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Comentário Geral n. 9

Adotado na 19a sessão (51a reunião), em 01 de dezembro de 1998.

Tradução: Geovanna Patrícia de Queiroz Rêgo

Aplicação doméstica do Pacto

A) O dever em tornar eficaz o Pacto na ordem jurídica doméstica

1. Em seu Comentário Geral n. 3 (1990), sobre  a natureza das obrigações dos Estados-partes (art. 2, parágrafo 1 do Pacto), o Comitê enfrentou questões relacionadas à natureza e abrangência das obrigações dos Estados-partes. Este Comentário Geral busca elaborar certos elementos adicionais das afirmações antecedentes. A obrigação central em relação ao Pacto é que os Estados-partes tornem efetivos os direitos ali reconhecidos. Exigindo que os Governos façam “por todos os meios apropriados”, o Pacto adota uma ampla e flexível abordagem que possibilita as particularidades dos sistemas jurídicos e administrativos de cada Estado, assim como outras considerações relevantes, sejam levadas em conta.

2. Mas esta flexibilidade coexiste com a obrigação de cada Estado-parte em usar todos os meios a sua disposição para tornar eficaz os direitos reconhecidos no Pacto. Sobre isso, as exigências fundamentais do Direito Internacional dos Direitos Humanos devem ser tidas em mente. Assim, as normas do Pacto devem ser reconhecidas de modos apropriados dentro da ordem jurídica doméstica, meios apropriados de indenização, ou remédios jurídicos devem ser disponíveis a quaisquer indivíduos ou grupos prejudicados, e maneiras apropriadas de assegurar a responsabilidade governamental  devem ser colocadas.

3. Questões referentes à aplicação doméstica do Pacto devem ser consideradas à luz de dois princípios do Direito Internacional. O primeiro, como foi refletido no artigo 27 da Convenção de Viena sobre  a Lei dos Tratados, enuncia que “[uma] parte não pode invocar as disposições de seu Direito interno como justificativas para suas faltas em implementar um tratado”. Em outras palavras, os Estados deveriam modificar a ordem jurídica doméstica, se necessário, a fim de cumprir suas obrigações nos tratados. O segundo princípio é refletido no artigo 8o da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de acordo com o qual “Todos têm o direito a um remédio efetivo pelos órgãos julgadores nacionais competentes para ações que violem os direitos fundamentais que lhes são garantidos pela Constituição ou pela lei”. O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais não contém nenhuma contrapartida direta ao artigo 2, parágrafo 3 (b), do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, que obriga os Estados- partes, inter alia, “desenvolver as possibilidades de remédio judicial”. Todavia, um Estado- parte, visando a justificar sua deficiência em prover quaisquer remédios jurídicos domésticos por violações a direitos econômicos, sociais e culturais, precisaria mostrar que tais remédios não são “meios apropriados” dentro dos termos do artigo 2o, parágrafo 1, do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais ou que, em vista de outros meios usados, eles são desnecessários. Será difícil mostrar isto e o Comitê considera que, em muitos casos, os outros meios utilizados poderiam ser considerados ineficazes se eles não forem reforçados ou complementados por remédios judiciais.

B. O status jurídico do Pacto na ordem jurídica doméstica

4. No geral, os padrões internacionais de direitos humanos legalmente vinculantes deveriam operar diretamente e imediatamente dentro do sistema jurídico doméstico de cada Estado- parte, possibilitando, com isso, os indivíduos a buscarem a efetivação de seus direitos perante os tribunais e órgãos julgadores nacionais. A regra exigindo a exaustão dos remédios nacionais reforça a primazia dos instrumentos jurídicos nacionais a esse respeito. A existência e posterior desenvolvimento de procedimentos internacionais para o processamento de queixas individuais é importante, mas tais procedimentos são, em última instância, suplementares a remédios nacionais eficazes.

5. O Pacto não estipula os meios específicos pelos quais ele é de ser implementado na ordem jurídica nacional. E não há nenhuma disposição obrigando sua incorporação ampla ou exigindo que lhe seja conferido algum tipo específico de status no Direito nacional. Embora o método preciso pelo qual os direitos previstos no Pacto são de ser efetivados no Direito nacional seja matéria para cada Estado- parte decidir, os meios usados deveriam ser apropriados no sentido de produzir resultados que sejam coerentes com a completa desincumbência pelo Estado parte de suas obrigações. Os meios escolhidos são também sujeitos à revisão como parte do exame, pelo Comitê, da observância pelos Estados- partes de suas obrigações para com o Pacto.

6. Uma análise da prática do Estado com respeito ao Pacto mostra que os Estados têm usado uma variedade de abordagens. Alguns Estados fracassaram não tendo feito nada em específico. Daqueles que tomaram medidas, alguns Estados transformaram o Pacto em lei nacional suplementando ou emendando a legislação existente, sem invocar os termos específicos do Pacto. Outros o adotaram ou incorporaram na legislação nacional, de modo que seus termos são mantidos intactos e dada validade formal no ordenado jurídico nacional. Isso é freqüentemente feito por meio de disposições constitucionais que concedem prioridade às disposições internacionais de direitos humanos sobre qualquer legislação nacional inconsistente. A abordagem dos Estados para com o Pacto depende significantemente do modo pelo qual os tratados, em geral, são adotados no ordenamento jurídico doméstico.

7. Mas qualquer que seja a metodologia preferida, vários princípios partem do dever de dar efeito ao Pacto e devem, desta forma, ser respeitados. Primeiramente, os meios de implementação escolhidos devem ser adequados para assegurar o cumprimento das obrigações contidas no Pacto. A necessidade de assegurar justiciabilidade (veja parágrafo 10 abaixo) é relevante quando determinando a melhor forma de dar efeito jurídico doméstico aos direitos do Pacto. Segundo, devia-se levar em conta os meios que provaram ser os mais eficazes nos países em questão, assegurando a proteção de outros direitos humanos. Onde os meios usados para cumprir o Pacto dos Direitos, Econômicos, Sociais e Culturais diferenciarem de forma significativa daqueles usados em relação a outros tratados de direitos humanos, deveria haver uma justificação convincente para isso, levando em conta o fato de que as formulações usadas no Pacto são, em uma extensão considerável, comparáveis àquelas usadas com tratados que lidam com direitos civis e políticos.

8. Terceiro, enquanto o Pacto não obriga formalmente os Estados a incorporar seus dispositivos no direito nacional, tal abordagem é desejável. A incorporação direta evita problemas que poderiam aparecer na tradução das obrigações dos tratados para o direito nacional e produz uma base para a invocação direta dos direitos do Pacto pelos indivíduos nas cortes nacionais. Por estas razões, o Comitê encoraja bastante a adoção formal ou incorporação do Pacto ao direito nacional.

c. A função dos remédios jurídicos

Remédios jurídicos ou judiciais?

9. O direito a um remédio eficaz não precisa ser interpretado como sempre exigindo um remédio judicial. Remédios administrativos serão, em muitos casos, adequados e, aqueles vivendo dentro da jurisdição de um Estado- parte têm uma expectativa legítima, baseada no princípio da boa fé, que todas as autoridades administrativas levarão em conta as exigências do Pacto em sua tomada de decisão. Quaisquer desses remédios administrativos deveriam ser disponíveis e de custos acessíveis, oportunos e efetivos. Em última análise, o direito a um apelo judicial de tais procedimentos administrativos também seria apropriado. Do mesmo modo, há algumas obrigações, tais como (mas de modo algum limitado a) aquelas referentes à não- discriminação, em relação as quais a disposição de alguma forma de remédio judicial pareceria indispensável, de modo a satisfazer as exigências do Pacto. Em outras palavras, sempre que um direito do pacto não puder ser inteiramente realizado sem alguma participação do Judiciário, remédios judiciais são necessários.

Justiciabilidade

10. Em relação aos direitos civis e políticos é incontestavelmente aceito que remédios judiciais por violações são essenciais. Lamentavelmente, a presunção contrária é também muito freqüentemente feita em relação aos direitos econômicos, sociais e culturais. A divergência também não é justificada pela natureza dos direitos ou pelos dispositivos relevantes do Pacto. O Comitê já esclareceu que considera muitos dispositivos do Pacto capazes de implementação imediata.

Assim, no Comentário Geral no 3 (1990), ele citou, como exemplo, artigos 3;7, parágrafo (a) (e); 8;10, parágrafo 3;13, parágrafo 2 (a); 13, parágrafo 3;13, parágrafo 4; e 15, parágrafo 3. É importante a este respeito distinguir entre justiciabilidade (que se refere àquelas questões resolvidas de forma adequada pelos tribunais) e normas que são auto- aplicáveis (capazes de ser aplicadas tribunais nem outra elaboração).

Enquanto a abordagem geral de cada sistema jurídico necessita de ser levada em conta, não há nenhum direito do Pacto que não poderia, na grande maioria dos sistemas, ser considerado como possuidor de um mínimo de uma dimensão de justiciabilidade significante.

Algumas vezes, é sugerido que questões envolvendo a alocação de recursos deveriam ser deixadas às autoridades políticas que para os órgãos do Poder Judiciário. Enquanto as respectivas competências de vários ramos do governo devem ser respeitadas, é apropriado reconhecer que os tribunais estão de um modo geral, já envolvidos em uma considerável quantidade de matérias que têm importantes implicações com recursos. A adoção de uma classificação rígida dos direitos econômicos, sociais e culturais, que os coloca, por definição, além do alcance dos tribunais, seria arbitrária e incompatível com o princípio de que os dois grupos de direitos humanos são indivisíveis e interdependentes. Isso também drasticamente reduziria a capacidade dos tribunais de proteger os direitos dos grupos mais vulneráveis  e desfavorecidos da sociedade.

Auto-Aplicabilidade

11. O Pacto não nega a possibilidade de que os direitos que contém podem ser auto - aplicáveis em sistemas em que a opção é fornecida. De fato, quando estava sendo elaborado, tentativas para incluir um dispositivo específico no Pacto para que o efeito de que fosse considerado não auto- aplicável foram bastante efeito rejeitados. Na  maioria dos Estados, a determinação se um dispositivo de um tratado é ou não auto- aplicável será matéria dos tribunais, não do Executivo ou Legislativo. A fim de exercer aquela função efetivamente, os tribunais e outros órgãos julgadores devem conhecer a natureza e implicações do Pacto e do importante papel dos remédios judiciais em sua implementação. Assim, por exemplo, quando os Governos estão envolvidos em procedimentos das cortes eles deveriam promover interpretações de leis nacionais que dêem efeito às suas obrigações sobre o Pacto. Da mesma forma a capacitação judicial deveria ter em conta a completa justiciabilidade do Pacto. É especialmente importante, para evitar qualquer presunção a priori, que as normas deveriam ser consideradas não auto- aplicáveis. De fato, muitas delas são redigidas em termos que são, pelo menos, tão claros e específicos quanto aqueles em outros tratados de direitos humanos, cujos dispositivos são regularmente considerados pelas cortes como auto- aplicáveis.

D. O tratamento do Pacto nos tribunais nacionais

12. Nas diretrizes do Comitê para os relatórios dos Estados, estes são solicitados a fornecer informação sobre se as disposições do Pacto ‘’ podem ser invocadas perante, e diretamente aplicadas pelos tribunais, outros órgãos julgadores ou autoridades administrativas ‘’.

Alguns Estados forneceram tal informação, mas maior importância deveria ser agregada a este elemento em relatórios futuros. Em particular, o Comitê solicita que os Estados- partes forneçam detalhes de qualquer jurisprudência significante de seus tribunais nacionais que se utilizem dos dispositivos do Pacto.

13. Com base na informação disponível, fica claro que a prática Estatal é mista. O Comitê nota que alguns tribunais aplicaram as disposições do Pacto tanto indiretamente quanto como um padrão de interpretação.

Outros órgãos judiciais estão dispostos a reconhecer, em princípio, a relevância do Pacto para interpretar o Direito nacional, mas, na prática, o impacto desse instrumento na fundamentação ou no resultado dos casos é muito limitado. Ainda outros tribunais recusaram-se a dar qualquer grau de efeito jurídico ao Pacto em casos em que indivíduos pretenderam fundamentar-se nele. Permanece uma enorme abrangência para as cortes, na maioria dos países, encontrar amparo no Pacto.

14. Dentro dos limites do exercício apropriado de suas funções de controle judicial, tribunais deveriam levar em conta os direitos do Pacto onde for necessário para assegurar que a conduta dos Estados seja coerente com as obrigações do Pacto.

A negligência das cortes para com essa responsabilidade é incompatível com o princípio do Estado de Direito, que deve sempre incluir respeito às obrigações internacionais de direitos humanos.

É geralmente aceito que o Direito nacional deveria ser interpretado de tanto quanto possível que esteja em conformidade com as obrigações internacionais legais dos Estados. Assim, quando um julgador nacional confronta-se com uma escolha entre uma interpretação da lei nacional que romperia com os princípios do Pacto e uma que possibilitaria ao Estado observar o Pacto, o Direito internacional exige a adoção desta última hipótese.

Garantias de igualdade e não discriminação deveriam ser interpretadas, tão amplamente quanto possível, de modo que facilite a total proteção aos direitos econômicos, sociais e culturais.

 
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