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        6. Alguns exemplos paradigmáticos da atuação do MNDH
        
         As
        referências históricas anteriores parecem suficientes para que se
        compreenda a diversidade - e o acúmulo histórico - da atuação do
        Movimento e das entidades que lutam pelos direitos humanos no Brasil.
        Essa luta caracteriza-se por intervenções muitas vezes simultâneas,
        em âmbitos diferentes e utilizando várias formas de mobilização e
        pressão.
        
         Não
        é preciso insistir nas dificuldades enfrentadas. Basta destacar a
        dificuldade representada pelo enfrentamento de uma cultura autoritária,
        presente nas relações sociais brasileiras desde o início da história
        do país. Apesar dessa realidade e da compreensão de que a correlação
        de forças, em nível de opinião pública, ainda desfavorece, no
        Brasil, uma cultura democrática baseada nos direitos humanos, há um
        considerável acervo político, acumulado, no dia-a-dia, por centenas de
        militantes e organizações.
        
         A
        partir dessa constatação, é importante, agora, elencar alguns
        exemplos paradigmáticos da atuação do MNDH e de suas entidades
        filiadas, em termos de conquistas e avanços, em anos mais ou menos
        recentes.    
        
          
        
         6.1.
        A responsabilização do Estado no caso dos mortos e desaparecidos políticos
        
          
        
         As
        entidades de direitos humanos, entre outras da sociedade civil
        brasileira, já haviam tido um papel determinante na mobilização sócio-política
        que resultou na anistia de 1979. Depois disto, continuou a luta para que
        o Estado reconhecesse a sua responsabilidade na atuação de seus
        agentes que resultou em centenas de casos de mortes e desaparecimentos
        políticos. A Lei 9.140, sancionada em 4 de dezembro de 1995, pelo
        Presidente Fernando Henrique Cardoso, é a medida mais recente,
        resultante, de um lado, da continuidade desse processo de pressão e, de
        outro, da abertura governamental para enfrentar o problema, na medida do
        possível, ou seja, da correlação de forças existente no sistema de
        poder.
        
         A
        partir dessa lei, foi formada comissão, com participantes da sociedade
        civil (entre os quais Suzana Keniger Lisboa, da comissão de familiares
        de desaparecidos, a qual, com os grupos Tortura Nunca Mais, integra a
        rede do MNDH). Essa comissão definiu os casos para pagamento de
        indenizações aos familiares por parte do Estado. A luta, agora,
        centra-se na extensão da medida nos casos em que os opositores e
        resistentes à ditadura foram executados sumariamente, fora de dependências
        policiais.
        
          
        
         6.2.
        Indenização em um caso de tortura cometida por policiais federais
        
          
        
         Pela primeira
        vez na história do Brasil, pelo que consta, o governo federal assumiu a
        responsabilidade de seus agentes diante de um caso de tortura em dependência
        policial. Isto aconteceu  este
        ano, diante do assassinato sob torturas de um preso, acusado de narcotráfico,
        numa repartição da Polícia Federal, em Fortaleza (CE). Projeto de lei
        do Presidente da República, prevendo indenização para a família, já
        foi aprovado pela Câmara dos Deputados. Os fatores dessa medida foram
        os mesmos: pressão organizada das ONGs e sensibilidade política do
        Executivo.
        
          
        
         6.3. Abertura
        de espaços institucionais 
        
          
        
         Um
        dos fenômenos mais importantes na história recente da luta pelos
        direitos humanos no Brasil é a abertura e ampliação de espaços
        institucionais, nesse campo. Por todo o país, multiplica-se a atuação
        de Comissões, Conselhos e Comitês de Direitos Humanos em Câmaras
        Municipais, Prefeituras, Assembléias Legislativas, Governos Estaduais e
        no âmbito dos Três Poderes da República. Esses organismos, em geral,
        ou são paritários ou têm participação majoritária do governo.
        Amplia-se a tendência de que as entidades da sociedade civil sejam,
        neles, majoritárias. É o caso do Conselho de Defesa dos Direitos da
        Pessoa Humana (CONDEPE), de São Paulo, em que 80% dos 20 conselheiros são
        de ONGs filiadas ao MNDH, o mesmo ocorrendo com os 20% restantes, que
        representam o Poder Executivo e o Poder Legislativo. 
        
          
        
         6.4.
        Projeto de lei sobre trabalho escravo
        
          
        
         O
        MNDH está participando da mobilização social em torno da tramitação,
        no Congresso, do projeto de lei que tipifica o crime de trabalho escravo
        no Brasil. Trata-se de um dos problemas mais graves de direitos humanos
        no país, com um número impreciso (em torno de 30 mil) crianças e
        adolescentes explorados como mão-de-obra barata em carvoarias e
        canaviais, sobretudo nas regiões Norte, Nordeste, Sudeste e
        Centro-Oeste.
        
          
        
         6.5. Campanha
        contra a Impunidade no Espírito Santo
        
          
        
         Trata-se
        de uma das intervenções políticas mais bem articuladas e sucedidas do
        MNDH, em parceria com outras organizações da sociedade civil do Estado
        do Espírito Santo. A Campanha vem sendo realizada desde 1993, no âmbito
        do Fórum Campo/Cidade, a partir de um seminário sobre reforma agrária
        e urbana.
        
         Mais
        de 40 entidades integram o Fórum, entre as quais o MNDH, o MST, a CPT,
        Igrejas e Pastorais, o Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua, o
        CIMI, Sindicatos de Trabalhadores Rurais e Urbanos, a CUT e o Movimento
        de Moradia.
        
         O
        mote da criação da Campanha contra a Impunidade foi o aumento no número
        de homicídios de autoria desconhecida, envolvendo agentes policiais, em
        particular os integrantes de um grupo parapolicial conhecido como
        “Scuderie Le Cocq”.
        Com apoio do MNDH, o governo federal e e as autoridades judiciárias
        federais passaram a acompanhar atentamente o caso, sempre com a
        participação e acompanhamento da sociedade civil. 
        
         Cinco
        inquéritos de maior repercussão foram escolhidos como casos exemplares
        da atuação da Scuderie, associada ao jogo do bicho e outras atividades
        criminosas. Foi formada uma Comissão Processante, integrada por
        advogados da OAB/ES e do MNDH. Com base no material recolhido, inclusive
        com subsídios do Banco de Dados sobre Violência Criminalizada, do MNDH,
        foi preparado um amplo e completo dossiê. 
        
         O
        Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, do Ministério da
        Justiça, criou uma sub-comissão estadual de inquérito no Espírito
        Santo, integrada por juristas e militantes de direitos humanos, entre os
        quais Oscar Gatica, pelo MNDH e Osmar Barcellos, pela OAB. No
        desenvolvimento dos trabalhos, esses dois militantes passaram a sofrer
        ameaças de morte.
        
         Como
        resultado desse esforço conjunto, a Scuderie Le Cocq acaba de ser
        considerada como ilegal e clandestina, pelo Ministério Público
        Federal. Em reconhecimento à luta, a Universidade Federal do Espírito
        Santo concedeu ao MNDH/Regional Leste 1, no ano passado, na pessoa do
        militante Oscar Gatica, o seu 1º Prêmio de Direitos Humanos. O mesmo
        dirigente foi indicado, no ano passado, para receber o 1º Prêmio
        Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República, que foi
        entregue ao Cardeal D. Paulo Evaristo Arns.
        
         No
        Espírito Santo, nesse mesmo contexto, a Universidade criou um Centro de
        Referência em Direitos Humanos (em que também 
        participa o MNDH) e tramita, na Assembléia Legislativa, o
        projeto que institui o Conselho Estadual de Direitos Humanos. 
        
                      
        
        
         6.6. Apoio
        e Proteção a Testemunhas, Vítimas e Familiares de Vítimas da Violência
        
        
          
        
         Uma
        experiência nessa área, nascida no Gabinete de Assessoria Jurídica às
        Organizações Populares (GAJOP), de Recife (PE), uma das entidades
        filiadas ao MNDH, começa a ganhar dimensão nacional. Trata-se da rede
        de pessoas, instituições e entidades que garantem proteção às
        pessoas ameaçadas de morte por terem sido testemunhas de crimes e, em
        cuja situação, haja evidências de ameaças à integridade física,
        dessas pessoas e/ou de seus familiares. Essa rede traduz-se, hoje, no
        Programa de Apoio e Proteção a Testemunhas, Vítimas e Familiares de Vítimas
        da Violência (Provita), apoiada pelo Governo do Estado de Pernambuco e
        Governo Federal. Com base na parceria com o Gajop, o Ministério da
        Justiça irá, agora, implantá-la inicialmente em cinco outros Estados
        (Rio Grande do Norte, Bahia, Ceará, Rio de Janeiro e Espírito Santo). 
        
         O
        Provita tem também o apoio da Anistia Internacional. No momento, as 42
        pessoas protegidas assistiram a crimes praticados por quadrilhas (57%),
        a assassinatos cometidos por policiais militares (20%) e civis (15%),
        assim como à atuação de grupos de extermínio (9%). Os locais de
        proteção incluem conventos e templos de várias religiões. A rede
        articula-se com os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, assim
        como com o Ministério Público e a Prefeitura da Cidade do Recife. 
        
         Com
        o Poder Legislativo, a parceria dá-se na elaboração e tramitação de
        projetos de lei de proteção a testemunhas e também na possibilidade
        de apoio financeiro, através do orçamento estadual. Com o Ministério
        Público, acaba de ser assinado convênio de cooperação técnica,
        entre a Procuradoria Geral de Justiça e o GAJOP, com a interveniência
        do MNDH. O Poder Judiciário, por sua vez, comprometeu-se a divulgar o
        Provita e a agilizar os procedimentos judiciais relativos aos seus
        beneficiários. A Prefeitura dispõe-se a colaborar nas áreas de saúde,
        educação, jurídica e de eventos.
        
         Em
        termos da sociedade civil, o Provita aprofunda parcerias com outras ONGs,
        como a Ação Católica Operária, o CENDHEC e o SOS Criança. 
        
         No
        plano federal, a parceria começa a acontecer com o Ministério da Justiça,
        que terá um papel muito importante na nacionalização do Provita.
        
          
        
          
        
          
        
          
        
         6.7.
        A criação da Ouvidoria de Polícia do Estado de São Paulo
        
          
        
         A
        instituição de uma Ouvidoria de Polícia do Estado de São Paulo, por
        decreto do governador Mário Covas, resulta de uma ampla mobilização
        que envolveu intervenções políticas das entidades filiadas ao
        Movimento Nacional de Direitos Humanos/Regional Sul 1 e que integram o
        Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CONDEPE). O
        detalhamento do projeto da Ouvidoria, encaminhado ao Governo do Estado,
        foi feito na Comissão Permanente de Justiça, Segurança e Questão
        Carcerária, desse Conselho.
        
         O
        primeiro e atual Ouvidor, sociólogo Benedito Domingos Mariano, é um
        dos militantes fundadores do MNDH. Ele define a Ouvidoria (primeira
        iniciativa, no país, de instituir a figura do ombudsman na
        estrutura estatal de segurança pública) como “o espaço
        institucional da sociedade civil no setor de segurança pública” e
        como “símbolo de identidade das democracias estáveis”. 
        
          
        
         O
        acompanhamento da sociedade civil à Ouvidoria é garantido pelo
        trabalho do Conselho Consultivo, integrado por representantes de ONGs de
        direitos humanos e do CONDEPE. O Conselho Consultivo já elaborou o
        anteprojeto que tramitará na Assembléia Legislativa para garantir
        autonomia e independência institucional à Ouvidoria, cujo titular terá
        um mandato. É a segunda etapa da história dessa instituição, que
        também integra as metas do Programa Nacional de Direitos Humanos e que
        já começa a ser criada noutros Estados.
        
         De
        março a maio de 1996, a Ouvidoria paulista recebeu 1208 chamadas e denúncias
        da população, das quais 563 foram transformadas em procedimentos
        investigatórios pelas Polícias Civil e Militar. Foram selecionados 36
        casos exemplares de violação à integridade física dos cidadãos,
        para acompanhamento prioritário. Um serviço telefônico, conhecido
        como “Disque Ouvidoria”, já está em funcionamento. 
        
          
        
         6.8.
        Banco de Dados do MNDH sobre Violência Criminalizada
        
          
        
         Com
        a implantação, em 1992, no Regional Nordeste, do Banco de Dados sobre
        Violência Criminalizada, o MNDH tornou-se a primeira articulação de
        ONGs do país a implementar um projeto informatizado para a coleta de
        dados estatísticos sobre a violência, com vistas à formulação de
        propostas de políticas públicas na área da segurança. Outras
        instituições públicas já possuíam experiências nesse sentido, em nível
        local. 
        
         Nesses
        quatro anos, o Banco vem sistematizando dados, coletados na imprensa,
        sobre as ocorrências de homicídios. A planilha utilizada registra uma
        série de variáveis sobre os crimes, desde os motivos e circunstâncias,
        até a indicação das armas utilizadas, locais das ocorrências e tipo
        de violência que concorreu ao homicídio. Dos Estados brasileiros,
        apenas o Amapá, Rondônia e Maranhão ainda não estão integrados às
        centrais estaduais do Banco de Dados, embora essa integração vá ser
        completada em breve. Em 14 Estados, os primeiros resultados do Banco de
        Dados já foram analisados e os resultados tiveram impacto junto à
        opinião pública e às autoridades. Um desses relatórios abrange os
        Estados nordestinos: “A dupla face da violência”, de Luciano
        Oliveira, de Pernambuco. O primeiro estudo em nível nacional, a partir
        das pesquisas do Banco, é o texto “Pensando sobre o Crime: notas
        introdutórias sobre homicídios e criminalidade no Brasil”, de Luiz
        Rattón, lançado no 9º Encontro Nacional do MNDH, no início deste
        ano, em Brasília.    
        
            
        
        
            
        6.9. Uma intervenção por brasileiros presos no Paraguai
        
          
        
         A
        defesa dos direitos dos brasileiros empobrecidos, presos no Paraguai,
        tem sido uma das prioridades da atuação do Centro de Direitos Humanos
        de Foz do Iguaçu (PR), filiado ao MNDH, através do Regional Sul 2.
        Desde 1991, os responsáveis pelo Centro têm feito esforços para
        descobrir saídas diante da dramática situação de cerca de 140
        brasileiros, em média, presos nas penitenciárias de Alto Paraná e
        Canandeyú, em Ciudad del Este, no país vizinho. 
        
         O
        CDH constatou, nesses presídios, brasileiros presos há mais de cinco
        anos, acusados de crimes cujas penas mínimas, em alguns casos, eram
        menores que o tempo de prisão já cumprido. No início das gestões,
        nenhum preso era assistido juridicamente pelo Consulado Geral do Brasil
        em Ciudad del Este. O Centro conseguiu articular-se com outras
        entidades, mobilizar a imprensa e sensibilizar o governo brasileiro,
        fazendo-o garantir recursos para a defesa dos presos. 
        
         Noutras
        visitas realizadas este ano, o CDH constatou o drama de menores
        encarcerados junto com maiores de idade, outros presos em greve de fome
        e, em geral, condições prisionais desumanas, como, aliás, também
        ocorre no Brasil. Na região do Alto Paraná, o Centro verificou a
        colaboração de fazendeiros brasileiros, latifundiários no Paraguai,
        contra trabalhadores rurais brasileiros que migraram para esse país, em
        busca de trabalho. Em abril, os representantes do CDH, advogado Samuel
        Gomes dos Santos e pastor presbiteriano Romeu Olmar Klich, estiveram em
        Assunção, mantendo contatos com autoridades dos Três Poderes, assim
        como com ONGs e dirigentes de Igrejas. 
        
         Graças
        à articulação entre o CDH de Foz de Iguaçu, a sede nacional do MNDH
        em Brasília e a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados,
        essa Casa constituiu uma Comissão Externa sobre Violações de Direitos
        Humanos contra Brasileiros no Paraguai. Acompanhada pelo MNDH, OAB e
        Associação dos Magistrados, essa Comissão visitou o Paraguai em 13 e
        14 de maio desse ano.
        
         Foram
        visitados os presos brasileiros em Ciudad del Este, onde também foram
        mantidos contatos com o Consulado do Brasil, com o Colégio de Abogados
        de Alto Paraná e com juízes da Corte de Apelación. Em Assunção, a
        Comissão foi recebida pelo embaixador do Brasil, Márcio de Oliveira
        Dias. Esteve também com o Colégio de Abogados do Paraguai, com a
        Associação de Magistrados e com várias Comissões da Câmara dos
        Deputados. Por consenso, foi aprovada proposta do deputado federal Pedro
        Wilson Guimarães (PT/GO), ex-coordenador nacional do MNDH, no sentido
        de se constituir um Fórum Permanente de Direitos Humanos, binacional,
        para tratar das conseqüências sociais do processo de implantação do
        Mercosul.
        
          
        
         6.10.
        Entidades do Acre na luta contra a violência policial 
        
          
        
         No
        Estado do Acre, o Centro de Defesa dos Direitos Humanos e Educação
        Popular e o Centro de Defesa dos Direitos Humanos da Diocese de Rio
        Branco, ambos filiados ao Movimento, lideram a resistência da sociedade
        civil estadual contra o agravamento da violência da polícia. A partir
        de junho deste ano, a escalada de violência aumentou,
        consideravelmente, com o assassinato de um subtenente da PM, cuja família,
        de sobrenome Pascoal, é muito poderosa e controla o aparato policial
        militar do Estado.
        
         Após
        o assassinato, segundo relato dos CDHs, a família Pascoal empenhou-se
        na captura dos suspeitos, utilizando, para isto, recursos arbitrários e
        violentos, incluindo seqüestros, torturas e execuções extrajudiciais.
        
        
         O
        Estado em que Chico Mendes foi assassinado, é um dos mais organizados
        em termos de movimentos sociais e populares. É também um dos
        recordistas brasileiros em matéria de violência. Segundo os registros
        do Banco de Dados do MNDH, entre 2 de janeiro de 1994 e 16 de junho de
        1996, foram assassinadas 333 pessoas no Acre, numa média de 11,5
        pessoas por mês. Entre os mortos, 85% não tinham qualquer envolvimento
        com ações ilícitas. Na capital, Rio Branco, com 220 mil habitantes,
        foram praticadas, de janeiro a junho deste ano, 11 chacinas ou
        “desovas” (execuções sumárias grupais). 
        
          
        
         6.11.
        No Pará, luta contra a impunidade
        
          
        
         A
        luta contra a impunidade dos mandantes e executores de crimes contra
        trabalhadores rurais e urbanos é uma das prioridades da atuação das
        entidades de direitos humanos do Estado do Pará, entre as quais a
        Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SPDH). Essa e outras
        organizações da sociedade civil estão na linha de frente, por
        exemplo, diante do massacre de 19 trabalhadores rurais sem terra, em
        Eldorado do Carajás, no Sul do Pará, em 17 de abril de 1996, quando
        organizou, com a CESE, duas visitas de líderes ecumênicos à área do
        massacre e ao acampamento dos sem terra, na Fazenda Macaxeira (a segunda
        visita foi de  caráter
        internacional, liderada pelo Conselho Mundial de Igrejas, com
        representantes de vários países e um membro do Partido Verde e do
        parlamento alemão).  Neste
        episódio ficou muito visível a presença e o papel da SPDH, 
        a partir de seus escritórios de Belém e Marabá por sua
        articulação eficaz, com apoio da CESE, junto às Igrejas e ONGs
        locais.  Também a destacar
        a presença direta do MNDH, por intermédio de um de seus secretários
        nacionais, que procurou adotar as primeiras medidas e denúncias, logo
        após o conflito. 
        
         Entre
        as ações organizativas do MNDH, através de suas entidades filiadas no
        Pará, destacam-se: a criação do Fórum contra a Violência, com a
        participação de organizações não governamentais e também do
        governo estadual; a participação por meio da SPDH no Seminário-Consulta
        Carajás: Desenvolvimento ou Destruição (articulado pela CESE e ONGs
        locais); a mobilização social para a criação do Conselho Estadual de
        Segurança Pública (que inclui a SPDH e o Centro de Defesa do Menor,
        também filiado ao Movimento) e para a instituição da Ouvidoria da Polícia
        e a criação - com o Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua -
        de Núcleos Municipais e Locais de Defesa dos Direitos da Criança e do
        Adolescente.
        
         As
        entidades paraenses promoveram, igualmente, com apoio do MNDH e de todos
        os seus oito Regionais, uma mobilização internacional bem sucedida em
        favor da libertação e absolvição do brasileiro Sebastião Hoyos,
        preso injustamente na Suíça e, depois de muitos anos de luta,
        libertado e absolvido. 
        
          
        
         6.12.
        D. Maria: um caso de legítima defesa
        
          
        
         Por
        ter matado, em legítima defesa, o pistoleiro que acabara de matar seu
        marido, na zona rural de São Mateus, interior do Maranhão, em 1990, d.
        Maria foi presa e processada. Seu caso, que ganhou repercussão
        internacional, foi acompanhado passo a passo pela Sociedade Maranhense
        de Defesa dos Direitos Humanos, filiada ao MNDH e por outras entidades
        desse Estado. Graças à pressão nacional e externa, d. Maria foi
        absolvida no ano passado. Mais de mil pessoas assistiram ao seu
        julgamento.
        
          
        
         6.13.
        Em Santa Catarina, CDHs apóiam pequenos agricultores
        
          
        
         Na
        rica diversidade de ações pelos direitos humanos, em todo o país, os
        nove Centros de Direitos Humanos do Estado de Santa Catarina, filiados
        ao Movimento Nacional, destacam-se por uma ação muito especial: o
        incentivo à formação de Associações de Pequenos Agricultores, desde
        1989. Paralelamente, começam também a ser organizadas, graças ao
        incentivo dos CDHs, as Associações dos Amigos da Natureza, que
        trabalham, como acontece, por exemplo, no município de Salete (SC), na
        preservação do meio ambiente, na prevenção do uso de agrotóxicos,
        substituídos pela adubação orgânica e na mobilização para
        conseguir a instalação da telefonia rural. 
        
          
        
         6.14.
        Formação conjunta: uma experiência histórica em Goiás 
        
          
        
         O
        Programa de Formação Conjunta (PCF), desenvolvido de 1987 a 1994, em
        Goiás, pelo Instituto Brasil Central (IBRACE), Instituto de Formação
        e Assessoria Sindical (IFAS) e Comissão Pastoral da Terra (CPT), foi
        uma experiência histórica, em termos de formação, na caminhada do
        Movimento Nacional de Direitos Humanos. Com o apoio do Movimento de
        Leigos para a América Latina (MLAL), da Itália, o PCF desenvolveu
        dezenas de cursos de formação para lideranças rurais e urbanas, com a
        participação de estudantes universitários, como estagiários. Hoje,
        60% desses/as estagiários/as que passaram pelo Programa assessoram, já
        como profissionais, movimentos populares do Centro-Oeste e também
        participam, como técnicos, de administrações públicas democráticas.
        
        
          
        
         O
        Programa de Direitos Humanos da PUC de Goiânia (a partir de 1983) e o
        IBRACE (fundado um ano depois) colaboraram decisivamente para a fundação
        da Federação dos Inquilinos e Posseiros de Goiânia, embrião do
        Movimento Nacional de Luta pela Moradia, com sede na capital goiana e
        também assessorado pelo IBRACE. 
        
          
        
         6.15.
        D. Heriberto: um bispo dos direitos humanos 
        
          
        
         Quando
        ainda era padre em Jataí (GO), Heriberto Hermes queria fundar uma
        Comissão de Direitos Humanos na diocese em que trabalhava. Procurou o
        MNDH, através da CPT e do IBRACE. Participou do encontro do Regional
        Centro-Oeste, em Tocantinópolis (TO), em 1986. Ao voltar à sua cidade,
        incentivou a criação do CDH da Diocese de Jataí/Mineiros e da Câmara
        de Direitos Humanos de Mineiros. Em 1993, foi nomeado bispo de Cristalândia,
        no Estado do Tocantins. Uma de suas providências foi a de novamente
        convidar o Instituto Brasil Central para assessorá-lo na criação de
        mais uma entidade, a Comissão de Direitos Humanos de Cristalândia,
        dotada de autonomia diante da Igreja. Da atuação dessa nova ONG, já
        surgiu outra entidade: o Centro de Direitos Humanos de Palmas, capital
        do Tocantins. 
        
          
        
         6.16.
        Teodoro e Dirley: um CDH nascido da resistência ao arbítrio
        
        
          
        
         Em
        17 de janeiro de 1986, ao atravessarem a favela Heliópolis, zona sul de
        São Paulo, para jogarem futebol numa quadra, cinco rapazes são presos
        pela ROTA, uma unidade de elite da Polícia Militar e levados ao 26º
        Distrito Policial. Três foram liberados, em seguida, sem maiores
        explicações.
        
         Dois
        - Teodoro Hoffman e Dirley da Silva - foram assassinados por policiais.
        Da resistência a esse ato de arbítrio, nasceu o Comitê Teodoro e
        Dirley de Direitos Humanos, filiado ao MNDH/Regional Sul 1. Uma das
        militantes engajadas na apuração do crime, Isabel Peres, do Centro
        Oscar Romero, sofre ameaças de morte.
        
         A
        resistência, porém, ganha forças, graças à mobilização da
        sociedade civil organizada. As ossadas dos dois jovens foram encontradas
        50 dias depois da execução, numa estrada vicinal de São Bernardo do
        Campo. Anos depois, os cinco policiais militares envolvidos foram
        condenados a 32 anos de reclusão. 
        
          
        
         6.17.
        Violência policial: desafio enfrentado pelo CDH de Manaus 
        
          
        
         O
        enfrentamento da violência policial, apoiada pelo próprio Secretário
        de Segurança do governo estadual, Klinger Costa, é uma das ações
        prioritárias do Centro de Defesa dos Direitos Humanos de Manaus (AM),
        ligado à CNBB e filiado ao Movimento. Por desobediência às ordens do
        Poder Judiciário, apoio pouco disfarçado aos grupos de extermínio e
        acobertamento de torturas, além da efetivação de prisões sem ordem
        judicial, o Secretário acaba de ser denunciado ao Ministério Público,
        em conjunto, pelo CDH e pela OAB do Amazonas.
        
         Manaus
        já se tornou uma das cidades mais violentas do país, segundo os
        registros das entidades de direitos humanos. O SOS Criança recebe uma média
        de 25 denúncias diárias de violências contra crianças e
        adolescentes, cometidas dentro e fora de suas casas. Noutro âmbito, o
        principal grupo parapolicial de extermínio na cidade é conhecido como
        a “Firma”. 
        
          
        
         6.18.
        Em Rondônia, CDH e Governo fazem convênio pela saúde da mulher 
        
          
        
         A
        formação e a promoção da saúde da mulher rural são o objetivo
        central do convênio que o Centro de Direitos Humanos de Ji-Paraná, em
        Rondônia, assinou, em agosto de 1995, com o governo estadual, através
        do Plano Agropecuário e Florestal de Rondônia (Planafloro). Além de
        suas atividades específicas como entidade de direitos humanos, o CDH
        produz material sobre a saúde da mulher, incluindo temas como a prevenção
        do câncer e a menopausa. Ministra também cursos para os agentes de saúde
        da Diocese de Ji-Paraná.
        
          
        
         6.19.
        Comissão Justiça e Paz de Salvador ajuda a organizar Núcleos de
        Direitos Humanos
        
          
        
         Fundada
        em 1982, no mesmo ano de fundação do MNDH, a Comissão Justiça e Paz
        da Arquidiocese de Salvador (BA) apresenta, em sua caminhada, um
        considerável legado em matéria de luta contra a violência e organização
        popular em torno dos direitos humanos.
        
         Um
        dos primeiros Núcleos de Direitos Humanos, formados a partir de uma ação
        de resistência à violência policial, foi organizado em 1994, na
        comunidade do Jardim Cajazeiras, da Forania 8 (subdivisão geográfica
        arquidiocesana). Os moradores organizaram-se, com apoio da CJP, depois
        da chacina de três rapazes, executados por um grupo de extermínio. 
        
         Um
        outro Núcleo nasceu, depois, no bairro de Sussuarana Velha, com base
        noutro fato de violência: o assassinato de uma empregada doméstica
        pelo filho de sua patroa, um policial militar que a espancou até à
        morte, acusando-a de ter roubado R$ 100,00. Mais um Núcleo, na Estrada
        Velha do Aeroporto, reúne nove comunidades circunvizinhas.
        
         A
        Comissão Justiça e Paz realiza também um trabalho na zona rural da
        Grande Salvador, articulada com associações e sindicatos de
        trabalhadores rurais, empregados da indústria açucareira e sem terra.
        Ainda em Salvador, a Comissão assessora a comunidade de pescadores do
        bairro de Gamboa de Baixo, cujos moradores estão ameaçados de expulsão
        para que, na área em que vivem, sejam implantados projetos turísticos.
        
        
          
        
         6.20.
        Centro Santo Dias: know how no enfrentamento da violência do Estado
        
          
        
         No
        universo de entidades filiadas ao MNDH, o Centro Santo Dias de Direitos
        Humanos, uma ONG autônoma, ligada pastoralmente à Arquidiocese de São
        Paulo, especializou-se no atendimento de casos de violência cometidas
        por policiais militares. Fundado em 1980, o Centro acompanha
        sistematicamente, através de seus advogados, 100 processos envolvendo
        Pms, inclusive homicídios, torturas e outras ações violentas. Como
        resultado desse trabalho, o Estado foi obrigado a pagar cerca de 58 de
        indenizações às vítimas e/ou aos seus familiares, como é o caso de
        Ana Dias, viúva do metalúrgico Santo Dias da Silva, assassinado a
        tiros, pelas costas, por um policial militar, quando participava de uma
        greve numa fábrica da região sul paulista.
        
         Quatro
        casos encaminhados pelo Centro à Comissão Interamericana de Direitos
        Humanos, da OEA, ilustram o quadro específico de violência diante do
        qual essa entidade atua: 
        
         1º)
        O metalúrgico Oséias Antônio dos Santos, pai de quatro filhos
        menores, sem qualquer antecedente criminal, foi executado por dois
        policiais militares, diante da esposa e dos filhos, em São Paulo, em 16
        de março de 1982. Entre os matadores, o capitão Conte Lopes, da ROTA
        (grupo de elite da PM), eleito, mais tarde, deputado estadual e autor,
        segundo ele mesmo conta em público, com orgulho, de cerca de 200 homicídios.
        Dias depois da execução sumária de Oséias, a Polícia reconhece ter
        cometido um “erro”: o metalúrgico não era a pessoa que estavam
        procurando. A família procurou o Centro que abriu processo na Justiça
        Militar. Até hoje, o Poder Judiciário aguarda a manifestação do
        Poder Judiciário para processar Conte Lopes que, como deputado, tem
        imunidade parlamentar;
        
         2º)
        Clarival Xavier Cotrim, 22 anos, negro, foi executado sumariamente, em
        20 de abril de 1982, em São Paulo, por seis policiais militares, após
        ser detido arbitrariamente, sem ordem judicial e sem qualquer motivo.
        Depois de preso, foi levado para São Mateus, na Zona Leste, onde foi
        assassinado. A própria promotoria da Justiça Militar reconheceu, em
        1983, que “a execução foi consumada em situação que impossibilitou
        a defesa, pois a vítima estava totalmente dominada e à mercê dos seus
        carrascos”. No entanto, até hoje não aconteceu o julgamento dos Pms,
        que estava marcado para 2 de maio de 1991 e passou a ser sucessivamente
        adiado, sem motivos; 
        
         3º)
        Celso Bonfim de Lima, 18 anos, era funcionário de um restaurante e foi
        baleado, pelas costas, no interior do estabelecimento, por PMs, em 29 de
        abril de 1983. Fora autorizado pelo patrão a pernoitar no local, pois
        morava longe. Foi acordado de madrugada por policiais que lhe mandaram
        colocar as mãos na cabeça. Quando ia abrir a porta, foi alvejado pelas
        costas. Ficou tetraplégico e incapaz para o trabalho. O julgamento dos
        PMs só aconteceu em 1993. Só um dos militares foi condenado, assim
        mesmo à pena de dois anos, com direito a sursis; 
        
         4º)
        Wanderley Gallati foi morto a coronhadas na cabeça, em 26 de agosto de
        1993, numadas ruas de São Paulo, por um PM, depois de colidido seu
        carro com outro. O PM assassino foi promovido a oficial, o que retardou
        o julgamento do caso. O júri ocorreu em 1991 e o PM foi absolvido
        “por falta de provas”, apesar do depoimento em contrário de cinco
        testemunhas oculares, que foram inclusive impedidos de prestar socorro a
        Wanderley.
        
          
        
         6.21.
        A Via Sacra da Pastoral de Direitos Humanos de Belo Horizonte contra o
        “esquadrão do torniquete”
        
          
        
         No
        início de 1990, a Comissão Pastoral de Direitos Humanos de Belo
        Horizonte foi procurada por moradores da região norte da capital
        mineira, preocupadas com a atuação do esquadrão da morte denominado
        “esquadrão do torniquete”. O grupo parapolicial começara a atuar
        durante o Carnaval de 1990.
        
         Em
        pouco menos de oito meses, foram assassinadas, pelos seus integrantes,
        algo em torno de 27 a 32 pessoas. A maioria das vítimas era formada por
        trabalhadores de 20 a 30 anos. Era o caso, por exemplo, de César, 24
        anos, um rapaz tranqüilo, muito ligado à família e aos amigos,
        residente em Contagem, na Grande Belo Horizonte. Nunca havia tido
        envolvimento nem com a polícia, nem com drogas ou outros vícios.
        
         A
        partir das denúncias, a Pastoral (filiada ao MNDH através do Regional
        Leste 2 começou o que seus militantes chamam de verdadeira Via Sacra em
        busca da justiça. Foram visitadas autoridades e meios de comunicação.
        Em parceria com Sindicatos e outros movimentos, fundou o Movimento SOS
        Vida, em 26 de julho de 1990. Vários membros do esquadrão foram
        levados ao banco dos réus.
        
          
        
         6.22.
        No Ceará, CDH luta pela valorização da escola pública
        
          
        
         A
        defesa do ensino público e gratuito é uma das atividades prioritárias
        do Centro de Defesa da Vida Herbert de Souza, a mais nova entidade
        filiada ao MNDH, no Estado do Ceará. Fundado em 1994, o Centro atua na
        região do Grande Bom Jardim, com cinco bairros, na área mais pobre da
        capital cearense, com cerca de 112 mil habitantes. O Ceará tem 14
        entidades de direitos humanos, seis das quais filiadas ao Movimento. 
        
         O
        Centro de Defesa da Vida atua através de dois Programas: 1. Defesa dos
        Direitos da Criança e do Adolescente e 2. Formação para a Cidadania.
        No primeiro, funcionam o Núcleo de Auto-Gestão de Direitos (que mantém
        um grupo de estudos e acompanhamento do Estatuto da Criança e do
        Adolescente, numa área em que há muita violência contra as crianças)
        e o Fórum de Valorização da Escola Pública. Este Fórum é integrado
        por diretores e professores das escolas públicas do Grande Bom Jardim.
        Em parceria com o Centro, essas escolas e o Fórum promovem uma
        atividade permanente de complementação escolar para os alunos. No
        segundo, são realizados cursos de capacitação para lideranças,
        oficinas de educação política e palestras sobre direitos humanos nas
        comunidades.
        
          
        
         O
        Centro atende a uma média de 20 a 30 pessoas por dia, no Balcão de
        Atendimento ao Cidadão e trabalha em parceria com 18 associações de
        moradores, 16 comunidades eclesiais de base, dois grêmios estudantis e
        dois grupos culturais. 
        
          
        
        
       |