4.
Defesa
de direitos humanos no Brasil urbano: luta contra violência da polícia,
crime organizado e corrupção
A
estagnação econômica em toda a América Latina nos anos 80, combinada
com a migração em massa das áreas rurais para os centros urbanos,
detonou um aumento sem precedentes de crimes nas duas maiores cidades
brasileiras, São Paulo e Rio de Janeiro. Segundo a antropóloga e
conhecida pesquisadora da violência urbana Alba Zaluar, de 1983 a 1990
a taxa de homicídios no Rio de janeiro cresceu de 23 mortes a cada
10.000 habitantes para 63,03 mortes a cada 10.000 habitantes, ou seja,
triplicou. Em São Paulo, um aumento
similar de três vezes foi registrado de 1980 a 1994.
Neste
contexto e enfrentando a resistência de um governo federal ainda
controlado pelos militares, políticos da oposição se elegeram
governadores em São Paulo e no Rio de Janeiro
após eleições no final de 1982. Nesses estados, administrações
com um novo discurso sobre direitos humanos assumiram o poder
precisamente durante o período marcado pelo aumento de crimes violentos
jamais documentado no Brasil. Um dos resultados deste período que
persiste até hoje tem sido a associação, por parte de uma
significativa parcela da população, entre a defesa dos direitos
humanos o aumento de crimes
violentos e a defesa de bandidos.
No
Rio de Janeiro o governador, Leonel brizola
(1983-1986 e 1987-1991) ao implementar uma política mais voltada ao
respeito dos cidadãos, como por exemplo, reduzir incursões abusivas da
polícia nas favelas, foi
visto em muitos setores da sociedade e da polícia como conivente com
bandidos e traficantes. de
forma crescente, os habitantes do Rio de Janeiro, particularmente
aqueles das classes alta e média, vieram a entender segurança pública
sob o prisma de uma falsa, embora largamente disseminada, dicotomia: a
de que é preciso escolher entre forças policiais agressivas (com os
abusos de direitos fundamentais) ou inação policial e submissão à
criminalidade (com respeito pelos direitos humanos).
Sentimento
semelhante se desenvolveu em São paulo,
onde o aumento do crime nos anos 80 levou a segurança pública a ocupar
um lugar central como assunto mais importante na política estadual. No
curso dos anos 80, após o governo de Franco Montoro, autoridades políticas
encorajaram a polícia a responder agressivamente à criminalidade.
Muitos policiais entendiam este discurso, quase literalmente, como uma
licença para matar. Entre 1988 e 1992, o número de civis mortos pela
Polícia Militar de São Paulo cresceu cinco vezes, de 294 para pelo
menos 1.470,
aproximadamente um terço de todos os homicídios no estado naquele ano.
Neste
contexto polarizado, aqueles que defendem os direitos humanos nos
principais centros urbanos no Brasil são largamente considerados
aliados do crime e da criminalidade, o que complica mais sua já difícil
missão. Essa visão popular, freqüentemente sustentada por autoridades
irresponsáveis, permite que as forças policiais desacreditem as alegações
e documentações dos defensores de direitos, apelando para a preocupação
do público com sua segurança e invocando a falsa dicotomia que força
uma escolha entre forças policiais vigorosas e respeito pelos direitos
humanos.
A batalha
contra a corrupção policial
No
cenário urbano, uma área particularmente difícil na defesa de
direitos destacados neste relatório tem sido a batalha contra a corrupção
policial. Esta corrupção, que com freqüência anda lado a lado com a violência policial, tem mostrado envolver uma larga série
de autoridades, incluindo não apenas policiais de alto escalão, mas
também promotores, juizes e funcionários eleitos. O desenvolvimento do
papel do Brasil no tráfico internacional de narcóticos nas últimas décadas
(primeiro como um ponto de trânsito e mais tarde também como mercado
consumidor) tem garantido a presença de milhões, se não bilhões, de
dólares em comércio ilegal. Este fato, combinado com as leis de sigilo
bancário do país, tem feito do Brasil um importante centro de lavagem
de dinheiro. Esta combinação tem promovido o crescimento de unidades
de crime organizado que com freqüência contam com a cumplicidade ou
assistência direta de autoridades do alto escalão.
Documentar
e denunciar este tipo de corrupção é uma atividade extremamente
perigosa, como os corajosos esforços do detetive da polícia civil
Francisco Badenes, demonstram. Por uma década, Badenes tem investigado
a Scuderie Le Cocq, uma organização legalmente constituída e
profundamente envolvida nos assim chamados assassinatos de “limpeza
social” (cujo alvo são adolescentes que vivem e trabalham nas ruas de
Vitória, no Espírito Santo), extorsões e outras formas de corrupção.
A
teia intrincada de policiais corruptos e assassinos que Badenes
investigou tornou o sistema judiciário ineficaz para combater seus
crimes: quando investigadores de polícia, promotores e juízes que não
são parte da rede da Scuderie investigam os crimes do grupo, são
induzidos a abandonar os casos contra os membros da Scuderie através de
suborno ou intimidação.
A
gravidade da investigação conduzida por Badenes requer menção
especial. Os envolvidos na scuderie,
segundo evidências colhidas e apresentadas por Badenes à Câmara dos
Deputados, incluem o ex-governador do Espírito Santo e ex-ministro da
defesa Élcio Álvares no vértice de um sindicato criminal com ligações
com o Partido da Frente Liberal, PFL. O presidente da Assembléia
Legislativa do Espírito Santo, José Carlos Gratz, vem logo após Álvares,
segundo Badenes.
Ameaças
de morte a Regino Antônio de Pinho Filho, Fortaleza, Ceará
Em
8 de outubro de 2001, Regino Antônio de Pinho Filho (Pinho), um
representante da Associação dos Parentes e Amigos das Vítimas de Violência
(APAVV) em Fortaleza, estado do Ceará, começou a receber ameaças de
morte. Quatro dias antes, através da APAVV, Pinho havia submetido um
relatório sobre crimes de matadores profissionais no estado do Ceará
entre 1997 e 2001. Tendo apresentado suas denúncias , pinho
concedeu várias entrevistas à mídia, e declarou publicamente que as
cidades de Tabuleiro do Norte e São João do Jaguaripe registravam a
maior incidência de atividade de pistolagem no Ceará. Logo depois, em
8 de outubro de 2001, um telefonema anônimo para a casa de Pinho disse
o ameaçou dizendo que ele era “muito novinho para morrer”. Em 10 de
outubro de 2001, Pinho recebeu uma carta afirmando “Justiça ajuste de
conta é um erro a saída é o fim sem a vida. P. de T. N. Cuidado”
O texto era escrito com letras recortadas de revistas.
Em
12 de outubro de 2001, pPinho
registrou um boletim de ocorrência na delegacia local sobre as ameaças.
Para acelerar a investigação, a Comissão de Direitos Humanos da Câmara
dos Deputados requisitou informações e assistência do secretário
Freire.
Em resposta, o general
Gal.Vargas
Freire disse à Comissão que havia designado o investigador da Polícia
Civil Lauro da Costa Leite Sobrinho para o caso.
Em
14 de fevereiro de 2002, o Centro de Justiça
Global enviou Ofício JG/RJ no 059/02 para Secretário
o
general Gal.
Cândido
Vargas Freire,
secretário de Segurança Pública do estado do Ceará,
requisitando maiores informações sobre os recentes progressos deste
caso.
Até
o momento de finalização deste relatório, o Centro de Justiça Global
não havia recebido uma resposta.
Ameaças
de morte, processos judiciais de intimidação e difamação contra o
detetive Francisco Vicente Badenes Júnior, Espírito santo
No
curso de quase dez anos de investigação do crime organizado no estado
do Espírito santo, o
nacionalmente elogiado detetive da Polícia Civil Francisco Vicente
Badenes Júnior tem sido sujeito a várias formas de intimidação.
Desde 1991, Badenes tem investigado a Scuderie Detetive Le Cocq
(S.D.L.C), um grupo de vigilância paramilitar com ligações com o
crime organizado e com membros do alto escalão da política e da
polícia.
Em
1996, o governo brasileiro conferiu a Badenes o Prêmio Nacional de
Direitos Humanos por suas investigações sobre a S.D.L.C, e Badenes
desde então adquiriu uma reputação entre as organizações
brasileiras e internacionais de direitos humanos como um tenaz
combatente do crime.
Entretanto, o trabalho de Badenes causou retaliações por parte de
membros e simpatizantes da S.D.L.C, na forma de ameaças de morte e ações
judiciais infundadas. Além disso, em pelo menos uma ocasião, segundo
fontes da imprensa, um pistoleiro teria sido contratado para matar badenes, embora, felizmente, esse crime não tenha se
concretizado. badenes está
atualmente sob proteção do Programa Nacional de Proteção Às Vítimas
e Testemunhas do Governo federal.
Badenes
começou a investigar a S.D.L.C em 1991, quando o governador do Espírito
santo Albuíno Azeredo
criou um órgão especial para investigar o envolvimento da organização
no assassinato de crianças de rua no Espírito santo.
Badenes foi nomeado investigador-chefe do órgão, conhecido como Comissão
de Investigações Administrativas Especiais.
Fundada
em 1964, sob a ditadura militar brasileira, em homenagem ao detetive
assassinado Milton Le Cocq D’Oliveira, a S.D.L.C teve mais de 3.800
membros no começo dos anos 90, e teve filiais em todo o Brasil e América
latina.
O aparato sofisticado da S.D.L.C incluiu departamentos de Assuntos
especiais, serviços de inteligência e contra-inteligência, e a
S.D.L.C operava sua própria estação de rádio e revista.
A Scuderie Detetive Le Cocq, é formalmente reconhecida através
de Registro Civil no Estado do Espírito santo,
sob a égide de "Uma instituição benemérita e filantrópica, sem
fins lucrativos, com o objetivo de servir à comunidade”.
Segundo investigações realizadas sobre a S.D.L.C, o “serviço”
prestado era vigilância, incluindo execuções extrajudiciais de
suspeitos de crimes de rua comuns, freqüentemente adolescentes de rua.
José Guilherme Godinho Ferreira, um dos fundadores do grupo, criou o
slogan mais conhecido do grupo: “Bandido bom é bandido morto”. A partir de 1996, os
membros do grupo incluíam juízes, promotores, policiais, militares,
fiscais do estado, vereadores, um deputado e um magnata do jogo do
bicho, todos distinguidos por um adesivo de pára-brisas com o logotipo
da S.D.L.C, uma caveira com as iniciais E.M. Publicações do grupo
afirmavam que estas letras vinham de Esquadrão Motorizado, embora
muitos leiam nas iniciais Esquadrão da Morte, uma interpretação bem
mais condizente com a imagem mórbida que as letras acompanham. Além dos membros
oficiais do grupo, a S.D.L.C tinha muitos simpatizantes em todo Brasil,
devido à infeliz, porém largamente difundida crença de que as
principais vítimas da S.D.L.C, crianças de rua, deveriam ser
eliminadas. Como resultado das atividades de grupos como a S.D.L.C, os
assassinatos de crianças e jovens subiram muito em 1992 e 1993, sendo
que trinta e quatro foram registrados em 1993 somente no Espírito
Santo.
As
investigações de Badenes sob o patrocínio da Comissão levaram a
numerosas prisões de policiais ligados à SDLC.
Entretanto, as prisões levaram a poucas condenações, e muitos dos
suspeitos foram subseqüentemente liberados, criando um clima de medo
tanto para as testemunhas como para os investigadores. Muitas das
testemunhas se recusaram a fornecer provas ou testemunhar, e vários
detetives trabalhando para a Comissão requisitaram transferência após
serem intimidados, inclusive o presidente da Comissão, Manoel Antônio
de Barros, que não acreditava que o governo do estado do Espírito santo
estivesse fazendo o suficiente para apoiar a Comissão.
No final de 1993, Badenes começou a ser ameaçado.
Reportagens de jornal circularam a notícia de que dois assassinos
profissionais haviam sido contratados para matá-lo como resposta às
investigações da Comissão. Os prováveis assassinos aparentemente
fugiram do Espírito Santo antes de realizar o assassinato.
Em
20 de novembro de 1995, Badenes apresentou suas descobertas sobre a
S.D.L.C à Comissão de Direitos Humanos da Câmara de Deputados,
apresentando 5.297 páginas de documentos, nove fitas de vídeo e duas
fitas de áudio.
Além de implicar a S.D.L.C no assassinato de dezenas de adolescentes,
Badenes atribuiu os assassinatos do jornalista Mário Eugênio e da
investigadora da Comissão do Orçamento, Ana Elisabeth dos Santos,
ambos oponentes da S.D.L.C, aos integrantes do grupo.
Em um capítulo entitulado “Do sistema de acobertamento”, Badenes
escreveu que devido à influência da S.D.L.C:
“No
poder judiciário, há a protelação de depoimentos relevantes quando
se trata de pessoas influentes... No Ministério Ppúblico
não são acompanhados os inquéritos... Na polícia
Civil... as provas colhidas pelo perito desaparecem ou são manipuladas.
Há confissões forjadas para desviar os verdadeiros culpados. Há álibis
forjados.”
Badenes
identificou uma campanha de intimidação de testemunhas realizada pela
S.D.L.C, começando em 1995, na qual a Scuderie ameaçou matar três
testemunhas de homicídios cometidos pela organização ou seus
simpatizantes, sob o pretexto de que estas testemunhas haviam cometido
os crimes. As descobertas de Badenes também demonstraram vínculos
entre a S.D.L.C e o Sindicato da Polícia Civil do Espírito Santo, o
Sindicato dos Trabalhadores em Transporte do Espírito Santo e a União
Democrática Ruralista (UDR).
Além
disso, Badenes citou o testemunho de cinqüenta e um membros da S.D.L.C
sobre as vantagens de pertencer ao grupo.
Um membro revelou que os policiais de trânsito não o
incomodavam por causa da insígnia da S.D.L.C em seu pára-brisas. Outro
afirmou que a condição de membro garantia maior segurança privada. Um
terceiro se sentia mais seguro sob a proteção do grupo porque a
S.D.L.C era “formada por policiais”.
Badenes
concluiu sua apresentação requisitando a revogação da autorização
legal do grupo. Quando este relatório foi escrito, a Ação de Dissolução
da Suderie Le Cocq ainda estava pendente.
Por
essa época, intrigado com o número de assassinatos e outros crimes
cometidos pelos membros da S.D.L.C no Espírito Santo que permaneciam
sem resolução, Badenes decidiu obter uma lista dos membros do grupo.
Badenes conseguiu um mandato judicial da juíza de Vitória, Magda Lugon,
ordenando que a S.D.L.C fornecesse uma lista de membros. O presidente da
S.D.L.C, Mário Rodrigues Lopes, submeteu uma lista, mas Badenes notou
que os nomes de muitos suspeitos nos casos não resolvidos estavam
faltando. Por causa desta
falha em cumprir com os termos de uma ordem judicial, Badenes chegou com
vários policiais a uma propriedade usada pela S.D.L.C e confiscou os
arquivos e computadores do grupo. A correspondência interna da S.D.L.C
revelou que suas atividades criminais iam muito além da execução de
crianças e adolescentes de rua, e incluíam tráfico de drogas, roubo
de carros, jogo do bicho
e outros negócios tipicamente associados com o crime organizado.
Além disso, estes materiais documentavam o conluio entre promotores,
advogados de defesa e juizes filiados à S.D.L.C para garantir a
liberdade de membros da S.D.L.C acusados de crimes. Esta prática ajudou
a explicar a preponderância de crimes sem resolução envolvendo
membros da S.D.L.C que havia inicialmente despertado o interesse de
Badenes na lista de membros da S.D.L.C.
Em
20 de janeiro de 2000, Badenes usou muitos destes documentos apreendidos
em uma segunda apresentação sobre a S.D.L.C à Comissão de Direitos
Humanos da Câmara dos Deputados. Dessa vez
badenes registrou o envolvimento da S.D.L.C em uma larga série
de atos criminoso s. Na talvez mais importante parte de seu testemunho,
Badenes forneceu um “gráfico organizacional” retratando o
ex-governador e então ministro da Defesa Élcio Álvares no topo de um
sindicato criminoso com ligações com Partido da Frente Liberal (PFL).
O presidente da Assembléia Legislativa do estado do espírito
Santo, José carlos gratz, vinha logo abaixo do ministro da Defesa Élcio Álvares
no esquema organizacional investigado por Badenes. Além destes funcionários
federais, Badenes identificou a participação de vários funcionários
públicos do estado do espírito
Santo, inclusive do prefeito de Cariacica, Dejair Cabo Camata, na
participação em assassinatos contratados de políticos locais, venda
ilegal de armas, e estabelecimento de conexões de drogas, tudo em
associação com a S.D.L.C. Camata tinha boas conexões na política
nacional, o primo de Camata, Gerson, representava o Espírito Santo no
Senado Federal, e a mulher de gerson
Camata servia na Câmara dos Deputados.
Investigações
paralelas realizadas por autoridades federais corroboraram muito da
substância do que Badenes havia afirmado em seu primeiro depoimento
frente à Câmara dos deputados,
que por sua vez não diferia significativamente de suas afirmações no
segundo depoimento no Congresso.
Em novembro de 2000, a Câmara dos
De
deputados criou a Comissão Parlamentar de Inquérito
Destinada a Investigar o Avanço e a Impunidade do Narcotráfico (CPI).
Em sua seção no Espírito Santo, o relatório da CPI se baseou
significativamente no testemunho de Badenes frente à Comissão de
Direitos Humanos em janeiro de 2000, e condenou a influência da SDLC e
outras organizações criminosas no estado. O representante do
Legislativo José carlos
Gratz, identificado nas investigações no mais alto escalão da S.D.L.C
, caracterizou o relatório da CPI como “papel higiênico usado”.
O porta-voz do ministro da Justiça, João Benedito de Azevedo Marques,
declarou que a S.D.L.C cooperou com policiais locais “Como se fossem
uma verdadeira quadrilha de bandidos, travestidos de policiais, que
matam, extorquem, roubam e seqüestram impunemente”.
Um dossiê da Polícia federal
caracterizou a SDLC como “O maior grupo de criminosos organizados de
que se tem notícia no Brasil, para roubar, traficar, matar e espalhar o
terror”.
O Procurador
da RepúblicaThe
regional
Prosecutor of the Republic no espírito
Santo, ao condenar a S.D.L.C no estado, notou que “Há informações
de que grandes empresários sonegadores seriam mandantes de crimes de
homicídio para a manutenção de seus esquemas de sonegação”.
As
investigações de Badenes ganharam o respeito de Ongs brasileiras e
internacionais de direitos humanos, que pressionaram o governo federal a
investigar a ação criminosa da Scuderie. Alguns meses após seus
depoimentos à Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos deputados,
em 1995, Badenes recebeu o Prêmio Nacional de Direitos Humanos. Uma
semana após a apresentação de Badenes para a Comissão em janeiro de
2000, o presidente Fernando Henrique Cardoso exonerou Álvares do Ministério
da Defesa. No curso das investigações de Badenes sobre a S.D.L.C,
retaliações têm vindo em forma de ameaças de morte, difamação e ações
judiciais.
Em
9 de abril de 1998, atuando sobre evidências fornecidas por Badenes, a
polícia Militar de Vitória prendeu o prefeito de Cariacica, Camata,
sob a acusação de contrabando de armas.
Naquele dia, camata
recebeu um número de visitantes de alto escalão que mais tarde Badenes
incluiu em seu gráfico organizacional da SDLC, entre eles o então
ministro da Defesa, Élcio Álvares. Mais tarde naquele dia Álvares
pediu ao governador do Espírito santo, Vítor Buaiz, que libertasse
Camata.
Em 10 de abril de 1998, menos de vinte e quatro horas após a prisão de
Camata, Geraldo Corrêa Lima, um desembargador
do Tribunal de Justiça
juiz
da Suprema Corte do estado do Espírito santo, ordenou a libertação de Camata. Após sua libertação,
Camata fez uma ameaça pública a Badenes, afirmando “Vou deixar um
recado para o delegado Badenes: quando ele vier me prender da próxima
vez, que venha preparado para tudo”. Camata acrescentou “Prefiro
morrer a ser preso por ele outra vez, vou para o inferno mas levo ele
comigo”.
Em
3 de março de 1999, a pPromotora
de Justiça
da 9ª Vara
de Vitória,
Eloísa hHelena
Chiabai,
indiciou Badenes por difamar o caráter do delegado da Polícia Civil do
espírito santo
Ismael Foratini Peixoto de Lima. Em um relatório de 495 páginas, badenes
havia acusado Foratini de distorcer evidências para isentar os
assassinos do advogado criminal Carlos Batista de freitas
afiliados da S.D.L.C. Em novembro de 2000, a
CPI reviu as alegações de badenes
sobre o delegado da Polícia Civil e concordou com elas, contestando a
acusação de difamação de Chiabai. O relatório da CPI afirmava que
Foratini, “...associando-se com os integrantes da MÁFIA SERRANA;
cabendo-lhe, na qualidade de autoridade policial, a missão de sabotar e
retardar o desdobramento das apurações neste inquérito policial, para
assegurar a impunidade dos mandantes do homicídio de CARLOS BATISTA”.
A CPI também destacou Chiabai por suas ligações com a SDLC,
escrevendo “Consideramos suspeita as atuações [da promotora] Dra.
Eloisa Helena Chiabai... naqueles processos que envolvem questões
concernentes à atuação do crime organizado e interesses de associados
da Scuderie Detetive Le Cocq...”.
A tentativa de Chiabai de proteger Foratini registrando queixas de
difamação contra badenes
não deu certo. Em 21 de junho de 2001, a Primeira Varadivisão
Criminal
de Vitória arquivou a queixa, endossando a conclusão da CPI de que a
denúncia de Badenes contra Foratini era fundamentada, e que portanto o
indiciamento de Badenes por difamação feito por Chiabai era sem
fundamento.
Entretanto,
enquanto Badenes conseguiu afastar o processo de difamação, a S.D.L.C
levou sua campanha de intimidação para a imprensa. Durante 2001,
simpatizantes da S.D.L.C deram entrevistas aos jornais do Espírito
Santo questionando a saúde mental de Badenes. No começo de 2001, Dório
Antunes de Souza em entrevista aos jornais diários de Vitória A
Gazeta e A Tribuna, afirmou que Badenes era homossexual. Infelizmente, no Brasil, muitos
consideram a homossexualidade doença ou imoral.
Em
junho de 2001, Eitel Santiago de Brito Pereira (Brito), Assistant
Directoe of the Federal Office of the Public ProsecutorSubprocurador-Geral
da República, convidou Badenes para dirigir o Centro de Inteligência
de Análise Financeira daquele escritório, focalizando em redes
financeiras ilegais associadas ao crime organizado. Visto que badenes
era tecnicamente um funcionário do estado, sua transferência para um
cargo federal requeria a aprovação do governador do Espírito santo José Inácio ferreira,
que concedeu a transferência.
No
final de agosto de 2001, a esposa de ferreira,
governador do Espírito Santo, viu-se envolvida num escândalo de desvio
fraudulento de verbas públicas. A legislatura estadual estabeleceu uma
comissão parlamentar para investigar as acusações, conduzida pelo
membro da S.D.L.C Gilson Lopes, detetive de polícia aposentado que foi
implicado nas investigações de Badenes em janeiro de 2001, e depois
foi eleito deputado estadual. No meio do escândalo, Ferreira tornou-se
simpatizante da S.D.L.C., e substituiu o então secretário de Segurança
Pública do estado do Espírito Santo pelo ex-presidente da S.D.L.C Mário
Rodrigues Lopes, e o presidente do Conselho da Polícia Civil por João manoel
Rodrigues, também integrante da S.D.L.C. Ferreira então subitamente
voltou atrás em sua decisão de permitir a transferência de Badenes
para Brasília, e exigiu que badenes
retornasse ao Espírito Santo dentro de trinta dias. Badenes não
voltou, mas a campanha da S.D.L.C continuou.
Em
22 de agosto de 2001, o novo presidente do Conselho da Polícia Civil
nomeado por Ferreira, João rodrigues,
começou processos disciplinares contra Badenes, agora subordinado de
Rodrigues, citando má conduta de Badenes na investigação sobre
Foratini.
Rodrigues substanciou suas queixas com as acusações registradas por
Chiabai – apesar do fato do tribunal as ter rejeitado dois meses antes
– e recomendou a demissão de Badenes. Várias jornais vieram em
defesa de Badenes. A edição de setembro de 2001 do jornal Jornal
Tribunal do Direito afirmou que “A reação diante das investigações
do delegado Badenes sobre as bandas podres foi fulminante: a própria
Polícia Civil voltou-se contra ele, abrindo inquérito administrativo
acusando-o de ‘denegrir a imagem dos colegas’ (sic)”.
Aumentando o furor na imprensa, em dezembro de 2001 o federal
prosecutorProcurador
da República Luiz
Francisco de Souza anunciou que Badenes havia se tornado o alvo de uma
campanha de intimidação da S.D.L.C, e havia recebido ameaças de
morte.
Com
as ações disciplinares de Rodrigues ainda pendentes, a SDLC tentou uma
nova abordagem. No final de 2001, Dório Antunes de Souza, um parceiro
de negócios de Álvares, vazou em uma reportagem a falsa informação
de que havia um contrato no valor de cinco dígitos em reais sobre a
vida de Badenes. Depois se descobriu que a informação era realmente
falsa, mas essa tática também representou uma forma de intimidação,
usando a simpatia da imprensa por Badenes para levá-lo a temer por sua
segurança.
Em
27 de janeiro de 2002, badenes
respondeu ao registrar uma requisição de processo criminal contra seu
superior, alegando que o estabelecimento de processos disciplinares por
Rodrigues constituía um abuso de autoridade.
Badenes afirmou que ao iniciar os processos, Rodrigues se baseou em evidências
falsas que já haviam sido judicialmente descartadas, e que o processo
inteiro buscava detê-lo para que não completasse suas legítimas
investigações.
Duas semanas depois, o
Assistant Director of the Federal Office of the Public prosecutor
Sub-Procurador-Geral
da República, Brito, superior de Badenes em Brasília, requisitou
que o presidente do Suprema
CorteTribunal
de Justiça do Espírito santo
arquivasse o processo contra badenes.
Em
13 fevereiro de 2002, badenes
escreveu para o Prof. Paulo Sérgio pinheiro,
secretário Nnacional
de Direitos Humanos, resumindo as intimidações perpetradas pela
S.D.L.C na década anterior, e requisitando “providências cabíveis”
para combatê-las.
Até
a data em que foi escrito este relatório, o processo de Rodrigues ainda
estava pendente. Também sem resolução estavam os processos de dissolução
da Scuderie, iniciado depois do primeiro depoimento de Badenes frente à
Comissão de Direitos Humanos, em 1995.
O
Juiz Federal, que sucedeu o Juiz Athiê (indiciado por suspeita de
corrupção no Superior Tribunal de Justiça), entendeu que a Justiça
Federal não seria competente para julgar o caso, apesar de todos os
fatos apontarem nesse sentido e que a atuação criminosa da Scuderie
tem ramificações em diversos estados, e proferiu decisão no sentido
de que o processo passe para a Justiça Estadual.
O
Ministério Público Federal recorreu e atualmente o processo
encontra-se no Tribunal Regional Federal da 2ª Região, no
Estado do Rio de Janeiro aguardando decisão judicial.
Quando
este relatório foi escrito, Badenes estava sob proteção do Programa
de Assistência às Vítimas e às Testemunhas Ameaçadas, enquadrado em
uma modalidade especial
Assassinato
de João Elízio Lima Pessoa, ativista de direitos humanos e líder
comunitário, Águas Lindas, Goiás
No
início de fevereiro de 2000, homens encapuzados, que se acreditava
fossem policiais, fizeram uma emboscada e assassinaram o ativista
comunitário João Elízio Lima Pessoa, 43 anos de idade, em Águas lindas, estado de Goiás. João Elízio foi uma figura pública
de grande importância por muitos anos em Águas lindas. Em 1998, fundou o Conselho Comunitário de Águas
Lindas, que com sucesso conseguiu melhorias na coleta de lixo, trabalho
para pessoas carentes e apoio financeiro para os aposentados.
João Elízio também havia trabalhado na comissão
regional de Transporte de Águas Lindas, um órgão de
supervisão do governo. O objetivo mais visível de João Elízio,
entretanto, vinha sendo a defesa dos direitos civis. Nesse contexto,
havia sido um crítico aberto da Polícia Militar de Águas Lindas, que
acusava de extorsão, buscas sem mandato, ataques, espancamentos,
tortura e assassinato.
As
denúncias João Elízio sobre a má conduta da polícia atraíram sobre
ele o descontentamento da polícia local. As autoridades federais e
estaduais reconheciam o ativismo de João, e no final de 1998, o secretário
de Segurança Pública do estado de Goiás o indicou para o Comitê de
Segurança de Águas lindas,
um conselho de inspeção civil. Em sua nova função, continuou a
denunciar abusos de direitos cometidos pela polícia local. Logo após
sua indicação, começou a receber ameaças de morte de integrantes da
polícia de Águas Lindas, inclusive de um delegado e de um tenente. Em
novembro de 1998, João Elízio testemunhou frente à Comissão de
Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, acusando o sargento Josué
Alves da Silva de liderar um grupo de policiais corruptos responsável
por numerosos casos de espancamentos, extorsão, e, em um caso, por
liberar da custódia da polícia dois colegas que seriam julgados por
assassinato.
O testemunho de João Elízio foi
suficientemente condenatório para levar o presidente da Comissão de
Direitos Humanos, deputado Eraldo trindade,
a requisitar que o ministro da Justiça tomasse medidas urgentes para
garantir sua segurança. Infelizmente, o ministro
da Justiça não agiu. Dois anos depois, o mesmo sargento Alves se
tornou o principal suspeito do assassinato de João Elízio Lima Pessoa.
Em
7 de fevereiro de 2000, por volta das 22:00 horas, João e sua mulher,
Neuza maria de Souza,
estavam indo para casa de carro sob uma chuva pesada após uma reunião
do Comitê de Segurança de Águas Lindas.
João Elízio, no banco do motorista, notou alguns entulhos e pedras
grandes na estrada, e desviou para evitá-los. Quando ele virou o
volante, o carro morreu. Devido à chuva, o motor do carro estava frio,
e levou mais tempo que o normal para funcionar. Quando finalmente
conseguiu fazer o motor do carro funcionar, uma bala de revólver
atingiu o carro, esmigalhando o pára-brisas. Este primeiro tiro foi
seguido por uma série de disparos, que atingiram a ele e sua esposa
antes que conseguissem se agachar juntos ao painel do carro. Depois que
os disparos cessaram, sua esposa, ferida no pescoço, engatinhou para
fora do carro e correu ao longo da estrada para pedir socorro. O
primeiro carro a parar foi um veículo da polícia, que a levou de volta
até o carro de João. Enquanto eles se aproximavam,
Neuza notou o que lhe pareceu ser um carro da polícia se
afastando de uma área obscura e cheia de árvores próxima dali. João
estava morto chegaram ao local da emboscada, tendo sido atingido por três
balas na cabeça. Os policiais que ajudaram a esposa de João, disseram
a ela que não poderiam perseguir os assaltantes, pois não tinham armas
suficientes.
No
dia seguinte, o presidente da Comissão de Direitos Humanos, deputado trindade,
solicitou a assistência da polícia
Federal na investigação. O deputado Trindade ressaltou em sua
correspondência que a ação das autoridades federais era imperativa
desta vez, visto que o governo havia falhado anteriormente na forma como
tratou a ameaça à vida de João Elízio.
Naquela
mesma semana, o disco rígido do computador de João Elízio, no escritório
da Comissão regional de
Transporte foi misteriosamente apagado, segundo os depoimentos de sua
esposa e de outra testemunha que solicitou que sua identidade não fosse
revelada. Ambas as testemunhas afirmaram que o disco rígido continha
testemunhos sobre violações de direitos civis pela polícia e que João
pretendia entregar para a Comissão de Direitos Humanos e Comissão
Parlamentar de Inquérito (CPI) do narcotráfico em Brasília.
Em
15 de fevereiro de 2000, uma testemunha ocular oculta por um capuz, óculos
escuros, luvas e um casaco longo chegou a uma delegacia de polícia em
Goiânia e disse aos investigadores que o mesmo sargento Alves que João
havia anteriormente acusado de liderar um grupo de policiais corruptos
havia participado de seu assassinato.
A testemunha afirmou que quatro policiais encapuzados, dois usando
distintivos da Polícia Militar, abriram fogo contra o carro parado de
João Elízio. Depois do tiroteio, os quatro homens saíram da estrada
correndo para a mata e tiraram seus capuzes. A testemunha conseguiu ver
seus rostos e identificou um dos policiais como o sargento Alves. A
testemunha também afirmou que os quatro policiais entraram em uma
caminhonete da Polícia Militar estacionada em uma clareira na mata e saíram
dali. Finalmente, a testemunha notou dois outros carros da polícia,
ambos com policiais dentro, em uma estrada ali perto.
O
depoimento da testemunha levou o secretário de Segurança Pública do
estado de Goiás, Demóstenes Torres, a deter todos os treze oficiais da
Polícia Militar em serviço na noite do assassinato de João Elízio
Lima Pessoa. Os Departamentos de Polícia Civil e Militar em Águas
Lindas iniciaram investigações separadas, tendo o sargento Alves como
principal suspeito.
Em
14 de fevereiro de 2002, o Centro de Justiça Global enviou Ofício JG/RJ
no 031/02 para o secretário Torres, solicitando maiores
informações sobre os recentes progressos deste caso.
Até
o momento de finalização deste relatório, o Centro de Justiça Global
não havia recebido uma resposta.
Tentativa
de assassinato de Sivaldo Dias campos,
membro do Movimento Cívico de Combate à Corrupção, Cuiabá, Mato
Grosso
Em
setembro de 2000, Sivaldo Dias Campos era o presidente do Partido dos
Trabalhadores (PT) em Cuiabá. Campos era um militante ativo do
Movimento Cívico de Combate à Corrupção (MCCC). Em 9 de setembro de
2000, Campos denunciou um esquema de compra de votos, implicando vários
candidatos à câmara municipal de Cuiabá. Campos apresentou suas
queixas primeiro a um juiz responsável por supervisão eleitoral, e então
publicou suas acusações na imprensa. A denúncia de cCampos
incluía conversações de telefone gravadas entre candidatos e equipe
de campanha.
Em
9 de outubro, indivíduos em um carro vermelho não-identificado
fotografaram a casa de Sivaldo e as de seus vizinhos no Jardim Industriário,
bairro de Cuiabá.
Na manhã de 10 de outubro de 2000, às 7:30 horas, Campos estava em
casa com sua mulher, Sônia Paiva de Oliveira, quando um homem jovem
apareceu em sua porta da frente. Segundo sua esposa , após alguns
minutos ela olhou novamente e percebeu que havia três homens à porta,
ao invés de um. Campos apareceu na sala e os homens entraram na casa. Sônia
percebeu que os três homens jovens carregavam revólveres. Campos disse
a sua mulher que permanecesse calma. Os homens perguntaram por objetos
de valor, como dinheiro, jóias e a chave do carro, e a levaram para o
quarto. Do quarto Sônia ouviu um barulho alto seguido pelo som de um
corpo caindo no chão. Ela deixou o quarto para ver o que estava
acontecendo e viu seu marido caído no chão. Ele conseguiu levantar e
sair da sala, indo em direção ao quarto. Um dos homens então atirou
em Campos, atingindo-o no pescoço. Campos cambaleou até o quarto e então
caiu no chão. Quando eles estavam saindo, outro homem deu um tiro na
cabeça de Campos. Eles deixaram a casa no carro da vítima e o
abandonaram a menos de cinco quilômetros dali.
Por milagre, Campos sobreviveu.
A
pasta de documentos de Campos desapareceu do carro. naquele
dia Campos tinha uma entrevista agendada na qual planejava denunciar
outros crimes eleitorais.
Por
volta das 10:30 horas, apenas três horas após a tentativa de
assassinato, a polícia conclui sua investigação do caso, dizendo a Sônia
que havia ocorrido um roubo de rotina, agravado pela reação da vítima.
No
começo da tarde do mesmo dia, três suspeitos já haviam sido presos.
Testemunhas oculares não reconheceram nenhum deles.
Os
deputados josé Dirceu e aloísio
mercadante apresentaram ao ministro da Justiça José Gregori
um documento solicitando a proteção de Sônia assim como de outras vítimas
potenciais. Entretanto, o ministro da Justiça autorizou proteção
apenas para Sônia, e somente pelo tempo que ela passar fora de casa.
O
Public
prosecutorprocurador-geral
de justiça de mato Grosso
indiciou seis pessoas pelo atentado à vida de Sivaldo. Três deles
confessaram a participação no crime, estão presos e aguardam
julgamento. Nicássio Barbosa, que supostamente orquestrou o ataque, e
dois cúmplices também aguardam julgamento, em liberdade.
O
ataque a Sivaldo o deixou com o lado esquerdo do corpo paralisado e
incapaz de falar.
Ameaças
de morte à equipe do Centro de Direitos Humanos Simão Bororo, Rondonópolis,
Mato Grosso
No
outono de 1996, a equipe do Centro de Direitos Humanos “Simão
Bororo” (CDHSB) de Rondonópolis, estado do Mato Grosso, tornou-se
alvo de uma campanha difamatória da mídia e começou a receber cartas
ameaçadoras. O CDHSB vem denunciando por vários anos, as más condições
das prisões em Rondonópolis e documentando ameaças de morte, tortura
e assassinatos cometidos pela Polícia Civil local. Isso levou a uma reação
contra o CDHSB e a defesa dos direitos civis em geral, por parte da polícia
e os políticos locais.
No
outono de 1996, essa reação começou a tomar a forma de uma campanha
ativa quando uma estação de rádio local, Rádio Clube de Rondonópolis,
começou a atacar diretamente o CDHSB em seu programa “Ronda
Policial”.
O programa acusou o CDHSB de favorecer os direitos dos criminosos sobre
os das vítimas, e foi parte de uma campanha maior da mídia dirigida
contra o CDHSB e defensores dos direitos humanos em geral que envolveu a
estação de televisão local TV Cidade. A Rádio Clube e a TV Cidade
eram ambas de propriedade do deputado Wellington Fagundes, um oponente
da defesa de direitos humanos com conexões próximas com a força
policial de Rondonópolis. Logo após a primeira transmissão, o
deputado Fagundes devotou uma segunda publicação à suposta má
conduta do CDHSB, e instou os espectadores a fechar a organização. O
CDHSB considerou essa mensagem um incitamento à violência, e solicitou
intervenção judicial para moderar o tom do programa. Os esforços do
CDHSB não tiveram sucesso, e o deputado fagundes
redobrou seus ataques contra o CDHSB.
Em
13 de novembro de 1996, a Comissão de Direitos Humanos da Câmara de
Deputados enviou o deputado Pedro Wilson Guimarães a Rondonópolis para
investigar a situação, e solicitou que a Federação Nacional dos
Jornalistas (FENAJ) enviasse um representante para acompanhar a
investigação do deputado Wilson.
Durante
o começo de 1997, o CDHSB recebeu ameaças de morte anônimas pelo
correio. Uma carta avisava que se continuasse a “defende ladrão
asasino” (sic), a equipe do CDHSB estava colocando suas vidas em
risco.
Algumas cartas tinham como alvo funcionários específicos e suas famílias.
Em abril daquele ano, a procuradora Valéria Teressoli Bertholdi Estrela
e a juíza Sonja Faria Borges de Sá, que estavam na época trabalhando
com o CDHSB em um caso envolvendo crimes cometidos pela Polícia Civil,
receberam ameaças de morte e solicitaram proteção às suas vidas. Em
28 de abril de 1997, após vários meses de ameaças, o CDHSB enviou uma
extensa queixa ao procurador
Geralprocurador-geral
de justiça do mato
Grosso, Antônio Hans, assim como para outras autoridades estaduais e
federais, com relação a natureza incendiária do programa de televisão
e das cartas hostis.
No mesmo dia, o deputado Pedro Wilson Guimarães, que havia estado em
Rondonópolis investigando o caso em nome da Comissão de Direitos
Humanos da Câmara dos Deputados, escreveu ao procurador-g
Geral solicitando que autoridades estaduais fornecessem
apoio e recursos adequados para o Ministério Público de Rondonópolis,
para que o mesmo fosse capaz de levar em frente as investigações e
seus funcionários não estivessem sujeitos a intimidações.
Em
10 de julho de 1997, o procurador-geral
informou à Comissão que tomaria medidas para investigar as ameaças
sofridas pelo CDHSB e protegeria as vítimas dessas ameaças.
Em
15 de fevereiro de 2002, o Centro de Justiça Global enviou Ofício JG/RJ
no 058/02 para o procurador-geral
de justiçadr.
antônio,
Public
prosecutor
do estado do Mato Grosso, solicitando maiores informações
sobre os recentes progressos deste caso.
Em
resposta, em 28 de fevereiro de 2002, Guiomar Teodoro Borges, director
of Public Prosecutionsprocurador-geral
de Justiça dee
Mato Grosso, informou ao Centro de Justiça Global que, em resposta a
uma requisição do Office
of the Public ProsecutorMinistério
Público, o juiz supervisionando
que
cuidava do caso havia
arquivado o mesmo baseado na expiração do estatuto de limitaçõesdeclarou
por sentença a extinção
da punibilidade dos agentes, que nunca foram identificados.
Assassinato
de Carlos Magno Nazareth cerqueira,
Ex-Chefe daPolícia Militar, Rio de Janeiro
O
cCoronel
carlos magno Nazareth cerqueira
serviu como delegado
chefe da Polícia Militar no estado do Rio de Janeiro
durante as administrações do governador Leonel Brizola de 1983 a 1986
e de 1991 a 1994. Como chefe da polícia, o coronel
Cel.
Cerqueira buscou limitar os abusos cometidos por seus subordinados
através de uma série de medidas, inclusive restringindo as operações
policiais nas favelas. Antes de se aposentar da Polícia Militar em
1994, o coronel
Cel.
Cerqueira desenvolveu uma reputação de ser a favor dos direitos
humanos e punir os policiais envolvidos em violações dos direitos dos
cidadãos. Depois de sua aposentadoria, o coronel
Cel.
Cerqueira dedicou seu tempo ao estudo da violência urbana como
vice-presidente do Instituto carioca de Criminologia.
Em
14 de setembro de 1999, o coronel
Cel.
Cerqueira, 62 anos de idade, foi atingido por tiros e assassinado
enquanto esperava o elevador no prédio em que trabalhava, perto do
centro do Rio.
Espantosamente, duas horas depois autoridades estaduais da polícia
declararam o crime solucionado. O secretário de segurança
pública do estado do rio
de janeiro, Josias Quintal, contou à mídia brasileira que o
sargento da Polícia Militar Sidney Rodrigues, 45, havia dado o tiro que
matou Cel. Cerqueira
e então, logo depois, matou-se com um tiro na cabeça.
Autoridades do rio de Janeiro também afirmaram que o sargento
Sgt.
Rodrigues tinha um histórico de problemas psicológicos. O
comandante do batalhão em que Sgt.
rodrigues trabalhava
e a esposa de Sgt.
Rodrigues negaram ter conhecimento de seus supostos problemas
psicológicos.
Segundo
os depoimentos iniciais das testemunhas publicados na mídia brasileira,
rodrigues atirou várias
vezes; tiros adicionais podem ter sido disparados pelos guardas de
segurança em serviço no prédio.
A arma usada por Rodrigues pertencia a outro policial que havia sido
assassinado em agosto de 1998. desde
a morte deste policial, a arma estava desaparecida.
Na
opinião do então
ex-governador
do Rio de Janeiro leonel
Brizola e do atual
governador Anthony Garotinho, o assassinato pode ter sido
uma represália contra o coronel
Cel.
Cerqueira por seus esforços em reestruturar as forças policiais
do Rio de Janeiro. “Foi um crime encomendado”, declarou Garotinho.
Após
a morte do sargento
Sgt.
Rodrigues em 27 de setembro, em decorrência de ferimentos
causados por arma de fogo, a polícia descartou a hipótese de suicídio.
Relatórios da autópsia mostraram que a bala que atingiu Rodrigues foi
disparada de uma certa distância e de outro revólver que o dele. Esta
revelação invalidou a explicação do assassinato de Cel.
Cerqueira inicialmente apresentada pelas autoridades, isto é,
homicídio seguido de suicídio. As verdadeiras circunstâncias da morte
de Cel. Cerqueira
permanecem desconhecidas, assim como os motivos das autoridades para
apresentar o caso como solucionado apesar da falta de evidências
convincentes que garantissem tal conclusão.
Em
19 de fevereiro de 2002, o Centro de Justiça Global enviou Ofício JG/RJ
no 073/02 para o secretário Josias Quintal requisitando
maiores informações sobre os recentes progressos deste caso.
Em
resposta, em 28 de fevereiro de 2002 o chefe de Gabinete da polícia
Civil, Danton Moreira de Souza, informou ao Centro de Justiça Global
que em 7 de julho de 2000 o inquérito policial havia sido reativado,
mas que não havia mais informações disponíveis sobre o assassinato
de Cel. Cerqueira.
Ameaças
contra Luis Eduardo Soares, Ex-Coordenador de Segurança Pública, Rio
de Janeiro, Capital
Em
1998, Anthony Garotinho foi eleito governador do Estado do Rio de
Janeiro. Um dos principais pontos de sua campanha era a reforma da polícia.
Após sua eleição, Garotinho nomeou Luis Eduardo Soares, respeitado
professor universitário e especialista em segurança pública, para o
cargo de Coordenador de Segurança, Justiça, Defesa Civil e Cidadania
da Secretaria de Segurança Pública do Estado.
Em
linhas gerais, o projeto de segurança proposto por Luis Eduardo Soares
promovia o policiamento comunitário e o controle externo dos abusos
policiais. Logo após tomar posse, o governo do Estado criou a Ouvidoria
de Polícia e nomeou Julita Lerngruber, reconhecida especialista em
assuntos penais, para sua diretoria. Na mesma época, Luis Eduardo
Soares buscou a exoneração de policiais, conhecidos por seus métodos
abusivos, dos postos de comando das forças policiais. Esses esforços
provocaram resistência significativa de vários setores tanto da Polícia
Civil quanto da Polícia Militar do estado. Durante seu mandato na
Secretaria de Segurança Pública do Estado, Luis Eduardo Soares
precisou de um minucioso esquema de segurança pessoal.
No
final de 2000, Luis Eduardo Soares se opôs a nomeação de Rafik
Lousada para a direção da Polícia Civil. Sua posição — baseada em
preocupações sobre o envolvimento de Rafik Lousada em corrupção —
acionou uma crise dentro da Secretaria de Segurança Pública. Em princípios
de março, após receber uma queixa de um delegado sobre a participação
de policiais que teriam facilitado a fuga de um suspeito traficante,
Luis Eduardo Soares encaminhou a informação diretamente ao Ministério
Público e não à Corregedoria da Polícia. Imediatamente após esse
incidente, o Governador Garotinho exonerou Luis Eduardo Soares.
Após seu afastamento, Luis Eduardo Soares, sofreu ataques do Governador
que através da imprensa contestou sua ética e acusou-o de
indiretamente apoiar o tráfico de drogas. Em decorrência da
intensificação das tensões que seguiram as acusações, o Secretário
de Segurança Pública designou trinta policiais militares para garantir
a segurança pessoal de Luis Eduardo Soares. Apesar dessa medida de
precaução, Luis Eduardo Soares temia que os ataques verbais se
tornassem físicos e no dia 21 de março de 2000, deixou o Rio de
Janeiro em direção aos Estados Unidos. Sua família, mais tarde, também
se transferiu para Nova Iorque, também temendo por sua segurança.
Alguns
dias após a partida de Luis Eduardo Soares, a esposa de um de seus
colegas foi abordada por policiais da Delegacia de Repressão de
Entorpecentes, DRE, divisão da Polícia Civil. Depois do incidente a
mulher contatou seu marido que solicitou a ajuda da força da Polícia
Militar designada para a proteção de Luis Eduardo Soares. Policiais
Militares escoltaram o casal até sua casa em um veículo utilizado pelo
destacamento de segurança do Luis Eduardo Soares, e em seu trajeto,
foram interceptados em uma emboscada da Polícia Civil. Seguiu-se uma
disputa entre representantes das Polícias Civil e Militar que quase
resultou em um confronto armado.
Nos
Estados Unidos, Luis Eduardo Soares trabalhou na Universidade de
Columbia, onde escreveu um livro, Meu
Casaco de General,
relatando suas experiências na Secretaria de Segurança Pública do Rio
de Janeiro. Em 2001, Luis Eduardo Soares retornou ao Brasil e assumiu a
responsabilidade pelos assuntos de segurança do governo da cidade de
Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul.
No
dia 19 de fevereiro de 2002, o Centro de Justiça Global enviou ofício
JG/RJ No. 074/02 para o Cel. Josias Quintal, Secretário de Segurança Pública
do Estado do Rio de Janeiro, solicitando maiores informações sobre os
desenvolvimentos recentes referentes a esse caso.
Em
resposta, no dia 28 de fevereiro de 2002, o Chefe de Gabinete da Polícia
Civil, Danton Moreira de Souza informou que não havia nenhuma outra
informação sobre o caso disponível.
Ameaças de
Morte contra Antônio Carlos Ferreira Gabriel (“Rumba”), Líder
Comunitário, Rio de Janeiro, Capital.
Antônio
Carlos Ferreira Gabriel, conhecido como “Rumba”, 47 anos, é um líder
comunitário, de descendência afro-brasileira, na favela do
Jacarezinho, Rio de Janeiro. Nos anos 80, cocaína e armas de fogo começaram
a circular no Jacarezinho e em outras comunidades, criando uma atmosfera
de tensão entre os moradores e traficantes. Segundo Rumba, a polícia
tem desempenhado um papel chave na manutenção dessas tensões através
de invasões regulares nas comunidades, abuso de autoridade e uso
indiscriminado da violência durante perseguições de traficantes.
Rumba
trabalha desde 1972 em projetos sociais dentro do Jacarezinho. Em 1994,
criou o Centro Cultural do Jacarezinho e em 1995 tornou-se membro da
Associação de Moradores do Jacarezinho. Desde 1999, Rumba é o
presidente dessa Associação, tendo criado a Liga das Associações do
Complexo do Jacarezinho que oferece um fórum para debates sobre os
assuntos da comunidade.
Em
1994, Rumba começou a denunciar casos de violência policial na cidade
do Rio de Janeiro, especialmente casos de violações dos direitos
humanos cometidos contra os moradores do Jacarezinho. Essas violações
incluíam invasões e operações de busca nas casas sem a devida
autorização, prisão arbitrária dos residentes e execuções sumárias.
Em
1995, o então Governador do Estado do Rio de Janeiro, Marcelo Alencar,
com o apoio do então Secretário de Segurança Pública, Gen. Nilton
Cerqueira, implementou uma nova política de prevenção ao crime através
da premiação e promoção de policiais envolvidos em atos de
“bravura”. Na prática, no entanto, esses atos de bravura
invariavelmente resultavam em incidentes onde civis eram mortos por
policiais.
Logo
após, Cel. Marcos Paes, Comandante do Terceiro Batalhão de Polícia
responsável pela jurisdição do Jacarezinho, declarou à imprensa do
Rio de Janeiro que os moradores dessa comunidade não teriam permissão
para deixar suas casas após as 10:00 da noite, e que aqueles que
chegassem as suas casas após esse horário seriam considerados
“marginais”. Em doze dias sob a supervisão do Cel. Paes, doze
moradores foram mortos no Jacarezinho. Rumba acredita que, o aparato de
segurança, montado pelo Gen. Cerqueira e o Cel. Paes permitiu e
encorajou policiais à violarem os direitos humanos mais básicos dos
moradores do Jacarezinho.
Ainda
segundo Rumba, por vários meses, pelo menos uma pessoa era morta por
semana no Jacarezinho. Rumba denunciou esses e
outros abusos cometidos pela polícia à Ouvidoria de Polícia do Rio de
Janeiro.
Em
1999, para chamar atenção sobre a crise no Jacarezinho e o trabalho da
Associação dos Moradores, Rumba convidou organizações de direitos
humanos, a Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do
Estado do Rio de Janeiro e da Câmara dos Vereadores para visitarem a
comunidade. Além disso, a Associação, liderada por Rumba, convocou a
imprensa e distribuiu panfletos para atrair publicidade.
Após
esse apelo público, Rumba começou a receber as primeiras ameaças,
inicialmente feitas através de ligações telefônicas para sua residência
onde uma voz masculina anônima dizia: “Rumba, eu vou te meter bala”
e também “Rumba, você não passa dessa semana”. Algumas das ameaças
foram feitas diretamente a sua esposa; outras foram deixadas em sua
secretária eletrônica. Durante esse período, apreensivo com sua
segurança, Rumba refugiou-se no Espírito Santo com sua esposa.
Ao
retornar do Espírito Santo, Rumba continuou seu trabalho como líder
comunitário do Jacarezinho. Após testemunhar na 23a. Delegacia de Polícia
no caso de uma família de quatro jovens que haviam sido mortos no
Jacarezinho, Rumba descobriu que alguém havia arrombado e atirado
contra a parede de sua casa. Rumba aflito com a falta de segurança no
Jacarezinho retornou ao Espírito Santo onde ficou durante um mês.
Em
agosto de 2000, Rumba retornou ao Jacarezinho e em entrevista ao site
“No.Com” sugeriu que as comunidades pobres poderiam se aliar a
elementos criminosos para prevenir o abuso policial. Em pleno desacordo
com as declarações de Rumba, o Secretário de Segurança Pública do
Rio de Janeiro, Cel. Josias Quintal declarou à imprensa que abriria uma
investigação policial sobre Rumba assim como de todos os outros líderes
que aderissem a sua causa.
As
ameaças foram intensificadas depois do ano 2000.
Em um incidente, no dia 17 de janeiro de 2001, o policial militar
Sgt. Castro, disse: “Tua batata está assando”, uma expressão
indicando que os dias de Rumba estariam contados.
No
mês de julho de 2001, Rumba denunciou a extorsão, corrupção e seqüestros
cometidos por policiais contra os moradores do Jacarezinho. Eram denúncias
de incidentes nos quais a polícia seqüestrava membros da família de
conhecidos traficantes, demandando resgates da ordem de R$ 30.000.
Muitas das vítimas apelavam a Rumba por ajuda, mas se recusavam a
reportar os incidentes oficialmente com medo de serem assassinados. Em
resposta, Rumba convidou a Ouvidoria de Polícia para trabalhar com a
Associação dos Moradores numa campanha para encorajar os cidadãos a
usar as linhas diretas da Ouvidoria.
Logo
em seguida, vários policiais começaram a seguir e atormentar Rumba. Em
uma ocasião, policiais entraram em sua casa com os revólveres
apontados, encontrando apenas sua esposa em trajes de dormir (para
entrar em sua casa os policiais tiveram que passar por três portas, que
precisariam uma chave mestra capaz de abrir qualquer fechadura). Sua
esposa ligou para ele pedindo ajuda. Quando ele chegou encontrou um
grupo de policiais em sua porta e fotografou-os. Embora Rumba tivesse
conseguido amenizar a situação, um policial forçou-o a entregar o
filme com suas imagens.
A
esposa de Rumba registrou queixa na 25a
Delegacia de Polícia.
Logo depois, Rumba e sua família começaram a receber novas ameaças
que levaram sua esposa a retirar as queixas. Essas ameaças eram feitas
por telefone e mensagens deixadas por policiais. Policiais vigiavam sua
casa o dia inteiro e a noite pessoas encapuzadas caminhavam próximo à
casa. Rumba e sua família se mudaram três vezes em menos de três
meses.
Durante
o período de Janeiro a agosto de 2001, o Secretário Cel. Josias
Quintal (que anteriormente ameaçara Rumba com um inquérito policial)
convidou-o para fazer parte do Centro de Referência para as Comunidades
Especiais. Rumba aceitou o convite como forma de se proteger das ameaças
de morte. Nesse espaço oficial, Rumba, juntamente com vários outros líderes,
expôs alegações de falta de conduta de centenas de policiais graves o
suficiente para garantir suas exonerações.
Em
agosto de 2001, Rumba recebeu um convite para participar por vários
meses em um projeto chamado CAPA (Coalizão Contra o Abuso Policial) na
Universidade de Texas, em Austin, Estados Unidos. Ao retornar ao Rio de
Janeiro, no final de 2001, Rumba recebeu a informação de que a policia
estava ciente de seu retorno.
Em
19 de dezembro de 2001, um grupo da Polícia Militar invadiu o Centro
Cultural do Jacarezinho, dirigido por Rumba. O único funcionário
presente no momento da invasão correu para informar Rumba da ação
policial.
Quando Rumba chegou ao local e solicitou uma explicação não recebeu
qualquer resposta. Nesse momento, Rumba deixou o edifício e contatou o
advogado do Centro Cultural e o Centro de Justiça Global.
No
dia 21 de dezembro de 2001, o Centro de Justiça Global encaminhou
informações sobre as ameaças de morte sofridas por Rumba para a
Representante Especial sobre os Defensores de Direitos Humanos das Nações
Unidas, Hina Jilani.
No
dia 15 de fevereiro de 2002, o Centro de Justiça Global enviou Ofício
JG/RJ No. 065/02 para o Secretário de Segurança Pública, Cel. Josias
Quintal solicitando maiores informações sobre os acontecimentos mais
recentes desse caso.
Até
a finalização deste relatório o Centro de Justiça Global não havia
recebido uma resposta.
Ameaças
ao Grupo Tortura Nunca Mais e a sua ex-Presidente, Cecília Coimbra, Rio
de Janeiro, Capital
O
Grupo Tortura Nunca Mais, GTNM/RJ, tem sido extremamente ativo na denúncia
de casos de tortura e abusos policiais e militares cometidos desde a
transição para a democracia em 1985. Tanto o GTNM/RJ e, em particular,
Cecília Coimbra, que atualmente é vice - presidente da organização
no Rio de Janeiro, tem recebido várias ameaças desde 1986.
Em
1986, quando o GTNM/RJ inaugurou várias ruas com nomes de militantes
mortos ou desaparecidos durante a ditadura militar no Brasil, recebeu
uma ligação que perguntava se os membros do GTNM/RJ haviam preparados
seus caixões.
Logo depois, o Grupo recebeu uma carta que alertava para que seus
membros tomassem cuidado porque estavam prestando homenagens a
terroristas e criminosos. O GTNM/RJ denunciou o fato na imprensa
nacional e as ameaças diminuíram. Em 1991, após uma campanha
organizada pelo GTNM/RJ que visava revogar as licenças médicas de médicos
que falsificaram autópsias para encobrir assassinatos cometidos pelas
forças policiais e de segurança durante a ditadura, o GTNM/RJ recebeu
novas ameaças e cartas intimidatórias. Em 1994, exatamente trinta anos
após o golpe de Estado que instalou a ditadura militar no Brasil, o
GTNM/RJ recebeu várias ameaças anônimas em resposta a sua campanha
contra a tortura “64 nunca mais”.
No
início de março de 1998, o GTNM/RJ recebeu várias cartas e telegramas
(alguns anônimos, outros assinados por oficiais militares) expressando
desprezo pela organização e seu trabalho. Depois de um mês, o GTNM/RJ
ganhou as manchetes nacionais ao denunciar a promoção de generais das
forças armadas com evidências, apuradas pelo Grupo, de participação
em atos repressivos durante a ditadura. Segundo a tradição militar, os
oficiais receberiam a promoção em ato público no dia 31 de março,
dia do aniversário do golpe militar de 1964. Os protestos do GTNM/RJ
contra a escolha dessa data em particular para comemorar o evento e a
promoção de alguns desses indivíduos provocou um debate na imprensa
sobre a utilização desta data para a promoção desses oficiais que
uma vez estiveram envolvidos em atividades repressivas no dia do aniversário
do golpe.
Além
da publicidade gerada pela crítica à promoção dos oficiais, o GTNM/RJ
acirrou ainda mais a hostilidade por parte dos simpatizantes militares
ao coordenar uma campanha de sucesso que culminou na renúncia forçada
do Gel. Ricardo Agnese Fayad, que havia sido nomeado como Diretor
Assistente de Saúde das Forças Armadas. Segundo documentos do GTNM/RJ,
Ricardo Fayad participou diretamente na tortura de presos políticos nos
anos 60 e 70.
No
dia 1°
de abril de 1998, um grupo chamado de “Tradição Família e
Propriedade” (TFP) distribuiu panfletos acusando o GTNM/RJ de
“comunizarem” o país. Por volta da mesma hora, Cecília Coimbra,
então presidente do Grupo, notou que estava sendo seguida quando se
dirigia ao evento do GTNM/RJ.
No
dia 3 de abril de 1998, o GTNM recebeu um panfleto anônimo atacando
seus membros pela conduta contra a nomeação do Gen. Fayad. No mesmo
dia, Cecília Coimbra recebeu uma mensagem gravada com ameaças. A
mensagem dizia: “Filha da p., terrorista, você vai ver o que você
merece.”
No
dia 8 de abril, outra mensagem gravada na secretária eletrônica do
escritório do GTNM/RJ dizia: “Alô, veja bem, aqui é um amigo da
causa de vocês. Avisa a Cecília que estão planejando coisa feia pra
ela. Cuidado, tomem muito cuidado porque não vai ser coisa pequena não.
Vai ser coisa séria. E tem mais, cuidado com a floricultura. Eu não me
identifico por segurança. Cuidado! Estão armando pra valer.”
O escritório do GTNM no Rio de Janeiro está localizado no
segundo andar de um prédio onde no primeiro andar funciona uma
floricultura. Cecília Coimbra relatou ao Centro de Justiça Global que
“o objetivo principal (das ameaças) era intimidar nosso trabalho.”
No
dia 8 de abril, Cecília Coimbra enviou cartas e efetuou ligações para
a Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro, para o Presidente
da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados e para o
Presidente Fernando Henrique Cardoso solicitando proteção para os
membros do GTNM/RJ.
No
dia 9 de abril de 1998, as ameaça tornaram-se públicas mas as
autoridades estaduais e federais não tomaram as medidas adequadas para
garantir a segurança dos membros do GTNM/RJ. As autoridades do Rio de
Janeiro ofereceram o serviço de segurança prestado por policiais em
uma viatura que vigiava, uma vez por semana, durante um mês, as reuniões
na sede do GTNM no Rio de Janeiro.
Embora,
nenhum membro do GTNM/RJ tenha sofrido danos físicos em 1998, Cecília
Coimbra continua apreensiva pela segurança de seus companheiros. O GTNM/RJ
continua recebendo cartas com conteúdo intimidatório. Dessas cartas,
algumas são escritas a mão, outros impressos em computador e outros são
panfletos. O conteúdo varia desde ataques vulgares dirigidos à Cecília
e sua família a artigos escritos em defesa das ações de grupos
militares durante a ditadura no Brasil, criticando de forma contundente
as posições e o trabalho do GTNM/RJ. Segundo Cecília Coimbra, o grupo
tem recebido esse tipo de comunicação intimidatória todos os meses
durante os últimos quatro anos.
No
dia 19 de fevereiro de 2002, o Centro de Justiça Global enviou ofício
JG/RJ No. 072/02 para o Cel. Josias Quintal, Secretário de Segurança Pública
do Rio de Janeiro, solicitando maiores informações sobre os
acontecimentos atuais do caso.
Em
resposta, no dia 28 de fevereiro de 2002, o Chefe de Gabinete da Polícia
Civil do Rio de Janeiro, Danton Moreira de Souza, informou ao Centro de
Justiça Global que não foi possível localizar o arquivo referente ao
caso.
Ameaça
de Morte Contra Cristina Guimarães, Jornalista, Rio de Janeiro, Capital
Em
agosto de 2001, Cristina Guimarães, jornalista, trabalhou na reportagem
“Feira das Drogas”, noticiado pela Rede Globo. A matéria abordava o
tráfico de drogas em favelas do Rio de Janeiro e continha cenas de
traficantes vendendo drogas abertamente em plena luz do dia.
Para
fazer a matéria, Cristina entrou nas comunidades da Rocinha e Mangueira
com uma mini câmera escondida em sua bolsa, filmando por cerca de seis
horas. A matéria foi uma das vencedoras do Prêmio Esso de Jornalismo
em 2001. As imagens filmadas por Cristina permitiram à polícia
identificar vários suspeitos traficantes e levou à prisão de um
suspeito logo após a exibição da reportagem.
Em
setembro de 2001, ao retornar de suas férias, Cristina Guimarães soube
através de um companheiro de trabalho que morava na Rocinha, que os
traficantes haviam oferecido uma recompensa de R$ 20.000 por sua cabeça.
Cristina também recebeu várias ligações de um telefone localizado na
Rocinha. Quando ela atendia ao telefone, a pessoa perguntava se ela era
“a dona ferrada”.
Cristina
Guimarães também foi ameaçada enquanto dirigia. Em duas ou três
ocasiões, um motociclista equipado com capacete bateu em seu pára-brisa
e perguntou se ela era “Cristina”.
Cristina
alega que quando informou seu chefe na TV Globo das ameaças que estava
sofrendo, e não recebeu a devida atenção. Cristina começou a
adoecer, necessitando de tranqüilizantes para dormir, demitiu-se da
Rede Globo e se mudou do Rio de Janeiro. Ela reportou seu caso para
Anistia Internacional. Até 13 de janeiro de 2002, Cristina estava
vivendo clandestina, sob proteção de seguranças particulares.
Ameaça
de Morte contra Roberto Monte, Ativista dos Direitos Humanos e Plácido
Medeiros de Souza, Delegado de Polícia, Natal, Rio Grande do Norte
Francisco
Gilson Nogueira de Carvalho, advogado do Centro de Direitos Humanos e
Memória Popular, CDHMP, organização dirigida por Roberto Monte,
investigava e reportava crimes cometidos por um esquadrão da morte
conhecido como “Meninos de Ouro”. O grupo CDHMP se tornou-se
conhecido devido às investigações de uma Comissão Especial do Ministério
Público de Natal e da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos
Deputados. Segundo a Human Rights Watch, os Meninos de Ouro era um grupo
formado por policiais civis e membros da Secretaria de Segurança Pública
responsáveis por uma dúzia de assassinatos e vários outros crimes
cometidos ao longo da última década.[95]
A busca de Gilson Nogueira por justiça nesses crimes
intensificou as tensões entre a polícia do Rio Grande do Norte e a
comunidade de direitos humanos.
Em
20 de outubro de 1996, passageiros de um veículo em trânsito
dispararam dezessete tiros contra Gilson Nogueira matando-o quando ele
retornava de Macaíba, Rio Grande do Norte.[96]
Até o presente, ninguém foi condenado por esse crime
embora um suspeito (Otávio Ernesto) aguarde julgamento, como detalhado
abaixo.
Ao
longo de seis anos, Roberto Monte e seus companheiros do CDHMP
continuaram a pressionar, com alguns êxitos, as autoridades locais para
que estas investigassem e julgassem os policiais e funcionários da
Secretaria de Segurança Pública envolvidos nos assassinatos atribuídos
aos Meninos de Ouro.[97]
Um avanço importante foi a condenação de um dos membros dos Meninos
de Ouro, o policial Jorge Luis Fernandes, conhecido como “Jorge
Abafador” por um homicídio duplo cometido em 3 de março de 1995 no
bairro de Mãe Luiza em Natal.
O
policial civil Plácido Medeiros de Souza, atuou em uma investigação
paralela sobre o assassinato de Gilson Nogueira e descobriu que Jorge
Luis Fernandes, em prisão preventiva à época do assassinato, era
constantemente liberado pelas autoridades para sair da delegacia. As saídas
de Jorge Luis Fernandes e seus retornos eram anotados em um livro de
registro. Plácido descobriu, ao revisar esse registro que Jorge Luis
Fernandes deixou a delegacia no dia 19 de outubro de 1996 e retornou em
21 de outubro de 1996, o que abria uma possibilidade de seu envolvimento
no assassinato de Gilson Nogueira no dia 20 de outubro de 1996. Logo após
a investigação de Plácido, as evidência das saídas e retornos de
Jorge Luis Fernandes nessas datas desapareceu do livro de registros da
investigação policial sobre o caso que, por sua vez, foi encerrado sem
implicar ninguém. Como descrevemos abaixo, uma investigação paralela
efetuada pela Human Rights Watch e pelo fotógrafo-jornalista John Maier
levantou novas evidências, o que levou a reabertura do caso e
posteriormente o ex-policial Otávio Ernesto foi indiciado.
Embora
as autoridades do Rio Grande do Norte tenham afastado Maurílio Pinto de
Medeiros de seu posto de Secretário Adjunto de Segurança Pública
durante a investigação sobre o assassinato de Gilson Nogueira, seis
meses depois Maurílio Pinto de Medeiros foi designado para a direção
de um departamento especial da polícia do estado. No final de 2001, o
Secretário de Segurança Pública do Rio Grande do Norte, Anísio
Marinho Neto, nomeou Maurílio Pinto de Medeiros para o cargo de
Sub-Cordenador de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública.
Com essa promoção, Maurílio Pinto de Medeiros ganhou responsabilidade
sobre as investigações e as informações sobre os suspeitos.
Jorge
Luis Fernandes foi condenado a quarenta e sete anos de prisão em regime
fechado pelo duplo assassinato cometido em março de 1995. No entanto,
segundo fontes do Rio Grande do Norte, Jorge Luis Fernandes teria
continuado a cumprir sua sentença na delegacia de Cidade Satélite, ao
invés de cumprir sua sentença em um estabelecimento seguro exigido por
lei. Além disso, Jorge Luis Fernandes continua sendo funcionário público
e recentemente recebeu uma promoção. O nível de cumplicidade vai além:
o juiz criminal, Carlos Abel, garantiu a Jorge Luis Fernandes permissão
para deixar a delegacia duas vezes por semana, uma ordem sem precedentes
válidos no direito brasileiro.
Roberto
Monte tem sido o ativista local mais importante na denúncia do papel de
Maurílio Pinto de Medeiros, Jorge Luis Fernandes e outros policiais
violentos nesse e em outros vários assassinatos. Devido ao seu trabalho
de defesa dos direitos humanos, Roberto Monte vem sendo ameaçado de
morte e objeto de processos indevidos.
É
nesse contexto que o mais recente plano para assassinar Roberto Monte e
Plácido veio à tona. Um homem anônimo primeiro ligou para Plácido no
dia 22 de outubro de 2001 e depois novamente (esta vez, Plácido
conseguiu gravar o telefonema) no dia seguinte, 23 de outubro,
fornecendo informações sobre um recente plano do assassinato de Plácido
e Roberto Monte.
Além
dessas duas ligações telefônicas, o Centro de Justiça Global obteve
informações de uma pessoa em Natal que pediu para não ser
identificada que também recebeu uma ligação anônima—a terceira
desta série—entre 8 e 9 de novembro de 2001, informando que Jorge
Luis Fernandes planejava não apenas assassinar Plácido como também a
Roberto Monte.
O
Centro de Justiça Global obteve a transcrição da ligação gravada
feita para Plácido no dia 23 de outubro de 2001. O seguinte trecho
confirma o grau de urgência desse caso:
Plácido:
“… Esses caras que vão atacar, eles virão a minha casa ou vão
para outro lugar? “
Chamador
anônimo: “Não, eu não sei. Não
sei onde... você sabe, eu acho que pode ser a qualquer hora... A pessoa
que falou disse que pode ser a qualquer momento... Hoje, quando você
sair... qualquer hora... por isso esteja preparado para usar um colete
[a prova de balas] , você sabe, esteja preparado, e com seu revolver
pronto, quase na mão...”
Plácido:
“Mas esses caras só atiram na cabeça... esses caras só
atiram na cabeça... eles sabem [como lidar com] coletes...”
Chamador
anônimo: “Não deixe nenhuma motocicleta chegar muito perto... essas
coisas... seria bom ter alguém ao seu lado, com um revólver na mão...”
Com
base nessa informação, no dia 13 de novembro de 2001, Plácido
preparou uma declaração a que foi enviada à Comissão Interamericana
de Direitos Humanos da OEA, resumindo o contexto das intimidações e
suas advertências telefônicas de 22 e 23 de outubro de 2001.
Embora
Plácido não tenha podido determinar a identidade das pessoas que
efetuaram as ligações, o aparelho de identificação de chamadas
registrou o número: (84) 234-1337.
Segundo Plácido, esse número é de um telefone público próximo
à delegacia onde Jorge Fernandes estava detido. [98]
Ainda
com base nessa informação, em 14 de novembro de 2001, durante uma audiência
perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, o Centro de
Justiça Global apresentou evidências do risco de vida ao qual estavam
submetidos Roberto Monte e Plácido. O Centro de Justiça Global também
forneceu informações adicionais nas subcomissões subseqüentes da
Comissão.
Na
Sexta-feira, 7 de dezembro de 2001, a Comissão autorizou o pedido de
medidas cautelares do Centro de Justiça Global ao governo brasileiro
para oferecer proteção a Roberto Monte e Plácido e tomar medidas
urgentes para garantir que Jorge Luis Fernandes seja transferido para um
centro de detenção de segurança, sem o direito de saída do
estabelecimento. [99]
O
Centro de Justiça Global recebeu a decisão na segunda-feira, 10 de
dezembro de 2001, e em seguida, enviou ofício No. JG-RJ 228/01 para a
Representante Especial dos Defensores de Direitos Humanos da ONU, Hina
Jilani. O ofício informava a Representante Especial do risco de vida
que correm Roberto Monte e Plácido.
No
dia 13 de dezembro de 2001, a Anistia Internacional circulou um
comunicado urgente entre seus membros, solicitando que estes escrevessem
as autoridades brasileiras solicitando medidas de proteção para
Roberto Monte e Plácido. Centenas de cartas foram enviadas.
Em
Janeiro de 2002, o Ministro da Justiça escreveu a Roberto Monte e Plácido
oferecendo a assistência do Programa de Proteção a Testemunha PROVITA
ou outros meios de proteção. Tanto Roberto Monte quanto Plácido
responderam que aceitariam a proteção da Polícia Federal, mas não
entrariam no programa PROVITA.[101]
A organização do PROVITA enviou uma segunda correspondência, no
dia 26 de fevereiro de 2002, perguntando se os dois desejavam entrar no
programa.[102]
Novamente, ambos recusaram o convite expressando interesse em
receber proteção da Polícia Federal. Segundo o CDHMP, Jorge Fernandes
ainda não teria sido transferido para um estabelecimento seguro mas
suas saídas da delegacia estariam sendo controladas.
Até
a finalização desse relatório, Roberto e Plácido não contavam com
proteção da Polícia Federal.
Processos
Indevidos contra James Cavallaro, Diretor Executivo do Centro de Justiça
Global, ex-Diretor da Human Rights Watch no Brasil,
Natal, Rio Grande do Norte
Como
relatado acima, uma série de crimes cometidos por um grupo de policiais
criminosos em Natal, supostamente coordenado pelo Secretário Adjunto de
Segurança Pública do Rio Grande do Norte, Maurílio Pinto de Medeiros,
e conhecido como os “Meninos de Ouro”, recebeu atenção nacional e
internacional no início de 1995. Além do trabalho do CDHMP e da Comissão
Especial do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte,
grupos de direitos humanos nacionais e internacionais apoiaram o esforço
para trazer à justiça os policiais criminosos de Natal. Entre os
envolvidos nesse esforço estava o escritório da Human Rights Watch no
Brasil e seu diretor, James Cavallaro. Durante o período de 1995-1998
Cavallaro viajou para Natal em várias ocasiões para pesquisar e
documentar esses abusos, encontrar-se com autoridades para pressionar
por investigações e instauração de processos, e encontrar com a mídia
local, nacional e internacional. A pesquisa em Natal resultou na publicação
de um relatório detalhado sobre a violência policial no Brasil que
retratava os Meninos de Ouro.[103]
Em
1998, juntamente com o jornalista-fotógrafo, John Maier, em trabalho
para a revista Time e a BBC de
Londres, Cavallaro se encontrou com um ex-policial atuante em um esquadrão
da morte em Natal. Esse policial, que insistiu que sua identidade não
fosse revelada, forneceu informações sobre as ações dos grupos de
extermínio (inclusive os Meninos de Ouro em Natal). Revelou detalhes
sobre dezenas de assassinatos e ocultação dos corpos das vítimas.
Essa fonte informou a Cavallaro e a John Maier sobre dois métodos de
ocultação dos corpos das vítimas. Um envolvia a cobertura do corpo
com uma substância corrosiva e retirada desses em poços da região. O
outro método era a utilização de cemitérios clandestinos. Ainda
segundo essa fonte, um cemitério clandestino estaria situado na
periferia de Natal em propriedade do ex-policial Otávio Ernesto. Essa
fonte informou ainda detalhes sobre o assassinato do ativista de
direitos humanos, Gilson Nogueira, no dia 20 de outubro (Ver caso
anterior), citando inclusive os nomes e as funções dos que estariam
envolvidos. Segundo essa fonte, o assassinato teria sido encomendado por
Maurílio Pinto de Medeiros e executado por quatro membros do grupo de
extermínio de Natal: Maurílio Pinto Jr. (filho de Maurílio Pinto de
Medeiros), Otávio Ernesto, Jorge Luis Fernandes e Admilson Fernandes.
Com
base nessas informações, foram mantidas várias reuniões com as
autoridades da Polícia Federal. Essas autoridades planejaram uma
vistoria na propriedade de Otávio Ernesto, citada pela fonte
confidencial como local onde se situaria um cemitério clandestino. No
dia 16 de novembro de 1998, agentes da Polícia Federal entraram na
propriedade de Otávio Ernesto para procurar o cemitério clandestino. A
polícia não localizou restos mortais na área (que havia sido
remanejada recentemente, sugerindo, pelo menos, a possibilidade de uma
tentativa de ocultação de algo). No entanto, o grupo encontrou várias
armas de fogo e munição ilegais. Exames de balística realizados pela
Polícia Federal em uma das armas demonstrou conclusivamente que essa
era compatível com as cápsulas de balas encontradas na cena do
assassinato de Gilson Nogueira.
Essa
descoberta levou a prisão e a denúncia pelo Ministério Público de Otávio
Ernesto pelo assassinato de Gilson Nogueira. Infelizmente, os outros
citados confidencialmente pela fonte como participantes do assassinato não
foram presos ou indiciados. No processo criminal contra Otávio Ernesto,
a juíza Patrícia Gondim
Moreira citou Cavallaro como testemunha. Em seu depoimento nesse
processo, Cavallaro citou a informação recebida dessa fonte
confidencial sobre os nomes dos participantes no assassinato de Gilson
Nogueira.[104]
No
dia seguinte, Cavallaro em entrevista ao jornal Diário
de Natal repetiu o conteúdo de seu depoimento perante o tribunal.
Em resultado desses depoimentos, publicados no Diário
de Natal, Maurílio Pinto de Medeiros abriu uma ação civil por
danos morais assim como uma representação para que o Ministério Público
do Rio Grande do Norte indiciasse Cavallaro pelo crime de difamação.[105] O
Ministério Público aceitou e indiciou Cavallaro.[106]
Seus advogados, com base nas deficiências legais da ação, inclusive a
incapacidade das autoridades do Rio Grande do Norte em notificar
Cavallaro pessoalmente, ingressaram com o um questionamento da
legalidade da ação. O questionamento foi recusado pelos tribunais do
estado. Uma apelação ao Supremo Tribunal Federal (através de um
pedido de habeas corpus), no
entanto, provou ser eficaz. O Supremo Tribunal Federal declarou que o
indiciamento fosse arquivado em decisão publicada em 4 de fevereiro de
2002.[107]
Uma
outra ação criminal por difamação decorrente do depoimento de
Cavallaro, no entanto, ainda está pendente. Essa ação requerida por
Admilson Fernandes de Melo, ainda está sendo processada sob o número
096/99 na Primeira Divisão da Comarca de Macaíba, Rio Grande do Norte.
Seqüestro
de Carlos Roberto Bezerra e Ameaças de Morte contra os Membros do
Ministério Público do Rio Grande do Norte, Natal, Rio Grande do Norte
Em
maio de 1998, três homens armados seqüestraram o segurança de plantão
do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte, localizado na
capital do estado, Natal, e ameaçaram os membros desse órgão.
Os indivíduos visavam Anísio Marinho Neto, Procurador-Geral de Justiça,
Paulo Leão, Presidente da Associação do Ministério Público, Paulo
Pimentel, Promotor Público na Comarca de Almino Afonso, e Edevaldo
Alves Barbosa, da Comarca de Lages. Todos esses homens investigavam o
assassinato do Promotor da Comarca de Pau dos Ferros, Manuel Alves
Pessoa Neto, em novembro de 1997. Segundo fontes jornalísticas, a
investigação revelava que o assassinato teria sido encomendado por um
juiz do distrito de Neto.
No
dia 12 de maio de 1998, por volta das 3:00 da tarde, um homem que se
identificou como “Henrique” ligou para a sede do Ministério Público
e pediu para falar com a secretaria do Procurador Geral de Justiça.
Quando a secretária atendeu, o homem disse em voz ameaçadora de que
haveria seqüestro na área, e que os Procuradores “iam pagar pelo que
fizeram”.
Por
volta das 7:00 da noite, nesse mesmo dia, três homens armados com revólver
calibre 12 e uma pistola calibre 38 saíram de uma carro Tempra escuro
estacionado em frente ao Ministério Público.
Os homens armados agarraram o vigia, Carlos Roberto Bezerra e forçaram-no
a entrar no bagageiro do veículo. Os homens foram para uma área
abandonada nas redondezas da cidade Parnamirim.
Ao
chegarem em Parnamirim, os seqüestradores retiraram Carlos Roberto do
porta-malas e mostraram algumas fotos de jornais de Marinho, Pimentel,
Leão e Alves, além de uma foto do próprio Bezerra.
Os
homens bateram em Carlos Roberto, causando hematomas em sua cabeça e
pernas, e ameaçaram-no de morte. Os homens também afirmaram que iriam
causar os mesmos ferimentos naqueles promotores que constavam das
fotografias do jornal. Carlos Roberto pensou que reconheceu um dos seqüestradores
como um dos envolvidos na tentativa de assassinato do Promotor Alves em
novembro de 1997.
Carlos
Roberto conseguiu distrair os seqüestradores e escapar em direção a
um bairro residencial. Os homens atiraram três vezes contra ele mas não
o acertaram. Carlos Roberto chegou em segurança a uma delegacia local
onde prestou depoimento sobre o incidente e contatou o Ministério Público.
No
dia seguinte, Marinho encontrou o Secretário de Segurança Pública,
José Carlos Leite Filho, e o Comandante da Polícia Militar, Cel.
Frankin Gadelha, para solicitar medidas que garantissem a segurança dos
membros do Ministério Público. Mais tarde, nesse mesmo dia, Marinho
solicitou a assistência da Assembléia Legislativa e do Tribunal de
Justiça do Rio Grande do Norte.
O
seqüestro e as ameaças de morte receberam atenção significativa da mídia
durante a semana seguinte, levando o Deputado Pedro Wilson Guimarães a
solicitar o envolvimento da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos
Deputados no caso. No dia 26 de maio de 1998, a Comissão de Direitos
Humanos respondeu clamando a Secretaria de Segurança Pública do Rio
Grande do Norte a tomar a medidas para proteção dos promotores e através
de uma investigação da secretaria sobre o incidente.
No
dia 14 de fevereiro de 2002, o Centro de Justiça Global enviou ofício
JG/RJ No. 029/02 para Paulo Roberto Dantas D. S. Leão, Procurador-Geral
de Justiça, solicitando maiores informações sobre o progresso de
caso.
Até
o momento de finalização deste relatório, o Centro de Justiça Global
não havia recebido uma resposta.
Ameaça
de Morte de Isabel Cândido, Assistente Social, Limeira, São Paulo
Quando
recebeu sua primeira ameaça de morte, em maio de 2001, Isabel Cândido
trabalhava há quase três anos no Centro de Defesa da Criança e do
Adolescente, (CEDECA) em Limeira, São Paulo. Durante o período de seu
mandato no CEDECA, Isabel trabalhou com vários jovens vitimas de
torturas cometidas por policiais civis e militares. No início de 2001,
o CEDECA promoveu um fórum público com a Polícia Militar para
discutir o tema de violência. Durante o evento ocorreu um
desentendimento, quando funcionários do CEDECA notaram um tenente da
polícia filmando o evento. O tenente estava apontando a câmera em direção
aos jovens sob cuidados do CEDECA que acompanhavam o evento. Os jovens
se sentiram ameaçados com a presença da câmera e esconderam seus
rostos. Isabel Cândido solicitou que as filmagens fossem interrompidas
e que a polícia mostrasse as cenas filmadas. Inicialmente a polícia
recusou o pedido mas cedeu sob pressão das autoridades públicas que
participavam do fórum. As imagens gravadas revelaram que o tenente
havia filmado unicamente os rostos dos jovens.
No
início de maio de 2001, Isabel começou a receber ligações telefônicas
que a advertiam para tomar cuidado, pois poderia ser vítima de um
ataque. Em princípio, Isabel acreditou que essas ligações não fossem
ameaças, mas sim advertências bem intencionadas para alerta-la de
perigos. Mais tarde nesse mesmo mês, a sede do CEDECA sofreu uma invasão
durante a noite. Os invasores causaram grandes danos no escritório de
Isabel destruindo a porta e seu arquivo. Isabel acredita que os
invasores estavam procurando por arquivos sobre o tratamento dos jovens,
que eles não encontraram porque Isabel os havia retirado do escritório.
Em
agosto de 2001, Isabel recebeu uma ligação telefônica que dizia que
“o gás iria subir, e se ela estivesse no CEDECA ela iria rodar
junto!” Isabel recebeu outra ligação em setembro, e começou a
questionar o que ela havia interpretado como ligações de boas intenções.
Na época, Isabel estava trabalhando em um caso no qual policiais haviam
espancado um jovem e descarregado spray de pimenta em seus olhos. Após
acompanhar o adolescente a delegacia de polícia para registrar queixa
sobre as ações dos policiais ao delegado, Isabel recebeu uma ligação
advertindo que ela tomasse cuidado com as pessoas com quem estava
lidando.
Isabel
não sabe quem fez as ameaças por telefone mas tem poucas dúvidas de
que sejam em decorrência de seu trabalho como defensora dos direitos
dos adolescentes.
No
dia 15 de fevereiro de 2002, o Centro de Justiça Global enviou ofício
JG/RJ No. 036/02 para Saulo de Castro Abreu Filho, Secretário de
Segurança Pública do Estado de São Paulo, solicitando maiores informações
sobre os progressos do caso.
Até
o momento de finalização deste relatório, o Centro de Justiça Global
não havia recebido uma resposta.
Ameaças
a Raquel Pântano De Gaspari, Limeira, São Paulo
Raquel
Pântano De Gaspari, de vinte e cinco anos de idade, trabalha como
educadora no Centro de Defesa da Criança e do Adolescente, CEDECA na
cidade de Limeira, São Paulo.
Em meados de julho de 2000, o adolescente F. S,
de dezesseis anos de idade, procurou por Raquel no escritório da CEDECA,
após escapar da Unidade Franco da Rocha (unidade da Fundação Estadual
do Bem Estar do Menor, Febem). F. S. era interno na Febem por tráfico
de drogas e roubo. Raquel foi a primeira a atender seu caso quando F. S
foi preso e por essa razão ele a procurou após fugir da Febem.
F.
S. contou a Raquel que ele havia sofrido repetidas agressões dentro da
Febem. Segundo o adolescente, ele estava sendo ameaçado por outros
jovens de sua mesma cidade e membros da mesma organização criminosa da
qual ele era membro.
Raquel
e outros membros do CEDECA, percebendo o risco de vida que F. S. corria,
providenciaram um lugar seguro para que ele pudesse ficar e continuaram
a prestar assistência. F. S voltou para a escola e começou a freqüentar
um grupo de Hip Hop organizado pelo CEDECA
Em
fevereiro de 2001, F. S. trouxe seu amigo, Rogério Arado, de vinte e
sete anos de idade, para o grupo de Hip Hop. Arado pertencera a mesma
gang que F. S.. Rogério foi apresentado a Raquel e depois de algum
tempo contou a ela que ele não mais queria fazer parte da organização
criminosa e que gostaria de dar uma nova direção a sua vida. Nessa época,
Rogério contou a Raquel como funcionava a organização criminosa e sua
atuação no roubo de cargas e no tráfico de entorpecentes na região.
Ele também contou a ela que membros influentes da comunidade, tais como
políticos, homens de negócios, um juiz e um promotor faziam parte da
organização.
Em
junho, Raquel e Rogério decidiram denunciar a situação. Raquel
solicitou o auxílio do Deputado Renato Simões, Presidente da Comissão
de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa de São Paulo na preparação
da denuncia.
Em
agosto de 2001, Raquel começou a receber as primeiras ameaças. Uma
noite ela saíra para jantar com alguns amigos e quando
retornou para casa recebeu um ligação de um homem que dizia:
“Foi bom o seu jantar? É bom encontrar os amigos, nê? Mas acidentes
acontecem! A casa vai cair para o seu lado! Você já esta há muito
tempo nesse mundo!” Raquel estava tremendo e passou o telefone para
sua mãe, que ouviu o homem dizer o seguinte: “ela ficou nervosinha?
É bom mesmo que ela tenha medo!” O homem então desligou.
Desde
então, Raquel tem recebido várias ligações com ameaças com a frase
“acidentes acontecem!”. A mãe de Raquel adquiriu um identificador
de chamadas mas o telefone do chamador sempre aparece como sendo 0000,
0024 ou outro número incompleto. Raquel, com ajuda da empresa telefônica
local, pôde determinar que a maioria das chamadas são feitas do estado
do Paraná, mas não conseguiu identificar a cidade.
Mais
tarde, em agosto, Raquel recebeu outra ligação que dizia para ela
“Fique esperta, pois vai ter um latrocínio no CEDECA! A casa vai
cair! De hoje vocês não passam!”. Em resposta a ligação, Raquel
registrou boletim de ocorrência na delegacia da mulher em sua cidade.
Entre
setembro e outubro de 2001,
Raquel ouviu o barulho de uma motocicleta em frente a sua casa enquanto
recebia amigos. Não foi possível identificar o motociclista, embora
eles pudessem ver que era um homem. O homem continuou em frente a casa
da Raquel, acelerando o motor de sua motocicleta, até que partiu
disparando um tiro para o alto.
Em
outra ocasião, um dos vizinhos de Raquel a alertou para o fato de que
um homem a esperava e observava de dentro de um carro escuro estacionado
próximo a sua casa. Quando escureceu, e o homem não partia, o vizinho
chamou a Policia Militar que chegou no local e perguntou ao homem o que
ele fazia ali. Ele respondeu que estava procurando por uma loja. Segundo
Raquel o bairro onde ela mora é uma zona residencial e não há lojas
no local.
Por
volta do dia 6 de dezembro de 2001, Rogério ligou para Raquel para
informa-la que a organização havia ordenado que ele deixasse a cidade
e que ele não podia contar a ela para onde ele estava indo.
Até
meados de dezembro de 2001, Raquel continuava a receber ligações telefônicas
dizendo, “acidentes acontecem!”
Assassinato
de Maria Nivaneide Santos Costa, Educadora, Nossa Senhora do Socorro,
Sergipe
Maria
Nivaneide Santos Costa, de vinte e sete anos de idade, era uma
professora primária, ativista dos direitos da criança e, desde 1998,
educadora pública do Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua,
MNMMR em Sergipe. Além disso, ela era vice-presidente do Conselho
Tutelar da Infância e da Adolescência. Seu marido, Edenilson Costa, é
o presidente da Associação de Moradores do Loteamento Rosa de Maio
localizado no município de Nossa Senhora do Socorro. Ele militava pelo
reforço da segurança dentro desse bairro, o bloco Rosa de Maio situado
na região metropolitana de Aracajú, através da construção de uma
delegacia local.
Por
volta das 2:00 da manhã do dia 4 de fevereiro de 1999, Maria Nivaneide
estava dormindo em sua casa quando seis homens com capuzes e armados
fizeram uma tentativa de arrombamento. Os homens atiraram contra as
janelas e portas e tentaram derrubar a porta da frente. Maria Nivaneide
tentou prevenir que eles entrassem gritando pela ajuda dos vizinhos.
José
Robério, vizinho de Maria Nivaneide ouviu ela gritar pedindo ajuda e
implorando para os agressores “Não matem meus filhos”. Ele tentou
abrir a porta de sua casa mas os homens atiraram em sua direção.
Desarmado, ele não pôde ajuda-la.
Maria Nivaneide foi atingida por vários tiros que atravessaram a porta
e as janelas e morreu imediatamente.
A
Sociedade Afrosergipana de Estudos da Cidadania, SACI, e a Comissão
Estadual do MNMMR denunciaram o assassinato ao Secretário de Segurança
Pública, a Comissão de Direitos Humanos da OAB/SE, ao Ministério Público
e a Secretaria do Estado de Justiça solicitando que o assassinato fosse
investigado e que os responsáveis fossem presos.
No
dia 9 de fevereiro de 1999, o Instituto de Estudos Sócio-Econômicos
solicitou que a Secretaria de Segurança tomasse as medidas para a
investigação do caso.
No
dia 3 de março de 1999, o Presidente da Comissão de Direitos Humanos
da Câmara dos Deputados, Nilmário Miranda, solicitou informações
sobre as medidas tomadas pela Secretaria de Segurança Pública
referentes a esse caso.
Em
19 de março de 1999, o superintendente da Polícia Civil do Estado de
Sergipe, Paulo Ferreira Lima respondendo às solicitações anteriores
sobre o andamento das investigações, informou que o assassinato de
Maria Nivaneide não foi motivado pelo seu trabalho dentro da comunidade
ou do trabalho de seu marido. Ele atribuiu o crime aos “abismos
existentes entre as classes sociais”. Em quarenta e oito horas as
autoridades estaduais prenderam quarto indivíduos apontados como
responsáveis pelo assassinato. A polícia prendeu um quinto suspeito
assim como a arma e os objetos roubados da casa de Maria Nivaneide. Três
dias depois, o inquérito policial havia sido encerrado.
No
dia 11 de março de 2002, o Centro de Justiça Global enviou ofício JG/RJ
No. 97/02 para João Eloi de Menezes, Superintendente da Polícia Civil
do Estado de Sergipe, solicitando maiores informações sobre os
desenvolvimentos mais recentes desse caso.
Até
o momento de finalização deste relatório, o Centro de Justiça Global
não havia recebido resposta.
Informação fornecida pela Comissão Estadual do Movimento Nacional
de Meninos e Meninas de Rua, MNMMR e a Sociedade Afrosergipana de
Estudos e Cidadania, SACI, em relatório divulgado para a Secretaria
de Segurança Pública do Estado de Sergipe e outras autoridades, em
fevereiro e março, 1999.
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