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EDUCAÇÃO E DIREITOS HUMANOS

 A experiência de Caxias do Sul

Marisa Formolo Della Vecchia[1]

 A Educação Cidadã é o paradigma que sustenta a concepção dos Direitos Humanos na educação. A educação se faz com a participação da escola, mas vai além, está nos movimentos sociais, nos meios de comunicação social, no modo de produção, nas relações de trabalho e renda, nas pastorais sociais...

A educação cidadã, enquanto um ato político, perpassa todas as diretrizes de um governo e se faz nas ações das diferentes unidades administrativas. Neste sentido, deve ser construída a educação popular nas diferentes áreas de atuação do governo. Entendemos que

“A transformação social é percebida como processo histórico, em que a objetividade e a subjetividade se prendem dialeticamente e a conscientização não é apenas conhecimento ou reconhecimento, mas opção, decisão, compromisso[2]

Essa concepção de educação exige uma leitura do mundo e da palavra, em que cada pessoa possa dizer sua palavra. Palavra que nasce da compreensão e uso do conhecimento produzido nas ciências, nas artes, nas religiões e da compreensão cotidiana da vida.

A escola que queremos é a que trabalha a educação como prática social transformadora. Essa escola pública e de qualidade não faz parte da tradição educacional. É uma escola em construção. Pressupõe uma concepção de educação libertadora, através da reestruturação curricular, gestão democrática, formação e valorização profissional, avaliação emancipatória e princípios de convivência fundados na ética do coletivo, que reconhece a individualidade de sujeito, que se educa, educando.

A escola que queremos é a que trabalha a educação como prática social transformadora. Essa escola pública e de qualidade não faz parte da tradição educacional. É uma escola em construção. Pressupõe uma concepção de educação libertadora, através da reestruturação curricular, gestão democrática, formação e valorização profissional, avaliação emancipatória e princípios de convivência fundados na ética do coletivo, que reconhece a individualidade de sujeito, que se educa, educando.

A nossa escola cumpre o papel político de participar na transformação social. Para tanto, é necessário minimizar a crise do modelo de desenvolvimento neoliberal; criar o desejo de um novo projeto social com os desafios de uma concepção dos direitos coletivos (econômicos, sociais e culturais), construindo o desenvolvimento para todos. Viabilizar uma escola onde as crianças, adolescentes e adultos tenham a alegria de fazer pensando, criando e recriando; reelaborando o saber interdisciplinar e multicultural com vistas ao desenvolvimento humano pleno é o desafio  da educação cidadã.

Acreditamos que esta escola, enquanto centro cultural da comunidade, é um espaço político-pedagógico, que precisa ter nos professores - militantes e técnicos - pessoas que desejem uma sociedade nova, resgatando a luta e a crença em um mundo humanizado. Esta escola está sendo construída aqui em Caxias do Sul e em outras cidades, de forma responsável e comprometida com todos os atores envolvidos no processo.

A Educação Cidadã, proposta nos princípios da democracia e da inclusão social, propõe a sistematização da prática, a práxis.

Na escola, a educação cidadã pressupõe:

1)    o direito de todos ao acesso, a permanência e a aprendizagem do conhecimento

2)    o conhecimento escolar vai além do saber elaborado pelas ciências, artes, religiões... o ponto de partida é o conhecimento da realidade social, econômica e cultural, e como resultado a consciência crítica que exige uma ação de transformação social.

3)    gestão democrática com a participação de pais, alunos, professores e funcionários;

4)    novos valores de convivência onde a solidariedade e o coletivo superem o individualismo e a competição;

5)    valorização e formação em serviço do professor e funcionários e

6)    a avaliação seja emancipatória.

Nessa perspectiva a educação e os direitos humanos pressupõem a educação a serviço de um novo projeto socio-econômico e cultural, isto é, uma nova cultura dos direitos humanos. A educação para os direitos humanos precisa se tornar educação com direitos humanos, como um todo integrador da dignidade humana.

Temos tratados direitos humanos como direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais em diferentes níveis de exigências, abrindo espaços para a impunidade. É preciso rever a concepção de direitos humanos. Hoje, propõe-se que os compreendamos como independentes e indivisíveis. É necessário esta revisão tanto para as ONGs e os Estados. Precisamos avançar na construção de uma concepção integral que leve a práticas coletivas na defesa dos direitos humanos, sem separá-los.

A dicotomia dos direitos humanos e a prevalência de uns sobre os outros tem dado rumos diferentes, segundo as convivências políticas dos Estados. A Assembléia da ONU de 1951, criou pactos separando os direitos civis e políticos, dos econômicos, sociais e culturais. Nos primeiros implica na ausência do Estado e nos demais a ação direta do Estado, através das políticas básicas e complementares.

"Não há direito à vida, à liberdade e à segurança, não há igualdade frente a lei ou direito ao devido processo, sem direito ao  trabalho, à saúde, à educação, a um salário mínimo, a alimentação, a moradia e a um nível significativo de vida e vice-versa, por uma  simples razão: o conjunto desses direitos têm a mesma finalidade: a dignidade humana.[3]  

A falsa idéia de que os direitos civis e políticos não têm custo econômico tem sustentado os pactos feitos entre os países na defesa dos Direitos Humanos. Esta falsa idéia serve e serviu para sustentar o projeto capitalista no mundo, não obrigando o Estado a assumir a igualdade dos direitos na economia, cultura e organização social.

Na declaração sobre o direito ao Desenvolvimento das Nações Unidas, em 1986, a ONU admite...

todos os direitos humanos e das liberdades fundamentais são indivisíveis e interdependentes; deve dar-se igual atenção e urgente consideração para a aplicação, promoção e proteção dos direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais.”[4]

A Comissão Interamericana reafirma a relação indissolúvel entre as condições de vida materiais e culturais e a urgência dos direitos políticos e civis.

 “... uma violação persistente e prolongada dos direitos econômicos, sociais e culturais acaba provocando situações de violência que terminam por afetar o exercício dos direitos civis e políticos[5]

não podemos esquecer que em muitos países os direitos civis e políticos são violados no marco das lutas pelos direitos econômicos, sociais e culturais, por exemplo, direito ao trabalho, a terra, a moradia, a educação...”[6]  

As maiores barreiras para a vigência dos direitos econômicos, sociais e culturais e o direito ao desenvolvimento são:

1.         Ajuste estrutural

Destaca-se a relativa diminuição da soberania nacional e do controle interno sobre os processos e recursos econômicos locais e o crescimento correspondente ao nível de influência direta dos organismos financeiros internacionais sobre as decisões políticas nacionais.

A dívida externa

É um mecanismo que mantém a dominação dos países ricos sobre os países pobres. Cria o empobrecimento interno, recessão e retira os recursos que poderiam garantir os direitos fundamentais das pessoas que são: saúde, educação, moradia, trabalho, ambiente sustentável. Tira a soberania nacional e o subjuga ao FMI.

2.         As instituições financeiras

A ONU estabelece os programas de agente econômico através de dois organismos fundamentais: o FMI e o Banco Mundial. As políticas fiscais no contexto da aplicação de programa de estabilização e ajuste tem relação direta com os direitos econômicos, sociais e culturais.

3.         Redistribuição de renda

O Brasil é dos países que tem a pior distribuição da renda per capital.

A concentração de renda é portanto criadora das desigualdades e inviabiliza a universalização dos direitos.

4.         Concepções errôneas acerca do Estado

O Estado mínimo do projeto neoliberal é débil e quando privatizado serve a poucos. Propomos um Estado forte, democraticamente participativo e capaz de inverter as prioridades sociais.

5.         O crescimento econômico como panacéia

O crescimento é necessário, mas não é por si mesmo uma garantia de prosperidade e crescimento para o conjunto da sociedade. O índice de Desenvolvimento Humano (IDH) enquanto indicador de qualidade de vida para todos é o que melhor demonstra a qualidade do desenvolvimento.

6.         Privatização dos Direitos Humanos

O Banco Mundial não esconde4 a sua proposição a favor da privatização e a redução da participação do Estado na economia, reduzindo sua atuação na política pública.

7.         Concepções errôneas do termo desenvolvimento

O desenvolvimento humano nunca tem sido prioritário nos países em geral, principalmente nos países ricos.

O termo desenvolvimento tem sido usado para indicar, apenas crescimento econômico, que acaba criando profundas desigualdades sociais em todo o globo.

É preciso pensar num desenvolvimento auto-sustentável e solidário.

Tais pautas de desenvolvimento não devem sustentar-se, sob pena de se perpetuar a injustiça social e a exclusão da maioria.

8.         Vontade política deficiente

A falta de vontade política na matéria de direitos econômicos, sociais e culturais é insuficiente pois a legislação existente sustentaria todas as medidas necessárias para evitá-las.

9.         Destruição do meio-ambiente

Os fatores ecológicos afetam mais os países em desenvolvimento porque os desenvolvidos transferem para os primeiros a maioria das suas indústrias poluentes.

10.   Gastos militares e conflitos armados

A violação sistemática dos Direitos econômicos, sociais e culturais sucumbe a verdadeira seguridade nacional e pode colocar em perigo a paz e a seguridade internacional. Por ser o Estado o responsável pela violação desses direitos, não deverá invocar a seguridade nacional como medida para justificar a adoção de medidas destinadas a suprir toda oposição a tal violação para impor práticas repressivas contra a população[7].

11.   Dualidade de critérios a respeito dos Direitos Humanos

O direito internacional concede a mesma importância aos direitos sociais, econômicos e culturais que os civis e políticos, mas, na prática, presta maior atenção aos últimos.

Conclusões

O Estado mínimo não é democrático, pois é regido pela lei do mercado globalizado. Não consegue garantir os direitos sociais, políticos e econômicos a todos.

Na lógica do Banco Mundial e o FMI, lógica de mercado, o custo dos direitos sociais deve ser racionalizado. E dentro desta ótica os Estados ricos sugam os pobres. A comunidade internacionalmente a ONU, são responsáveis por essa permissividade.

A sociedade não conhece seus direitos. A educação na Escola, nos movimentos sociais, nos MCS, etc. não tem sido persistente e forte para assumir a formação política na defesa dos direitos de todos.

As ONGs têm o papel de vigiar o Estado, usar as vias jurídicas, todos os recursos disponíveis (jubileu 2000) criando ações destinadas a sensibilizar a opinião pública sobre os direitos econômicos, sociais e culturais. É preciso recriar a legislação, tornando essencial, a garantia dos direitos dos excluídos, isto, é fundamental à carta de direitos dos empobrecidos com condições para a inclusão social.

Nesta via a escola é fundamental. Não a que temos. A que estamos construindo.

Tratar do tema Direitos Humanos na escola envolve basicamente o estudo do Estatuto dos Direitos das Crianças e Adolescentes e a visão dos direitos dos cidadãos, enquanto direitos civis, políticos, sociais, econômicos e culturais; a Reestruturação Curricular com gestão democrática e novos valores de convivência. Como e quem faz isto? Depende do plano de trabalho na Escola. Se o professor trabalha no Currículo por Atividades ele poderá abordar os direitos em qualquer área de conhecimento que estiver trabalhando. O trabalho por área ou por disciplina precisará de um plano integrado, fazendo as interfaces do estatuto, na metodologia crítica, dialógica e problematizadora.

Temos constatado que é preciso que o professor se deixe encharcar da compreensão crítica da estrutura sócio-econômica e cultural neste contexto e fluirá, pela sua posição política a luta pelos direitos humanos, enquanto coletivos e individuais. Reeducar politicamente o educador é condição para que a escola seja cidadã e possamos estudar a questão dos direitos na escola, inter-disciplinarmente. Precisamos do educador militante da transformação social.

A escola enquanto espaço e fronteira do projeto neoliberal reproduz a cultura social e política da seletividade social e cultural. Age como funil, construindo a lógica da exclusão.

A Escola somente se constituirá em fronteira avançada dos direitos se ela como instituição social tiver coragem de se redefinir não apenas em seus conteúdos, mas sobretudo se definir em sua estrutura rígida e seletiva, ser democrática não apenas em sua gestão, mas em seus processos na organização de seus tempos e espaços. Superar a cultura seletiva que ainda legitima essa estrutura excludente. Essa é a ESCOLA POSSÍVEL. Ela já está acontecendo no profissionalismo e dedicação de inúmeros coletivos de professores que transgridem a escola peneradora antipopular. A ESCOLA POSSÍVEL está se tornando possível na medida em que continuar sendo fronteira avançada dos direitos.

Os direitos avançam na medida em que construímos e legitimamos uma cultura pública e espaços públicos. Nossa tradição se apega a uma cultura privada e a espaços privados. Estes são destacados como os espaços do progresso, da eficiência, da dignidade. Os espaços públicos são apresentados como pobres, ineficientes e indignos. É urgente revertes esse imaginário para avançar na construção da cidadania e dos direitos.”[8]


[1] Vice-Prefeita de Caxias do Sul.

[2] Paulo Freire.

[3] TEXIER, Phillippe. Encuentro Latinoamericano para la Promoción de los Derechos Econômicos, Sociales y Culturales. Quito, 1998.

[4] Declaração sobre o Desenvolvimento das Nações Unidas, 1986. Resolução 41-126, parágrafo 2 do Art. 6.

[5]  Declaração sobre o Desenvolvimento das Nações Unidas, 1986. Resolução 41-126, parágrafo 2 do Art. 6.

[6] Princípios de Lininburgo relativos a la aplicación del pacto Internacional de Derechos Econômicos, Sociales y Culturais Human Rights Quarterly, vol.9, N°2, mayo de 1987. Pags. 122 a 135. Veáse tambíen la Revista N°37, 1986.

[7] ARROYO, Miguel. Palestra Realizada em Caxias do Sul, 22/02/99.

[8] ARROYO, Miguel. Palestra Realizada em Caxias do Sul, 22/02/99.

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