Leia abaixo a íntegra da sentença que condenou o coronel
Ubiratan Guimarães pela morte de 102 presos, durante uma invasão
da Polícia Militar na Casa de Detenção de São Paulo, o
Complexo do Carandiru, em 2 de outubro de 1992.
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
Comarca de São Paulo
2ª Vara do Júri
Processo nº 223-A/96
UBIRATAN GUIMARÃES, qualificado nos autos, foi denunciado
e pronunciado como incurso nos artigos 121, parágrafo 2º, inciso
IV (cento e onze vezes) e artigo 121, parágrafo 2º, inciso IV,
combinado com oA?=??? artigo 14, inciso II, por cinco vezes, todos do Código
Penal, porque no dia 02 de outubro de 1992, a partir das 16:00
horas, nas dependências do pavilhão nove da Casa de Detenção
Fláminio Fávero, localizada na Avenida Cruzeiro do Sul, nº
2936, nesta Capital, na condição de Comandante do Policiamento
Metropolitano portando uma metralhadora HK MP5K-21362, calíbre
9mm, decidiu pelo início da operação que resultou na invasão
daquele estabelecimento prisional, ordenando que seus comandados
munidos de grande poder de fogo, sem medir, ou melhor, avaliar da
necessidade e conseqüências da medida, conhecendo perfeitamente
a violência com que agiam alguns de seus comandados, agindo
assim, com dolo eventual, na medida em que teria admitido e
aceitado "o risco de produzir o danoso evento (anteviu o
resultado e agiu)", pois, "percebeu que era possível
causar o resultado e, não obstante, realizou o comportamento.
Entre desistir da conduta, mesmo após iniciada a operação, onde
já se dsenhava a tragédia, com as rajadas de metralhadoras e
causar o resultado, preferiu que este se produzisse" (fls.
64/65). Por conseguinte, o Ministério Público responsabiliza o
coronel Ubiratan por todos os crimes dolosos contra a vida,
consumados e tentados, ocorridos no pavilhão nove da Casa de
Detenção, onde são vítimas José Pereira da Silva e outros
mencionados.
Processo em ordem, foi o réu
submetido a julgamento nesta data.
Composto o Conselho de Sentença,
foi submetida à apreciação dos Senhores Jurados a primeira série
de quesitos, no tocante à vítima A?=???j??????José Pereira da Silva, bem
como as demais vítimas, com relação aos crimes de homicídios
consumados, mediante o uso de armas de fogo, por unanimidade de
votos, afirmando o primeiro e segundo quesitos, reconhecendo,
assim, a materialidade e a letalidade dos mesmos.
Por maioria de votos, os Senhores
Jurados afirmaram no terceiro quesito que o réu concorreu para a
prática do crime homicídio simples. Quanto às outras séries de
quesitos às respostas dos Senhores Jurados, também por maioria
de votos, negaram a conduta omissiva do réu; ainda, por maioria
de votos, negaram ter o réu agido no estrito cumprimento do dever
legal, razão pela qual tornaram-se prejudicados, respectivamente
o sexto e sétimo quesitos. Também por maioria de votos, os
Senhores Jurados negaram ser exigível conduta diversa, mas
votaram, também por maioria de votos que o réu incorreu em
excesso doloso. Tangente à qualificadora, os Senhores Jurados
reconheceram a existência da mesma, por maioria na votação. Por
fim, reconheceram a existência de atenuantes em favor do réu.
Com respeito à acusação de homicídio
consumado mediante a utilização de objeto perfuro cortante, por
unanimidade, responderam os Senhores Jurados afirmativamente ao
primeiro e segundo quesitos, reconhecendo assim a materialidade e
letalidade dos mesmos; todavia, votaram negativamente, por maioria
de votos, a autoria delitiva, razão pela qual restaram
prejudicados os demais quesitos desta série.
Na seqüência, por unanimidade,
absolveram o réu pela prática dos nove homicídios praticados
A?=???j"????? mediante o uso de objetos perfuro cortantes.
Com relação à série de quesitos
referentes aos crimes de tetativa de homicídio, votaram
afirmativamente, por maioria de votos, o primeiro e o segundo
quesitos, reconhecendo a materialidade e a interrupção da
conduta por circunstâncias alheias à vontade do réu. Por
maioria de votos, os Senhores Jurados negaram que o réu tenha
agido por conduta omissiva; contudo reconheceram por maioria de
votos, que o réu agiu dentro do estrito cumprimeito de seu dever
legal; ainda com relação às tentativas de homicídio, por
maioria de votos, reconheceram o excesso doloso na conduta do
agente. Ainda por maioria de votos, reconheceram que era exigível
conduta diversa por parte do réu, com o que restaram prejudicados
a votação dos quesitos afirmativos dos excessos culposo e
doloso. Por fim, por maioria na votação, negaram os Senhores
Jurados a qualificadora delitiva e reconheceram a existência de
atenuantes em favor do réu.
Derradeiramente, responderam
afirmativamente, por maioria de votos o quesito relativo ao crime
de falso testemunho de Antonio Luiz Filardi, testemunha ouvida em
plenário.
Apurada a autoria e a materialidade
do crime pelos senhores Jurados, passo à dosimetria da pena. O
acusado é primário e não havendo outras causas que justifiquem
o acréscimo da reprimendam fixo a pena-base no mínimo legal,
qual seja, seis anos de reclusão por cada um dos crimes de homicídio
consumado, por cento e duas vezes; no tocante aos crimes de homicídio
na forma tentada fixo aA?=???j"????? pena-base, para cada crime, no mínimo
legal, diminuo-a em 1/3 pela tentativa, tendo-se em conta que o
"itercriminis" foi totalmente percorrido; torno-a
definitiva em quatro anos de reclusão, por cinco vezes. As penas
serão aplicadas em cúmulo material.
Ante o exposto julgo PARCIALMENTE
PROCEDENTE a pretensão punitiva do Estado a fim de CONDENAR
o acusado UBIRATAN GUIMARÃES, como incurso no artigo 121,
"caput" (cento e duas vezes) combinado com o artigo 23,
inciso III, e artigo 121, "caput", combinado com o
artigo 14, inciso II, por cinco vezes, todos do Código Penal, a
cumprir pena de SEISCENTOS E TRINTA E DOIS (632) ANOS DE RECLUSÃO.
ABSOLVO-O pela infração ao artigo 121, parágrafo 2º,
inciso IV, do Código Penal, por nove vezes, com fundamento no
artigo 386, inciso IV, do Código de Processo Penal.
O acusado iniciará o cumprimento
da pena no regime fechado.
Considerando-se que o acusado é
primário, bem como que respondeu ao processo em liberdade,
residindo no distrito da culpa, concedo-lhe o direito de recorer
em liberdade.
Transitada em julgado, lance-se o
nome do réu no rol dos culpados, expedindo-se mandado de prisão.
Oficie-se à Egrégia Presidência
do Tribunal de Justiça, para as providências cabíveis, no
tocante ao crime de falso testemunho ora reconhecido.
Registre-se.
Proceso nº 223-A/96 flA?=???j"?????s. 6
Cumpra-se.
Publicada em plenário, saem os
presentes cientes e intimados.
Sala de Deliberações do segundo
Tribunal do Júri de São Paulo, às 00:00 horas, do dia 30 de
Junho de 2001.
MARIA CRISTINA COTROFE
JUÍZA DE DIREITO
PRESIDENTE