade e do efeito. Não foi possível gerar um pensamento que só veja a si mesmo, não como algo estático e imutável (verdade revelada), mas que assuma a dinâmica e as leis mesmas do movimento do real onde o ser humano é apenas uma parte de si e na totalidade.

Esta concepção do conflito em termos de vida dos seres humanos se expressa em múltiplos espaços e com uma dinâmica onde desempenha um papel determinante para a construção de sua identidade, na “pareja” como o primeiro espaço onde se manifesta a confrontação das diferenças, na escola, na vizinhança, na comunidade, ou seja, em toda a gama de encontros sociais que temos. Ali intervem na geração dos ideais e ações que determinam nossa convivência e a concepção de desenvolvimento que desejamos.

Quando Marx coloca a emancipação humana como objetivo último (utopia) do desenvolvimento das forças produtivas e do dever do social, o faz em termos de “humanizar a natureza e naturalizar o ser humano. No caminho dessa emancipação o ser humano participante obteve muito, fundamentalmente no que se refere à emancipação política, que se deu em termos de uma dominação sistemática que está muito longe dos termos em que poderia ser realidade - um homem natural e uma natureza humana”.

Para as sociedades ocidentais, o desenvolvimento humano utilizou como princípio a primazia do domínio sobre a natureza, a busco da liberdade. O que se concedeu em liberdade foi a emancipação política no marco restrito da democracia burguesa. “... Esta democracia compensa a submissão dos homens ao trabalho com a eleição cada vez mais a puro aparência - dos dominantes pelos dominados e com o melhoramento das condições de vida. Em outras palavras: na história pode-se medir de fato um progresso quantitativo.”

No entanto, a integração sistemática de uma sociedade ou sistema de sociedades, de maneira alienada garante a seus associados a produção, reprodução e satisfação de um sistema de necessidades de tipo econômico, religioso, social, etc.; podemos afirmar que conta com um grande exército de homens e mulheres que combaterão o outro/a, o desconhecido, o contraditor, naqueles momentos em que estes ponham em jogo as vantagens que o sistema brinda existencialmente.

Os exemplos do tipo sistemático e de melhorias comparativas ao longo da história, que implicam um mecanismo de coesão em seu interior, e intolerância, exclusão e segregação em seu exterior, refletem de maneira condizente. A importância dos processos estrutural nestes comportamentos de maneira generalizada em praticamente todas as sociedades existentes.

Esta pode ser a explicação para o recente fenômeno na Europa do auge dos movimentos de direita, neofascistas, racistas e xenofóbicos, como resposta às crescentes migrações de africanos, asiáticos e latinos e o embate dos políticos econômicos de corte neoliberal a nível mundial que, de fato, vem afetando tanto a nível de vida dos europeus, como seu próprio sistema de necessidades. Ou a explicação dos fenômenos de exclusão que padecem as populações de baixa renda para aceder, para se conformar com os espaços reais do poder nos países do sul.

Não se trata de grupos isolados, de desadaptados ou violentos sem causa, senão de sentimentos de frustração com tendência a generalizar-se ao grosso da população. O recente triunfo do partido da direita francesa nas eleições, sob a bandeira de impedir que os estrangeiros pudessem trabalhar no solo francês é um dos exemplos mais claros deste fenômeno. Mostramos ao cidadão comum, ao chauvinista temeroso de não poder satisfazer sua necessidade. Aí temos os Hooligans e seus espetáculos de violência, querendo saciar sua raiva, produto da desesperança: tem que acabar, ao contrário, destruir sua cor, desenterrá-lo do planeta e barrar as ondas de sua existência, queimar sua bandeira, que não fique nada dele !

O sistema de necessidades, a integração sistemática a nível social, as expectativas não cumpridas que marcam as seguidades, e a aguda luta entre classes, etnias, gêneros, e idades, se constituem em marcas de referência estrutural sob os quais é possível espreitar linhas de comportamento e tendências da ação social, onde a tolerância/intolerância se apresenta em uma imensa gama de expressões com uns rasgos e acentos particulares que respondem a cada contexto, a cada realidade social. Só estando atentos a estas manifestações pode ser possível definir estratégias e mecanismos de ação coerentes, que respondam ao que a realidade exige.

Como pudemos apreciar de forma tangencial, a intolerância se corresponde a fatores de diversa índole, desde as do tipo estrutural, que constituem nos indivíduos referenciais muito sólidos que se ativam quase que automaticamente até os que mediante fatos conjunturais não significativos no sistema geral de necessidades e valores são criados por interesses particulares imediatos.

 

O QUE É EDUCAÇÃO PARA A TOLERÂNCIA

(apenas alistei os conceitos)

 

“É colaborar para que o cidadão se libere de tudo o que impede desfrutar das coisas mais elementares da vida, vindas das violências direta ou da violência estrutural”. (Lederach)

 

“É um processo para conhecer, junto a outros, como mudar as relações sociais que criam violência. Ainda, é como adquirir a habilidade moral para eliminar os obstáculos sociais, que impedem a própria realização pessoal.” (Mario Boreli)

 

“A paz não se trata, somente, de um conceito a ser ensinado, mas, a realidade a ser vivida. É necessário experimentar um processo para a comunicação eficaz de valores, bem como dar a habilitação necessária à construção da paz. O meio é a mensagem. A metodologia tem que estar em conformidade com os valores da paz, da justiça, da não violência, a redor dos quais guia o conteúdo.” (Mcginnis)

 

“Educar para a paz não significa aplicar uma fórmula mágica, que converta as pessoas em gente pacífica; educar para a paz é bem mais que isso. É tratar de estimular o conflito, aceitá-lo como algo substancial 1a natureza humana, mas a partir de uma perspectiva criadora. Quer dizer: estão implícitos os mecanismos para regular, ou solucionar o mesmo conflito, satisfatoriamente.” (Fisas Vicent)

 

         Depreende-se desses conceitos, que a educação para a paz ou para a tolerância, trazem marcados um reconhecimento do social, onde as pessoas desempenham um papel ativo e a paz, ou tolerância, tem um rol de valores que se relaciona com a realidade, dinamicamente.

         Portanto, desta curta revisão de conceitos, queremos dar a conhecer nosso ponto de vista a respeito.

 

A COLHEITA: UMAS IDÉIAS PARA COMPARTILHAR

 

         Conceber um novo tipo de educação que corresponda às exigências de construção de uma sociedade mais justa e tolerante, é uma tarefa que implica várias considerações. Em primeiro lugar, esta educação que poderíamos denominar como “Educação para a tolerância”, venha a se desenvolver a partir do restabelecimento e fortalecimento da dinâmica existente entre a teoria e a prática, entendendo que entre ambos existe uma ligação dialética, permitindo aos sujeitos beneficiários utilizá-la como uma ferramenta para a crítica e transformação da realidade. Assim, adquire-se a condição de ser uma ferramenta para desentranhar todos os elementos de uma determinada situação, bem como o compromisso de contribuir para a construção de alternativas necessárias à solução.

         Sua construção dá-se mediante um compromisso entre as pessoas e a sociedade, em que aquelas possam viver em sua plenitude a capacidade de raciocínio, sentir e transformar sua realidade, através do exercício de valores como a solidariedade, a cooperação, a amizade, o respeito na diferença, o diálogo horizontal, a relação entre iguais, a transformação construtiva dos conflitos, a equidade, a democracia e a tolerância, permitindo, assim, gerar mudanças em todos os seus espaços de vida, desde sua dimensão mais íntima até os espaços mais públicos.

         É uma educação que permite reconhecer e promover um caráter político estreitamente ligado à solução das contradições da sociedade e das contradições próprias da educação, aberta à mudanças, à crítica, como uma condição inerente de seu “quehacer”. Isto implica em que a educação continua o horizonte ético que regulamenta sua concepção e prática.

         Outra condução que pensamos necessária estabelecer, é que a educação “juega um rol particular”, que não é a única ferramenta para entender e transformar a realidade, a qual para poder ser interpretada requer uma visão multidisciplinar, onde os poderes de outras fontes do conhecimento se relacionam com os da educação, para poder abarcar a complexidade da realidade. Portanto, ela deve ter um caráter de cooperação com outros conhecimentos, deve buscar seu lugar na dinâmica social e contribuir para conseguir uma visão integral.

         Ao se reconhecer que o conflito é inerente à condição humana, a Educação para a Tolerância deve contar, para que se desenvolva, com elementos conceituais, metodológicos e didáticos que explicitem o conflito, que permitam entender seu papel na dinâmica das relações pessoais, econômicas, políticas, culturais, que nos surgiram uma concepção do manejo construtivo do conflito e de seu papel na construção bem-estar humano.

         A Educação para Tolerância está estreitamente relacionada com a dinâmica do desenvolvimento social, que determina o bem-estar individual e coletivo, contribuindo desde sua condição particular com ferramentas que permitam transformar os conflitos que se implementam no interior dos indivíduos, entre eles e com a sociedade. Assim a Educação para a Tolerância deve promover o reconhecimento das próprias diferenças de cada sociedade entre sociedades, de onde seja possível desenvolver o reconhecimento das diferenças, a vivência da pluralidade e o respeito que gere a convivência; para ela contribuirá a explicação dos conflitos fruto destas diferenças e com este reconhecimento possibilitará a geração de soluções construtivas, que respeitem a identidade, a cultura, promova a autonomia e sugira espaços de encontro e cooperação.

         Isto faz com que a Educação para a Tolerância. centralize para interesses naquelas formas de desenvolvimento que promovem a satisfação dos interesses materiais e espirituais de cada um/a em termos de igualdade, em dignidade e direitos que temos como seres humanos, assim como também o progresso social que eles e a qualidade de vida dentro de um conceito de vida dentro de um conceito amplo de liberdade.

 

ESPAÇOS DE TRABALHO DA EDUCAÇÃO PARA A TOLERÂNCIA: ALGUNS CAMINHOS PARA A IGUALDADE

 

         Dentre as frentes de trabalho, que poderíamos chamar de Educação para a tolerância, em que é urgente realizar ações que permeiem as relações sociais até a uma maior compreensão - ação de e sobre a realidade concreta, enumeramos os espaços seguintes de modo esquemático como os espaços que na atualidade se podem perfilar como os mais viáveis:

 

Relações de Gênero:  tem como horizonte a participação plena de homens e mulheres na tomada de decisões referidas a aspectos de condição em sociedade. Aqui, não estamos referindo exclusivamente às políticas macro do governo, mas também àquelas decisões que no dia-a-dia constróem sólidas as diversas problemáticas que vai implantando nas áreas profissional, familiar, escolar, social, etc.

        

         As mulheres, recentemente, irromperam com muita força nas esferas profissionais, intelectuais, de participação comunitária e de educação oficial. Materializar proposta como o planejamento com perspectiva de gênero nas áreas municipais, departamentais e nacionais, implica reconhecer na prática a importância da participação conjunta de homens e mulheres na construção dos referidos claros que consolidem pronta irrupção. Trata-se de planejamento para a ação social, para uma prática política, cultural e econômica. É necessário preencher de conteúdo de equidade entre gêneros, elaborar, racionalizar e projetar os saldos gigantescos que neste sentido temos dado, nós, os seres humanos. É o momento, e as condições estão dadas para validar no pensamento estas categorias que já fazem parte do mundo moderno. Fora de dúvida, a responsabilidade compartilhada entre homens e mulheres, fato este que a cada dia se estende a mais áreas do social, as relações de equidade de tais níveis de responsabilidade ainda encontram-se bastante longe do desejável. Colocar sobre o tapete esta discussão para a ação é acelerar, dar a mão à engrenagem da história, e puxar no sentido positivo a direcionalidade desta construção cultural. Assim como a história faz os homens e mulheres, nós homens e mulheres também somos fazedores da história.

         A perspectiva do Gênero como marco referencial e ação sobre a qual se construírem relações de tolerância, significa, por um lado, a mútua significação e reconhecimento da possibilidade de ser e fazer desde o distinto, como unidade; e por outro lado, a destruição da diferença falsa, alienada. Sabemos que não é dentro da contradição do sistema de capital, que chama a mulher à participação como ativa força de trabalho; brinda espaços de participação eleitoral como mecanismo de legitimação política; qualifica-a profissionalmente para explorar suas particularidades como força de trabalho sem resolver estruturalmente o fenômeno da subordinação, cotidianamente, coloca-a a competir entre si e com o homem em diversos espaços sociais, antes vedados a elas. No caso das realidades dos países do sul, a mulher, e em especial, a dos setores populares, tem piorado sua qualidade de vida, fazendo fenômenos endêmicos como a sobrecarga laborativa, a feminização da pobreza, a violência intrafamiliar, as mulheres chefes do lar.

         A proposta deve girar em torno da eliminação progressiva das falsas diferenças que, desde o ideológico e cultural, não permitem uma real apropriação de um novo conceito do masculino e do feminino e por uma nova estrutura de papéis onde homens e mulheres assumam de maneira partilhada a responsabilidade da construção do individual e do social.

 

RELAÇÕES ENTRE ETNIAS E CULTURAS:  

 

         Com o fracionamento político e econômico da Europa Oriental saíram à luz não somente as enormes diferenças de tipo étnico-religioso e cultural que se faziam presentes nestes povos, mas, fundamentalmente, as condições de discriminações, injustiça e segregação a que historicamente foram submetidos.

         Abre-se uma porta e parece saltar em mil pedaços a exígua sociedade socialista.

         Os relacionamentos de intolerância entre etnias, fora de qualquer dúvida, podem em muitos casos estar referenciados a elementos de caráter fundamentalista. Em maioria, eles encontram-se sustentados e potencializados por fatores de índole territorial, político e econômico que são suscetíveis de serem negociados em termos de benefícios que ele representaria a nível regional para lograr objetivos mais coletivos. Em muitos casos, as estruturas sociais de cada país, as fronteiras que dividem territórios de uma mesma comunidade e a ausência de autonomias regionais, são fatores que escondem uma aguda luta política e de classes onde as minorias caracterizam-se, precisamente, por serem as mais exploradas, e às quais os benefícios de distribuição da riqueza social nunca chegam.

         A possibilidade de desenvolvimento de uma proposta de educação para a tolerância está baseada no relacionamento da diversidade como riqueza, onde a realidade pode ser interpretada de mil formas como semeador da pluralidade, do respeito pela diferença, da identidade e o direito que tem cada povo à autonomia e à existência particular. Busca interpretar estas particularidades como marca de referência para a real compreensão da conflitividade, com o objetivo de adequar ou criar os mecanismos mais idôneos para o entendimento das comunidades.

 

RELAÇÕES DE ECOLÓGICOS E MEIO-AMBIENTAIS:

 

         A nível mundial, há uma crescente preocupação, tanto governamental como de iniciativas da sociedade civil, em torno da defesa de recursos naturais renováveis e não renováveis. A proteção do meio ambiente abre espaço para a educação de tipo democrática, dentro de um conceito não depredador da espécie humana, em face dos demais elementos da vida do planeta. Não se trata de apenas interesse de sobrevivência do ser humano como de harmonia entre si e o espaço circundante, é reconhecer o homem em sua vulnerabilidade como espécie e seu destino inseparável do resto do planeta.

         Hoje que se vem questionando modelos de desenvolvimento, e mesmo o próprio conceito de desenvolvimento, é possível gerar propostas que assimilem o sentido de defesa da vida com a defesa do planeta, da diversidade, do equilíbrio ecológico, e portanto, da tolerância vital com aquilo que aparentemente não é útil dentro dessa concepção homocêntrica de racionalidade ocidental.

         Ainda recentemente, vêm-se realizando esforços internacionais, como a Conferência do rio, agilizando-se propostas, que vêem na biodiversidade e sua defesa um critério necessário para entender a sustentabilidade da própria existência. Coloca-se sobre o tapete o desenvolvimento da indústria nuclear de caráter militar, pondo-se barreiras ao uso do terceiro mundo como da indústria de reativos tóxicos dos países desenvolvidos. Em geral, este é um espaço que deveremos canalizar politicamente até a superação da ação conjuntal. Transformando-o e propostas metodológicas tendentes a integrar o ser humano a uma compreensão da totalidade, com um caráter mais estrutural onde a tolerância se converte em um meio para a interação do seu humano com seu meio natural.

 

RELAÇÕES DO CICLO VITAL:

 

         São as que se realizam entre membros de grupos etários diferentes, cada um dos quais com suas particularidades, objetivos, subjetivos, simbólicos e de interesses.

         Geralmente os mecanismos de interação para estes tipos de relações se apoiam em termos de autoritarismo em cadeia: os meninos são socializados, fundamentalmente, com base no sistema de necessidades da família ou da sociedade, desconhecendo em sua totalidade o tipo de interesse do menino/a como individualidade e como categoria particular.

         A partir daí, o critério relacional utilizado é a castração das possibilidades criativas, subversivas e construtivas das novas gerações. Pretende-se medir pelos padrões, normas e valores de outra(s) geração (ões) que pretendem fazer de sua experiência o critério único de apropriação da realidade como ética, estética, conhecimento, normatividade, valoração, etc. Aqui o conflito geracional é assumido como negação das possibilidades do outro/a, (por ser muito velho e, portanto, caduco ou por ser muito jovem e inexperto).

         A intolerância geracional manifesta-se em diferentes esferas: sociais, escolares, no acesso diferenciado dos meios de comunicação, no uso do espaço urbano. Ao fragmentar seus componentes, fragmentam-se as possibilidades de uma apropriação do novo por parte de toda sociedade, assim como do reconhecimento do saber acumulado por parte dos maiores, dos mais idosos.

         Esse conflito é inerente às vidas humanas, porém, não significa que as contradições nele expressadas, não se possam pôr a serviço de uma concepção de ser humano muito mais integral, onde os mais velhos e a criança, o/a adulto e o/a jovem possam ser assumidos socialmente como o que são, e não como o que as outras categorias esperam que não sejam. Portanto, a proposta de Educação para a Tolerância se embasa em abrir espaços de diálogo e ação entre os diferentes grupos de idade, que possibilite reconhecer suas diferenças atuais, porém de igual modo estabelecer a linha de continuidade da existência humana como um todo, na busca de um tecido social fortalecido.

         Consideramos, assim, que a Educação para a Tolerância é uma educação para a vida; que reconhece a diversidade, os seus protagonistas em todas as suas dimensões; que assume o Direito Reto do respeito pela diferença, da pluralidade, do diálogo como sua ferramenta, do concerto como um ponto de encontro entre os/as diferentes, a relação horizontal como uma condição. É uma educação que reconhece a realidade que lhe deu origem e que entende seu papel na transformação dela. Quer dizer, que reconhece seus limites, mas também seus horizontes. A Educação para a Tolerância não vai mais além do que nos desejamos, ou seja, que algum dia entendamos a complexidade do ser humano, unindo o íntimo ao social na aventura maravilhosa de viver sem destruirmos.      

 

“La Piragua”

Revista Latino Americana de Educação e Política
Nº. 11 – 2º. Semestre de 1995.
Fls. 69/78 – Santiago - Chile

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