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Insurreição Comunista de 1935
em Natal e Rio Grande do Norte

 

A Revolta Comunista de 1935 em Natal
Relatos de Insurreição que gerou o primeiro soviete nas Américas
Luiz Gonzaga Cortez

 

 

 

 

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12. Muita confusão e traição na intentona

Após a prisão de Luís Carlos Prestes, em 1936, no Rio de Janeiro, pela Polícia Especial, chefiada por Filinto Muller, foram apreendidos diversos documentos de membros do Partido Comunista do Brasil-PCB e da Aliança Nacional Libertadora, procedentes de diversos pontos do País. Entre eles, diversas cartas do comunista conhecido por “Santa”, que esteve em Natal dirigindo ações que culminaram com a insurreição de novembro de 1935.

Alguns desses documentos foram impressos pela Imprensa Oficial do RN, em Natal, 1938, sob o título Movimento Comunista de 1935 - Excertos da publicação: “Arquivos da Delegacia Especial de Segurança Política e Social Volume III - Polícia Civil do Distrito Federal-Rio 1938”. A carta de ‘Santa’ (1), cuja cópia da transcrição foi localizada em Natal, no arquivo particular de João Alfredo de Lima, revela detalhes interessantes sobre as ações dos revolucionários potiguares e as rivalidades dos dirigentes da precipitada revolução que ficou conhecida por “Intentona Comunista” na historiografia oficial.

Parte dos documentos apreendidos nos arquivos dos chefes comunistas, segundo a Polícia do então Distrito Federal, tem o seguinte teor:

“DOCUMENTO 6 - C
Recife. Caros camaradas do S. do N. e do CC.
Prezados camaradas, este é o meu informe o qual faço para ser transmitido ao CC com urgência.

NATAL

1) Começou o movimento no dia 24 (aqui deve haver engano de data pois que já sabemos que começou no dia 23). Neste mesmo dia estava reunindo o CR; começou às 9h da manhã e terminou às 14h da tarde. Na reunião se tratava de diversos assuntos, menos do levante do 21 BC por que não se sabia desse movimento. Fui a esta reunião e pedi o informe ao Secretário que estava ligado a este setor; ele não informou nada sobre este respeito. Só nos informou que o trabalho estava bem animado neste setor, já se contavam com grande números de aderentes, e que este setor estava ciente da transferência de unidades do norte para o sul e do sul para o norte, de acordo com uma carta do S. do N. nos mandou que na mesma nos pedia que o momento não permitia que se fizesse alguma loucura. Tudo isso foi bem discutido e todos cientes.

Terminando a reunião às 14h, retiramo-nos todos; estava junto conosco o camarada Dante. Passando eu pelo ponto de ligação achei um aparelho procurando o camarada secretário. Eram 15 horas. Então eu indaguei o que queria com o secretário, me disseram que andavam 3 militares do 21 a procura dele. Eu então me retirei para encontrar com o secretário para saber do que se tratava. Quando eu andava rua acima fui chamado a voltar à dita casa de ligação do israelita M. onde encontrei os três militares. Conheci o músico Quintino e mais dois jovens sargentos. Eram três da tarde e então eles me diziam que ia levantar o movimento às 4h da tarde. Eu combati muito esta atitude deles, dizendo que esperassem mais dois dias ao menos. Eles não aceitaram a minha proposta e me informaram que (hoje) na parada da manhã tinha sido desincorporado 28 militares inclusive sargentos, cabos e soldados, todos da confiança dele, era denúncia e eu então disse a eles que não resolvia nada individual e ia reunir o restrito mas que às 16 horas não podia ser o levante. E ele então deu-me mais 2 horas de prazo. Eu não aceitei, fui reunir o restrito. Já o secretário estaca ciente de tudo e andavam a minha procura. Encontramos todo o restrito às 15h30, mandei chamar o camarada Dante que tomou parte na reunião com o restrito. Meu ponto de vista foi contra se fazer esse movimento sem avisar o S. do N. Resolvemos mandar um companheiro para Recife de avião, quando vimos o avião já estava de partida, saiu o secretário e o camarada Dante para reunir com quatro militares e convencê-los de seu desespero. Reuniram às 4h30 com os militares, não puderam convencê-los. Então o camarada secretário e o camarada Dante trataram para às 8h da noite. Mobilizamos mais de 150 homens e mulheres. Dei as instruções das linhas traçadas, o desespero da traição de Quintino foi tanto que às 7h45 ele rompeu o movimento no quartel do 21. Não dei um só tiro contra. Todos aderiram com simpatia: foram presos todos os oficiais que estavam de serviço sem resistência. Os planos traçados na reunião que o secretário e Dante estiveram com os militares, não foram cumpridos. Quintino modificou tudo. Não fez as prisões dos grandes homens que estavam todos reunidos numa festa no teatro Carlos Gomes, que ficaram com medo de sair para a rua, que só saíram às 10h30 da noite e fugiram para uma casa onde toda hora chegavam notícias ao conhecimento de Quintino e ele fazia-se de surdo. Quando rompeu o movimento, nós, o secretário restrito, às 9h30 da noite nos reunimos para ver se a tarefa estava sendo posta em prática. Logo eu notei que não estava, mandei chamar Dante informamos o que tínhamos visto na rua, durante 1h45 de luta. Neste momento, chega o aparelho de ligação com Quintino e nos dá o informe: Quintino já estava desanimado porque a polícia estava resistindo. O povo estava na rua, os soldados do 21 com uma coragem bruta. Quando eram 24 horas da noite tínhamos mais de 3.000 mulheres e crianças em luta tomando de arranco e em 3 horas de combate tomando a praça da Detenção (há uma emenda ilegível sobre uma única perda) soltando todos os presos e ainda seguiram para o Esquadrão da Cavalaria que o fogo durou das 3 da manhã até às 7 horas. A massa e os soldados tomam o esquadrão. Com o informe do aparelho de ligação nos deu a vacilação de Quintino, o secretário resolveu que fôssemos dirigir no quartel a luta. Eram 6h da manhã de 25 (?) quando chegamos ao pé de Quintino e Elizeiel, sargento, e Guerreiro, cabo, e Agapito, sargento, os dois últimos uns heróis, aplicavam todas as diretivas mas Quintino e Lesiel (o nome correto é Eliziel) nada. Chegando nós no quartel, Quintino nos disse que estava má a situação; perguntamos por quê isto, pois só é a polícia que está resistindo? E nós animávamos ele. Tomamos diversas diretivas, armamos muitos trabalhadores que ele não queria dar armas. Chamamos 135 estivadores e mandamos para a tomada do quartel de Polícia que fez 4 horas de fogo cerrado. A massa atirava de bomba de mão no meio de fuzil e metralhadora. A tomada do quartel de polícia às 10h da manhã, expedimos grupos para ocupação dos impressos; imprimimos folhetos e mais folhetos, comícios em toda parte, distribuição de víveres para todos os cantos da cidade, tiramos um jornal com o nome LIBERDADE. Nas feiras, prendemos os cobradores de impostos e pagamos todos os vencimentos de todos os funcionários nas repartições onde se achavam eles aguardando ordens nossas. Queimamos todas as papeletas de cartórios, mesa de rendas, etc. Abatemos os bondes para funcionar a 100 réis, pão a 100 réis. Apoderamo-nos dos telégrafos, rádios, casa do governador, instalamos uma Junta Revolucionária na Vila Ceci e no outro dia 26 (?) já se estava senhor da cidade, já se seguiu tomando 7 municípios e Quintino continuava convidando-nos para abandonar-mos a luta dizendo que estávamos cercados. No dia 26 grande era a quantidade de massa na rua armados mais com arma curta e branca - os armamentos não aparecerem - cortamos mais de 500 metros de E. de Ferro de todos os setores. Esteve preso o chefe de polícia e comandante da polícia e uns oficiais do 21. - Quintino não nos quis entregar estes presos Fizemos diversas tentativas para arrancar estes para a massa, ele não quis e somente respondia “mais tarde”. Eu compreendi bem sua traição, comuniquei a todo o CR, logo separamos a junta de perto dele e então eram 4h da tarde do dia 26(?). A situação melhorou muito para a aplicação de nossas diretivas. Botamos a Junta na sua sede e entramos a agir. Quintino, vendo-se isolado por nós e a massa, nos acompanhava e os soldados do seu comando atendia mais a nós do que a ele, chegou a ponto de um cabo dizer a Quintino, este papel que ele estava fazendo dando toda a liberdade a proteção aos presos estava muito mal; ele só dizia para mim que eu estava muito afobado, que isto não era assim, que ele estava a par das leis e eu dizia a ele que no momento de uma revolução de massas as leis burguesas desapareciam. No momento em que nas massas andam mulher, criança, soldado pela rua afora, cantando os hinos da ANL e da Internacional, o povo, já está convicto de nossa vitória, parecem (aqui está incompreensível) a média (cremos que no meio dia) aparece Quintino com seu estado maior para propor a retirada de noite; resistimos porque não havia motivo para tal; dava a notícia de que Recife estava perdido, eles não acharam o nosso apoio, só tiverem apoio foi dos 3 da Junta, João Batista Galvão, Lauro Lago (1) e José Macedo, e eu então chamei Mamede e Dante e todo o CR e discutimos a traição”.


NOTA:

1 - Segundo informações prestadas por Lauro Lago, filho de Lauro Cortez Pereira do Lago, um dos dirigentes da Junta Governativa que se instalou em Natal, após a insurreição de 23 novembro de 1935, faleceu a 26 de abril de 1961, no Rio de Janeiro, onde residia desde 1945. Lauro C. P. do Lago era contabilista e durante décadas manteve o “Escritório Técnico-Comercial Ltda-ETECO”, na rua Barata Ribeiro, em Copacabana. Foi anistiado quando faltavam cinco meses para cumprir a pena, na Ilha Grande. Foi casado com Renê Barbosa Lago e Vanda Galvão do Lago (esta ainda vivia em Natal no início de 1990). Em 1935, Lauro Lago era diretor da Casa de Detenção de Natal. Um filho de Lauro C.P. do Lago do seu primeiro matrimônio é geólogo em Natal. Lauro Lago, filho do revoltoso de novembro de 35, é comerciante e reside na rua Praia de Camurupim, 8999, Conjunto Ponta Negra, em Natal.

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