Elogio da Preguiça
Bemdita sejas tu, Preguiça
amada,
Que não consentes que eu me ocupe em nada!
Mas queiras tu, Preguiça, ou tu
não queiras,
Hei de dizer, em versos, quatro asneiras.
Não permuto por toda a humana
ciência
Esta minha honestíssima indolência.
Lá esta, na Bíblia, esta
doutrina sã:
-Não te importes com o dia de amanhã.
Para mim, já é grande
sacrifício
Ter de engolir o bolo alimentício.
Ó sábios , daí à luz um novo
invento:
A nutrição ser feita pelo vento!
Todo trabalho humano, em que se
encerra?
Em na paz, preparar a luta, a guerra!
Dos tratados, e leis, e
ordenações,
Zomba a jurisprudência dos canhões!
Juristas, que queimais vossas
pestanas,
Tudo que legislais dá em pantanas.
Plantas a terra, lavrador?
Trabalhas
Para atiçar o fogo das batalhas...
Cresce o teu filho? É belo? É
forte? É loiro?
- Mas uma rês votada ao matadouro!...
Pois, se assim é, se os homens
são chacais,
Se preferem a guerra à doce paz,
Que arda, depressa , a colossal
fogueira
E morra assada, a humanidade inteira!
Não seria melhor que toda gente,
Em vez de trabalhar, fosse indolente?
Não seria melhor viver à sorte,
Se o fim de tudo é sempre o nada, a morte?
Queres riquezas, glórias e
poder?...
Para que, se amanhã tens de morre?
Qual mais feliz? O mísero
sendeiro,
Sob o chicote e as pragas do cocheiro,
Ou seus antepassados que,
selvagens,
Viviam, livremente, nas pastagens?
Do Trabalho por serem tão
amigas,
Não sei se são felizes as formigas!
Talvez o sejam mais, vivendo em
larvas,
As preguiçosas, pálidas cigarras!
Ó Laura, tu te queixas que eu,
farcista,
Ontem faltei, à hora da entrevista,
E, que ingrato, volúvel e
traidor,
Troquei o teu amor - por outro amor...
Ou que, receando a fúria
marital,
Não quis pular o muro do quintal.
Que me não faças mais essa
injustiça!...
Se ontem não fui te ver - foi por preguiça.
Mas, Juvenal, estás a trabalhar!
Larga a caneta e vai dormir... sonhar...
Juvenal Antunes, poeta nascido em
1883 em Ceará Mirim, RN.
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