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Insurreição Comunista de 1935
em Natal e Rio Grande do Norte

 

A Revolta Comunista de 1935 em Natal
Relatos de Insurreição que gerou o primeiro soviete nas Américas
Luiz Gonzaga Cortez

 

 

 

 

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10. Médico foi o comandante da revolução no agreste

O ex-prefeito de Santo Antônio do Salto da Onça, a 90 quilômetros de Natal, Lindonfo Gomes Vidal, que fugiu da cidade poucos minutos antes da chegada das tropas revolucionárias de novembro de 1935, disse que os rebeldes não administraram o município porque a população tinha fugido. “Faltou povo para eles governarem”, disse.

Já o tabelião aposentado Lourival Cavalcante da Silva, que era cafeísta, mas amigo de Lindolfo Vidal, do Partido Popular, disse que o governo revolucionário dominou Nova Cruz, Pedro Velho e Santo Antônio, sem encontrar fortes resistências. “Os rebeldes andavam com lenços encarnados nos pescoços”, afirmou Lourival, que chorou ao relatar os episódios ocorridos entre 25 e 27 de novembro de 1935, na sua cidade natal.

Durou quase três dias o “governo revolucionário popular” na região Agreste do Rio Grande do Norte, em novembro de 1935. O domínio começou na manhã do dia 25 e terminou na madrugada do dia 27, quando tropas da Polícia Militar da Paraíba invadiram a cidade de Santo Antônio do Salto da Onça, sede do ‘Comitê Revolucionário”, comandado pelo médico Orlando Azevedo, formado na Alemanha. Os revoltosos eram cafeístas “sequiosos de vingança” pela vitória eleitoral de Rafael Fernandes, o donatário da época, além de meia dúzia de comunistas e integrantes da Aliança Nacional Libertadora.

Os insurretos ocuparam as cidades Santo Antônio, Pedro Velho e Nova Cruz, sem nenhum derramamento de sangue, apesar de vários tiroteios ocorridos entre as forças policiais e os pelotões de soldados e civis liderados por Orlando Azevedo. Na época (ainda hoje continua assim), a região era dominada econômica e politicamente pelas tradicionais famílias conservadoras - os Simonetti, os Barbalho, os Azevedo, os Vidal, os Carvalho, etc. Os Azevedo eram adversários dos Barbalho. E a revolução de novembro foi uma oportunidade para um acerto de contas entre os grupos familiares-oligárquicos.

Nomeado no dia 2 de novembro de 1935 para o cargo de interventor municipal de Santo Antônio do Salto da Onça, Lindolfo Gomes Vidal, 93 anos, ainda com boa disposição física, estava na sua cidade quando rebentou o movimento revolucionário em Natal. Ao lado da mulher, Manuela Ferreira Vidal, Lindolfo Vidal, que se diz homem de muita coragem, conta o que foi o regime comunista de 35, na região de sua influência política:

“No domingo, Lulu Fagundes trouxe a notícia de que havia um movimento na capital, mas não sabia do que se tratava. Ele me pediu que eu saísse da cidade, mas eu não queria sair porque tinha a Polícia do Estado comigo pra “receber” quem chegasse. Terminei saindo de Santo Antônio para a fazenda do Jucá, do meu pai, e no meio do caminho ouvi os primeiros disparos de armas de fogo. Eram os revolucionários que estavam atacando Santo Antônio. No outro dia, 26, dormi na cada de José Domingos, na “Fazenda Malhadinha”, de onde mandei um rapaz chamado Cícero ir a Santo Antônio ver como estavam as coisas. Cícero foi e voltou com as notícias: Santo Antônio estava ocupada pelos homens de Orlando Azevedo, mas toda a população tinha fugido para as fazendas e sítios. A minha residência foi invadida e saqueada pelos soldados, que me roubaram um rifle novinho. Na casa de Gentil Garcia, vendedor de gasolina, os revoltosos levaram o combustível para os caminhões que transportavam suas tropas. Não tenho notícias de que houve mortes, mas eles deram uns tiros dentro de minha casa, que ficou imprestável. O prédio da Prefeitura ficou intacto. Eles dominaram a cidade, mas não deixaram nenhum documento de ato administrativo do “governo revolucionário”. Eu voltei no dia 30 de novembro, sábado, depois que tudo tinha voltado ao normal”, conta Lindolfo Gomes Vidal.

O chamado “governo revolucionário” de novembro de 35 na região Agreste não está registrado nas obras de Hélio Silva, João Maria Furtado, João Medeiros Filho e de qualquer outro historiador brasileiro ou estrangeiro. Não se sabe o porquê.


CONDENADO

Lindolfo Vidal, que era do Partido Popular, de José Augusto Bezerra de Medeiros, disse que os elementos cafeístas participaram da revolução para “acertar as contas” com ele. “Se eu não tivesse fugido, eles tinham me matado”. Segundo Lindolfo Vidal, que exerceu uma interventoria e quatro mandatos de prefeito de Santo Antônio, o único documento que possuía sobre os episódios de 35 foi roubado por um grupo de oficiais da Marinha, por volta de 1969, que estiveram em Santo Antônio, fazendo investigações sobre possíveis irregularidades administrativas na prefeitura local. “Ao invés de combaterem a corrupção, esse grupo de militares praticou extorsão e roubo”, disse Lindolfo. O bando era integrado pelos tenentes Jaime, Rubens e outro, cujo nome não se lembra. Mas o tal tenente Rubens se interessou por papéis de 1935 que estavam comigo e pediu-os emprestado para tirar cópias. Até hoje não me devolveu”, disse Lindolfo.


A PRISÃO E FUGA DO CHEFE

Lourival Cavalcante da Silva, 72 anos, residente em Brejinho/RN, à Rua Antônio Alves Pessoa, 822, é escrivão aposentado de uma memória extraordinária. Ele assistiu os principais acontecimentos de novembro de 35, na região Agreste do RN.

- A revolução de 35 chegou aqui como uma coisa proveniente da Aliança Social (denominação dos grupos políticos liderados por Mário Câmara, interventor, e João Café Filho, líder operário, eleito deputado federal em 1934). Muito tempo depois disseram que era uma revolução comunista. Eu não sei, só sei que quem era contra o Partido Popular, cafeísta ou não -eu era cafeísta - entrou no movimento. Os revoltosos chegaram de Natal, compraram toda gasolina de Gentil Garcip e não pagaram, seguindo para Nova Cruz, depois de darem uns tiros no quartel dos soldados da Polícia, em Santo Antônio. Era uma segunda-feira, quando o doutor Orlando Azevedo seguiu para Nova Cruz, onde as tropas sob seu comando, atacaram e dominaram o quartel da polícia. Todos os soldados foram desarmados e levados presos para Natal. Ele deu uns tiros na feira e botou o povo pra correr, acabando com a feira da cidade. A loja A Paulista foi invadida. Deixou alguns seguidores “governando” Nova Cruz e retornou para Santo Antônio, com um lenço vermelho no pescoço. Eu estava lá e vi tudo. Para voltar para Santo Antônio, peguei uma carona no pára-choque do carro do velho Rodopiando, pai do Dr. Orlando. Quando chegamos no “Riacho da Piranga”, João Saburana entregou um bilhete de Aníbal Barbalho, com o seguinte teor: “Orlando não entre na cidade que Lindolfo está impiquetado com a polícia. Não sacrifique a família”. Isso aconteceu no primeiro dia do domínio deles aqui, mais ou menos. Orlando desceu do carro e tomou outro rumo. Eu voltei para Santo Antônio, a pé, e assisti o quebra-quebra na casa de Lindolfo Vidal, que não se encontrava na cidade. Além de Orlando Azevedo, um rapaz chamado Nelson Dimas chefiava o movimento revolucionário que não governou de verdade porque não tinha gente na cidade. Era um deserto. Uma coisa que achei inédita: certo dia, às 13h, os galos cantavam nos terreiros. O quartel dos revoltosos era na casa de Manuel Fernandes, - que também tinha fugido com medo - onde hoje funciona o Primeiro Cartório de Santo Antônio. Quando souberam que a revolução tinha fracassado, os revoltosos fugiram. Na tarde de quinta-feira, chegaram 14 caminhões cheios de soldados da Polícia da Paraíba. Os soldados entraram na cidade tocando cornetas e cantando. Por conta da política local, muita gente se envolveu. Orlando Azevedo foi preso na localidade “Mão Curta”. Luiz Ciríaco e Domiciano, meu irmão, também foram presos. Orlando, que era adversário de Lindolfo Vidal, foi levado para o quartel da Polícia em Natal, de onde, dias depois, facilitaram a sua fuga para ele pegar o trem que passava atrás do quartel. Dias depois ele voltou a se preso em Pedro Velho por ordem do juiz Osvaldo Grilo. Respondeu a inquérito, foi condenado a vários anos de prisão e cumpriu parte da pena na Paraíba. Em 1942 ou 43, Orlando foi solto. Era um homem caridoso, mas se envolveu na política local e terminou assassinado em 1954, por Benedito de tal, que morreu em seguida, vingado por Zé Binga, morador do doutor Orlando. Edgar Azevedo não participou da Revolução de 35, pois estava estudando medicina no Rio de Janeiro, afirmou Lourival Cavalcante da Silva.


A MATANÇA DE CURRAIS NOVOS

Continua repercutindo a entrevista do ex-prefeito de Santana do Seridó, Seráfico Batista, publicada na última edição de O POTI, com o título “Em 35, os coronéis fugiram da luta”. Alguns leitores telefonaram para a redação para confirmar as informações prestadas por Seráfico Batista. O parelhense Jaime de Oliveira disse que “até hoje tem gente correndo com medo do tiroteio da Serra do Doutor”, e que não existiu nenhum “general” no meio dos sertanejos que ofereceram resistência aos revoltosos. Segundo Jaime de Oliveira, alguns soldados da PM foram promovidos por “atos de bravura”, sem terem disparado um tiro na Serra do Doutor.

Mas a primeira pessoa, nos últimos 50 anos, que falou a verdade sobre o episódio (1) de novembro de 35, na Serra do Doutor, foi dona Otávia Bezerra Dantas, natural de Acari, integralista, que em entrevista publicada em O POTI de 26.03.84, disse que o padre Walfredo Gurgel estava em Santa Luzia-PB e o fazendeiro e “coronel” Dinarte de Medeiros Mariz tinha viajado para Campina Grande em busca de armas e munições. Conforme declarações de Seráfico Batista e Otávia Bezerra não houve nenhum “General da Serra do Doutor”.

Na historiografia sobre os acontecimentos de novembro de 1935 no RN, apenas João Maria Furtado, na página 139 do seu livro “Vertentes”, registra a matança de revoltosos na cidade de Currais Novos. ... Narrou-me o Dr. José Bezerra de Araújo, político udenista que chegou a exercer a senatória pelo Estado e que pegou em armas contra o movimento de novembro de 1935, que, após sua derrocada, elementos do Partido Popular tiraram da cadeia de Currais Novos presos de justiça que lá se achavam e os que eram adversários políticos foram sumariamente fuzilados, depois de conduzidos a lugar ermo, fora da cidade”, escreveu João Maria Furtado, desembargador aposentado e vítima da violenta repressão policial ordenado por Rafael Fernandes. Furtado era cafeísta.

O ex-deputado estadual Segundo Saldanha, 85 anos natural de rejo do Cruz-PB, agrônomo aposentado do Ministério da Agricultura, residente em Natal, disse ao repórter que no tiroteio de Panelas (Bom Jesus) fugiu muita gente depois dos primeiros disparos. “Só ficou Adonias Galvão, que era muito gordo e não pode correr, e findou sendo preso pelos comunistas. O pessoal voltou para a Serra do Doutor, onde Dinarte fugiu para a Paraíba. Em Currais Novos, muita gente dormiu debaixo das camas, depois do tiroteio da Serra do Doutor, onde houve uma partilha de dinheiro que os comunistas deixaram por lá. Quem ficou rico foi Zé Epaminondas”, relembra Segundo Saldanha, que foi deputado estadual durante quase 20 anos.

Sobre a matança de presos da delegacia de Currais Novos, ele afirma: “O sargento José Bastos, o delegado, foi quem algemou e matou os presos”. Em 35, Segundo Saldanha, residia no Povoado Bulhões, município de Acari. Não gostava de Café Filho, mas simpatizava com Mário Câmara. Tinha horror a integralista, pois considerava o integralismo de Plínio Salgado como “um movimento verde por fora e vermelho por dentro”. A mesma opinião tinha os coronéis e os senhores de terras do Seridó do Rio Grande do Norte.


NOTA:

1 - Otávia Bezerra Dantas, João Maria Furtado, Segundo Saldanha, José Pacheco, Lindolfo Gomes Vidal, Poty Aurélio Ferreira, João Medeiros Filho e Enéas Araújo são falecidos. Em outubro de 1998, o sr. João Wanderley encontrava-se enfermo.

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