Direitos Humanos e Tortura
CRISTIANO
MORINI
"Nem o Estado, nem sua soberania
são um fim em si mesmos; mas, estão a serviço do homem, e são
limitados pelos direitos humanos". Montesquieu.
"Ninguém será
submetido a torturas nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou
degradantes". Declaração
Universal dos Direitos do Homem, art. 5.
O presente artigo divide-se em três partes: a
primeira delas foca o tema TORTURA, em breve recapitular histórico nos níveis
nacional e internacional; a segunda parte, correlaciona o tema descrito na
primeira com a Proteção Internacional dos Direitos Humanos; por fim, a última
parte traz a conclusão.
Primeira Parte: Retrospectiva Histórica acerca da Tortura.
Primeiramente, a definição da palavra tortura. Do
latim, tortura, significa suplício, martírio, tormento, transe aflitivo,
podendo ser físico ou psicológico. O verbo torturar também traduz o mesmo
sentido na língua espanhola; no inglês, to torture; no francês,
torturer; no italiano, torturare; no alemão, foltern. A
semelhança da tradução nas mais conhecidas línguas do mundo ocidental, com
exceção da da língua alemã, corrobora a assertiva de que TORTURA sempre o foi e
sempre será uma prática globalizada, da maioria absoluta das nações e dos
Estados outrora e hoje existentes na Terra.
Ademais desse tecnicismo vernacular do parágrafo
anterior, o conceito será utilizado neste artigo na forma politizada ("o homem é
um animal político", afirmara Aristóteles) que o mesmo adquiriu desde os
primórdios da denominada História Geral.
Reportando-se a partir da Idade dos Metais - cerca de
quatro mil anos antes de Cristo - o bronze e posteriormente o ferro foram
utilizados no cotidiano dos povos. É a partir dessa época que se tem os
primeiros dados registrados sobre maus tratos e penas cruéis, empreendida aos
prisioneiros das batalhas travadas na Idade dos Metais.
No segundo milênio antes de Cristo, a cidade de
Babilônia (hoje Bagdá, capital do Iraque) dominou a Mesopotâmia (região hoje
compreendida entre Iraque, Turquia e Síria) e o rei dos babilônios, Hamurabi,
baseado em trabalhos anteriores de Urocagiana, criou o primeiro código de leis
escrito, o qual regulava rigorosamente a vida social, baseado em penas severas e
degradantes, como a do Talião, do "olho por olho, dente por dente".
Como os povos orientais, tais como os atuais China e
Japão, ainda não haviam iniciado suas incursões "imperialísticas", pode-se
considerar que foi com os Assírios, um dos povos mesopotâmios, que a prática da
tortura foi, primeiramente, utilizada de maneira corrente aos povos
conquistados.
Por volta do século VIII a.C., no mundo ocidental, o
modo de produção era o escravista, que, embora não se considerassem os escravos
como indivíduos de direitos, apenas de deveres, os maus tratos eram utilizados
indiscrimidamente, sem qualquer contestação social.
A partir do século II a.C., em Roma, cidade que
conquistara grande parte do mundo ocidental, dicotomizou-se dois grupos, a
saber: o dos democratas e o dos aristocratas, surgindo o gérmen do que
posteriormente viria a ser denominado de democracia e de ditadura (locus
da tortura política).
Com o débâcle do Império Romano do Ocidente,
no século V, inicia-se, pela cronologia da História, o período denominado de
Idade Média, ou dark age (Idade Negra). Neste período, o terror era a
palavra corrente. O ato de discursar, falar ou se manifestar contra a ordem
religiosa imposta levava ao suplício nas fogueiras em praças públicas. O domínio
pelo terror não era exclusividade da parte ocidental do mundo. No mundo árabe,
guerras santas (em nome do deus Alá) - jihad - eram empreendidas
juntamente com os maus tratos aos capturados. As "guerras santas" dos ocidentais
chamaram-se Cruzadas, estas com a mesma brutalidade daquelas.
No século XV, na região chamada Valáquia, no sul da
Romênia, Vlad Tepes, cunhado pelo cinema e pela literatura de ficção como o
Drácula, transformar-se-ía em um símbolo das forças do mal e da tortura,
praticada na forma do empalamento - um ferro é introduzido no ânus ou no umbigo
da vítima até sair pelo pescoço.
O colonialismo ocorrido e iniciado a partir do século
XV realçou a antiga prática do escravagismo - aos povos vencidos e aos
indivíduos da raça negra. A estes, até o século XIX, em diferentes
circunstâncias e momentos (século XVI e XIX), foram aplicadas penas cruéis e
degradantes, em um modo de vida subserviente e oprimido.
Neste rápido cavalgar pela História, em episódios
como a independência dos Estados Unidos (1776) - quando Thomas Jefferson foi
encarregado de redigir a Declaração dos Direitos do Homem, juntamente com a
Declaração de Independência -, a Revolução Francesa (1789) - quando a Bastilha,
símbolo do autoritarismo governamental francês, é tomada pelo povo -, as
revoluções de 1830 e 1848 na Europa (contrapondo-se nacionalismo, liberalismo e
socialismo), a Guerra de Secessão nos Estados Unidos (1861-1865), as rivalidades
sino-japonesas no extremo oriente, as independências dos povos
latino-americanos, a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), os Direitos Humanos
eram violados, antes da prática da tortura, pelas execuções extrajudiciais, pela
idealização da superioridade racial, econômica, político-ideológica e/ou bélica.
Ainda abordando o nível internacional, o período
entre guerras (1918-1939) é marcado pelo afloramento dos regimes de exceção em
toda a Europa, a exemplo de alguns países sul-americanos, como o Brasil de
Getúlio Vargas (será abordado mais à frente). Nestes regimes, denominados de
fascismos - o português de Salazar, o espanhol de Franco, o italiano de
Mussolini, o nazista-alemão de Hitler - a prática da tortura difundiu-se como
forma de justificativa a algo de mal que ocorrera nas economias daqueles países
destroçados após a Primeira Guerra. Para a Alemanha, o anti-semitismo foi a
política adotada. Deu-se um holocausto judeu, seja nos campos de concentração
alemães, seja nos laboratórios que faziam experiências com pessoas vivas. Se na
Primeira Guerra os judeus eram, antes de tudo, alemães - tendo que pegar em
armas e defender o país -, no período entre Guerras, o judeu era, antes de ser
alemão, um judeu-semita. As torturas e o desprezo à etnia são bem mostrados no
filme "A Lista de Schlinder" (produção hollywoodiana de 1994).
O fim dos fascismos, com a Segunda Grande Guerra
(1939-1945), não encerraram o período de práticas de torturas no velho
continente. Franco e Salazar continuaram no poder até a década de setenta,
quando foram substituídos: Revolução dos Cravos, em Portugal; morte de Franco,
na Espanha. Na Europa Oriental, os regimes fortes de esquerda.
Ainda hoje na Europa, não-continental, irlandeses do
norte digladiam-se com irlandeses do sul. Na capital, Dublin, ocorre morticínios
e torturas entre grupos religiosos rivais. A historicidade da questão, de longos
anos, não sensibiliza mais a imprensa; a população, tampouco.
Nos países do extremo Oriente Asiático, a divulgação
de violações aos Direitos Humanos são freqüentes, mesmo se considerando a
dificuldade de reportá-las e publicá-las. A China chega a ser ameaçada pelos
Estados Unidos, devido a denúncias de organismos internacionais de proteção dos
Direitos Humanos, quanto a possibilidade de desqualificação na regra da "nação
mais-favorecida" no comércio bilateral entre os dois países. A Indonésia oprime,
tortura e degrada a população e governo do Timor Leste, valendo, pelas denúncias
e tentativas de malograr a dominação, o prêmio Nobel da Paz de 1996 ao timorense
José Ramos-Horta.
Quanto ao continente africano (mormente a região
central), antes de se falar em tortura, realça-se a barbárie, a violência, a
selvageria, configurando-se no que Thomas Hobbes chamava de "estado de
natureza", de "todos contra todos", onde o "homem é o lobo do homem" (homo
homini lupus).
Por fim, no que tange especificamente à tortura, a
Anistia Internacional tem delatado graves práticas no Iraque (principalmente com
os curdos do norte do país), no Sri Lanka (desaparecimentos de jornalistas), no
Zimbábue (com a impunidade), na Turquia (desaparecimentos e execuções
extrajudiciais no meio rural e urbano) e no Marrocos (desaparecimentos
políticos).
América Latina e Brasil.
No que tange à América Latina e ao Brasil, a prática
da tortura e dos maus tratos sempre esteve presente nos trezentos anos de
período colonial. Da descolonização dos anos 1800 até meados de 1850, grosso
modo, a prática da tortura restringiu-se aos escravos.
O tema volga à tona quando no momento da instauração
dos governos militares nospaíses latino-americanos, em meados de 1960-70.
No Brasil, no entanto, execuções extrajudiciais se
perpetuavam ao não-escravos desde a Confederação do Equador (1817), quando Frei
Caneca foi executado. A Sabinada, na Bahia (1831-1837), a Guerra dos Farrapos,
no Rio Grande do Sul (1835) e a Balaiada, no Maranhão (1838-1841), adicionam-se
ao exemplo acima mencionado. Além disso, houve graves denúncias de torturas
durante o primeiro governo de Getúlio Vargas (1930-1945).
Os períodos militares na América Latina e Brasil
configuram-se no apogeu no tema tratado. As torturas mais comuns sofridas pelas
vítimas foram:
CAPUZ: causa tortura física inesperada e tortura
psicológica (o torturado fica incapacitado de ver de onde vem os golpes);
FORMAS DE IMOBILIZAÇÃO: utilizada nos intervalos de
outras formas de tortura com o objetivo de causar esgotamento físico (segurar
pesos nos braços, equilibrar a sola dos pés em latas cortantes);
ESPANCAMENTO: murros e pontapés aplicados em regiões
como rins, estômago e diafragma;
CORREDOR POLONÊS: filas paralelas de torturados
formando um caminho obrigatório para a vítima passar;
TELEFONE: aplicação de tapas com ambas as mãos nos
ouvidos da vítima (provoca rompimento dos tímpanos e labirintite);
PAU-DE-ARARA: aplicado desde os tempos de escravidão,
constitui-se em um dos métodos mais antigos de tortura. A vítima fica pendurada
em posição de frango assado (provaca causa dores terríveis no corpo e na
cabeça);
CHOQUES ELÉTRICOS: aplicados em regiões sensíveis do
corpo (que é molhado para facilitar a condutividade da corrente elétrica) como
órgãos genitais, língua e ouvidos;
HIDRÁULICA: como o pau-de-arara, é um dos métodos de
tortura mais antigos, utilizados desde a Inquisição (Idade Média). Quando
aplicado em indivíduos em pau-de-arara, causa afogamento;
PALMATÓRIA: espécie de raquete de madeira que é
aplicada às mãos, pés, nádegas e costas da vítima;
ESCOVA DE AÇO: causa esfolamento e sangramento quando
aplicada no peito e nas costas da pessoa torturada;
NÓ-DA-MÁFIA: amarra-se o pescoço da vítima aos seus
pés, sendo, estes, suspensos, causando enforcamento;
QUEIMADURAS DE CIGARRO: costumeiramente utilizada no
momento dos interrogatórios;
CADEIRA-DO-DRAGÃO: espécie de cadeira
elétrica;
TAMPONAMENTO POR ÉTER: aplicação nas partes sensíveis
e feridas do corpo, provocando queimaduras e dores;
TORTURA SEXUAL: prática de estupros, introdução de
cacetete no ânus, compressão e choques nos testículos;
SORO DA VERDADE OU PENTOTAL: causa depressão e
diminuição da capacidade de reação (os próprios médicos, a serviço do Estado, o
aplicavam);
"GELADEIRA": constitui-se em um pequeno quarto de
dois metros quadrados, escura e fria. Os agentes que praticavam torturas
mesclava a permanência da vítima nas "geladeiras" e nas salas fortemente
iluminadas e quentes. Psicologicamente, a vítima sentia insegurança;
ANIMAIS: eram utilizados nas sessões de tortura, tais
como cobras e ratos (no DOI-CODI/RJ, em 1970, utilizaram um jacaré);
ARRASTAMENTO EM VIATURA: causava esfolamento e
escoriações generalizadas no corpo da vítima. Também forçavam a vítima a
respirar o gás que saia pelo escapamento do veículo;
ESCALPO: consiste na retirada da pele da
vítima;
CHURRASQUINHO: introdução de material inflamável no
ânus e na vagina;
CAMA CIRÚRGICA: a vítima é amarrada e esticada em uma
cama. Causava o rompimento de nervos e, sobre a cama, também praticavam torturas
como o arrancamento das unhas;
"MASSARICO": espécie de "churrasquinho" que causa
queimaduras de primeiro grau;
COROA-DE-CRISTO OU CAPACETE: consistia no esmagamento
do crânio por meio de um anel metálico e um mecanismo que o estreitava;
TORTURA AOS FAMILIARES E A AMIGOS: consistia em
torturar amigos e parentes em frente ao perseguido político.
Segunda Parte: A Legislação Internacional na Área de Proteção dos Direitos
Humanos.
"Pensar sem realizar obras não conduz a nada,
mas realizar obras sem pensar conduz ao
desastre".
Provérbio japonês.
"Cada pessoa tem uma inviolabilidade
baseada na justiça que nem mesmo
o bem-estar ('welfare') da sociedade pode
sobrepujar".
John Rawls.
A associação dos temas Proteção, Direitos Humanos e
Indivíduo é recente. Prisioneiros e escravos nunca foram considerados seres
humanos de direitos, apenas de deveres, quando o foram.
Grandes marcos na correlação desses temas acima
mencionados ocorreram no século XVIII, seja pela independência da colônia
inglesa do norte da América (1776), seja pela deposição da nobreza na França
(1789).
Nestes momentos, morticínios não foram poupados,
independente de religião, origem ou nível econômico. Os ingleses, dominadores,
foram mortos pelos seus colonos, dominados; a nobreza francesa foi decapitada
pela lâmina da guilhotina.
Os avanços das ciências médicas nos séculos dezoito e
dezenove, juntamente com os fatos de que o aparentemente mais fraco pode
sobrepujar o mais forte (como nos episódios do parágrafo anterior), contribuiram
para a evolução da percepção de que os homens são iguais por natureza,
biologicamente falando, e que, por isso - e não apenas -, podem galgar os mesmos
objetivos e atingir os mesmos propósitos.
Ademais, com uma das batalhas mais sangrentas e
violentas que a Europa já observara, a Batalha de Solferino, na Lombardia, em
1859, um cidadão suíço, Henry Dunant, fundou, anos depois com mais quatro
amigos, o que se denomina, atualmente, Cruz Vermelha Internacional.
A Cruz Vermelha Internacional vem, assim, a bem mais
de cem anos, fomentando e desenvolvendo leis, normas e regulamentos
internacionais de como se fazer a guerra, jus in bellum, ou seja, o
direito na guerra. O direito de guerra, jus ad bellum, prescreveu das
discussões por ser considerado utópico, ou seja, não há qualquer legislação
internacional que proiba a guerra de ser feita enquando tal.
A Cruz Vermelha não é contra nem a favor da guerra. A
organização é imparcial e a-ideológica. O que a mesma defende é a
obrigatoriedade dos países beligerantes respeitarem as normas de como se fazer a
guerra em si mesma (por exemplo, não é permitido atacar hospitais, arquiteturas
históricas e fontes de abastecimento vitais à vida) e de respeitarem as normas
de direitos humanos em guerra. A essas, há todo um direito especializado,
denominado de Direito Internacional Humanitário, ou Direito de Haia. Àquelas, há
o Direito de Genebra, que é o mesmo que o direito na guerra.
Com a deflagração das duas maiores guerras na Europa
(com conseqüências também no Japão, no caso da segunda), dá-se uma completa
descrença na razão e, também, na espiritualidade do europeu. A fragilidade da
vida de quem quer que seja, associado aos meios de destruição de massa -
alcançados pela revolução industrial e tecnológica dos séculos XIX e XX -
aplicados nas guerras, fez com que a proteção internacional aos direitos básicos
da pessoa humana encontrasse o seu gérmen de criação baseado em um necessidade
real, ocorrida em território europeu e japonês - e não nas colônias - e com
cidadãos europeus, e não colonos.
Dessa maneira, em 1948, as nações mais poderosas do
mundo, dentre outras, acordam e assinam a Declaração Universal de Direitos
Humanos, espécie de carta básica contendo princípios gerais de proteção ao
homem, seja este de qualquer origem, classe social, sexo, religião, raça, crença
ou posição ideológica.
Em 12 de agosto de 1949, sistematizam-se convenções
que já haviam sido discutidas sem muito logro. Seus nomes: Convenções de
Genebra, quais sejam:
i) Convenção de Genebra para Melhorar a Condição dos
Feridos e Enfermos das Forças Armadas no Campo;
ii) Convenção de Genebra para Melhorar a Condição dos
Feridos e Enfermos das Forças Armadas no Mar;
iii) Convenção de Genebra relativa ao Tratamentos dos
Prisioneiros de Guerra;
iv) Convenção de Genebra relativa à Proteção das
Pessoas Civis em Tempo de Guerra.
Especificamente sobre tortura, há o artigo 3 comum às
quatro convenções: "Em caso de conflito armado não-internacional, (...) os
seguintes atos permanecem proibidos a qualquer tempo e a qualquer lugar: (a)
violência à vida e à pessoa, em particular assassinatos de qualquer tipo,
mutilação, tratamento cruel e tortura. (...)"
Outrossim, os artigos de mesmo conteúdo: artigo 50 da
Primeira Convenção de Genebra, artigo 51 da Segunda, artigo 130 da Terceira e
artigo 147 da Quarta: (...) "em todas as circunstâncias as pessoas acusadas têm
direito a um julgamento em tribunal. É considerado ilegítimo e irresponsável, no
cumprimento da atividade militar, a execução sumária, a tortura ou tratamento
desumano, incluindo experimentos biológicos, causador de graves sofrimentos ou
sérios danos ao corpo e à saúde (...)".
Destarte, o artigo 31 da Quarta Convenção de Genebra,
combinado com os artigos 34 e 100, da mesma Convenção, prescreve o tratamento
digno ao prisioneiro, sendo, portanto, proibida qualquer prática de tortura. Os
mesmos relatam que o prisioneiro deve ser assistido por médicos periodicamente
para constatar o estado geral de saúde, nutrição e asseamento dos prisioneiros
(art. 31), além destes poderem exercer suas práticas religiosas (art. 34). Além
disso, a pena de morte não pode ser pronunciada por um tribunal de um país do
qual ele não é nacional, além dele não ter a obrigação de lealdade, pois se
encontra em situação independente de sua vontade.
Outro dos artigo que cobre a matéria é o 17
(parágrafo quarto) da Terceira Convenção: "nenhuma tortura física ou mental, nem
qualquer outra forma de coerção, deve ser aplicada em prisioneiros de guerra
(...). Prisioneiros de guerra que se recusarem a responder questões não devem
ser ameaçados, insultados ou expostos a qualquer tratamento desagradável ou
humilhante".
Outros artigos também tratam do tema: 87 da Terceira
e 118 da Quarta - a respeito ao tratamento sem tortura; artigo 32 da Quarta,
proibindo qualquer punição corporal e/ou tortura.
Em 1968, em Teerã, no Irã, ocorre a I Conferência
Internacional de Direitos Humanos, com a presença de 84 países, organizações
internacionais e organizações não-governamentais. A II Conferência ocorreu em
1993, em Viena, com o objetivo primordial de rever os avanços no campo dos
direitos humanos desde a Declaração de Universal, em 1948, e avaliar a eficácia
dos instrumentos, mecanismos e métodos de proteção de direitos humanos no seio
da Organização das Nações Unidas (ONU).
Concluindo a normatização na área, em 1977 publica-se
dois Protocolos Adicionais às Convenções, no tocante à proteção das pessoas
civis em tempos de guerra (contra execuções sumárias e tortura), além da
proteção aos patrimônios históricos.
Conclusão
A tortura é uma prática antiga da história da
humanidade, independente de raça ou localização geográfica. O criminalista
italiano Franco Lombardi comenta bem sobre o papel das mudanças na História: "em
certo sentido, poder-se-ia dizer que a História é feita pelos reacionários, tão
grande é a força da inércia da conservação, e tão menores, esporádicas e
intermitentes as forças da renovação e do adiantamento. (...) Pode-se objetar
que, em qualquer época, o tirano, por definição, procurou ir de encontro ao povo
e se cingiu da auréola de quem garantiria ao povo "panem et circenses" ou
encerrou na inicial da forca os outros dois "ff" da farinha
e das festas. Neste sentido, poder-se-ia dizer que os nossos modernos
governos ditatoriais e paternalistas não representam nada de novo".
A prática da proteção dos Direitos Humanos só evoluiu
quando sua violação atingiu pessoas que se julgavam inatingíveis, tais como os
europeus. Muitos os eventos da história da humanidade acontecem por fatalidade,
e não por filantropismo. Não é por acaso que banalidade rima com fatalidade. Os
acontecimentos, outrora banais, fatalizaram-se na Europa e em todo o
mundo.
Os Direitos Humanos constituir-se-ão uma linguagem
corrente dos próximos anos e séculos, pois relacionam-se a todos os homens. O
líder africano Léopold Sédar Senghor extrai do folclore senegalês um grande
oração: "O homem é o remédio do homem; e o homem é a medida de todas as coisas".
Do homem, pelo homem e para o homem, os direitos humanos dele emanam e a ele
almejam ao mesmo tempo.
O tema da tortura, tratado neste artigo, não é apenas
mais um dentre a lista de violações aos direitos humanos. Mas, o que atinge
diretamente a pessoa humana, em sua integridade física e psicológica, e, o pior,
é praticada por alguém constituído com as mesmas características biológicas e,
na maioria das vezes, racial, religiosa e social.
Em suma, direitos humanos devem ser promovidos,
resguardados quando adquiridos e compartilhados sempre que
possível. |