11.
O trâmite da denúncia da Comissão e as suas fases
O
trâmite do
procedimentos perante a comissão está contemplado nos artigos
44 a 51 da Convenção e nos artigos 34 e 50 do Regulamento da
Comissão. O procedimento reconhece o princípio do contraditório,
que permite a ampla e recíproca argumentação pelas partes
litigantes. Durante as primeiras etapas do procedimento a Comissão
tem um papel passivo: recebe a documentação, avalia-a e,
verifica se contém todos os requisitos de admissibilidade, e
por fim, solicita informações ao governo.
Assim
que recebe a resposta do governo, a Comissão transmite o seu
conteúdo para a parte denunciante, os peticionários. É
importante destacar que o papel do peticionário, ONG, vítima
ou advogada, é de vital importância para impulsionar o
procedimento.
O
CEJIL atua como representante das vítimas de violações aos
direitos previstos na Declaração e na Convenção,
apresentando várias denúncias em casos individuais. O papel
das ONG’s é fundamental para demonstrar à Comissão de que
forma ocorrem as violações nos estados partes e para solicitar
o seu pronunciamento sobre o caso denunciado. A Comissão, através
do exame de cada caso, poderá apresentar sobre o caso
denunciado um relatório recomendando providências visando a
sua reparação. Tal relatório tem um caráter de sanção
internacional e pode atingir resultados concretos e eficazes
para reparar as violações.
11.1
o recebimento de petições iniciais
A
comissão tem adotado a prática de acusar o recebimento das
petições enviadas. A Secretaria da Comissão revisa a petição
a fim de verificar se prima
facie a mesma satisfaz aos requisitos de forma e conteúdo.
No caso da petição ser aprovada nesta primeira verificação,
será enviada ao Estado, juntamente com uma solicitação de
informações sobre os fatos denunciados, uma advertência que o
pedido de informações não implica em prejulgamento sobre a
admissibilidade da petição (artigo 34.3 do Regulamento da
Comissão).
A
solicitação de informações deverá ser respondida pelo
Estado no prazo de 90 dias (artigo 34.5 do Regulamento), prorrogáveis
através de uma petição fundamentando o pedido do Estado (porém
nunca poderá ser superado o prazo de 180 dias, conforme
estabelece o artigo 34.6 do Regulamento). Na prática, os
Estados não cumprem necessariamente com os prazos e nem
solicitam dilatações de prazos, embora tal conduta possa ter
consequências negativas para o Estado. Da resposta do Governo,
dá-se necessariamente o traslado aos peticionários com um
pedido para que formulem as suas observações, se a Comissão
considerar prudente.
Assim,
quando o governo apresenta a sua resposta,. A Comissão envia-a
para os peticionários, juntamente com o pedido para que
apresentem as suas observações à resposta do governo.
11.2
O exame de admissibilidade da petição
Atualmente
tem-se verificado a prática da Comissão de elaborar em alguns
casos relatórios de admissibilidade, posteriormente ao
recebimento das petições iniciais. Na prática – e segundo a
interpretação da Corte (caso Velásquez
Rodríguez, Exceções Preliminares, sentença de 26 de
julho de 1987, Série C. No. 1, parágrafo 39 e 40) – o trâmite
de uma petição individual perante a Comissão não necessita
de uma declaração expressa de admissibilidade.
Logo,
ao ser dado início ao trâmite da petição, e tendo sido
solicitadas informações ao governo, é aceita prima facie a sua admissibilidade, sempre e quando a Comissão, ao
tomar conhecimento através da Secretária, continuar o trâmite,
não declarando expressamente a inadmissibilidade (artigo 48.1
da Convenção Americana). Assim , a declaração de
inadmissibilidade deve ser apresentada de forma expressa pela
Comissão.
Além
disso, tendo sido emitido ou não um relatório sobre a
admissibilidade, na prática o trâmite irá continuar através
do intercâmbio de informações e observações entre o governo
e os peticionários. Há casos apresentados pelo CEJIL em que,
após a petição inicial, e antes de que a Comissão houvesse
se pronunciado sobre a admissibilidade, foram apresentados
escritos fundamentados sobre a devida interpretação de alguns
direitos previstos na Convenção, provas, informação
adicional, etc.
11.3
As audiências
O
procedimento pode conter uma fase de audiências perante a
Comissão, que não é obrigatória, na qual participam
geralmente os peticionários, os representantes do Estado
denunciado e os membros da Comissão (em salas ou plenários).
Nas audiências são discutidos pontos fundamentais sobre os
casos que precisam ser reforçados, tais como: questões de
forma e conteúdo; apresentação de vídeos, de novas provas
documentais, alegações, etc.
O
peticionário, ou Estado, terá que solicitar uma audiência
expressamente, explicando à Comissão o motivo pela qual faz a
solicitação, e a decisão será discricionária, podendo ser
concedida ou não. A Comissão pode por iniciativa própria
convocar audiências. Em geral, as reuniões ocorrem em
janeiro/fevereiro e setembro de cada ano e realizam-se na sua
sede, em Washigton. Além dos representantes dos Estados, que têm
representação permanente na OEA, também comparecem: ONGs,
advogados, e às vezes vítimas, (quando não é possível a sua
presença em audiência pode-se apresentar vídeos com
depoimentos).
11.4
A solução
amistosa entre partes
O
procedimento inclui também a possibilidade da Comissão
colocar-se à disposição das partes para que seja alcançada
uma solução amistosa para o caso denunciado, antes de que seja
emitido um Relatório final sobre o caso, previsto no artigo 50
da Convenção.
Quanto
à oportunidade e as características do procedimento para que
as partes cheguem à solução amistosa ver o artigo 48.1 (f) da
Convenção, que estabelece que a Comissão, ao receber uma petição
ou comunicação, irá colocar-se à disposição das partes
interessadas que tenham a intenção de chegarem à uma solução
amistosa sobre o assunto, fundada nos respeito aos direitos
humanos.
Na
decisão sobre Exceções Preliminares do Caso Caballerro-Santana
da Colômbia (Exceções Preliminares, sentença de 21 de
janeiro de 1994), a Corte estabeleceu que a solução amistosa
constitui uma parte essencial do procedimento, da qual a Comissão
não pode discricionariamente evitar. N
ão obstante, a Comissão poderia, somente em casos
excepcionais fundamentados, omitir o procedimento de conciliação
para proteger os direitos das vítimas e de seus familiares (parágrafo
27 do caso Caballerro-Santana).
Tal
precedente, confirmado no caso Genie Lacayo da Nicarágua (Exceções Preliminares, sentença de
27 de janeiro de 1995), motivou uma mudança na prática da
Comissão, na qual a solução amistosa deixou de ser apenas um
trâmite rotineiro, e converteu-se numa obrigação da Comissão
de colocar-se à disposição das partes que intencionam torná-la
efetiva.
Assim,
os procedimentos de solução amistosa são realizados sob a
supervisão da Comissão e não devem ser vistos como uma forma
de subverter a função tutelar do sistema. A experiência do
CEJIL nestes processos têm sido bastante proveitosa e de grande
utilidade para as vítímas. Através deste procedimento foi
alcançado o pagamento de indenizações, a modificação das
leis, a liberação de pessoas detidas, a constituição de
comissões de investigação, reparações à comunidades indígenas,
entre outras medidas importantes.
Se
o caso é solucionado de forma amistosa, a Comissão irá
elaborar um relatório que conterá uma breve descrição dos
fatos e a solução do caso que será transmitido às partes e,
posteriormente (artigo 49 da Convenção).
11.5
Trâmite Final
Porém,
se o procedimento para a solução amistosa fracassa, e se a
Comissão considerar que há informação suficiente, passará a
analisar se existe ou não a responsabilidade do Estado pela
violação de algum dos direitos protegidos na Convenção. Se a
Comissão concluir que o Estado é responsável, será enviado
um relatório contendo os fatos, as questões de
admissibilidade, de direito, e um série de recomendações que
o mesmo deve cumprir no prazo a ser fixado, conforme
estabelecido no artigo 50 da Convenção. O relatório é
enviado somente para o Estado, que não será autorizado a
publicá-lo.
Tais
recomendações são obrigatórias para o Estado denunciado e o
seu não cumprimento acarretará a sua responsabilidade
internacional por ter violado os direitos enunciados na Convenção.
Assim, o Estado tem o dever de acatar as recomendações
contidas no relatório enviado pela Comissão.
Se
o Estado não cumprir com as recomendações, a Comissão tem a
faculdade de: elaborar um novo relatório dando um novo prazo
para o Estado, ou ainda, enviar o caso para a Corte. Se for
elaborado um novo relatório e o Estado não cumprir com o
determinado, a Comissão pode decidir pela sua publicação.
(artigo 51 da Convenção).
A
possibilidade do caso ser enviado para a Corte dependerá da
aceitação prévia por parte do Estado da sua jurisdição
obrigatória (38), ou da aceitação da sua jurisdição para um
caso concreto, motivada pelo pedido da Comissão. Somente a
Comissão e os Estados partes podem enviar casos à Corte. Os
Estados partes podem remeter um caso para a Corte mesmo que não
se trate de uma violação cometida pelo próprio Estado, sempre
que os mesmos tenham aceitado a possibilidade de que a Comissão
examine as comunicações apresentadas por outro Estado sob a
condição de reciprocidade (art. 45 em combinação com o art.
61 da convenção).
Todavia,
os critérios para determinar o envio dos casos para a Corte
ainda não são muitos claros. A Comissão não justifica
expressamente quais são as suas motivações em cada situação.
Por exemplo, há casos que têm características similares e tem
soluções diferentes; alguns casos de violações massivas
merecem relatórios, outros não; um caso de desaparecimento
isolado pode merecer ir à Corte; países com graves violações,
às vezes, têm poucos casos ou nenhum perante a Corte. (39)
Os
critérios de exame dos casos, pela Comissão, são baseados em
vários fatores como, por exemplo, no impacto para a jurisprudência
do sistema interamericano na busca da solução que seja melhor
para os interesses e a defesa dos direitos das vítimas. Não
obstante, a prática da Comissão no passado não facilitou o
estabelecimento de critérios precisos para processar as denúncias.
Contudo, esperava-se que a Comissão retome este importante tema
das fases do procedimento durante o processo em curso de
reformulação do sistema interamericano. Neste sentido, o
problema seria solucionado com a possibilidade das vítimas
poderem decidir sobre o envio do caso para a Corte, como no
sistema Europeu, posteriormente à aprovação do protocolo 9.
Não
obstante, na prática, a maioria dos casos termina com um relatório
final da Comissão no qual é estabelecido a responsabilidade do
Estado pela violação da Convenção. Só excepcionalmente um
caso é remetido à Corte (nos últimos anos, porém, a Comissão
enviou um maior número de casos para a Corte), mesmo quando o
país tenha aceitado a sua jurisdição obrigatória.
Atualmente, a Comissão está atendendo a mais de 750 casos e a
Corte, aproximadamente 20 casos.
Quando
o caso não é enviado à Corte é aplicado o disposto no artigo
51 da Convenção. Tal artigo estabelece que: se no prazo de três
meses o assunto não tiver sido solucionado pelo Estado e nem
tiver sido remetido à Corte (pela Comissão ou pelo próprio
Estado), a Comissão poderá elaborar as recomendações
pertinentes fixando um prazo no qual o Estado deverá tomar as
medidas para remediar a situação denunciada (art. 51.2). Ao
fim do prazo fixado pela Comissão, esta decidirá pelo voto da
maioria absoluta de seus membros se o Estado tomou as medidas
que considera adequadas, e decidirá se publicará ou não o
relatório. Este relatório é incluído no Relatório Anual que
a Comissão apresenta na Assembléia Geral da OEA.
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