Insurreição
Comunista de 1935
em
Natal e Rio Grande do Norte
A
Revolta Comunista de 1935 em Natal
Relatos
de Insurreição que gerou o primeiro
soviete nas Américas
Luiz Gonzaga Cortez
Nosso
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15. Veterano comunista diz que 35 foi uma precipitação
O
secretário Geral do Partido Comunista do
Brasil, João Amazonas, no dia 14 de agosto
de 1985, após o encerramento da solenidade
de instalação das comissões
Regional e Municipal do PC do B, na Assembléia
Legislativa do RN, respondeu a uma pergunta deste
repórter sobre a natureza do movimento
armado de novembro de 1935, ocorrido em Natal,
Recife e Rio de Janeiro. Como se tratava de uma
solenidade e conferência sobre as atividades
do seu partido na Nova República, aquele
não era o momento para uma digressão
aprofundada sobre 35. Mesmo assim, Amazonas disse
o seguinte sobre a insurreição militar
de novembro de 35:
“- A questão é muito mais
ampla, é um assunto que precisava ser examinado
sob diferentes ângulos.
Eu entrei no Partido Comunista do Brasil, em abril
de 1935 – há 50 anos atrás
eu era recém-membro do PC do B quando se
deu o movimento da ANL e a insurreição
de 35. Mas naturalmente não é por
isso que eu desconheço os fatos, porque
estudamos todas as questões que se relacionam
com o partido, que é o nosso dever. Tenho
impressão que:
Primeiro: O movimento de 1935 foi patrocinado
pela Aliança Nacional Libertadora, num
movimento de frente única, anti-imperialista
e antifascista que surgiu no Brasil com uma grande
potencialidade.
Segundo:
Me parece que esse movimento e a resistência
que se procurou fazer à marcha do fascismo
no Brasil, não pode deixar de merecer aplausos
de todos os patriotas. Todos nós sabemos
que o fascismo constituiu uma grande ameaça
não somente internacional como também
no nosso país. Ameaça fascista aberta
e o dever de todos nós, patriotas, democratas,
era opormos decididamente contra as tentativas
do fascismo. Penso também que de qualquer
maneira a ação armada que se desenvolveu
em Natal, Recife e no 3º Regimento do Rio,
apresentou aspectos heróicos e gloriosos.
No entanto do ponto de vista histórico,
tenho a opinião de que avaliou-se mal o
momento político que se vivia. O Governo
de Vargas fechou a Aliança em agosto de
35. E fechou porque a Aliança ganhava força
em todo o país. Pressionado pelos militares,
Getúlio decidiu pôr em ilegalidade
a Aliança Nacional Libertadora.
Se
fosse hoje, teríamos raciocinado de maneira
diferente, embora que nessa ocasião não
dependeu de mim nem de companheiros que formam
hoje a direção do Partido Comunista.
Outros eram os elementos. Mas raciocinaram de
maneira diferente. O Governo fechou dentro de
uma provocação. Eu acho que se respondeu
a provocação do governo tal como
ele desejava. Eu penso que foram precipitados
os acontecimentos armados de novembro de 35. É
preciso dizer isso abertamente, francamente, o
que não foi. Eu creio que ao invés
de depois do fechamento da ANL, pelo Governo,
ao invés dos aliancistas, comunistas terem
procurado reforçar a organização
popular sobretudo no campo e demais movimentos
das vastas áreas camponesas do Brasil,
e encontrar mil e uma formas de prosseguir na
luta pelos ideais que a Aliança levantava,
não, precipitou-se e caiu-se na questão
de resolver o problema pelas armas. E eu acho
que esse problema foi resolvido à margem
da participação da grande massa
do povo brasileiro. E esse foi um dos fatores
que levou à derrota esse movimento. Se
fosse hoje, no que dependesse de mim, eu não
responderia dessa forma. Eu acho que a vida nos
ensinou agora, recentemente, nesses vinte e um
anos, que sempre se encontrará mil e uma
maneiras, desde as mais radicais às menos
decisivas, menos confrontantes, formas de levar
adiante o movimento e de criar as condições
populares para depois acionar todo um processo
que se consiga tornar vitoriosa a idéia
que se defendeu. Essa é a opinião
que eu tenho a cerca do movimento de 35, falando
em síntese.
“
Provocação do inimigo não
se responde precipitando acontecimentos, pois
a gente acaba fazendo jogo que ele desejava que
se fizesse. Quer dizer que quando o 3o Regimento
de Infantaria, de Praia Vermelha, se levantou,
estava totalmente cercado. Os revolucionários
sequer conseguiram sair do quartel. Ora, nessas
condições, tomar iniciativa é
um pouco um gesto que não encontrava apoio
num raciocínio lógico. Então,
essa questão assim, que é muito
mais complexa, restou um pensamento um tanto sintético,
sei a maneira como reajo em relação
a 35. Nem por isso deixo de destacar 35 como marco
glorioso na história das lutas do nosso
povo oprimido, sacrificado e humilhado que tem
o direito de, em certas circunstâncias,
ter de renascer as soluções extremas,
heróicas para fazer valer os seus direitos.
LINHA DO PC do B
Sobre
a linha do Partido Comunista do Brasil, João
Amazonas disse que o PC do B não tem “nada
de linha chinesa, albanesa, soviética.
“A linha do PC do B, é elaborada
no Brasil por brasileiros, de acordo com a nossa
compreensão dos problemas sociais, políticos,
históricos e culturais do nosso povo. Portanto
não pode ser linha de nenhum outro partido.
Somos amigos da Albânia que luta pela transformação
de sua sociedade e solidários com a luta
do povo albanês, do ponto de vista do internacionalismo
proletário.
Mas não somos albaneses, não ligamos
a questões e problemas deles.
Dou
opinião sobre os nossos problemas e nunca
procurei me imiscuir em assuntos de outros partidos
e estados estrangeiros, mesmo sendo um estado
socialista. Sobre perseguição religiosa
na Albânia, eu não falo, mas quanto
ao Brasil digo que a Constituição
de 46, assegurou a liberdade religiosa, pois até
46 havia perseguição religiosa feroz
contra religião de homens simples e do
povo pobre, ao candomblé e até seitas
protestantes. Se existe na constituição
de 46 um dispositivo que assegurou a liberdade
religiosa no Brasil foi de iniciativa da bancada
do PC do Brasil. O primeiro signatário
foi o Deputado Jorge Amado, seguido de todos os
membros da nossa bancada. A nossa posição
é de assegurar a liberdade religiosa, que
é um direito que o povo tem e não
podemos mudar as crenças do povo e a concepção
das pessoas por decreto e com medidas de hostilidades...”
SIZENANDO: "Eu matei Luiz Gonzaga''
“
Eu matei o falso soldado Luiz Gonzaga durante
a revolução de 35 “, disse
o aposentado Sizenando Filgueira da Silva, 75
anos, residente no bairro de Lagoa Seca, na manhã
de quinta-feira passada. Ele não quis ser
fotografado em virtude de ter sido operado recentemente.
Sem titubear, Sizenando forneceu detalhes sobre
o rapaz conhecido por Luiz Gonzaga que, por motivos
desconhecidos, envolveu-se nos acontecimentos
militares de novembro de 1935.
Sargento
da Polícia Militar do Estado, Sizenando
disse que participou dos combates da insurreição,
principalmente no ataque ao quartel do “
Batalhão de Segurança” ( hoje
Casa do Estudante do RN, na rua da Misericórdia
) que durou 19 horas. Ele disse que foi o comandante
do grupo de insurretos que prendeu os oficiais
( um da PM e outro do 21ºBC ), praças
e sargentos da PM que tentavam fugir pelos fundos
do Batalhão, na tarde do dia 24 de novembro
de 1935. Antes da rebelião, ele era encarregado
da agitação no quartel e homem de
confiança do interventor Mário Câmara,
pois também comandava um grupo de 15 homens
do serviço secreto do Chefe do Executivo.
Ele
não era herói nem militar na época.
Ele apenas era um débil mental, menor de
idade, e deram-lhe um fuzil para acompanhar os
que fugiam do quartel em procura da Base Naval.
Depois que fiz a prisão do major Luiz Júlio
(comandante do Batalhão da PM), e de um
coronel do Exército, eu olhava para a direita
e vi quando ele estava procurando fazer pontaria
para atirar. Antes que ele atirasse, eu atirei;
só dei um tiro e ele caiu. Ele estava por
trás de uma moita, no mangue, fazendo pontaria,
vi que era para mim, a uns 80 metros de distância.
O tiro foi no peito, deu um pulo e caiu para um
lado e para o outro. Aí mandei buscá-lo
e botei o corpo dele ao lado dos prisioneiros,
do major Luiz Júlio e do coronel Pinto
Soares, comandante do 21º BC. Eram 27 prisioneiros,
inclusive o tenente Zuza (José Paulino
de Medeiros), que foi baleado no braço
por um soldado da polícia. Eu prendi o
soldado da polícia e mandei Zuza para o
hospital, onde foi operado pelo Dr. José
Tavares e depois mandei-o ficar na casa de José
Anselmo. O tenente Zuza perdeu o braço
“ disse Sizenando Filgueira, membro do Partido
Comunista Brasileiro ( PCB ) desde 1932, na época
em que chamava-se Partido Comunista do Brasil.
Ele disse que entrou no PCB durante a Revolução
Constitucionalista de São Paulo, que participou
como soldado do 29º BC de Natal. Nos intervalos
dos combates, leu dois livros marxistas emprestados
pelo tenente Bicudo, do Exército.
Uma
das pessoas que participaram ativamente da revolução
de novembro de Natal foi o tenente Mário
Cabral, da Polícia Militar, um dos manobradores
da metralhadora pesada do 21º BC que ficou
estacionada na casa da esquina da rua João
da Mata, em frente a praça André
de Albuquerque, despejando balas na frente do
quartel do Batalhão de Segurança.
Mário Cabral, vestia farda do Exército
durante os combates, segundo informou João
Wanderley, que foi cabo telegrafista do 21º
BC.
- Mário Cabral era tenente da Polícia.
Quando tomei o quartel da Polícia, na entrada
tinha um presídio, com uma porta da cela
do tenente Rangel. Quebrei o cadeado e soltei
Rangel. Aí soube que Mário Cabral
estava na sala da Ordem, armado. Ele estava com
o fuzil a tiracolo e abrindo as gavetas ( isso
eu já disse, certa vez, ao coronel Bento,
muitos anos depois ). Mário Cabral era
o único oficial que estava lá e
mais três ou quatro doentes na enfermaria.
Aí eu disse a ele que se retirasse do quartel.
Ele respondeu-me que ia se apresentar e “
estou também com vocês “. Então,
vá, que eu preciso do quartel desocupado
para entregar, disse para ele. Eu quero deixar
claro também que, quando foi mandado por
Quintino ( sargento músico do 21ºBC,
chefe militar da insurreição, natural
de Serra Negra do Norte, cujo nome completo era
Quintino Clementino de Barros ) para tomar o quartel
só estava o cabo Walfredo, lá em
cima do quartel. Então, eu botei três
muros abaixo, na rua da Laranjeiras e cheguei
na casa de um bodegueiro, pai do coronel Armindo
Aguiar, da Polícia Militar. Seu Júlio,
pai de Armindo, cedeu a casa dele para a gente
atirar. Mandei Odilon deixar seu Júlio
na rua Padre Pinto, pois ele queria ficar lá.
Depois ficamos entrincheirados na mercearia e
atirando contra o quartel da Polícia, até
o fim. Depois fui para o antigo matadouro, atrás
do quartel, onde tinha uma rampa para a Estrada
de Ferro, juntamente com mais quatro soldados.
Aí avistei o pessoal descendo para o mangue,
mandei os soldados cercarem esse pessoal e dei
voz de prisão a todos eles. Eu disse, gritando,
que se rendessem ou morreriam, pois estavam cercados.
Eles se renderam e assim prendi 27 de uma vez.
Depois que eu prendi os 27, vi uma moita se mexendo
e gritei “ quem está aí? “.
“Sou eu, Sizenando não atire”,
respondeu a pessoa. Veio e me abraçou,
dizendo: “vocês não fizeram
ligação comigo. Se tivessem feito,
eu tinha abafado essa merda lá dentro”.
A pessoa era o tenente Zuza. A gente estava conversando
quando apareceu o tiro no braço esquerdo
dele. O soldado que atirou quis fugir, mas eu
botei o fuzil para cima e disse “tá
ferrado, soldado”, e ele não pôde
fugir. Eu não sei porque o soldado atirou
nele, se foi enganado ou se vinha observando os
passos do tenente Zuza. Isso aconteceu na manhã
de domingo (24.11.35). Nessa época, eu
não vestia farda. Aliás, eu nunca
vesti farda porque Mário Câmara disse
que eu era homem de confiança dele e mandou
que fosse tomar conta da investigação
e repressão política e ainda prometeu
que promoveria a oficial, se ele fosse eleito
governador”, afirmou Sizenando Filgueira.
Por causa da sua participação no
movimento de 35, ele passou dez meses na Ilha
Grande, no Rio de Janeiro, além de outros
longos meses na Casa de Detenção
de Natal. O tempo integral que passou na cadeia
Sizenando não sabe, “porque fui solto
e preso tantas vezes que perdi a conta”.
Ele estranha o fato de ninguém ter sabido
que foi o autor do disparo que matou Luiz Gonzaga,
vulgo Doidinho, conhecido como o mártir
da Polícia Militar do Rio Grande do Norte.
- Anos depois contei a história para o
desembargador João Maria Furtado, autor
do livro “Vertentes”, tendo ele me
dito que não daria em nada, pois tudo aconteceu
no meio de uma revolução e atirei
nele em legítima defesa. Se eu não
tivesse atirado, talvez eu estivesse morto hoje.
Quando o livro saiu, coronel Bento Medeiros mandou
me chamar para conversar sobre isso. Mas eu confirmei
tudo e disse “ foi eu quem matei”.
Ele perguntou se eu não estava enganado
e eu disse que não. Matei não foi
por matar, não. Fiz para me defender. Ele
estava com pontaria para mim e eu atirei primeiro.
Coronel Bento disse que aquilo foi coisa de uma
revolução mesmo, se fosse crime
matar em revolução, eu pegaria prisão
perpétua. “Você em São
Paulo era conhecido como doido”, disse Bento,
se referindo a minha participação
impetuosa na revolução de 32, em
São Paulo, onde o major Zenóbio
gostava muito de mim. E Zenóbio chegou
a ser Ministro da Guerra, contou Sizenando Filgueira,
aposentado que vive de uma pensão de salário
mínimo.
Finalizando, Sizenando diz que “o culpado
de tudo, dessa História do herói
Luiz Gonzaga, é o Dr. João Medeiros
Filho. Todos os anos fazem essas comemorações
para refrescar a memória contra o comunismo.
Fazem discurso para os comunistas serem odiados
pela população. Nada é verdade
sobre essa história do herói Luiz
Gonzaga, que nunca foi herói de nada, tudo
foi criado.
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