PAUL
CAMPHIN
Nascido
em 1922. Originário de Arras. Dirigente da Juventude Comunista em
Pas-de-Calais. Trabalha desde 21 de Outubro de 1940 com Charles
Debarge na Organização Especial (OE) tal como os seus dois irmãos
Maurice e René. Oficial dos FTPF, adjunto do coronel Dumont, mais
tarde comissário político. Preso no dia 24 de Outubro de 1942.
Fuzilado no dia primeiro de Novembro de 1943, na cidadela de
Arras.
Arras, 17 de Outubro de 1943
Ao meu grande Partido Comunista
Dentro de dias eu
e meus camaradas caminharemos para o posto de execução.
Irei de cabeça erguida, com a satisfação do dever cumprido e a
consciência de ter sido para ti, querido partido, um militante
fiel. Membro das Juventudes Comunistas desde 1935, apoiado e
orientado pelo meu irmão René, a quem quero dirigir uma suprema
homenagem, tornei-me secretário da secção dos jovens. Depois
veio a guerra; alistado voluntário, fiquei um ano no serviço
militar e, depois de assinado o vergonhoso armistício, voltei a
Arras para junto dos meus camaradas, para continuar o combate. Em
Março de 1942, entrei para os guerrilheiros franco-atiradores com
o meu irmão Maurice que veio a morrer heroicamente no dia 14 de
Março de 1943 sob as balas alemãs, depois de ter suportado
longos meses de prisão e sofrimento.
Em Abril de 1942 passei à clandestinidade e
no dia 24 de Outubro de 1942 fui ferido e preso em Hellemmes por
nove polícias franceses e três alemães. Eram então nove horas
da noite; a casa em que me encontrava foi cercada, os polícias
ordenaram-me que me entregasse; tentei fugir; o polícia francês
Delannoy, de Lille (Brigada Especial) descarregou três vezes o
revólver. Atingido com uma bala na coxa e outra no joelho, fui
preso por estes polícias que têm o atrevimento de dizer-se
Franceses. Fui conduzido ao comissariado central de Lille; aí,
socos, bateram-me com matracas por todo o corpo; o próprio comissário
central Rochat me deu pontapés na cara, quando estava deitado em
cima de duas cadeiras e a perder sangue abundantemente (o cirurgião
declarou que era preciso levar-me imediatamente para o hospital).
As torturas continuaram cada vez mais fortes.
Só confessei o meu nome às cinco horas da
manhã, depois de ter sofrido a pior das torturas; estes polícias
puseram-me as partes sexuais em cima duma cadeira esmagando-as com
as mãos; utilizaram de novo este processo para me fazer confessar
e marcar um encontro com os camaradas, mas eu declarei não os
conhecer e não ter nenhum encontro. Finalmente no dia 25 de
Outubro de 1942, às onze horas, fui transportado para o hospital
Saint-Sauveur em extremo estado de fraqueza; fiquei seis dias em
coma e fui sujeito a duas operação ao joelho. Era guardado dia e
noite por quatro inspectores armados, embora estivesse engessado
até ao peito; agradeço aqui à irmã que me tratou e aos doentes
da sala Henri-Follet, pelos carinhos que me proporcionaram.
No dia 12 de Novembro de 1942, fui
transportado para o hospital alemão (Calmette) onde fiquei três
meses e meio. Daí fui transferido para a prisão de forçados de
Loos onde cheguei a 28 de Fevereiro. Oito dias depois estava a ser
interrogado; suspenso pelos pulsos durante cinco horas, servia de
“punching-ball” aos bárbaros que faziam de instrutores. Uma
outra vez fui atado e deitado sobre três traves levantadas a
cinquenta centímetros do solo, uma nos pés, outra nos rins,
outra na cabeça. Fiquei assim três horas. Noutros interrogatórios
puseram-me o capacete elétrico, sendo sempre vergastado com um
chicote com uma selvejaria inaudita (as minhas costas estão todas
estriadas de cicatrizes). Deixaram-me quatro dias sem comer e
mostraram-me a gamela. Apesar destas torturas, neguei sempre
aquilo de que era acusado. Recebi quatro encomendas, mas
encontrava-me sempre sozinho na cela; estive dois messes e meio
sem ter recreio.
No dia
28 de Julho de 1943, deixei o inferno de Loos e cheguei na
mesma noite a Arras; fui lá metido numa cela, as minhas
encomendas foram proibidas, as torturas e os interrogatórios
recomeçaram. Neguei os actos que me atribuíam, mas os
instrutores terroristas introduziram falsidades no processo (dei
por isso no tribunal). Finalmente, puseram-me numa sala comum;
tinha estado mais de sete meses sozinho na cela, torturado pela
fome e pelos meus ferimentos, mas a minha alegria e o meu moral não
tinham desaparecido.
No dia 6 de Outubro de 1943, um tribunal de
opereta – foi preciso acordar o nosso advogado para a defesa –
condenou-nos à morte aos cinco, entre os quais o meu valente
camarada Georges Louchet, que foi como um pai para mim. Apesar de
tudo, eu continuava a rir e a cantar; mantendo-me comunista francês
até o fim, não lamento nada, excepto não ter trabalhado mais
ainda. Se eu tivesse de recomeçar a minha vida, recomeçá-la-ia
semelhante à primeira. Sinto-me orgulhoso de ti, meu grande
Partido Comunista, orgulhoso dos teus íntegros militantes que
todos os dias morrem ser ter dado informações ao inimigo.
Partirei para o poste cantando “A Marselhesa” e “A
Internacional” com a alegria no coração por ver estas hordas
de teutões recuar pela acção do valente Exército Vermelho, por
ver a resistência do nosso país, por ver o nosso partido mais
forte do que nunca. Isso faz com que não me importe de morrer;
sei que eu e os meus camaradas seremos vingados; todos os dias os
traidores e a soldadesca caem debaixo das balas dos
Franco-Atiradores. Muitos de nós estão mortos; saúdo aqui estes
heróis da libertação, entre os quais Julien Hapiot, a quem
ofereceram grandes somas para trair, Charles Debarge, Augustin
Lombaerts, Jules Dumont, Armand Pillard, morto na minha frente
devido aos maus tratos recebidos – deixaram-no estendido no chão
durante dois dias – o meu irmão Maurice, e ainda muitos outros.
Jovens franceses, lembrem-se destes
heróis; os seus nomes permanecerão como sinónimo de
coragem e honra. Como eu, outros camaradas aguardam com calma o último
momento. Entre eles encontram-se Georges Louchet, Georges Santerne
e dois camaradas gaulistas. Jovens comunistas, Franceses,
Franco-Atiradores, conservai-vos fortes, não vos deixeis abater,
que o sopro da patriotismo e da liberdade que nos animou se
mantenha em vós mais vivo do que nunca; expulsai o inimigo do país,
atacai os traidores, não tenhais piedade.
Não deveis chorar-nos, mas erguer sempre
mais alto a bandeira do combate; haveis de nos vingar, camaradas.
Honra a todos vós que nos seguistes; os que morreram e os que vão
morrer vos agradecem.
Em breve vou deixar a minha curta vida de
vinte e um anos para que os filhos da França sejam livres e
felizes; não traí a causa do meu partido, parto com o sorriso
nos lábios, a canção na boca; a morte não me faz medo.
Adeus camaradas Franco-Atiradores! Adeus,
Jovens Comunistas! Adeus, meu belo partido! Adeus, meu belo país.
Aquele que vai morrer saúda-vos.
Viva o Partido Comunista!
Viva a França!
Paul
Camphin
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