O
Sistema Interamericano de Proteção
aos Direitos Humanos
Trabalho
referente à etapa
do 3º estágio da disciplina ministrada pelo
professor Luciano Maia, pelas alunas:
Lysandra
Leopoldina de Souza
Nilda Maria Vaz
Oona de Oliveira Caju
Sancha Maria F. de Alencar
Introdução
O Sistema Interamericano de Proteção
aos Direitos Humanos
Origem
Órgãos de monitoramento
O
Sistema Americano de proteção baseado na Carta da
OEA
A evolução da Comissão
Interamericana de Direitos Humanos
*Investigações
e estudos nos países
*Petições individuais
O
Sistema baseado na Convenção Interamericana de
Direitos humanos
A Convenção Americana
A Corte Interamericana de
Justiça
O
processamento do Estado perante a Corte Intramericana
de Direitos Humanos
A fase de propositura da ação
e as exceções preliminares
Fase probatória
Fase decisória
Fase das reparações
Fase da execução da sentença
da Corte
Protocolo
de San Salvador
Instrumentos Interamericanos mais
recentes em relação aos Direitos Humanos
Casos práticos encaminhados à
Corte Interamericana
de Justiça
O
Sistema de Proteção Interamericano e o Brasil
Conclusões
Referências Bibliográficas
INTRODUÇÃO
"A História é um profeta com o olhar
voltado para trás" (Eduardo Galeano). A evolução
da consciência dos direitos inerentes à pessoa
humana tem se desenvolvido, apesar de lentamente,
segundo a História da Humanidade que, "pelo que
foi e contra o que foi, anuncia o que será".
Justificação para essa afirmativa é o fato
de que os grandes marcos que deram início a um
processo mais efetivo de reconhecimento
internacionalização e proteção dos Direitos
Humanos até então surgido foram as duas Grandes
Guerras Mundiais, que levantaram questões acerca de
atrocidades, abusos de autoridade, crimes hediondos,
que não poderiam ser abordados como crimes
individuais e contra pessoas isoladas, mas crimes de
instituições, ideologias, intolerâncias contra nações
inteiras e, dessa forma, também contra a humanidade,
dignidade mínima da pessoa humana e da própria
limitação do Estado, que passa a ter uma nova
identidade: não mais a de senhor dos seus cidadãos,
mas a de "tutor", tenso que prestar contas
internacionalmente dos indivíduos que estão sob a
sua responsabilidade e que pertencem à humanidade.
A integração dos Direitos Humanos numa norma
jurídica internacional ainda necessita de uma longa
evolução para fazer valer uma autoridade livre de
parcialidade e embasada não em autoridade estatais,
mas na autoridade da própria vida, exercida de forma
legítima.
No âmbito regional, talvez porque aí as uniões
em torno dos Direitos Humanos se façam entre Estados
mais semelhantes em muitos aspectos, os sistemas de
proteção aos Direitos Humanos têm tido maior eficácia.
O Continente Americano, de que trataremos neste
trabalho, é especialmente marcado por contradições.
Não históricas, já que ele constitui-se num fiel
retrato de tudo que foi cultivado pelos sujeitos da
História desde a sua "descoberta" até os
dias atuais: a colonização, o genocídio indígena,
a escravidão do africano, as guerras civis; mas entre
seus habitantes. A América tem sido essencialmente um
continente ambíguo no que se refere aos povos e nações
que abriga.
De um lado, existe a América do Norte (leia-se
América branca), cuja herança foi menos de exploração
que de povoamento e, dessa forma, constituiu-se num
recomeço para muitos refugiados europeus, perseguidos
religiosos, exploradores, que se tornaram pioneiros na
fundação de novos Estados que conseguiram identidade
e independência e, assim, diferenciaram-se das demais
colônias americanas. Essa diferenciação deixou sua
marca no presente, já que evoluiu num caminho da
construção do elevado nível de vida conhecido
atualmente e em que se encontram os Estados da América
do Norte. Contudo, não foram eles isentos da violência
, do genocídio indígena, da escravidão, da devastação
e conflitos, que também deixaram suas marcas na
atualidade: a América do Norte, apesar de todos os
seus recursos, não tornou-se uma democracia racial,
como também é excludente de suas minorias.
De outro lado, existe a América Latina (América
Central e América do Sul), protagonista de um
processo histórico muito mais dramático, onde o
impacto e a fusão entre raças e culturas ocorreu de
forma muito mais intensa. É a parte da América mais
marcada pela exploração européia, a dizimação e a
escravidão, cuja evolução foi fortemente assinalada
por guerras civis, intervenção dos países mais
poderosos, e por ditaduras reacionárias: o retrato da
latino América também não contradiz o seu processo
histórico; herdamos pobreza e dependência e também
não constituímos uma democracia racial.
Como,
então, seria possível conciliar os interesses de
povos tão diferentes em rumos históricos tão
diversos e constituir uma organização regional que
promova a proteção dos Direitos Humanos? A nosso
ver, apesar de tantas diferenças, existe na América
algo em comum, compartilhado por todos os seus Estados
membros: as minorias, que são a parte da população
sobre a qual mais incidem violação de Direitos
Humanos e também um reconhecimento de direitos que
existem não historicamente, mas são imprescindíveis
ao caráter humano.
As minorias americanas são, quase sempre, as
mesmas, seja nos Estados Unidos, Canadá, México ou
Colômbia, e são os indígenas, os negros, os mestiços,
as mulheres, os pobres, entre inúmeras outras. São
elas as herdeiras da fatia mais amarga da história
americana e o fato de haver um imenso marco separando
a América do Norte da América Latina não significa
que aquela tenha construído uma democracia que
abrigue todas a minorias citadas, o que acontece é
que na Latino América a situação das minorias é um
agravamento da já sofrida população.
A OEA surge compilando os interesses comuns
entre os Estados americanos, instituindo os princípios
a que veio, como:
a) garantir a paz e a segurança continentais; b)
promover e consolidar a democracia representativa,
respeitado o princípio da não-intervenção; c)
prevenir as possíveis causas de dificuldades e
assegurar a solução pacífica das controvérsias que
surjam entre os seus membros; d) organizar a ação
solidária destes em caso de agressão; e) procurar a
solução dos problemas políticos, jurídicos e econômicos
que surgirem entre os Estados membros; f) promover,
por meio da ação cooperativa, seu desenvolvimento
econômico, social e cultural; e g) alcançar uma
efetiva limitação de armamentos convencionais que
permita dedicar a maior soma de recursos ao
desenvolvimento econômico-social dos Estados membros;
e, especialmente, instituindo vários mecanismos
essenciais de proteção aos Direitos Humanos, como a
Convenção Interamericana de Direitos Humanos,
protegida pela Comissão Interamericana de Direitos
Humanos e a Corte Interamenricana de Proteção aos
Direitos Humanos.
A
Comissão é encarregada de receber denúncias de
violações dos Direitos Humanos consagrados pela
Carta da OEA e pela Convenção e de agir da forma que
se constituir mais eficaz no sentido de se extinguir a
violação, repara os seus danos e dar encaminhamento
à punição do estado infrator, sendo essas ações
atos mais do que simbólicos da supremacia, pelo menos
pretendida, dos Direitos Humano em relação aos
Estados.
Contudo,
ainda é insipiente a ação desses órgão, já que,
como já foi dito, existe uma longa evolução a ser
trilhada por esses sistemas internacionais, incluindo
agora que a desigualdade entre o poderio dos Estados
é uma grande ameaça à liberdade, o que torna
temerosa uma abertura da soberania dos Estados,
principalmente dos mais carentes. A solução para
esse desequilíbrio é o primeiro passo para que se
consiga construir um sistema de monitoramento
internacional eficaz.
O
Brasil, particularmente, tem incorporado à sua
legislação ordinária inúmeros tratados de proteção
aos Direitos
Humanos e possui uma das Constituições mais avançadas
do mundo quanto a esse aspecto, no entanto o próprio
Supremo Tribunal Federal tem dado mostras de que não
aceita de bom grado a vigência de tratados
ratificados pelo país que regulem matéria de
Direitos Humanos, isso porque também acarretam em
responsabilidade internacional.
O
SISTEMA INTERAMERICANO DE PROTEÇÃO
AOS DIREITOS HUMANOS
1.
ORIGEM
Com
a evolução dos tempos, o homem foi se
conscientizando da necessidade de estabelecer meios
para a proteção dos Direitos Humanos, tanto em nível
internacional quanto regional.
À
medida em que atrocidades ocorriam, como as Grandes
Guerras Mundiais, tornava-se maior o interesse por
essas questões. Visto que, como disse a Prof ª. Flávia
Piovesan, “seu desenvolvimento pode ser atribuído às monstruosas
violações de Direitos Humanos da Era Hitler e à
crença que parte dessas violações poderiam ser
punidas se um efetivo sistema de proteção
internacional de Direitos Humanos existisse”.
O
ideal de solidariedade americana, concebido por Simon
Bolívar, encontrou sua primeira expressão no tratado
assinado no Congresso do Panamá, em 1826. Mas somente
no final do século XIX, a Primeira Conferência
Internacional Americana, realizada em Washington,
d.C., em 1890, pôde concretizar esse ideal, ao criar
a União Internacional das Repúblicas Americanas, que
promoveu sucessivas conferências internacionais nas
Américas, a saber: na Cidade do México, México
(1901), no Rio de Janeiro, Brasil (1906), em Buenos
Aires, Argentina (1910), em Santiago, Chile (1923), em
Havana, Cuba (1928), em Montevidéu, Uruguai (1933), e
em Lima, Peru (1938)2.
As repúblicas americanas expressaram o seu
desejo de estabelecer um sistema de proteção em nível
regional na Conferência Interamericana sobre
Problemas da Guerra e da Paz, realizada na Cidade do México
entre os dias 21 de fevereiro e 8 de março de 1945,
almejando impulsionar compromissos contínuos nesse
aspecto.
É
importante ressaltar a significação que teve o preâmbulo
do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR),
assinado no Rio de Janeiro em 1947, como precedente do
sistema regional, trazendo em um de seus parágrafos
que: “a paz se fundamenta na Justiça e na ordem
moral, portanto, no reconhecimento e na proteção
internacional dos direitos humanos e liberdade da
pessoa humana”
Contudo,
a aprovação de dois importantes instrumentos jurídicos
sobre direitos humanos só ocorreu na Nona Conferência
Internacional Americana, realizada em Bogotá entre os
dias 30 de março a 2 de maio de 1948. São eles: a
Carta da Organização dos Estados Americanos e a
Declaração Americana dos Direitos e Deveres do
Homem.
A
fim de concretizar os ideais em que se baseia e
cumprir com suas obrigações regionais de acordo com
a Carta das Nações Unidas, a OEA estabeleceu como
propósitos essenciais os seguintes: a) garantir a paz
e a segurança continentais; b) promover e consolidar
a democracia representativa, respeitado o princípio
da não-intervenção; c) prevenir as possíveis
causas de dificuldades e assegurar a solução pacífica
das controvérsias que surjam entre os seus membros;
d) organizar a ação solidária destes em caso de
agressão; e) procurar a solução dos problemas políticos,
jurídicos e econômicos que surgirem entre os Estados
membros; f) promover, por meio da ação cooperativa,
seu desenvolvimento econômico, social e cultural; e
g) alcançar uma efetiva limitação de armamentos
convencionais que permita dedicar a maior soma de
recursos ao desenvolvimento econômico-social dos
Estados membros.
A
Declaração veio para dar significado aos direitos e
garantias individuais contidos na Carta, que é
bastante enfática quanto à necessidade de se
promover e proteger tais direitos, como relata no seu
artigo 3º: “Os Estados Americanos proclamaram os
direitos fundamentais das pessoas humanas, sem fazer
distinção de raça e nacionalidade, credo ou sexo”
(...). Outra importante referência foi a de que
“cada Estado tem o direito de desenvolver sua vida
cultural, política e econômica livre e
naturalmente”, essa garantia é atingida desde que
“neste desenvolvimento livre, o Estado respeite os
direitos do indivíduo e os princípios da moral
universal”.
Observa-se
ainda que a Declaração Americana dos Direitos e
Deveres do Homem forma a base normativa da Convenção
Americana sobre os Direitos Humanos de 1969,
oferecendo uma visão integral dos direitos humanos,
semelhantemente à Declaração Universal de 1948, à
medida em que une duas gerações de direitos (Civis e
Políticos; Econômicos, Sociais e Culturais),
destacando no seu preâmbulo que: “Todos os homens
nascem livres e iguais em dignidade e direitos, e como
são dotados pela natureza de razão e consciência,
devem proceder fraternalmente uns para com os
outros”.
A Declaração
Americana dos Direitos e Deveres do Homem precede à
Declaração Universal dos Direitos Humanos. Como
afirma Lidgren, a DADDH pode não ter chegado a
influenciar diretamente a Universal, mas é certo que
a sua adoção anterior pelos países americanos
colaborou para que a Carta da ONU tivesse adesão
determinante desses países, inclusive quanto à criação
dos mecanismos de controle internacional e a proteção
dos direitos ali elencados.
No
entanto, semelhantemente às demais Declarações, a
Americana não detinha caráter vinculante, assim como
o têm os Tratados, e o próprio Comitê Jurídico
Interamericano reforçou tal ponto de vista com sua dictamen de 1949, quando expressou que a Declaração não cria
obrigações contratuais jurídicas e que carecia de
caráter de direito positivo substantivo. Então, em
1959, a OEA cria a Comissão Interamericana de
Direitos Humanos,
cujo Estatuto deveria ater-se aos termos da
Declaração, que, a partir deste momento, adquire um
caráter normativo.
2.
ÓRGÃOS DE MONITORAMENTO
A
Organização dos Estados Americanos realiza suas funções
através de vários órgãos.
A
Assembléia Geral é o órgão supremo que define
a ação e a política gerais da Organização,
é convocada anualmente numa sessão regular,
muitas vezes especial como também necessária, na
qual cada um dos Estados-membros,
em que se incluem cerca de 32 países, possui
um voto na Assembléia.
A
Reunião de Consulta dos Ministros das Relações
Exteriores,
que se reúne a pedido de algum Estado membro para
considerar problemas de caráter urgente e de
interesse comum e serve de órgão de consulta para
considerar qualquer ameaça à paz e segurança
continental, conforme exposto no Tratado
Interamericano de Assistência Recíproca, assinado no
Rio de Janeiro, em 1947.
O
Conselho Permanente
é composto por representantes permanentes de cada
Estado Membro e toma conhecimento, dentro dos limites
da Carta e dos tratados e acordos interamericanos, de
qualquer assunto de que seja encarregado pela Assembléia
Geral ou a Reunião de Consulta dos Ministros das Relações
Exteriores. O
Conselho é um órgão de decisão e cumprimento, logo
depois da Assembléia, e ambos possuem jurisdição
para lidar com questões de direitos humanos.
O
Conselho Interamericano Econômico e Social, fiel ao interesse de promover a cooperação entre os países
americanos, apesar das divergências social-econômicas
intercontinentais, tem o objetivo de conseguir o seu
desenvolvimento econômico e social acelerado;
O
Conselho Interamericano de Educação, Ciência e
Cultura
tem por finalidade promover relações amistosas e
entendimento mútuo entre os povos da América,
mediante a cooperação e o intercâmbio educacional,
científico e cultural entre os Estados membros.
A
Comissão Jurídica Interamericana serve de corpo consultivo da Organização em assuntos jurídicos e
promove o desenvolvimento progressivo e a codificação
do Direito Internacional.
A
Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que,
conforme o art.1 do Estatuto da Comissão, tem funções, entre outras, de “promover a observância e a
defesa dos direitos humanos e servir como órgão
consultivo da Organização nesta matéria”. Esta se
compõe de sete membros, que são eleitos a título
pessoal, pela Assembléia Geral da Organização, de
uma lista de candidatos propostos pelos Governos dos
Estados membros.
A
Secretaria-Geral
é o órgão central e permanente da Organização,
com sede em Washington, d.C.
As
Conferências Especializadas Interamericanas, que se ocupam de assuntos técnicos especiais e de desenvolver aspectos
específicos da cooperação interamericana.
Os
Organismos Especializados Interamericanos, que são entidades com funções específicas em matérias técnicas de
interesse comum para os Estados americanos. São
estes:
-
—
O
Instituto Interamericano da Criança;
-
—
A
Comissão Interamericana de Mulheres;
-
—
O
Instituto Indianista Interamericano;
-
—
O
Instituto Interamericano de Cooperação para a
Agricultura;
-
—
A
Organização Pan-Americana da Saúde;
-
—
O
Instituto Pan-Americano de Geografia e História.
O
SISTEMA AMERICANO DE PROTEÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS
BASEADO NA CARTA DA OEA
1.A
EVOLUÇÃO DA COMISSÃO INTERAMERICANA DOS DIREITOS
HUMANOS
A
Comissão interamericana de Direitos Humanos foi
estabelecida num mandato em 1959, na Quinta Reunião
de Consulta dos Ministros de Relações Exteriores em
Santiago, Chile.
Com
o propósito de criar um órgão responsável em velar
pela observância e promoção dos “direitos humanos
e garantias fundamentais”, essa Reunião aprovou
importantes resoluções para o desenvolvimento e
fortalecimento do Sistema, entre os quais, a Resolução
VIII, que criou a Comissão Interamericana dos
Direitos Humanos.
O
Conselho da OEA cumpriu com o mandato em 1960, quando
aprovou o estatuto da Comissão em 25 de maio e
convocou a eleição da primeira Comissão de sete
membros em 29 de junho do mesmo ano.
Sendo
de 1948, a Carta da OEA não previu o estabelecimento
da Comissão, sendo designada pelo Conselho como uma
“entidade autônoma” da OEA, “com função,
entre outras, de
promover o respeito aos direitos humanos”, 1960
Comission Statute, art.1.
Esses
direitos foram definidos no art.1 (2) do Estatuto de
1960. “Para os fins deste Estatuto, entendem-se por
direitos humanos os direitos consagrados na Declaração
Americana dos Direitos e Deveres do Homem”.
Entre
vários dispositivos, o art.9 (Estatuto de 1960)
possibilitou à Comissão poderes adicionais para a
promoção dos direitos humanos, entre os quais,
“preparar os estudos ou relatórios que considerar
convenientes para o desempenho de suas funções;
formular recomendações aos Governos dos Estados no
sentido de que adotem medidas progressivas em prol dos
direitos humanos no âmbito de sua legislação,...
bem como disposições apropriadas para promover o
respeito a esses direitos”.
À
luz de suas designações, a Comissão interpretou tal
afirmação como uma autorização para o
encaminhamento de recomendações gerais aos Estados
Individuais, e ainda o poder de preparar estudos nos
países com visitas para a investigação da situação
dos direitos humanos em uma nação particular.
No
entanto, o Estatuto de 1960 não autorizava a Comissão
de receber petições individuais, e esta achava
necessário ampliar suas faculdades para por um fim
nas violações dos direitos humanos.
Assim,
a VIII Reunião de Consulta de Ministros de Relações
Exteriores em 1962 (Punta Del Est,Uruguai), por meio
da Resolução IX, propôs ao Conselho da OEA a
criação de uma emenda no Estatuto da Comissão
Interamericana de Direitos Humanos
para a ampliação de faculdades e poderes
desta, declarando
que a “insuficiência de suas faculdades e atribuições,
consignadas em seu Estatuto,” fora o empecilho da
“missão que lhe foi confiada”, sendo necessário
“ampliar e fortalecer as suas atribuições e
faculdades num grau que lhe permita levar a efeito,
eficazmente, a promoção do respeito a esses direitos
nos países continentais”.
Com
isso, observou-se a concreta manifestação da vontade
em 1965 na II Conferência Interamericana Extraordinária
no Rio de Janeiro, com a Resolução XXII, a qual
ampliou significativamente os poderes da Comissão nos
seguintes termos:
-
Solicitar
à Comissão Interamericana de Direitos Humanos que
continue a velar pela observância dos Direitos
Humanos em cada Estado membro da Organização.
-
Solicitar
à Comissão que dispense especial atenção à
aludida tarefa no que tange à observância dos
direitos humanos mencionados nos Artigos I, II, III,
IV, XVIII, XXV, e XXVI da Declaração Americana dos
Direitos e Deveres do Homem.
-
Autorizar
à Comissão a examinar relatórios que lhe forem
apresentados e quaisquer outros dados disponíveis, a
fim de encaminhar ao Governo de qualquer um dos
Estados-membros, os pedidos de informação julgados
pertinentes pela Comissão, bem como a formular as
recomendações que se fizerem necessárias, com
vistas a promover uma observância mais efetiva aos
direitos humanos fundamentais. (...) (Resolução IX).
Desta
forma, os poderes da Comissão expandiram-se para o
estabelecimento de sistema de relatórios (Relatórios
de Sessão, Relatórios Anuais e Relatórios sobre
determinados países), recebimentos de petições
(incluindo também as petições individuais), o exame
de comunicações, visitas aos Estados e formulação
de estudos e seminários. E ainda, conforme previsto
na Resolução, a Comissão velaria pela observância
de alguns direitos proclamados pela Declaração
Americana, por incorporá-los ao seu Estatuto em 1966;
são eles: o direito à vida, liberdade e segurança
(Art.I), igualdade perante a lei (Art.II), liberdade
de religião (Art.III), liberdade de expressão (Art.XVIII),
liberdade contra prisão arbitrária (Art.XXV),
direito de processo regular (Art.XXVI). Comissionada
em promover uma larga investigação das violações
dos direitos humanos por meio dos Estudos nos Países,
esta tramitaria numa visita in
loco, com a permissão dos Estados, e investigaria
a situação nos territórios destes, ouvindo
testemunhas, analisando evidências, encontrando-se
com oficiais do governo, visitando prisões, entre
outras formas.
Com
a reforma da Carta da OEA (no artigo 51), mediante a
entrada do Protocolo de Buenos Aires em 1967, a Comissão
Interamericana dos Direitos Humanos tomou novos
contornos, transformando-se em um dos órgãos
principais da OEA, cuja função fundamental, atribuída
pela Carta reformada, entrada em vigor em 1970, é
“promover o respeito e a defesa dos direitos humanos
e servir como órgão consultivo da Organização em
tal matéria”.
O Protocolo ainda expressou o desejo de criar uma
Convenção Interamericana, a qual “deveria
determinar a estrutura, a competência e as normas de
funcionamento da referida Comissão, bem como as dos
outros órgãos encarregados de tal matéria”.
Enquanto
não entrasse em vigor a Convenção Interamericana de
Direitos Humanos proferida pela Carta, conforme o
art.150 desta, “a atual Comissão deve velar pela
observância dos direitos humanos”.
Pela
designação da Comissão como um órgão da OEA e
pela extensão de suas funções em promover a
“observância e proteção aos direitos humanos”,
a emenda à Carta conferiu-a legitimidade
institucional e constitucional. E, como implicação
necessária, reconheceu-se também o efeito normativo
da Declaração Americana, até mesmo porque a Comissão
fora encarregada de aplicar o seu Estatuto, ao menos,
até o instante em que entrasse em vigor a Convenção
Interamericana de Direitos Humanos, conforme expresso
no Protocolo emendado à Carta, art.150.
A
Convenção, à qual a emenda à Carta da OEA
refere-se, entrou em vigor em 1978, após ter obtido
um mínimo de onze ratificações. E seu novo
Estatuto, adotado em 1979, designa à Comissão
diferentes funções: sua existência como um
órgão da OEA, e, assim, seu poder é aplicado sobre
todos os membros da Organização;
como um órgão em serviço, cujo poder
restringe-se apenas aos Estados-partes que ratificaram a Convenção, e ainda, a ação sobre os
Estados Membros da OEA que não fazem parte da Convenção.
Além de ter sido criada a Corte Interamericana de
Direitos Humanos, como segundo órgão de supervisão
do Sistema Interamericano de Direitos Humanos.
Destarte,
o poder exercido pela Comissão em relação aos
Estados não partes da Convenção tem base legal na
Carta da OEA e verificamos no Novo Estatuto da Comissão,
Art. 1(2), referência à Declaração como a base
normativa.
Como
um órgão da Carta,
a Comissão desempenha várias funções, incluindo a
investigativa, bem como procedimentos não
contenciosos de busca de soluções amigáveis para
conflitos. Emite, ainda, opiniões consultivas em relação
à interpretação da Convenção ou outros Tratados
de proteção aos direitos humanos, e também sobre
adequação dos ordenamentos internos a esses
Tratados. Regularmente, ela é consultada pelo
Conselho Permanente da OEA e Assembléia Geral em
debates de direitos humanos.
Como
observamos no Art.1º do Estatuto da Comissão: “Art.1º
- 1. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos é
um órgão da Organização dos Estados Americanos
criado para promover a observância e a defesa dos
direitos humanos e para servir como órgão consultivo
da Organização nesta matéria. 2. Para fins deste
Estatuto, entende-se por direitos humanos: a) os
direitos definidos na Convenção Americana sobre
Direitos Humanos, com relação aos Estados-partes da
mesma; b) os direitos consagrados na Declaração
Americana de Direitos e Deveres do Homem, com relação
aos demais Estados membros”.
Para
manutenção dos direitos humanos, a Comissão realiza
visitas in loco
aos países para averiguar o cumprimento de tais
direitos, além de receber petições individuais
sobre o desrespeito e violações dos direitos
elencados.
1-
Investigações
e estudos nos países
O
Estudo nos Países é uma forma de investigar as condições
de direitos humanos dentro dos Estados. A Comissão
inicia seus estudos quando recebe numerosas comunicações
ou outras evidências individuais, freqüentemente
provindas de organizações não governamentais de
direitos humanos, alegando uma violação em
larga-escala de
tais direitos dentro de um país.
As
investigações nos Estados são geralmente
proporcionadas pela troca de cartas e telegramas entre
o Presidente da Comissão e os Governantes
preocupados. Como uma regra, a Comissão requisitaria
permissão para visitar um país em particular, mas
alguns Presidentes têm também suscitado a Comissão
por sua própria iniciativa.
Antes
de 1977, as regras que governavam as visitas in
loco eram negociadas em base própria, então,
depois, adotou-se um conjunto de normas, codificadas
no Regulamento da Comissão, como, por exemplo, o art.
58 do Regulamento, que requer do Estado anfitrião que
se ponha à disposição da Comissão toda facilidade
necessária para o cumprimento da missão e que
prometa não impor medidas punitivas contra indivíduos
que cooperem ou forneçam informações à Comissão.
O
direito dos membros da Comissão de viajar livremente
para o Estado anfitrião, de se encontrar
individualmente com qualquer indivíduo, de visitar
prisões, etc. está previsto no Art. 59 do
Regulamento. Esta provisão também estabelece as
obrigações dos governantes em manter a segurança da
Comissão e de seus membros, provendo à Comissão
todos os documentos ou informações que sejam
possivelmente solicitadas.
Na
preparação dos Estudos nos países envolvidos, com
ou sem investigação in
loco, a Comissão prossegue no palco.
Inicialmente, depois da coleta de relevantes informações,
ela prepara um esboço de relatórios. Estes relatórios
detalharão as condições nos países, com especial
referência aos padrões dos direitos humanos em
conjunto com a Declaração Americana dos Direitos e
Deveres do Homem ou com a Convenção Americana dos
Direitos Humanos, dependendo de o Estado fazer parte
ou não da Convenção.
Os
relatórios são submetidos aos Governos dos Estados
para seus comentários. A sua resposta é analisada
pela Comissão, que determinará se o relatório deve
ser corrigido à luz das informações trazidas à
atenção pelo Governo.
Depois
da reavaliação dos resultados, os relatórios serão
enviados para publicação caso o governo não
requeira uma nova observação (Art. 62). A Comissão
não necessitaria publicar o relatório se as
respostas do Governo fossem afirmativas e este
concordasse em se submeter às recomendações ou
demonstrasse que não estava cometendo alguma infração.
Além
de publicar o relatório, a Comissão também poderá
transmiti-lo à Assembléia Geral da OEA, visto que
debates na Assembléia podem atrair uma considerável
atenção da opinião pública, tendo um impacto
significativo no comportamento do Governo em que a
Comissão encontrou infrações de direitos humanos.
Embora
as resoluções da Assembléia Geral não sejam
legalmente impostas, são atos que emanam do alto órgão
político da OEA, conseqüentemente, carregam um peso
político e consideravelmente
moral. Os governos tendem a levar tais
considerações em conta antes de decidir como reagir
contra recomendações feitas pela Comissão em um de
seus estudos no país.
Finalmente,
como em todo esforço de proteger internacionalmente
os direitos humanos garantidos, a eficácia da prática
da observação in loco da Comissão
depende do prestígio e da credibilidade da própria
Comissão, gerados junto à opinião pública e às
forças de "pressão" em suas recomendações
e também com a ajuda das resoluções que a Assembléia
Geral da OEA presta em favor da Comissão.
2
Petições Individuais
Antes
de a Convenção Americana entrar em vigor, a Comissão
examinava e agia formalmente apenas com comunicações
privadas quando alegava–se infração de uma das
liberdades garantidas, conforme enumerados no art.9 de
seu Estatuto anterior. Esta prática mudou com a
promulgação de seu Estatuto atual. Os Regulamentos
da Comissão, que servirão como regras de
procedimento ou implemento à Convenção e ao
Estatuto, não fazem distinção entre as
“liberdades garantidas”, elencadas no antigo
Estatuto, e os outros direitos proclamados na Declaração.
Agora,
de acordo com o procedimento baseado na Art. 20 do
Estatuto, a Comissão tem o poder de receber e agir em
petições individuais contendo denúncias de infração
de qualquer dos direitos enumerados na Declaração.
As
petições com denúncias fundadas em presumidas violações
da Convenção podem ser formuladas diretamente pelos
indivíduos ou através de representantes, como também
por organizações não governamentais.
Quando
a Comissão recebe uma petição, ela solicita ao
Estado infrator, que tem, teoricamente, a obrigação
de cooperar com o processo, informações a respeito
das denúncias que ela contém .Quando for necessário,
este organismo pode solicitar ao Estado que adote
medidas provisórias, com o fim de evitar que se
inflija um dano irreparável aos indivíduos. A requisição de tais
medidas pela Comissão pode ser imposta sem nenhum
julgamento prévio no que tange à decisão final do
caso.
A
partir de então, a Comissão tem o poder de
dirigir-se à Corte, solicitando a adoção de medidas
provisórias quando o Estado envolvido tenha
ratificado a Convenção e aceito a jurisdição da
Corte.
Para
que a petição individual seja aceita pela Comissão,
esta deve cumprir certos requisitos formais e
substanciais exigidos, como por exemplo: a identificação
da pessoa, ONG, etc. que formula a denúncia e do
Estado infrator; a descrição do caso de violações
de direitos; a especificação dos direitos elencados
pela Convenção, cuja violação tenha sido alegada e
o esgotamento dos recursos da jurisdição
interna, sendo estipulado que a denúncia deve ser
apresentada até um prazo de seis meses seguintes à
notificação da decisão final dos recursos internos, e ou outras
particularidades.
Durante
a fase de investigação, a Comissão desempenha um
importante papel de mediadora entre as partes,
promovendo uma discussão entre o peticionário e o
Estado denunciado. Assim, esta solicita informações
mútuas, integrando um intercâmbio entre as partes, e
estabelecendo limites para o tempo cabível para
resposta de cada uma. Caso um Estado não mostre
interesse algum em cooperar, a Comissão aplicará o
Art. 42 de seu regulamento, que permite estabelecer
uma presunção da verdade acerca dos feitos
pertinentes em favor do denunciante.
No
entanto, o principal objetivo da Comissão é
oferecer-se como mediadora, buscando uma solução
amistosa, e tal faculdade de pôr-se à disposição
das partes é uma característica discricionária, mas
não arbitrária da Comissão, porque suas soluções
são fundadas no respeito pelos direitos humanos
reconhecidos pela Convenção.
Por
fim, quando a Comissão conclui a fidelidade da petição,
na qual verifica-se realmente uma violação dos
direitos protegidos pela Convenção ou pela Declaração
por meio de um Estado, esta aprova uma resolução
contendo uma série de recomendações ao Estado. Se,
porventura, o Estado não adotar tais recomendações,
a Comissão poderá adotar um informe final e publicar
a resolução no Informe Anual, submetido à Assembléia
Geral. Essa Assembléia é, conforme afirma André de
Carvalho Ramos, "o
órgão político final no procedimento de
responsabilização internacional do Estado diante de
descumprimentos do rol de direitos fundamentais
constantes da Declaração Americana de Direitos e
Deveres da Pessoa Humana e da Carta da OEA".
A
Comissão poderá encaminhar o caso à Corte, caso
aqueles Estados ratificados na Convenção tenham
aceito a competência contenciosa da Corte.
Citamos, em relação ao Brasil, os casos 1983
e 1984,
que reuniram várias entidades peticionantes contra o
Estado brasileiro, acusado de repetidas violações de
direitos humanos durante os “anos de Chumbo” da
Ditadura Militar (1969-1970), quando o Brasil ainda não
havia ratificado a Convenção Americana de Direitos
Humanos, devendo obediência, entretanto, aos
dispositivos da Carta da OEA e da Declaração
Americana.
A Comissão
iniciou o exame do caso, que após três anos de
apreciação teve como resultado a consideração pela
Corte Interamericana que houve veemente presunção de graves violações de direitos humanos,
recomendando, portanto, medidas de determinação dos
fatos, recusadas pelo Governo brasileiro de então.
O
SISTEMA BASEADO NA CONVENÇÃO INTERAMERICANA DE
DIREITOS HUMANOS
1.
A CONVENÇÃO AMERICANA
O
sistema regional americano, como já foi citado,
principiou seus anseios na Conferência Interamericana
sobre Problemas de Guerra e da Paz (1945). Diante do
visto, várias Conferências foram realizadas para a
exposição da matéria e, em Bogotá (1948), os dois
maiores instrumentos jurídicos foram aprovados: A
Carta da OEA e a Declaração Americana dos Direitos e
Deveres do Homem.
No
entanto, com caracteres de declaração , a DADDH “não
criou obrigações contratuais jurídicas e
carecia de caráter de direito positivo
substantivo” . Assim, devido à ausência
de um órgão encarregado da promoção e proteção
dos direitos humanos, a Conferência Especializada em
Direitos Humanos, realizada em San José da Costa Rica
(1969), aprovou a Convenção Americana sobre Direitos
Humanos, que estabelece dois órgãos para assegurar o
cumprimento efetivo de suas diretrizes: A Comissão
Interamericana de Direitos Humanos e a Corte
Interamericana de Direitos Humanos.
A
Comissão Interamericana de Direitos Humanos possui
duplo tratamento normativo. O órgão é o mesmo,
variando apenas suas atribuições. Combinando esses
poderes concebidos pela Convenção Americana e pela
Carta da OEA, como já foi mencionado anteriormente, a
Comissão pode iniciar estudos geográficos, elaborar
relatórios apontando violações aos direitos humanos
e conseqüente violação da obrigação internacional
de respeitá-los, responsabilizando os Estados partes
da OEA, podendo encaminhar denúncias à Assembléia
Geral e até à Corte Interamericana. Tem ainda
poderes para investigar todas as comunicações sobre
violações, conforme garantem os arts. 44 e 45 da
Convenção, pode processar petições individuais e
interestatais contendo alegações de violação dos
direitos humanos. No seu caso, o
procedimento individual é considerado de adesão
obrigatória e o interestatal é facultativo.
Valendo
ressaltar que, no período de ausência da Comissão
Americana, foi firmada em Buenos Aires, em 1967, um
Protocolo de reforma da Carta da OEA, estabelecendo
novas competências à Comissão Interamericana dos
Direitos Humanos, incumbindo-a da observância de tais
direitos.
Além
disso, foi o Estatuto da Comissão integrado à Corte
Interamericana, assumindo ela, assim, a personalidade
de órgão institucional da OEA com base convencional.
Dando margem, desta forma, à posterior elaboração
da Convenção Americana no que determina o art.112 da
Carta Reformada.
O
Pacto de San José da Costa Rica, como é mais
conhecida a Convenção Americana dos Direitos
Humanos, introduz em seu conteúdo as disposições da
Declaração e o catálogo dos direitos civis e políticos
assegurados no Pacto de Direitos Civis e Políticos
(1966).
O
texto estabelece obrigações positivas e negativas
por parte dos Estados-membros, onde o Governo abstém-se
de algumas atitudes, respeitando os direitos e
liberdades reconhecidos do indivíduo e deve oferecer
subsídios necessários ao melhor desenvolvimento físico
e psíquico humano. O seu conteúdo enuncia
o direito à personalidade jurídica, direito à vida,
o direito de não ser submetido à escravidão, o
direito à liberdade, entre outros, e, de cunho
inovador, o “ direito à propriedade, associando
esse direito à uma vida mais humana e digna do indivíduo
e sua família", impondo que o uso e gozo dos
bens se faça em razão de interesse social, como também,
a matéria referente à pena de morte, não admitindo
o seu uso em caráter absoluto.
A
tendência, como afirma André de Carvalho Ramos, é o
esvaziamento do sistema da OEA e seu desaparecimento,
pois cada vez mais Estados ratificam a Convenção
Americana de Direitos Humanos e aceitam a jurisdição
obrigatória da Corte Interamericana. Mas, até lá, o
sistema da OEA permanecerá exigindo o cumprimento do
respeito aos direitos humanos por parte dos Estados.
Ressaltamos,
como curiosidade, que o primeiro presidente brasileiro
da Comissão Interamericana de Direitos Humanos foi o
jurista Dunshee de Abranches, no biênio 1968-1970; a
professora Gilda Russomano foi presidente da Comissão
em 1989-1990 e, coincidentemente, ela é presidida
atualmente por outro brasileiro, Hélio Bicudo.
2.
A CORTE INTERAMERICANA DE JUSTIÇA
A
Corte Interamericana é o órgão jurisdicional do
sistema regional, é uma instituição autônoma, não
sendo órgão da OEA, mas sim da Convenção Americana
de Direitos Humanos. É constituída por sete Juizes,
“experts” na matéria de direitos humanos, eleitos
com base na titulação pessoal pelos Estados-partes
da Convenção.
O
órgão tem o propósito de aplicar e interpretar os
parâmetros da Convenção, e , sendo possuidor de
Estatuto próprio, celebrado em La Paz, em 1979, a
partir de então, exercerá duas funções designadas:
a consultiva, estendendo-se essa a todos os Estados da
OEA, e a contenciosa, abrangendo apenas aqueles
Estados-Partes da Convenção que reconheceram a sua
Jurisdição, já que ela é apresentada
com caráter facultativo.
Na
primeira das funções, a consultiva, como é previsto
no artigo 64, qualquer Estado da OEA, independente de
fazer parte ou não da Convenção, pode solicitar à
Corte a interpretação da Convenção ou de outros
Tratados concernentes à proteção dos direitos
humanos nos Estados Americanos, podendo também ela
emitir opiniões sobre a “coexistência harmônica”
da legislação interna dos países e sobre a Convenção.
No
plano contencioso, como já foi dito, a competência
da Corte vai depender da ratificação dos
Estados-partes na Convenção. De acordo com essa
prerrogativa, a Corte examinará os casos que
exercerem a trâmite pela Comissão ou aqueles que
sejam apresentados por um Estado-parte, desde que
tenham sido esgotados os procedimentos previstos nos
seus artigos 48 a 50, isto é, tudo o que diz respeito
à tramitação das petições e comunicações
perante a Comissão. Além disso, para que possa ser
submetido à Corte um caso baseado em denúncia
interposta contra um Estado-parte, este deve
reconhecer expressamente a competência da Corte. Essa
declaração de reconhecimento pode ser
incondicionalmente aplicável a todos os casos ou, então,
em condições de reciprocidade, por determinado tempo
ou para um caso específico.
Possuindo
essa jurisdição, a Corte, detentora de força jurídica
vinculante e obrigatória, poderá dispor que seja
garantido à vítima o gozo do direito violado, bem
como o pagamento de uma indenização justa.
Adicionando ainda à sua competência, a Corte atende
às solicitações da Comissão Interamericana de
Direitos Humanos, que dizem respeito à disposição
de medidas provisórias judicialmente aplicáveis.
Essas medidas estão respaldadas no Art. 63(2)
da Convenção, visto que elas são executadas “em
casos de extrema gravidade e urgência e quando for
necessário evitar danos irreparáveis às pessoas”.
Podendo essas medidas preliminares ser executadas em
assuntos “conhecidos” da Corte, ou ainda, aqueles
que ainda não a alcançaram, estando ainda no âmbito
da Convenção. Em relação à sua durabilidade, esta
de fato tem um caráter provisório, mas persistirá
enquanto os elementos contidos no Art. 63(2) da Convenção
Americana se fizerem presentes.
O
PROCESSAMENTO DO ESTADO PERANTE A CORTE INTERAMERICANA
DE DIREITOS HUMANOS
1.
A fase da propositura da ação e as exceções
preliminares
Após o
primeiro informe do Estado (também denominado de
Relatório), a Comissão, não o acatando, vai poder
acioná-lo perante a Corte, caso esse tenha
reconhecido a sua jurisdição. Outros Estados
“contratantes” também podem acionar um outro
Estado, já que a garantia dos direitos humanos é
interesse de todos os membros da Convenção.
Todos os
documentos relativos ao caso, entre eles a demanda e
sua contestação, poderão ser dirigidas à Corte
pessoalmente ou por qualquer outro meio mais
utilizado, fax, telex, correio, etc.
A
Secretaria da Corte vai receber a propositura das ações,
obtida mediante a interposição da petição inicial
da demanda. A petição inicial indicará as partes no
caso, as testemunhas e todos os ítens básicos, a
saber, como as provas e os fatos. Sendo o autor a
Comissão, essa petição será acompanhada pelo relatório
a que se refere o art. 50 da Convenção.
Após a
propositura, o Presidente da Corte vai examinar
preliminarmente a demanda para verificar quais os
requisitos fundamentais não cumpridos e solicitar ao
demandante que, num prazo de 20 dias, supra essas
lacunas. Em seguida, ordena a citação do Estado Réu,
como também a intimação da Comissão (se essa não
for a demandante).
O Réu
pode, num prazo de dois meses seguintes à citação
da demanda, argüir exceções preliminares. Essa petição
das exceções preliminares será apresentada à
Secretaria e conterá a exposição dos fatos, bem
como as conclusões e os documentos de apoio.
Contando
trinta dias a partir do recebimento da intimação da
interposição das exceções, as partes do caso
interessadas poderão expor por escrito sobre as exceções
preliminares. Poderá a Corte convocar uma audiência
especial para essas exceções. Ao fim desse contraditório,
a Corte decidirá sobre as exceções preliminares,
podendo arquivar o caso ou ordenar o seu
prosseguimento. Ocorrendo o último, a parte
demandante poderá requerer à Corte a desistência do
processo. Entretanto, a Corte ainda ouvirá as opiniões
das demais partes no caso, como os representantes da vítima,
para poder visualizar se arquiva ou não o caso.
Por outro
lado, havendo por parte do Estado demandado o
acatamento às pretensões da parte demandante, a
Corte, ouvindo a opinião desta e dos familiares da última,
resolverá sobre a procedência do caso e de seus
efeitos jurídicos, fixando reparações e indenizações.
2.
A Conciliação
Haverá
também a solução conciliatória, onde poderá ser
executado um acordo entre as partes, submetido à
homologação da Corte, desempenhando essa, agora, um
papel de fiscal do respeito aos direitos protegidos na
Convenção.
No
entanto, a Corte poderá, levando em conta as características
de tal acordo, decidir pela sua não homologação.
Prosseguindo, assim, o exame do caso, demonstrando que
os “interesses” foram indisponibilizados.
3.
Fase Probatória
O
demandado, nos quatro meses seguintes à notificação
da demanda, poderá apresentar por escrito sua
contestação. O Presidente então fixará a data de
abertura do procedimento oral e indicará as audiências.
As
provas do caso serão aquelas descritas na petição
inicial e na sua contestação, salvo que alguma
dessas tenha sofrido “impedimento anterior de força
maior”, porém vai ser assegurado à parte contrária
o direito de ampla defesa. Entretanto, a Corte poderá,
em qualquer fase da causa, produzir prova, ex
offício, que considere útil, desde que se mostre
o apego à verdade material.
Finalmente,
é assegurado, pelo art. 50 do seu regulamento, que os
Estados não poderão processar as testemunhas e os
peritos, nem pressionar os demais envolvidos no caso,
seja, direta ou indiretamente.
4.
Fase decisória
Após
a fase probatória, a Corte delibera a sentença
internacional, que vai ser similar à sentença
interna.
Havendo por parte da Corte o dever de expressar o
resultado da votação e indicar o idioma do texto de
que faz fé.
Além
disso, o juiz que participou de tal exame tem o
direito de expor publicamente o seu voto. Esse último
deve ser formulado dentro do prazo fixado pelo
Presidente, para que seja do conhecimento dos demais
juizes, o que antecede a finalização da sentença.
5.
Fase das reparações
Essa é
uma fase não obrigatória, terá ocorrência apenas
quando a sentença não houver decidido
especificamente sobre as reparações. Ou seja, a
Corte fixa a reparação na própria sentença que o
Estado violou determinado direito protegido.
Em outros
casos, a Corte abre uma oportunidade à conciliação,
no que se refere à reparação a ser fixada. Ouvindo
a vítima ou seus representantes, a Corte inicia uma
nova etapa onde o autor e a vítima (ou seus
familiares) vão apresentar provas e pleitos de reparação.
Na maioria das vezes, as partes se encaminham para um
acordo, onde a Corte irá homologar ou não, tal decisão.
A jurisprudência da Corte demonstra grande
variedade de reparações, assegurando o gozo do
direito ou liberdade violados e ainda a reparação
das conseqüências do ato infrator, além do
pagamento de indenização pecuniária justa à parte
lesada.
6.
Fase de execução da Sentença da Corte
No sistema
judicial interamericano há o dever do Estado de
cumprir integralmente a sentença da Corte (art.
68.1). Assim, o Estado deve exercer uma política
abstencionista ou positiva para que a vítima faça
valer os seus direitos dantes violados.
Valendo
ressaltar que a Corte aplica o Direito Internacional,
mas não determina qual o órgão nacional que foi
falho. Como também, há uma relativa liberdade dos
Estados em definir os meios internos de execução da
sentença compensatória, afirmada pelo art. 68.2 da
Convenção.
Caso não haja o cumprimento por pare do Estado
das sentenças da Corte, esse será inserido no Relatório
Anual da Assembléia Geral da OEA. Entretanto, esse
mecanismo político de coerção dos Estados para o
cumprimento de tais sentenças, tem se mostrado
insuficiente, apesar de gerar repercussão ante a
opinião pública do Continente.
Apesar disso, há um notável implemento por
parte de alguns Estados das suas normas internas, a
partir de pronunciamentos da Corte ou mesmo da Comissão.
O
PROTOCOLO DA SAN SALVADOR
A
Convenção Americana de 1969 deixou uma lacuna a ser
preenchida até 1988, pois consistia apenas, em relação
aos Direitos Econômicos Sociais e Culturais, um
dispositivo de “desenvolvimento progressivo” (Vide
Art.45), que seria regido pelas normas de matéria
relativa contidas na Carta da OEA. Ao contrário da
Declaração Americana de 1948, que instituiu em seu
texto normativo os direitos civis e políticos, como
também, os direitos econômicos, sociais e culturais.
(Vide Art. 13-15 e 22)
Assim,
essa “relativa omissão” vai sendo detectada em
alguns Relatórios da Comissão Interamericana de
Direitos Humanos, que indica a situação de tais
direitos em diversos países, como em 1979 no Haiti.
Do mesmo modo, o Relatório Anual da Comissão, de
1985, aludiu à idéia de um futuro Protocolo à
Convenção Americana em Matéria de Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais, não deixando também de
ressaltar o caráter indivisível dos direitos
humanos.
Associado
ao cenário de completa crise econômica e absoluta
recessão da década de 80, também denominada de “a
década perdida”, o Art. 77 da Convenção Americana
(que prevê a adoção de vindouros Protocolos
Adicionais, tendo como finalidade incluir nesse regime
outros direitos e liberdades), incita os Estados
Membros e a própria Comissão de Direitos Humanos a
apresentarem projetos de protocolos adicionais à
Convenção, como também foi suscitada à Organização
Pan-americana de Saúde (OPAS) que se pronunciassem
sobre o assunto.
Então,
em 17 de novembro de 1988, na décima oitava sessão
da Assembléia Geral da OEA realizada em San Salvador,
os Estados Membros da OEA subscreveram o Protocolo
Adicional à Convenção Americana de direitos Humanos
em matéria de Direitos Econômicos Sociais e
Culturais.
Os
Estados-partes da Convenção vêm a reafirmar, no preâmbulo
do Protocolo de San Salvador,
o intuito de instalar no continente Americano o regime
de liberdade pessoal e justiça social, inseridas no
cenário de instituições democráticas e baseadas
nos direitos essenciais do homem.
Concernente
a esse preâmbulo está o caráter de indivisibilidade
e integridade dos direitos humanos, que dita aos
Estados partes a obrigação de instituírem condições
para que os indivíduos possam gozar se seus Direitos
Econômicos, Sociais e Culturais, com o preceito de
que o ideal de liberdade do ser humano só se é
atingido com a isenção do terror e da miséria .
INSTRUMENTOS
INTERAMERICANOS MAIS RECENTES RELATIVOS AOS DIREITOS
HUMANOS
No
âmbito da própria Assembléia Geral, que aprovou, em
09/12/1985, o Protocolo de Cartagena das Índias,
mediante o qual foi emendada a Carta da OEA, os
Estados membros abriram à assinatura a “Convenção
Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura”.
Este
instrumento define detalhadamente a tortura, indicando
quais seriam os responsáveis por esse delito. Os
Estados-partes não só se comprometem a punir
severamente os perpetradores da tortura como também a
adotar medidas para prevenir e sancionar qualquer
outro tipo de tratamento cruel, desumano ou degradante
em suas jurisdições.
Assim,
uma pessoa acusada de tortura não pode evitar seu
castigo, nos termos da Convenção, ao fugir para o
território de outro Estado Parte.
A
Convenção entrou em vigor em 28 de fevereiro de
1987, decorridos os trinta dias do depósito do
segundo instrumento de ratificação. Instrumento
este, só ratificado pelo Brasil em 20/07/1989.
O
Protocolo à Convenção Americana sobre Direitos
Humanos, referente à Abolição da Pena de Morte, foi
aprovado durante o Vigésimo Período Ordinário de
Sessões da Assembléia Geral da OEA (Assunção,
Paraguai, 1990). Em 1969, época em que estava sendo
redigida a Convenção Americana sobre Direitos
Humanos, um esforço concertado no sentido de incluir
uma provisão de proibição absoluta da pena capital
não alcançou êxito. Este instrumento aboliria a
pena de morte em todo o Hemisfério, mediante a
ratificação do Protocolo pelos Estados-partes, entre
eles, o Brasil, que ratificou em 1996.
Temos ainda Convenção
Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência
contra a Mulher, adotada em 1994 em Belém do Pará
(Brasil) e ratificada pelo Brasil em 1995, e a Convenção
Interamericana sobre Desaparecimento Forçado de
Pessoas, adotada em 1994 e em vias de ratificação
pelo Brasil.
Desde então, o Sistema Interamericano vem crescendo
com a incorporação de novos Estados-membros, hoje em
número de 35, a saber: Antígua e Barbuda, Argentina,
Bahamas, Barbados, Belize, Bolívia,
Casos Práticos encaminhados
à Corte Interamericana de Justiça
1º Caso: Fairén
Garbi e Solís Corrales
“Caso
Fairén Garbi e Solís Corrales“ representação
contra Honduras, protocolada na Secretaria da Comissão
Interamericana de Direitos Humanos em 14 de Janeiro de
1982. O caso foi analisado pela Comissão, que julgou
o Estado de Honduras responsável pelo desaparecimento
desses dois costarriquenhos, desrespeitando, assim, os
direitos fundamentais da pessoa humana, os quais foram
previstos na Convenção Americana de Direitos Humanos
como: Direito à vida (art. 4º), Direito à
integridade pessoal (art. 5º) e direito à liberdade
pessoal (art. 7º). Por isso, a Comissão ingressou
com uma ação contra Honduras perante a Corte
Interamericana de Direitos Humanos no dia 24 de abril
de 1985.
O caso
passou pela fase de admissibilidade e suas exceções
preliminares com dificuldade. Indo para a fase de
julgamento, a Corte sentenciou a referida ação no
dia 15 de março de 1989, julgando improcedente a ação
da Comissão devido à “inexistência de prova
suficiente para vincular o desaparecimento de Garbi e
Corrales à mencionada prática governamental”,
negando a responsabilidade internacional do Estado réu
sobre os casos apontados.
Esse foi o primeiro caso contencioso opondo a
Comissão a um Estado. Possibilitando diminuir as dúvidas
relativas à independência efetiva da Comissão
frente ao Estados e a sua pouca eficiência.
Fato também importante foi a menção ao caráter
pro homini
da Convenção Americana de Diretos Humanos feito pela
Corte, que implica reconhecimento da dificuldade da
Comissão em trazer ao juízo provas irrefutáveis de
lesão a direitos humanos, justamente quando os
responsáveis agem clandestinamente e contam ainda com
o beneplácito dos agentes oficiais do Estado.
2º
caso: Velásquez
Rodriguez
Iniciou-se
com a representação contra Honduras protocolada na
Secretaria de Comissão Interamericana de Direitos
Humanos em 7 / 10 / 1981.
A comissão, após analisar detalhadamente o
caso, de acordo com os fatos narrados, que demonstram
que o estudante da Universidade Nacional Autónoma de
Honduras, Angel Manfredo Velásquez Rodriguez, foi
detido sem ordem judicial de captura e levado com
outros detidos, conforme afirmam inúmeras
testemunhas, para as celas da II Estação da Força
de Segurança Pública, em Tegucigalpa, Honduras, por
elementos da Direção Nacional de Investigação (DNI)
e do G–2 das Forças Armadas de Honduras em 12 de
setembro de 1981. Sendo, então, submetido a
interrogatórios sob cruéis atos de torturas, pois
estava sendo acusado de supostos crimes políticos.
Foi levado a novos Batalhões, onde continuou a
sofrer tratamento desumano, fatos que foram
negados pelos policiais.
A comissão,
após vários levantamentos, pediu explicações ao
Estado Hondurenho, que não respeitou a comunicação,
omitindo-se. Portanto, este órgão de proteção
decidiu aplicar o art. 3º do seu Regulamento, que
julga verdadeiros os fatos denunciados desde que a
parte não os conteste. Aprovando a Resolução
de 30/83, considerando o Estado Hondurenho
negligente e violador do direito à vida e à
liberdade de pessoas (arts. 4º e 7º da Convenção).
Depois
disso, o Estado solicitou a reconsideração da resolução,
argumentando que não tinham sido esgotados os
recursos internos como também a incerteza do
paradeiro de Velásquez pela DNI, chegando esta a
afirmar que ele se encontrava junto a guerrilheiros em
El Salvador.
Devido a essas explicações a Comissão
reconsiderou a sua resolução por algum tempo, para
analisar as afirmações de Honduras.
A Comissão,
em sua resolução 22/86, considerou que as novas
informações prestadas não serviam para afirmar a
reconsideração de 30/83. Ao contrário, os elementos
trazidos dão conta de que o paradeiro de Velásquez
Rodriguez continuava incerto, atestando que o Estado não
demonstrava a inveracidade dos fatos denunciados.
Honduras
havia reconhecido a jurisdição obrigatória da Corte
em 1981, logo, a “Corte era o palco privilegiado
para a solução da controvérsia entre Comissão
Interamericana de Direitos Humanos e Honduras”.
A Comissão
submeteu o caso à Corte, alegando violação dos
seguintes direitos fundamentais da pessoa humana
previstos na Convenção Americana: direito à vida
(art.4º), direito à integridade pessoal (art.5º),
direito à liberdade pessoal (art.7º), direito à
honra e dignidade (art.11), proteção à família
(art.17), direito à propriedade privada (art.21) e
direito à proteção judicial (arts. 25.1, 25.2ª e
25.2.c), requerendo, portanto, a condenação do
Estado hondurenho e a reparação às lesões sofridas
por Velásquez.
A Corte deve, inicialmente, analisar os
pressupostos de admissibilidade da demanda por ser
“o único órgão judicial competente para apreciar
matérias relativas à Convenção Americana de
Direitos Humanos”. Esse posicionamento da Corte
reforça a separação das funções entre a Comissão
e a própria Corte no Sistema Interamericano de Proteção
Internacional de Direitos Humanos. Mas, acertadamente,
a Corte julgou não ter poderes para interferir na
formação da convicção jurídica da Comissão.
Por unanimidade, a Corte repeliu as exceções
preliminares argüidas pelo Estado de Honduras,
continuando com o conhecimento do caso.
Inicia-se,
então, a fase probatória. Prosseguia o julgamento
com as duas partes mostrando suas provas. Era um período
conturbado, chegando ao ponto até de a Comissão
requerer à Corte, tendo em vista as ameaças
contra duas testemunhas, adotar medidas cautelares
previstas no art.63.2 da Convenção, para protegê-las
contra eventuais ameaças.
Várias
testemunhas tiveram mortes suspeitas, que fez com que
a Corte editasse medidas cautelares, solicitando ao
Estado hondurenho a adoção
das medidas para prevenir novos atentados contra os
direitos fundamentais de quem tenha comparecido ou
tenha sido intimado para comparecer perante a Corte.
Ressalta-se,
ainda, que o Estado réu insinuou que testemunhar em
processos contra o Estado poderia constituir em
deslealdade contra o seu país. Argumento este
vergonhoso e sem fundamento, conforme pronunciou de
forma veemente a Corte, pois os direitos humanos
representam valores superiores, resultantes do fato de
sermos primordialmente pessoas
humanas e só depois, pertencentes a um país.
O
Estado mencionou diversos remédios judiciais
empregados, justificando não se haverem esgotado os
recursos internos. Fato este contestado pela Comissão,
que provou a ineficácia desses instrumentos na situação
interna do país durante aquela época, como por
exemplo, os três recursos de habeas
corpus, interpostos em favor de Velásquez que não
produziram efeito.
Assim,
a Corte rechaçou a exceção de não esgotamento dos
recursos internos proposta por Honduras.
Depois
de muita discussão, a Corte determinou que foi
provado que durante os anos de 1981 e 1984, na República
de Honduras, entre cem e cento e cinqüenta pessoas
desapareceram. Considerando, então, que ficou provado
que o seqüestro de Velásquez foi realizado a cabo
por pessoas vinculadas às Forças Armadas ou sob sua
direção. Continuando ele desaparecido, chega-se à
conclusão que se encontra morto.
A
Corte estabeleceu como sanção o pagamento de uma
indenização compensatória aos familiares da vítima,
ocorrendo que esta quantia foi estabelecida
pela própria Corte, pois as partes não chegaram a um
acordo no prazo estabelecido de seis meses contados a
partir da data da sentença.
Atendendo
algumas solicitações de familiares da vítima, a
Corte estabeleceu que: a. Honduras deveria
energicamente atuar contra violações de direitos
humanos, conferindo especial atenção à investigação
do caso Manfredo Velásquez; b. Honduras deveria
indenizar o cônjuge e os filhos da vítima, pagando a
mais elevada pensão vitalícia existente no país
para a viúva; subsidiando a educação, até o grau
universitário, dos três filhos de Velásquez;
outorgando a propriedade de uma habitação digna,
equivalente àquelas habitadas pela classe média; c.
Honduras deveria pagar uma indenização pelos danos
materiais e morais sofridos pelos familiares da vítima
(conforme valores fixados e que seja adotada legislação
especial que permita a concessão de indenização sem
trâmites judiciais convencionais); como indenização,
ética o Estado réu deveria emitir declaração pública
de repúdio à prática de desaparição a logradouros
públicos do nome delas, sem contar com a investigação
dos casos e punição dos responsáveis pelos
desaparecidos.
Esse
caso teve uma grande importância, pois foi o primeiro
caso em que um Estado americano é condenado por um órgão
judicial internacional, após ser devidamente processado segundo o Direito
Internacional dos Direitos Humanos.
A
questão da investigação e punição enquanto reparação
específica de violação de direitos humanos aponta
para a necessidade de prevenção de futuros abusos.
Segue-se o preceito de que uma sociedade que esquece suas violações presentes e passadas de
direitos humanos está fadada a repeti-las.
O
SISTEMA DE PROTEÇÃO INTERAMERICANO E O BRASIL
Ao
ratificar a Convenção Americana sobre Direitos
Humanos e, mais recentemente, o reconhecimento e a
aceitação da Corte Interamericana de Direitos
Humanos, o governo brasileiro dá cumprimento ao princípio
de prevalência dos direitos humanos estabelecidos
pelo art. 4º n. II da Constituição Federal, fazendo
integrar, na ordem jurídica nacional, essa Convenção,
como previsto no § 2 º do art. 5º da mesma
Constituição.
Como
disse Antônio Cançado Trindade, fazendo menção à
demora do Brasil de aceitar a competência
jurisdicional da Corte: “à luz das posições do
Brasil avançadas naquelas ocasiões, seria difícil
compreender e explicar um não reconhecimento pelo
Brasil da competência obrigatória da corte
interamericana de Direitos Humanos".
Esses
dispositivos constitucionais permitem que a violação
de Direitos Humanos no Brasil seja levada ao
conhecimento e decisão da Comissão Interamericana e
da própria Corte Interamericana, para a obtenção da
reparação necessária, ou para evitar a violação
pretendida.
É
certo que há resistências à aplicação de decisões
da Comissão e da Corte pelas autoridades judiciais e
do executivo, não acostumadas a dar maior importância
a resoluções e a atos internacionais, mesmo que
ratificados pelo Governo brasileiro.
O
próprio Supremo Tribunal Federal tem dado mostras de
que não aceita de bom grado a vigência de tratados
ratificados pelo país, que regulem matéria de
direitos humanos, como é o caso da prisão do depositário
infiel. Ela é proibida pela Convenção
Interamericana de Direitos Humanos e pelo Pacto
Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, mas
é aceita segundo a nossa Constituição. E, como os
tratados e acordos internacionais vigoram no Brasil
como leis ordinárias, são infraconstitucionais, ou
seja, devem respeitar a Constituição.
Além do mais, o Poder Judiciário ao
interpretar a nossa lei fundamental, afirma, por meio
da posição consolidada do Supremo Tribunal Federal,
que é necessária
a incorporação interna das normas convencionais
internacionais através de ato do Poder Legislativo e
ato subseqüente do Poder Executivo.
Contrário
do que realmente ocorre, os agentes políticos de
todos os Poderes da República (membros do Poder
Executivo, Legislativo, Judiciário e Ministério Público)
devem sempre levar em consideração a interpretação
da Corte (quer no âmbito de sua competência
consultiva ou contenciosa) no momento do cumprimento
de suas missões constitucionais. Isso porque qualquer
ato estatal (mesmo legislativo ou judicial) enseja o
nascimento da responsabilidade internacional do
Estado, pois ele pode ser responsabilizado pela violação
de direitos humanos por não cumprir com os
dispositivos da Convenção Americana, cujo conteúdo
é determinado, em última análise, pela interpretação
judicial proferida pela Corte.
Por
outro lado, todos sob a jurisdição do Estado
brasileiro devem ter consciência desse reconhecimento
efetuado pelo Brasil para, se necessário for,
interpor petições individuais perante a Comissão
Interamericana de Direitos Humanos relatando casos de
violação de direitos humanos para posterior
ajuizamento, pela Comissão, de ação contra o Brasil
perante a Corte.
CONCLUSÕES
Ao
lado do sistema normativo global, surge o sistema
normativo regional de proteção, que busca
internacionalizar os direitos humanos no plano
regional. sendo os sistemas global e regionais não
dicotômicos, mas complementares.
Considerando
o sistema regional interamericano, é a Convenção
Americana de Direitos Humanos o seu instrumento de
maior importância. Ela assegura um catálogo de
direitos civis e políticos
e determina aos Estados que alcancem
progressivamente a plena realização
dos direitos sociais, culturais e econômicos
através de medidas legislativas e outras formas
apropriadas (essa é a única referência feita aos
direitos sociais, culturais e econômicos).
O aparato de
monitoramento estabelecido pela Convenção Americana
é integrado pela Comissão Interamericana de Direitos
Humanos e pela Corte Intramericana de Direitos
Humanos.
A Comissão
tem como função proteger os direitos humanos na América,
sendo encarregada de fazer recomendações aos
Estados-partes, estudos a cerca das condições dos
direitos humanos em determinado país, receber denúncias
de violação por parte dos Estados, tanto de indivíduos,
ONGs ou outros Estados (para isso, o Estado que
denuncia deve ter prévia autorização para isso por
parte do Estado denunciado), enviar relatórios anuais
à Assembléia Geral da OEA, etc.
A Corte é o
órgão jurisdicional do sistema regional americano,
que apresenta competência consultiva e contenciosa.
Consultiva para todos os Estados membros da OEA e
contenciosa apenas para aqueles que reconhecem a sua
jurisdição, tendo, dessa forma, autoridade para
avaliar e julgar casos de violação dos direitos
humanos por parte dos Estados, promovendo acordos,
aconselhamento, pagamentos de indenizações quando
julga pela culpa e sanções (porém não é
coercitiva).
Esses órgão
vêm se desenvolvendo à medida em que surge a
necessidade de uma responsabilização internacional
dos abusos dos direitos humanos para que se promova a
sua redução , já que cresce a consciência de que
esse não é um problema particular de cada Estado,
mas um problema mundial, já que a globalização
impeliu os países a um intercâmbio cada vez mais
forte.
Foram
considerados aqui dois casos de atuação dos órgãos
interamericanos:
Garbi-Corrales e Veláquez Rodrigues. O número
de casos que chegam á Comissão ainda é ínfimo e o
que chega à Corte é menor ainda. Isso porque ainda
existem muitos empecilhos nas legislações internas
dos estados e a sua relutância em ter a intervenção
internacional em seus assuntos privados.
Finalmente,
ressaltamos que o Brasil apresenta diversas limitações
à atuação do sistema interamericano, sendo também
a contragosto dos diversos órgãos nacionais a
intervenção internacional em assuntos de jurisdição
interna.
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