Livros
Direitos Humanos
Direitos
Humanos
Direitos
Humanos em Moçambique
Josué
Bila
Parte
II
Capítulo
V
Entrevistas
Silas
Grecco propõe educação
em direitos humanos para a globalização
solidária
Silas
Grecco15
é jovem com lucidez intelectual
contemporânea. Dá para escutá-lo
a questionar sobre a globalização,
ONU e não só. Brasileiro
e defensor de direitos humanos. Sonhador
de um mundo justo. Tenciona em trabalhar
como voluntário em um dos países
africanos. Moçambique é
um deles, basta-lhe a oportunidade. O
blog bantulândia captou os seus
argumentos, aqui, em São Paulo,
Brasil.
Bantulândia
- O professor norte-americano, Richard
Falk, no seu livro Globalização
Predatória (1999), propõe
que a globalização possa
ser transformada a fim de melhor servir
os interesses dos povos do mundo. Como
transformar esse pensamento em realidade,
na defesa de direitos humanos dos povos
do mundo?
Grecco - Não creio
que seja possível transformar o
carácter neocolonialista que existe
na globalização tecnocrata.
Transformar a globalização
em prol dos direitos humanos daria origem
a um novo fenómeno, talvez uma
revolução ética muito
improvável de acontecer, que com
semelhanças do renascimento e do
iluminismo, traria de volta valores humanos
cívicos, retomaria a noção
de Direito Natural tão repelida,
faria a cidade menos heterônoma,
diminuiria o sentimento de auto-suficiência
dos cidadãos e traria a interdependência
cooperacional, inclusive com a própria
biosfera. Se para Rousseau a sociedade
corrompe o homem, hoje eu substituiria
sociedade por globalização.
Bantulândia
-Uma observação, até
menos atenta, indica que, no mundo actual,
a compreensão e a implementação
internacional dos direitos humanos é
fraca para elevar as condições
de vida dos excluídos, espalhados
pelo mundo, particulamente no Terceiro
Mundo.
-Que propostas avança para a materialização
dos direitos humanos?
Grecco - De maneira simplista,
porém fundamental, é a vontade
política. Contudo, existem avanços
incríveis promovido pelas Nações
Unidas, como o Mecanismo de Revisão
Periódia Universal (UPR) que dentre
suas várias funções,
visa identificar e monitorar as dificuldades
e os fenómenos que afectam a concretização
dos Direitos Humanos. A materialização
dos Direitos Humanos, em termos de longo
prazo, só será possível
quando os países-membros da ONU
se engajarem na melhoria da participação
na diplomacia, na luta pela aplicação
do Direito Internacional Humanitário,
nos Tribunais Internacionais e etc. É
agregar e religar o máximo possível
o diálogo em torno dos direitos
humanos, caso contrário iremos
dar continuidade a uma cultura de administração
assistencialista da pobreza e o usar o
excluído como objeto de estudo
acadêmico e fonte de relatórios
internacionais.
Bantulândia
- Quais são as grandíssimas
diferenças entre o cidadão
do hemisfério sul e do norte na
compreensão dos direitos humanos?
Grecco - Seria papel
de um sociólogo ou um antropólogo
responder essa pergunta apuradamente,
mas de forma subjetiva e genérica,
o hemisfério norte tem um posicionamente
muito autárquico, monopoliza a
luta pelos direitos humanos, tornando-a
cada vez mais acadêmica, fazendo
do ativista uma pessoa “privilegiada”
por lutar pelos direitos humanos, quando
esse deveria ser o papel possível
de todos nós. Essa idéia
pode ser melhor compreendida com Bárbora
Bukovská em seu artigo: “Perpetrating
Good: Unintended Consequences of International
Human Rights Advocacy”.
Ainda de forma genérica, o hemisfério
sul, carentes de direitos, tem um posicionamento
bem menos positivista, mas com muitas
heranças militaristas e oligárquicas,
no caso da América Latina, por
exemplo, e das ditaduras em África,
típicas situações
que limitam cidadãos ávidos
por justiça. Por outro lado, é
possível ver um forte crescimento
de organizações da sociedade
civil tão forte quanto as do hemisfério
norte, prova disso é a Cooperação
Sul-Sul criada pela Agência Brasileira
de Cooperação (ABC) com
o objetivo de coordenar, negociar, aprovar,
acompanhar e avaliar a cooperação
para o desenvolvimento, em todas as áreas
do conhecimento, usando as palavras da
ABC.
Bantulândia
- O filósofo Thomas Pogge afirma
categoricamente que, “sem o apoio
dos Estados Unidos da América e
da União Européia, a pobreza
e a fome mundiais não serão
certamente erradicadas enquanto formos
vivos”. Qual é o seu posicionamento?
Grecco - Concordo com
Pogge, inclusive é possível
ver grandes sinais de como ele defende
a cooperação da comunidade
internacional em sua teoria de Dividendo
dos Recursos Globais para a pobreza sistêmica.
Se vermos pobreza e desigualdade como
consequências da privatização
e de todas as tendências capitalistas,
historicamente os EUA e a UE são
os principais réus para se responsabilizarem
sobre esse tema. Mas é importante
lembrar que não é válido
lutar contra a pobreza somente com a concepção
que desenvolvimento está intrínseco
com a industrialização.
Usar o pobre como mão-de-obra barata
para grandes indústrias também
não é desenvolvimento. Os
EUA e a UE tem grandes poderes de Investimento
Externo Direto (IED) de forma que seja
possível respeitar os direitos
humanos e as características locais,
ou seja, nem todos os países precisam
da Nike, pode-se fazer um IED incentivamento
o crescimento de pequenas e médias
empresas locais ao invés de exterminá-las.
Bantulândia
- Na actualidade, que vantagens traz o
Fórum Social Mundial, para o debate
e inspiração de programas
de inclusão social dentro dos países?
Grecco - Em 2009, o FSM
teve 133 mil participantes de 142 países.
Que outro Fórum mundial tem essa
representatividade? Certamente, o FSM
é uma ferramenta democrática,
perto desses encontros aristocráticos
internacionais, com excepção
dos encontros diplomáticos oficiais,
é claro. Portanto só o evento
em si já trata da inclusão
social.
FSM é o empoderamento dos recursos
constitucionais na luta pelos direitos
de forma autodeterminada que dá
espaço para que diversos grupos
e ONGs construam uma rede internacional
e religada, aumentando o poder de pressão
governamental e diminuindo a dissolução
existente entre os defensores de direitos
humanos e ambientais.
Bantulândia
- Como é que os grupos excluídos
e oprimidos pela “globalização
predatória” podem estabelecer
redes cosmopolitas para uma possível
“globalização solidária”?
Grecco - Muito bom uso
do termo “cosmopolita” e desse
entendimento de cidadania mundial que
elaboro minha resposta. Num único
termo: Educação em Direitos
Humanos em que está a origem das
possibilidades dos excluídos acharem
seu fluxo centrípeto de volta à
humanidade e perceber que todos nós
somos seres políticos. É
a Educação em Direitos Humanos
que educa o cidadão a discernir
e se perguntar sobre suas próprias
atitudes diante de si, do outro e da sociedade;
educa-o a se relacionar além da
tolerância, pois não somente
suporta-se o outro, mas reconhece-se no
outro; torna-o capaz de compreender sua
função na cidade, ou seja,
praticar a cidadania voluntária
de acordo com as circunstâncias
da cidade; educa-o a raciocinar que trabalhar
pelo bem comum é, ao mesmo tempo,
trabalhar o melhor bem para si, pois,
quando não há respeito aos
direitos humanos e às peculiaridades
culturais, religiosas e sociais, o ser
humano será constantemente espoliado
e agredido, dando lugar à violência;
por fim, educa-o para saber como se tornar
um ser humano, disposto a lidar, respeitar
e amar o que há de universal em
todos nós, principalmente as diferenças,
as culturas, as etnias, etc.
São
Paulo, 8 de Abril de 2009
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Nota:
15
- Activista de direitos humanos desde
os 16 anos. Voluntário da Associação
da ONU no Brasil. Experiente com a causa
dos refugiados pela Cáritas e Agência
das Nações Unidas para os
Refugiados-ACNUR. Ganhador do Prêmio
Direitos Humanos, 2006, da Presidência
da República. Representou Angola
na Model United Nations Conference 2007.
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