Papel do
Ministério Público na
Promoção dos Direitos Humanos
Maurício José
Nardini
promotor de Justiça em Goiás,
coordenador do Centro de Apoio Operacional de Controle Externo da
Atividade Policial
Por direitos humanos ou direitos do homem devemos que se tratam
daqueles que o homem possui por sua própria natureza humana e
pela dignidade que ela é inerente. Não resultam de uma concessão
da sociedade política. Constituem sim, um dever da sociedade política
a ser garantido e consagrado. São admitidos desde a antigüidade:
No código de Hamurabi (Babilônia), na filosofia de Mêncio
(China), na república (de Platão), no direito Romano.
Logicamente que nessas épocas, não existia o conceito que hoje
temos de direitos humanos.
Na Idade Média, apesar das
atrocidades cometidas pela inquisição, podemos destacar a existência
da Magma Carta (1226) que estabeleceu alguns direitos básicos que
se incorporariam a partir de então no seio de nossa consciência
e prevalece até nossos dias.
Séculos mais tarde vieram as
declarações dos direitos do homem e do cidadão, com a revolução
Francesa e tais ideais foram consolidados. Em nosso século a
Constituição Mexicana 1917 proclamou os direitos do trabalhador
. A Revolução Russa trouxe a luz a declaração dos direitos do
povo , dos trabalhadores e explorados (1918).
Ultrapassado o ideal liberalista em
nosso século , surgiu a idéia dos direitos sociais. Já não
bastava o estado de direito . Era necessário um Estado Social de
direito. Essas aspirações foram colocadas de maneira solene na
proclamação das quatros liberdades, de Roosevelt em 1941 (a
liberdade de palavra e expressão, a de culto, a de não passar
necessidade, e a de não sentir medo ). Depois vieram as declarações
das nações unidas (1942), e as das conferência de Moscou
(1943), são Francisco (1945), culminando com a conhecida Declaração
universal dos direitos do homem, de 1948.
Numa primeira geração ficaram
cristalizados os direitos de cidadania . Numa segunda geração
foram inseridos os direitos sociais na dos direitos fundamentais .
A partir de então a preocupação centrou-se não mais na formulação
de meras declarações mais ficou evidenciada a necessidade de
verdadeira promoção dos direitos humanos. Não adianta mais
multiplicarmos textos que encerem promessas mais ou menos vagas .
E preciso que tais textos sejam aplicados no mundo jurídico a fim
de que surtam efetivo efeito.
Não podemos negar o caráter pedagógico
da declaração do Direitos do homem. Tal documento carrega uma
presunção de verdade, de legitimidade, e de amplo consenso seus
termos . Todavia , a declaração sofreu um profundo desgaste
decorrente entre a distância que separa seus enunciados e o
efetivo cumprimento dos mesmos. Daí a necessidade de criarmos
mecanismo que os provam e salvaguardem tais direitos a todos nós.
No Brasil, a situação não é diferente.
Não podemos falar de direitos
humanos sem falarmos em classe sociais . Com efeito , a historia
demonstrou que o discurso discursos em direitos humanos no Brasil
veio sendo influenciado pela classe média que oscilou sua defesa
e hoje procura esvaziar o discurso em favor dos direitos humanos.
Isso porque o discurso dos direitos humanos no Brasil (como de
resto em toda América latina) durante muito tempo sempre foi uma
maioria marginalizada e pobre .
A luta pelos direitos humanos no
Brasil nas três últimas décadas é o reflexo do movimento
popular da classe média . Do golpe de 64 ( e especialmente depois
de 1969) até a morte do jornalista Wladimir Herzog nas dependência
do DOI-CODI em 1975, a luta pelo direitos humanos era sinônimo de
luta pelo direitos políticos e, principalmente contra a tortura.
Nessa fase destaca-se o trabalho da Igreja Católica em favor dos
direitos humanos, no Brasil, e fora do Brasil, o apoio Anistia
Internacional.
A partir da morte de Herzog, até
1979, com a "distensão lenta e gradual" promovida pelo
governo militar , buscou-se não apenas garantir a atividade física
dos opositores do regime militar mas também procurou-se alcançar
os direitos de cidadania política. Essa época foi marcada pela a
luta pela anistia, por campanha contra a Lei de Segurança
Nacional, pelas greves do ABC paulista, e pelo engajamento do
movimento sindical paulista. Nesse período a Igreja não lutou
sozinha. A Ordem dos Advogados do Brasil e o próprios sindicatos
dos trabalhadores, organizados e fortes, se engajaram na luta
pelos direitos humanos. Ocorre aí, como reflexo dessa luta, o fim
da censura à imprensa. O assassinato do operário Santos Dias da
Silva , nas greves de 1979/80 em São Paulo é o símbolo da luta
nesse período .
A partir de 1979, a identificação
dos direitos humanos com as classes marginais se deu de maneira
total. Conquistados os diretos políticos e restabelecido o regime
democrático, o discurso, a prática e a luta migraram para a
conquista dos direitos econômicos e sociais. Passou-se a lutar
pelo trabalho, (não nos esquecendo que a recessão de 1981 a 1984
exerceu uma influência importante nesse sentido), à saúde, à
vida, à moradia e à integridade física. A luta continuou em
favor dos presos (agora presos comuns) e em prol dos lares pobres.
Marcou essa época a campanha pela reforma agrária. O assassinato
de dois menores na favela de Heliópolis (Teodoro e Dirley)
representam um marco nas reivindicações deste período.
Com a Constituição de 1988,
consolidado o regime democrático, a luta pelos direitos humanos
passou a ser a luta pela efetiva implementação dos direitos
adquiridos através da nova carta. E também a partir daí que
surge um novo perfil do Ministério Público, que se consolidam
(pelo menos no papel) os direitos democráticos e surgem leis mais
importantes em defesa do cidadão. O conteúdo da luta pelos
direitos humanos continua a favor dos presos e pela inserção das
classes menos favorecidas nos direitos mais essenciais como a
moradia, a saúde, a educação e pelos menores. Esse último período
pode ser simbolizado pela chacina da Candelária, chacina de
Carandiru e pelos violentos conflitos com o sem-terra em Eldorado
do Carajá, no norte do país .
O professor paulista José Reinaldo
de Lima Lopes observou bem que, do ponto de vista das classe
sociais a historia recente dos direitos humanos pode ser dividida
em dois momentos: o Golpe Militar até 1975, e de 1975 até nossos
dias . O primeiro período foi marcado pela violação dos
direitos da classe média (intelectuais, artista e estudantes ) ao
lado das lideranças populares. A distinção de classes não
constitui uma figura de retórica mas verdadeiramente aparece como
um divisor de águas pelos direitos humanos. No período inicial,
a prisão e a opressão do Estado recaía sobre a classe média
(as classes dominantes nunca sofreram com as ditaduras militares
nem no Brasil, nem no resto da América Latina )e havia uma retórica
em favor do Estado de Direito. A violência contra as classes
populares , que já existia desde antes de 1964, existiu durante o
regime militar e persiste até hoje. Essa violência é reflexo de
nossa infeliz tradição, desde os tempos da escravatura, onde os
açoites eram públicos passando pela abolição que deixou uma
grande massa de negros sem a mínima perspectiva, abandonados à
própria sorte em que continuaram a reproduzir o mesmo modo de
produção anteriormente estabelecido.
E em cima desse movimento pendular
da classe média é que podemos melhor compreender a situação de
luta pelos direitos humanos no Brasil. A deterioração das condições
de sobrevivência da classes populares constitui um fator
importante para a ampliação da pauta de reivindicações que
deixou de ser apenas na proteção aos presos e partiu para a luta
por melhores condições salubridade, habitabilidade e educação
das periferias. Assim, o modelo econômico brasileiro acabou de
implantar um sistema falido de habitação popular . O êxodo
rural, que antes era interessante porque garantia mão de obra
barata para o processo de industrialização passou a constitui um
problema sério porque o inchaço da cidade acabou degradando as
classes dos trabalhadores . A luta agora e contra o Estado através
de reivindicações de caráter social (das classes populares
enquanto produtora) e econômico ( das classes sociais enquanto
consumidoras ). São lutas de caráter concreto por melhores condições
de trabalho ( produção) ou de sobrevivência (reprodução).
As classes médias apoiaram os
movimentos de direitos humanos no momento em que buscava defender
os presos políticos e retiraram esse apoio no momento em que a
expressão "direitos humanos" passou ter uma conotação
estendia a um caráter social e econômico . No período em que
vigorava a censura no Brasil , o envolvimento das classes médias
se deu através daqueles que diretamente se sentiam afetados pelos
problema. Assim, as famílias de presos torturados e desaparecidos
, os setores que tinham acesso à imprensa alternativa, exerceram,
juntamente com a igreja , um papel importante na luta pelos
direitos humanos no Brasil durante a ditadura militar . É
importante ressaltar que a classe média brasileira não foi unânime
nesse apoio. Muitos se calaram , seduzidos pelo "milagre econômico".
No período ditatorial ocorreu um
contato maior dos intelectuais (artistas, professores, estudante e
advogados), oriundos em geral da classe média , com a realidade
social das classes populares, através da proximidade física com
os presos comuns . Num segundo momento , restabelecido o Estado de
direito , o apoio dos intelectuais se esvaziou e somente aqueles
desligados e independentes do grande capital e que não têm , em
principio grande apoio da imprensa , é que continuaram na luta em
favor dos direitos humanos , agora com um conceito renovado e com
uma pauta de reivindicações ampliada .
Em contrapartida , iniciaram-se as
distorções com a redução do discurso pelos direitos humanos
uma questão policial, deixando de lado os direitos básico à
sobrevivência . Essa distorção pretende mudar o eixo das
discussões todo o conteúdo dos direitos humanos reduzindo-o à
um discurso limitado.
Esse discurso policial que procura
limitar a atuação dos movimentos de defesa dos direitos humanos
a uma questão policial ainda carrega uma grande distorção.
Muitos acabam sem responder a uma indagação que amiúde surge na
boca daqueles que pretendem esvaziar o discurso acerca dos
direitos humanos: "e os direitos humanos da vítima?"
Parece até que existem duas espécies de direitos humanos: os dos
marginalizados e o das vítimas. Direitos humanos constituem um
instrumento forjado defender a pessoa humana de um modo geral e não
apenas um indivíduo qualquer , seja ele criminoso , seja ele vítima
de crimes . Os direitos humanos estão disseminados não só através
transgressões à lei praticadas pelos homens mas sim no exercício
abusivo do poder político e do poder econômico . Esquecem-se de
uma violação de um direito, seja ele uma pessoa , seja um grupo
de pessoas , é permanente e estruturalmente subordinadas ao autor
da violação mas também estão envolvidos outros fatores sociais
e econômicos na questão.
As pessoas que lutam pelos direitos
humanos no Brasil são rotuladas como aquelas que lutam pela proteção
do bandido contra a policia . Esquecem-se ( ou fingem esquecer)
que o conceito e muito mais abrangente e envolvem outras ações
civis de reintegração de posse, ações civis relativa a tutela
ou curatela de crianças e adolescentes carentes na busca de
regularização de áreas urbana de forma irregular, na divulgação
dos direitos trabalhistas e previdenciários , na verdadeira luta
por condições dignas de vida. O discurso, portanto, é muito
maior.
A retórica de que os direitos
humanos se resumem na busca de proteger os bandidos da policia
encobre o fato de que a policia e utilizada com freqüência como
repressora dos movimentos de reivindicação das classes
populares. A invasão do Carandiru em São Paulo, o massacre do
sem terra ocorrido recentemente no Pára são exemplos disso. Na
verdade o choque não e entre a policia e o cidadão e sim entre o
estado e o cidadão . A policia serve apenas de instrumento , de
força aparente , de materialização do Estado mas ela não e o
Estado . O conflito não ocorre entre policia e bandido e sim
entre Estado e cidadão .
É importante ressaltar que
essa retórica , hoje, interessa a classe média . Afinal, seus
membros já não estão mais no cárcere porque os motivos políticos
que ensejaram a prisão de seus membros já se acabou .
Institua-se novamente a ditadura militar no Brasil e veremos de
novo a classe média ingressar as fileiras dos movimentos em
defesa dos direitos humanos...
E o direito? Onde é que ele se
engaja nesse contexto? Os operadores do Direito estariam
capacitados para atender as demandas sociais que hoje vivemos ?
Qual seria o papel do Ministério Público nesse sentido ?
Vivemos uma situação peculiar em
nosso país . Nossas leis são avançadíssimas . Somente pare
exemplificar , possuímos um estatuto da criança e do adolescente
moderno mas que, na prática , vem se mostrando ineficaz . Possuímos
uma lei de execução penal de moldes europeus que vem sendo
permanentemente desrespeitada. Possuímos um Código de defesa do
consumidor avançado mas que não surte efeito frente a uma grande
massa de pessoas que não tem acesso ao consumo . Como podemos
falar em direito do consumidor num País em que existem inúmeros
cidadãos vivendo dos restos que são depositados em lixões das
grandes cidades? Como podemos pensar na proteção integral à
criança ao adolescente quando abrirmos os jornais e constatamos o
trabalho escrava nas carvoarias , nas plantação de erva-mate e a
prostituição queque grassa em alguns estados do Nordestes e
Centro Sul do País? Será que podemos resumir o conteúdo das
discussões sobre o direito humano aos maus tratos que recebe
nossa população carcerária ? Não seria uma simplificação
demasiada de seu conteúdo?
Sabemos que o Brasil é rico em
leis. Possui uma estrutura legal que da inveja a muito país dito
desenvolvido. O grande problema é fazer com nossas leis sejam
cumpridas porque leis existem para promover direitos humanos no
Brasil . O judiciário (e aqui podemos colocar também o Ministério
Público) possui algumas deficiências que impedem a efetiva
aplicação das leis Brasileiras . Afinal , não é do interesse
das classes dominantes fazer com que as leis sejam cumpridas . Por
outro lado , as classes populares quando começam a reivindicar
aquilo que lhes pertence , não como esmola mas sim como direito
garantidos pela a lei, a situação muda de figura . De fato , as
garantias de direitos fundamentais que estão na lei mas sim no
modo como se aplica a lei. A relevância não e sobre aquilo que
esta escrito mas principalmente no modo como são tomadas as decisões
sobre matéria . Nesse sentido , o Ministério Público pode
exercer um papel importantíssimo na garantia da aplicação das
leis que já existem.
O Ministério Público adquiriu uma
nova configuração a partir de 1988 quando foi colocado na
constituição como constituição permanente , essencial à função
jurisdicional do Estado , incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica
, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis . Essa nova configuração Ministério Público é
decorrente de suas ações a partir do século 80, 7347/ 85). Por
outro lado, o contexto político da redemocratização e as aspirações
das classes médias e especialmente do legislador constitucional
alçaram o Ministério Público a uma categoria forte de
operadores do direito . Com o passar dos anos , o Ministério Público
incorporou sua nova faceta e desde de então passou a incomodar as
classes dominantes . Não é por acaso que hoje , com o processo
constitucional , pretende-se cortar algumas atribuições
conferidas ao Ministério Público pela carta de 1988. E que, no
atual contexto , a instituição forte que era necessária para se
contrapor sobre aos interesses dominantes passou a incorporar
lutas que incomodaram as próprias classes dominantes.
O Ministério Público está
colocado não dentre a organização dos poderes mas como instituição
permanente, essencial à prestação jurisdicional do estado .
Incube-lhe a defesa da ordem jurídica dos interesses sociais e
individuais indisponíveis e do regime democrático . Deve zelar
pelo efetivo respeitos dos poderes Públicos e dos serviços de
relevância pública aos direitos assegurados na constituição .
Por isso, os membros do ministério Público não são
considerados meros funcionários públicos são agentes políticos
investidos de atribuições constitucionais e responsáveis pelo
exercício de funções mais altas e complexas , cuja atuação e
decisões exigem independência funcional . Para tanto são
garantidas pela constituição a vitaliciedade . Não pode o
promotor perder o cargo senão por sentença judiciária. Não se
admite a perda do cargo por decisão administrativa (senão seria
estabilidade). Também é garantida a inamovibilidade que visa
garantir o exercício funcional e não apenas a garantia do membro
do Ministério Público . Por isso , é impossível a remoção
compulsória do promotor , salvo por motivo público , mediante
decisão do colégio de procuradores (art. 12, III, lei 8625/ 93).
Tais garantias conferiram força ao Ministério Público para
poder agir livremente, sempre de acordo com a lei.
A constituição estabelece que o
Ministério Público tem as seguintes funções institucionais,
dentre outras:
I - Promover privativamente a ação
penal pública;
II- zelar pelo efetivo respeito dos
poderes públicos e dos serviços de relevância pública aos
direitos assegurados na constituição , promovendo as medidas
necessárias à sua garantia;
III- promover o inquérito civil e
a ação civil pública , para a proteção do matrimônio público
e social , do meio ambiente e de outros direitos difusos e
coletivos.
IV- defender juridicamente os
direitos e interesses das populações indígenas;
V- Exercer o controle externo da
atividade policial; além de outras funções que lhe foram
conferidas , desde que compatíveis com sua finalidade.
De acordo com a constituição , o
Ministério Público constituiu uma entidade governamental que
pode, e muito, promover os direitos humanos.
A ação penal pública, função
privativa do Ministério Público , tem sido promovida e constitui
instrumento poderoso para que se busque soluções justas para a
repressão aos violadores dos direitos humanos. Infelizmente,
nesse sentido o Ministério Público deixa muito a desejar no que
se refere às leis especiais . Os dispositivos previstos no
estatuto da criança e do adolescente bem como aqueles que
protegem o consumidor são bem aplicados . falta conhecimento ,
empenho e vontade do Ministério Público para a devida aplicação
das leis penais contra o deficiente físico ( lei 7853/89) ,
contra a discriminação racial (lei 1390/51, lei 7437/85, lei
7716/89) crimes resultantes de atos discriminatórios ou de
preconceito de raça , religião , etnia ou de procedência
nacional , praticados por meios de comunicação de massa (lei
8081/90). Mas e importante nos fazermos também uma ressalva .
Esses dispositivos legais que tratam de incriminar condutas
preconceituosas são de difícil aplicação por que trazem em deu
conteúdo algumas expressões que limitam sua aplicação e que
acabam por tornar leis inócua . A lei penal que trata de proteger
os deficientes físico coloca como conduta criminosa os atos de
recusar , suspender, procrastinar, cancelar ou fazer cessar , sem
justa causa , a inscrição de alunos em estabelecimento de ensino
, por motivos da derivados da defici6encia que porta . A prova
desses crimes é difícil consecução. Como provar a procrastinação
de uma inscrição de alunos em um estabelecimento de ensino ?
Como provar que está procrastinação se deu decorrência de
preconceito advindo da defici6encia física do aluno ? Nesses
sentidos, nossas leis são hipócritas . Racismo , na delegacia de
policia , é tratado como injúria . Tortura é tratada como
crimes de lesões corporais ou abuso de autoridade . Com a
tipificação de crime de tortura esperamos poder dispor de meios
mais eficientes para tratar do assunto .
O zelo pelo efetivo respeito aos
serviços relevantes assegurados pela constituição também
constitui armas poderosas nas mãos do Ministério Público que
pode fazer valer os direitos da minoria , das crianças e dos
adolescentes . Inúmeras são as ações do Ministério Público
nesse sentido. O Ministério Público tem legitimidade para
ingressar com ações de investigação de paternidade, pode
efetivamente garantir o ingresso de alunos em escolas , enfim,
possui legitimidade para promover inúmeras ações que podem
garantir o respeito aos direitos básicos da sociedade .
O controle externo da atividade
policial é uma área que também merece por parte do Ministério
Público atenção especial . Trata-se de uma função
institucional ainda não aproveitada completamente mas que já
apresenta resultados visíveis quando entra em ação . Em Goiás
já existe um núcleo que fiscaliza a atuação da policia em que
vem promovendo medidas efetivas de combate a tortura , aos maus
tratos ,e aos abusos de autoridade . Em São Paulo também podemos
destacar semelhante atuação . O caso do bar Bodega é exemplo
disso .
A policia, instrumento de manutenção
de poder durante a ditadura militar sempre cometeu abusos .
Inicialmente vigorava uma ideologia de Segurança Nacional que,
com a redemocratização política perdeu o sentido . Daí , a
tecnologia da tortura passou para uma ideologia da segurança pública
e os abusos continuaram a ocorrer . Igual situação encontra-se a
policia da Argentina que também comete toda uma séries de abusos
em nome da segurança pública . O Ministério Público incomoda
as policias . Em Goiás movemos ações contra os policiais e
promovemos nós mesmos as investigações . Dessa forma
conseguimos furar o espírito corporativo das corregedorias e
temos conseguido um resultado satisfatório , apesar da pouca
estrutura .
A tortura constituiu o maior
desafio a ser vencido pelo Ministério Público . Novas
tecnologias foram sendo implantadas à barbárie de modo a fazer
com que a tortura seja praticada de maneira de não deixar vestígios
. Na linguagem policial trata-se do "método científico"
expediente utilizado para obtenção de confissões mediante coação
moral, e mesmo com a utilização de mecânicos de violência física
que não deixam vestígios . Tal "tecnologia" acaba
mascarando qualquer exame médico legal e termina por impedir que
as autoridades tomem conhecimento dos fatos. As denúncias de práticas
foram trazidas a sociedade quando no final da ditadura e depois
disso parece que a questão ficou meio que sepultada como se entre
nós a sinistra prática estivesse banida . Infelizmente , o que
se constata é o contrário . A tortura conseguiu sobreviver a
democracia que ora estamos vivendo .
Durante o regime militar, a tortura
era aplicada para conter a "subversão" e tinha caráter
eminentemente político . O final da ditadura trouxe a impressão
de que com ela estaria encerrado o ciclo da tortura . Na verdade ,
encerrou-se uma fase em que, em nome da ideologia da segurança
nacional , quais meios para manter a estabilidade do regime eram
utilizados , inclusive os suplícios aos opositores do regime .
Ocorreu assim uma ligação psicológica entre o fim da ditadura e
o fim da tortura no Brasil. Tal falácia parece ter encontrado
ressonância na sociedade que prefere ignorar , ou fingir ignorar
que entre nós existe tal procedimento . O regime militar acabou e
a prática de tais atrocidades migrou para o aparato repressivo do
Estado . Migrou para os órgãos encarregados da segurança pública.
O levantamentos de tais fatos e difícil
e requer coragem e paciência dos investigadores . Os métodos
modernos empregados para os maus tratos são insidiosos .
Raramente deixam vestígios aparentes . Devido a prática de
diversos maus tratos , com emprego de energias mecânicas (lesões
corporais), bioquímicas (inanição) ou biodinâmicas (choques) ,
a determinação médico legal da tortura deve levar em conta um
conjunto generalizados de sintomas. Devemos também nos lembrar
que por quaisquer meio , sempre a vítima apresenta um violento
comprometimento da emotividade , reagindo ante ao terror , medo,
revolta ou submissão . Qualquer "verdade" pode ser
arrancada de uma pessoa nessas condições . Em sua quase
totalidade as vítimas da tortura são pessoas pobres e
desenformadas sobre seus direitos fundamentais ou se tratam de
pessoas sobre as quais recai uma investigação criminal .
Constatar e provar tais torturas se
constitui em tarefas difícil ,tendo em vista que nem sempre é
possível levar a vítima ao perito para que realize o exame de
corpo de delito a tempo de não ter desaparecido ainda os sinais
corporais . Por outro lado , há de se observar que os médicos
que realizam tais perícias , na condição de funcionário da
secretaria de segurança pública , atendendo a práticas
corporativas ou mesmo tendendo represália por parte dos membros
da policia , deixam de fazer com devida cautela os exames e os
laudos de tortura . Além das aflições físicas e morais , a
tortura acaba por trazer também prejuízos jurídicos às vítimas
que acabam confessando crimes que não praticaram tornando assim
mais difícil a sua defesa perante o poder judiciário . Inúmeras
são as acusações que pesam sobre as autoridades brasileiras que
governavam o país durante o regime militar após o golpe de 1964
, dentre essas acusações sobressaem aquelas que apontam as
referidas autoridades como coniventes e até como fontes de
autorização para prática da tortura contra os presos políticos
.
Urge divulgar todos esses fatos a
sociedade a fim de que seja pressionados os órgãos
governamentais encarregados da segurança pública em todo país
no sentido em que seja tomadas as medidas institucionais cabíveis
. O Ministério Público , fiscal da lei, controlador externo das
atividades policiais , por força constitucional, necessita de
aparelhamento para poder exercer o seu mister . Para isso , deve
ser regulamentado detalhadamente o inciso VII do artigo 127 da
Constituição Federal e dos governantes do estados espera-se
maior atenção e recursos a fim de que a prática da tortura seja
banida das dependência policias .
Outro instrumento poderoso e que
vem sendo utilizado com freqüência é o inquérito civil público
e a ação civil pública . Tratam-se de mecanismo processuais que
visam a garantia dos direitos difusos e coletivos . Destinados à
proteção do patrimônio público e social , do meio ambiente e
dos outros direitos difusos e tais coletivos tais instrumentos jurídico
esta sendo utilizado para a defesa das pessoas portadoras deficiência
física , pela criança e adolescente , pelo direito a um meio
ambiente equilibrado , dentre outros .
A defesa das nações indígenas
também constitui importante atribuição do Ministério Público
. Defender juridicamente os direitos e interesses das populações
indígenas constitui um conceito amplo que visa a proteção e
organização social, dos costumes, das línguas, das crenças,
das tradições e dos direitos originário sobre suas terras . Tal
proteção recai sobre o Ministério Público da União através
das procuradorias da república .
João Batista Herkenhoff já falava
em 1979 sobre o judiciário (e tais observações ainda são
pertinentes ao Ministério Público) que para que tenhamos êxito
na promoção dos direitos humanos é necessário que organizemos
uma justiça (e um Ministério Público) que sejam cercados de
garantias e preparados para enfrentamos a questão. Além disso,
deve-se partir para uma educação libertadora onde o homem terá
judiciais mais célebre , eficientes e realmente populares ,
capazes de salvaguardar todos os direitos humanos .
Temos muito a fazer. Os jornais
mostram que crianças brasileiras são explorada sexualmente e
atuam em fitas pornográficas no Equador (folha de S. Paulo,
04.12.96 , 3º Caderno , p. 02). Mostram também o descanso com saúde
onde só a Maternidade Escola Assis Chateubriand , Fortaleza foram
registradas de 91 bebês no mês de novembro desse ano. Sete
agricultores sem-terra foram agredidos por funcionários
encapuzados dia 04 de dezembro na Paraíba . A Human Rights
divulgou relatório em Washington no último dia 04 com dados
sobre a violação de direitos humanos em 74 países em que
critica o Plano Nacional de Diretos Humanos elaborado pela presidência
da República mas que até agora ainda não saiu do papel. O
Ministério Público do Para foi acusado de ter formulado
"uma denuncia mal substanciada à justiça Militar (OESP,
05.12.96, p. C7). Manchetes sobre a exploração do trabalho
infantil também estão presentes ( FSP, 04.12.96, p. 1-3).
Como disse , muito há de ser feito
. O Ministério Público precisa tomar uma atitude mais firme com
relação ao respeito aos direitos humanos . Para isso precisa se
aparelhar melhor , precisa adquirir uma consciência maior acerca
do problema . E importante , todavia que mantenha as atribuições
que a constituição federal lhes conferiu a fim de que possamos
tornar efetivo trabalho de promoção dos direitos humanos . Na
medida do possível , o Ministério Público tem feito um trabalho
que vai além da retórica e do proselitismo mas é preciso agir
mais , é preciso conferir meios materiais para que o Ministério
Público tenha condições de desempenhar seus mister . Por outro
lado , o Ministério Público é hoje a única instituição
governamental capaz de efetivar a promoção dos direitos humanos
. O Ministério Público , sozinho , não conseguira atingir esse
objetivo . E preciso também contar com o poder judiciário para
que as proposições do Ministério Público possam ter efetiva
ampliação . Outro elemento importante e que não deve ser
olvidado é o intercâmbio entre o Ministério Público e as
entidades não governamentais . Pode ser feito uma eficiente
trabalho de parceria entre o Ministério Público e as entidades não
governamentais . Na área do meio ambiente esse trabalho já se
faz sentir . Falta agora ampliar essa parceria para que os
trabalhos sejam mais eficientes . As organizações não
governamentais poderão utilizar sua força de mobilização para
acionar o canal competente . O Ministério Público, por sua vez ,
alimentando pelos relatos não governamentais , com as
prerrogativas dadas pela Constituição pode fazer utilizar sua
força na defesa dos direitos da coletividade , em especial , dos
direitos humanos .
Para tanto , creio que numa atitude
inicial poderíamos propor a inserção do direito ao meio
ambiente sadio como direito humano. Trata-se da terceira geração
dos direitos humanos . E a luta por um meio ambiente sadio capaz
de assegurar uma vida mais saudável a todos .
Passar os institutos Médicos
Legais para o Ministério Público constitui uma outra providência
salutar ao desenvolvimento das atividades do Ministério Público
. Dessa forma , o espírito corporativo da policia pode ser
anulado pelo desligamento de tais órgãos da policia .
A regulamentação do art. 127, VII
da CF/88 é outro obstáculo que deve ser vencido por muitas das ações
do Ministério Público esbarraram na falta de clara e precisa
regulamentação dessa função institucional.
Quanto às ONGs, é preciso tirar
proveito da liberdade de informação e promover mecanismo de
pressão econômica contra os países que violam os direitos
humanos . As ações do Ministério Público são eminentemente públicas
e abertas as participação popular . Assim, as organizações não
governamentais podem se utilizar o Ministério Públicos para
canalizar a defesa jurídica de seus direitos . Por outro lado, a
publicidade , fator predominante nas ações do Ministério Público
pode ser utilizada como fonte de informações para as não
governamentais de modo a poderem ter acesso seguro e confiável de
dados a fim de que possa exercer sua função de grupo de pressão
, especialmente utilizando-se de entidades internacionais . Com a
globalização do mundo podemos tirar proveito para pressionar as
autoridades . Com as facilidades advindas por exemplo, da
INTERNET, podemos divulgar de maneira atualizadas todas as lesões
aos direitos humanos que ocorrem no Brasil e com isso buscarmos
outras formas de pressão - principalmente de caráter econômico)
para que possamos lutar por um mundo melhor.
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. Revista de Informação Legislativa , a. 24, nº 95. Brasília :
Senado Federal - Subsecretaria de edições técnicas, jul./set.
1987.p. 05-22.
E-mail do autor: nardini@persogo.com.br
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