O PAPEL DAS UNIVERSIDADES EM
TEMPO DE EXCLUSÕES.
José Ivo Follman
“Se
a Universidade não existisse, ela teria que ser inventada!” O
conferencista que pronunciou esta frase durante um Seminário
Internacional nesta Universidade no ano de 1997 referia-se à
Universidade enquanto espaço onde se aprende a pensar.
Nós
estamos numa Universidade, cuja filosofia de origem está centrada sobre
a idéia da formação de homens e mulheres competentes, conscientes e
comprometidos/as com a transformação.
Mais
do que nunca, a humanidade necessita de homens e mulheres assim.
Certamente a Universidade não é o único espaço, e talvez nem o mais
apropriado, olhando certas condições em que ela se desenvolve, para
atender a isso.
Cabe
a nós, a cada um e a cada uma de nós, fazer com que a Universidade
seja atual, e ela só será atual, se fizermos repercutir nela os vivos
anseios da humanidade nos mais diversos campos, na construção da
cultura, mas, sobretudo, na ânsia pela justiça no meio das distorções
e desigualdades escandalosas de nossas sociedades
.
Não
se justifica a existência da Universidade para formar profissionais
simplesmente segundo as demandas do mercado, organizar pesquisas a
pedido de seus clientes e empresas, atender à demanda das classes médias
por incrementarem seu nível de ingresso através de diplomas
prestigiosos etc... Escolas de formação profissional ou institutos
tecnológicos podem muito bem realizar essas tarefas, com mais
especialização e produtividade....
O
documento da AUSJAL (Associação das Universidades dos Jesuítas na América
Latina) sobre os Desafios da América Latina para as Universidades
aponta para a importância de a formação profissional universitária
ser acompanhada e perpassada por três grandes eixos que garantam a
formação do profissional cidadão, e cidadão latino-americano: “Fundamentos antropológicos”, “História e atualidade
latino-americana” e “Valores
éticos”.
Poderíamos
aqui discorrer longamente sobre o quanto nossa antropologia, nossa
consciência latino-americana e nossas posturas éticas ainda são frágeis,
defasadas (ou até desviadas) frente aos graves desafios que nos
envolvem...
É
necessário que a Universidade ajude a despertar cidadãos
competentemente inquietos e dispostos a enfrentar os absurdos que
acontecem em nossa sociedade; inquietos e dispostos para transformar seu
país numa sociedade justa, de todos e para todos.
Estamos
ainda, confesso, longe de alcançar bons caminhos dentro da Universidade
para proporcionar verdadeiramente isto. Conhecem-se muitas tentativas.
Como
eu já disse numa outra oportunidade,
"ninguém
duvida que a Universidade é um espaço privilegiado. Basta que olhemos
a sociedade, como um todo, para chegarmos a esta incontestável conclusão.
Talvez alguns não aceitem isto sem dificuldade, sobretudo aqueles que só
conseguiram se aproximar do meio universitário, mediante grandes esforços
e sacrifícios. A dura verdade é, no entanto, que, apesar de raras exceções,
a Universidade é um dos lugares onde os excluídos da sociedade menos
se permitem sonhar em poder um dia chegar".
Já
ouvi alguém dizer que:
“Universidade nunca rimou com pobreza ou com exclusão”. Com
rima ou sem rima, esta é, sem dúvida, uma das questões que mais
diretamente inquieta e interroga a muitos daqueles que fazem da
Universidade o dia-a-dia de sua vida.
Existe
um consciência grande na comunidade acadêmica em geral em abrir
caminho neste sentido. Poderíamos mencionar aqui por exemplo todo o
envolvimento e compromisso assumido pelo CRUB (Conselho dos Reitores das
Universidades Brasileiras) com relação à questão da Reforma Agrária
e à luta do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Em nossa
Universidade formou-se um Grupo coordenado pelo Prof. Luiz Inácio
Gaiger.
Junte-se,
também, a isto, todo o respaldo dado por diversas Universidades ao
grande empenho na área da educação levado por este Movimento, que,
aliás, acabou de ser homenageado com o Prêmio Educação RS 1999.
Destacam-se em nossa Universidade, neste sentido, as Profas. Gelsa
Knijnik e Noely Varella.
Devo
mencionar também a UNITRABALHO, importante rede na qual participam
Universidades e entidades representativas dos Movimentos dos
Trabalhadores. O nosso Núcleo local é coordenado pela Prof.ª Maria
Clara Bueno Fischer.
O
CRUB também está preparando (e isto acontece um pouco na esteira da
Campanha da Fraternidade deste ano, como expressa o próprio Presidente
do CRUB no Ofício de encaminhamento) a Primeira Semana Nacional
Universitária sobre “O fenômeno
do desemprego: diagnóstico e perspectivas”, no dia 26 a 29 de
outubro, onde se visa colocar as Universidades em rede para debates e
reflexões simultâneas envolvendo esta temática tão desafiadora para
a nossa sociedade no momento atual. Esta Semana Nacional objetiva
preparar a Primeira Conferência Nacional Universitária (dias 23 e 24
de novembro), onde participarão Reitores e especialistas, com
representantes do governo, do empresariado das organizações sindicais
etc. São projetos do Programa de Interação Universidade e Sociedade,
constante do Plano de Ação do CRUB para o biênio 1999-2000
Também
a III Semana Social iniciada no ano passado, continua em andamento. Por
exemplo, o “Encontrão Estadual”
a realizar-se em Gravataí promete um grande afluxo de participantes e
um professor de nosso Centro, o Prof. Paulo Peixoto de Albuquerque estará apresentando
pesquisa sobre os “principais
focos de exclusão no Estado”, realizada pelo Núcleo de Estudos
da Pobreza NEP – um dos promotores deste evento. A III
Semana Social vem proporcionando uma grande mobilização da
Sociedade Civil em torno da questão do resgate das dívidas sociais e a
sua equipe de preparação e coordenação acertou bem no alvo ao chamar
também a Universidade ao centro do palco. Vou retomar, aqui, mais uma
vez, uma reflexão feita por mim em outra oportunidade nesta
Universidade...
"As
Universidades podem e devem contribuir não só pelo que têm condições
de aportar em termos de apoio científico e de reflexão, que os quadros
acadêmicos têm condições de dar num empreendimento como este, mas
também pela sua situação de privilégio e o terrível distanciamento
social, que aponta para uma
grande dívida social que elas (as Universidades) vêm acumulando e que
deve ser saldada. No contexto social em que vivemos, não se pode
conceber uma Universidade que permaneça alheia ao drama vivido pela
maioria da população, empurrada sempre mais para a exclusão social.
Afinal, não estamos mais vivendo, por exemplo, no tempo da antigüidade
egípcia, onde uma minoria, formada nas escolas, detinha o monopólio
das “falas dos deuses” para dominar e escravizar a população".
Concluo
repetindo, também, algo que já falei em outras oportunidades:
"Só
se pode efetivamente falar em solução para os graves problemas que
afligem a nossa sociedade, na medida em que as populações empobrecidas
forem levadas a sério. A Universidade evidentemente não está aí para
suprir o déficit assustador das políticas sociais, mas a sua participação
não pode estar ausente quando se trata de buscar respostas científicas
e técnicas aos grandes desafios com os quais a sociedade se depara...
Para mim, Universidade tem sentido na medida em que leva isto a sério.
É somente nesta medida, que a Universidade, enquanto tal, também
merecerá ser levada a sério".
Eu
acredito que eventos como este ajudam certamente a Universidade a levar
esses grandes desafios a sério.