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Insurreição Comunista de 1935
em Natal e Rio Grande do Norte

 

A Revolta Comunista de 1935 em Natal
Relatos de Insurreição que gerou o primeiro soviete nas Américas
Luiz Gonzaga Cortez

 

 

 

 

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04. Giocondo quase morre com 17 facadas

A insurreição de novembro de 1935, em Natal, desenrolou-se de forma totalmente desorganizada, apesar dos poucos e pequenos saques aos estabelecimentos comerciais. Não havia coordenação logística e estratégica. Não havia comando unificado. Não havia planejamento. Não se sabia em que iria dar a revolução.

Estas informações foram prestadas pelo ex-1º cabo telegrafista do Exército, do 21º Batalhão de Caçadores, João Wanderley, industrial na área metalúrgica, aposentado, que participou do movimento militar de 35, em Natal, ao lado de Giocondo Dias e do sargento músico Quintino Clementino de Barros, natural de Serra Negra do Norte (região Seridó do RN, conterrâneo do falecido senador Dinarte Mariz, político ultraconservador).

Quase cinqüenta anos depois da revolução vermelha, mais conhecida por Novembrada ou Intentona Comunista de 35, João Wanderley, residente nas proximidades da Praia do Meio, aos 69 anos de idade, concedeu rápida entrevista ao O Poti, a fim de relembrar os fatos e deixar um depoimento para a história política do Rio Grande do Norte.

“Durante toda a revolução houve muita falta de controle. Muitos soldados ficavam atirando a esmo pelas ruas da cidade e os grupos desgarrados, sem comandos, eram muitos. Não existiam comando e disciplina revolucionária. Apesar dos grupos soltos e desagarrados, até hoje, fico admirado não ter acontecido nenhuma ofensa à honra pessoal. É verdade que ocorreram alguns pequenos saques, mas o caso da Casa da Viúva Machado, na Ribeira, não foi um saque, um roubo. Não, a loja da Viúva Machado foi o centro abastecedor de gêneros alimentícios da Revolução. Mesmo assim, eu asseguro que bastava um grupo de 20 homens, organizados, armados e de direita para abortar a revolução, tal era a desorganização. A revolução não acabou logo porque a direita não reagiu por causa da surpresa e da apatia. Se fosse hoje, claro, a coisa teria sido diferente. A direita hoje é organizada, armada, faz propaganda, se reúne, etc. Por exemplo: alguns revolucionários resolveram queimar um cartório que existia na frente do “Magestic”, no cruzamento das ruas Ulisses Caldas e Vigário Bartolomeu, na Cidade Alta. Então, o pessoal foi lá e queimou o cartório. Não sei quem mandou queimar, apesar de eu ter assistido tudo. Talvez alguém interessado em dar fim a algum ou alguns processos. Bom, o pessoal foi lá e queimou tudo. Não sobrou nada e ninguém fez nada para controlar ou apagar o incêndio. Era assim, uma desorganização total. Se estivesse aparecido uns 20 homens decididos e treinados, a coisa tinha acabado no nascedouro. O sargento Quintino, gente muito boa, caladão e culto, vivia aperreado. Baixinho, Quintino andava pra cima e pra baixo com um revólver pequenininho na cintura e um cinto sobre a túnica. Eu digo que Quintino (Ministro da Defesa da Junta Revolucionária Popular de 35 em Natal) vivia aperreado porque o pessoal vivia em cima dele, pressionando para fazer isso e aquilo e ele ficava indeciso. Na realidade, ninguém sabia o que fazer na área militar”, disse o aposentado João Wanderley.


PARTICIPAÇÃO DOS PRESOS

Wanderley entrou no Exercito com 15 anos de idade. Isso foi possível porque ele aumentou a idade para 17 anos. Entrou no Quartel do 29º BC em 1932 e foi mandado para Mato Grosso, a fim de combater a revolução constitucionalista de São Paulo. Em Mato Grosso, o efetivo do 29º BC quis se revoltar e se posicionar em favor dos paulistas. Como castigo, segundo conta Wanderley, o contingente do 29º BC foi transferido para o Amazonas, na fronteira, em virtude da guerra entre Bolívia e Paraguai, a Guerra do Chaco. Depois, o batalhão veio para Natal e no início de 1933, foi transferido para Recife, sendo substituído pelo 21º Batalhão de Caçadores, do Recife, no final de 33.

Apesar de não concordar com as afirmações de Giocondo Dias sobre a organização militar e civil durante a insurreição de 23 a 27 de novembro de 35, em Natal, João Wanderley assegura que o ambiente político naqueles anos era de “conspiração permanente”.

Mas a revolução de 35 não foi feita em nome do comunismo ou do socialismo. A Aliança Nacional Libertadora, que tinha um hino, assim como os integralistas tinham o seu hino, foi a bandeira de luta da revolução. Em Natal, todo o efetivo militar do 21º BC estava ligado a ANL, aliado aos cafeístas, que estavam debaixo politicamente. A demissão de 300 guardas-civis pelo governador Rafael Fernandes foi o estopim da revolução. É claro que o pessoal militar queria fazer a revolução, à exceção dos oficiais. Por isso, eu sempre digo que a revolução de 35 foi uma revolução de cabos.

Todos os cabos do Exército participaram da revolução inclusive eu, que era rádio-telegrafista. Sobre a soltura dos presos comuns da Casa de Detenção, onde hoje está o Centro de Turismo, já escreveram muita coisa, mas eu asseguro para você que esses presos participaram da revolução com toda garra. Os presos tiveram uma atuação decisiva. Centenas de presos foram soltos e, ao invés de irem para suas casas, para juntos de seus familiares ou “caírem do mundo”, eles foram lutar contra o pessoal da Polícia Militar, no quartel, na rua da Salgadeira (hoje rua da Misericórdia, Cidade Alta, onde fica a Casa do Estudante do RN). Os presos lutaram corajosamente e ficaram aqui até o fim da Revolução, isto é, ao final da tarde de terça-feira, dia 26, quando começou a debandada geral. No dia 27, não tinha mais ninguém. Como não tinha mais nenhum dirigente revolucionário em Natal, os presos resolveram “cair no mundo”, afirmou João Wanderley.


A PRISÃO VIROU ACADEMIA

Ele disse que a sua prisão, em virtude de sua participação na revolução como rádio-telegrafista, ocorreu quando estava completando 17 anos de idade (no papel, sua idade era 19 anos), “O 21º BC era comandando por um oficial gaúcho, grandalhão e bonachão. Um dia depois da revolução, eu fui preso no quartel. O oficial chegou para mim e perguntou: “Mas, rapaz, você foi um dos tais?”. Eu respondi na hora: “Fui revolucionário”. Me prenderam na hora e jogaram numa alvarenga que estava no porto, o Butiá, onde passamos o dia sob o sol quente. Depois fomos para Recife onde ficamos trancafiados numa prisão imunda, a Casa de Detenção. Lá, vi, dezenas de vezes, o sargento Quintino deitado numa rede, se balançando e calado. Passava dias sem dizer uma palavra. A prisão em Recife foi uma verdadeira escola, pois quem não era e queria, virou comunista. Quem era comunista e não queria mais saber de comunismo, abandonou tudo e virou anticomunista. A Casa de Detenção do Recife foi transformada uma verdadeira academia de marxismo. Por incrível que pareça, nas celas se ministravam verdadeiros cursos de marxismo. Tinha professor e tudo o que uma academia tem. Mas isso aconteceu depois que a repressão diminuiu. Lá, a gente ficava sabendo de tudo o que se passava no mundo. Mas nunca soubemos quem foi o agente do Partido Comunista que veio do Rio de Janeiro para dar a ordem de deflagração da revolução em Natal. O PCB chegou a fazer um verdadeiro inquérito na Casa de Detenção do Recife para descobrir quem foi esse homem que chegou em Natal, dando ordens para todo mundo, que precipitou os acontecimentos. Naquele tempo, o partido era tão frágil, o pessoal era tão verde, imaturo, que todo mundo não desconfiou desse homem que chegou dando ordens à torto e a direito. No final do inquérito, nada foi elucidado. Dizem que foi a polícia quem mandou esse homem, mas ainda é um mistério no Partido Comunista, do qual nunca fui membro. Tudo isso soube na prisão do Recife, porque eu ficava ouvindo e participando das conversas dos comunistas presos. Em tempo: Luiz Cleodon Medeiros, natural de Currais Novos/RN, revolucionário em 1935, em entrevista dada em 29 de agosto de 1987, disse que conheceu dois presos na cadeia de Recife, de nacionalidade russa, conhecidos por Aarão Glorenquem e Jacó Clingó. Para ele, os principais chefes do movimento foram Quintino, Giocondo, cabos Valverde, Mourão, Guerra e Ponte, além do sargento Wanderley.

Cleodon disse que o disparo que atingiu Giocondo foi acidental e o seu autor foi um recruta, imediatamente substituído por Quintino. O tiroteio na serra do Doutor, segundo Cleodon, foi na quarta-feira, dia 27. Soldado do 21 BC, participou do ataque ao Esquadrão de Cavalaria, juntamente com a soldadesca "desnorteada, sem liderança, dando tiros na rua" Disse ainda que um grupo de soldados, numa estrada de Jundiaí, município de Macaíba, esperou os sertanejos que vinham de Panelas, mas que eles não apareceram.

Sobre o tenente Rangel: por onde ia passando, levava o dinheiro das prefeituras. Tenente Roberto, do 21 BC: foi contra a revolta e ganhou a simpatia dos soldados. Luiz Albino Moreira, Abel, João Cícero, Tenente Bezerra, foram os primeiros presos no quartel do 21 BC quando estourou a rebelião. "Eles iam chegando e a gente prendendo",disse.

Foram muito atuantes na revolta, segundo Cleodon: os sargentos José, Waldemar e Eliziel Diniz Henriques, do 21 BC. O sargento Barradas era do movimento e fugiu. Preso, foi orientado a denunciar os companheiros. O interrogador principal foi o coronel Portela. "Ninguém sabia nada de comunismo, o que vim conhecer nas aulas dadas pelo Partido, na cadeia de Recife. Diziam que a revolução era nacional, trocaram a senha e deu no que deu, pois era para estourar no dia 27. O cabo Walfredo, interrogado, disse que era coisa de comunista. Idem o cabo Farias. A causa principal da revolta foi a desincorporação dos cabos e soldados na véspera. Os chefes dos cinquenta rebeldes que foram para o Seridó, com o objetivo de dominar a região, foram os sargentos Aquino e Santos, mas o baluarte da revolução foi o segundo cabo Antonio Andrade (falecido em meados de 1998), conhecido por Totinha. Ele foi preso, sofreu muito, mas foi anistiado e retornou ao Exército como sargento. Totinha foi preso comigo no Recife. Eu tinha 3 meses de caserna, era um matuto", afirmou Cleodon. "Os civis fizeram a revolta, os militares deram a sustentação".

Ao autor, Antonio Andrade, que não quis se aprofundar no assunto, disse que se os comunistas tivessem sido os vitoriosos, o seu herói era o soldado Cândido Mariano das Neves, que morreu no assédio ao quartel da Polícia Militar. "Foi uma luta de compadres, pois a grande maioria dos recrutas do BPM, tinha saído do 21 BC há quatro meses. Luiz Gonzaga, que era doente mental, foi morto por Sizenando, um policial civil, sem necessidade, nos mangues", disse Antonio Andrade. Em fevereiro de 1997, ele recusou-se a dar entrevista a uma equipe de televisão da GNT para uma reportagem organizada por Fernando Morais.

Antonio Andrade revelou que o sargento Abel foi quem manejou a metralhadora na subida da Serra do Doutor e, após 10 rajadas, botou os civis seridoenses para correr. O sargento Cantídio também atirou com metralhadora no mesmo local e ficou perturbado depois do fracasso da revolta comunista. Em Natal, tempos depois, matou a sogra e a esposa.


NAVIOS MEXICANOS (1)

João Wanderley afirmou, ainda, que o cabo Giocondo Dias, seu companheiro e amigo de caserna, era um homem destemido e líder da revolução de 35. “Chequei a ficar pálido e lívido quando vi Giocondo com a cabeça enfaixada. Causou muita preocupação o ferimento em Giocondo, pois ele era um dos cabeças do movimento”, relembra Wanderley.

Sobre os navios mexicanos surtos no Rio Potengi, perto do porto de Natal durante a Revolução de 35, nos quais alguns auxiliares do Governador Rafael Fernandes se refugiaram, além de vários oficiais do Exército, João Wanderley disse que se lembra dos oficiais da Marinha Mexicana que procuraram comida na Vila Cicinato, sede da Junta Revolucionária Popular. (2)

Os oficiais desceram dos seus navios e vieram comprar comida. O governo da revolução mandou que eles tirassem alimentos na Casa Machado. Eles tiraram os alimentos que precisavam e depois perguntaram: “quanto paga? quanto paga?”. Quintino respondeu: “não paga nada. Querem mais? Se quiserem, podem levar mais”. Eles ficaram alegres e foram embora para os seus três navios, pequenos e branquinhos. Não eram cinco navios, eram três, afirma João Wanderley, sargento da reserva não remunerada do Exército.


AS FACADAS EM GIOCONDO

Na casa de Detenção do Recife chegou a informação de que uma mulher tentou transar com ele. Giocondo recusou porque estava sendo obsequiado pelo dono da fazenda. Ela, então, acusou Giocondo de tentar seduzi-la. Mas Giocondo sempre negou essa versão. Eu acredito na versão de Giocondo porque ele sempre foi um rapaz sincero, honesto e corajoso. Acho que ele não seria capaz de trair um amigo. Tudo isso eu soube na prisão através de membros do Partido Comunista. Pessoalmente, não conversei com Giocondo sobre esse fato, pois a última vez que vi Giocondo foi durante a revolução de 35, disse João Wanderley.

Ele confirma que Giocondo recebeu 17 cutiladas de faca e punhal em diversas parte do corpo, desferidas por Paulo Teixeira, um fazendeiro residente no município de Lages-RN (hoje Jardim de Angicos), na localidade em que está encravada a Fazenda Primavera, que pertenceu a Alzira Soriano, a primeira prefeita da América do Sul. (3).

Ao contrário do que noticiamos em outra reportagem o cabo Giocondo Dias não foi salvo pelo sargento Genésio Cabral (existia um Genésio Cabral de Lima, na Polícia Militar), mas por Genésio Cabral de Macedo.

O ‘salvador” de Giocondo não era da PM. Era comerciante. Segundo informações prestadas por Fátima Cabral, filha de Genésio Cabral de Macedo, o seu pai nasceu no dia 28 de agosto de 1905 e faleceu a 26 de janeiro de 1976. Passou a infância em Touros e Santana do Matos, onde negociou com algodão. Viajava muito pelos municípios de Currais Novos, Santana do Matos, Lages e Angicos, como gerente-sócio da firma “João Câmara Indústria e Comércio S.A.”.

Genésio Cabral de Macedo foi juiz Municipal e vice-prefeito do distrito de São Romão (F. Pedroza). Foi presidente do BANDERN no governo José Varela. Deputado Estadual em duas legislaturas, dirigentes do PSD e 1º Secretário da Assembléia Legislativa. Secretário da Fazenda no governo Dinarte Mariz, aposentando-se como Superintendente de Fiscalização (Aluízio Alves colocou-o em disponibilidade). Aposentado, ainda foi prefeito de São Rafael e Santana do Matos.

Segundo a filha de Genésio C. de Macedo, é verdade que Giocondo Dias, homiziado na Fazenda Primavera, pelo seu amigo Paulo Teixeira, recebeu 18 cutiladas. (4) O fato foi presenciado por Nezinho Procópio, Capitão João Pedro, delegado de Polícia de Lages e autor da prisão de Giocondo Dias. “Giocondo não foi morto porque meu pai chegou na hora h. Giocondo estava amarrado numa árvore e sendo esfaqueado pelo amigo furioso”, contou Fátima. Ela disse ao repórter que essas informações foram transmitidas pelos seus pais. O desembargador aposentado João Maria Furtado, no seu livro “Vertentes” registra superficialmente esse evento. O médico Onofre Lopes da Silva foi quem tratou dos ferimentos de Giocondo. O agressor, Paulo Teixeira, autor das facadas, andou armado, em Macaíba, ao lado de Giocondo Dias, Cabo do Exército, durante a insurreição, segundo J. M. Furtado (“Vertentes, página 142). (5)


NOTAS:

1 - Os navios mexicanos, “avisos”, eram similares, em tamanho às atuais corvetas. Tinham reduzidas tripulações.

2 - A casa da Vila Ciccinato, antiga residência oficial do Governador do Estado, localizava-se na rua Trairi, defronte ao Palácio dos Esportes “Djalma Maranhão”. Na década de 70 funcionou como sede da Secretaria da Educação e Cultura do Estado e, mais tarde, Centro de Ensino Supletivo e Centro de Educação Especial (superdotados).

3 - A jornalista Heloísa Galvão, que integrou o Diário de Natal, pesquisou sobre Alzira Soriano, segundo notícia publicada na edição de 05.08.1987 e publicou livro em Natal sobre a primeira prefeita eleita.

4 - Paulo Teixeira, irmão de Luíza Alzira Teixeira de Vasconcelos Soriano, em entrevista exclusiva (única) ao jornalista Carlos Lyra (Memória Viva, Nossa Editora, Natal, 1987, p. 196 e seguintes, conta que Giocondo Dias e o cabo Adalberto efetuaram a transferência dos auxiliares do governador Rafael Fernandes para o navio mexicano G-24, Alzira Soriano convenceu Paulo a abrigar Giocondo na Fazenda Primavera, município de Lages, hoje Jardim de Angicos. Paulo Teixeira desmente que tenha amarrado e dado 17 facadas em Giocondo. Segundo informações prestadas por familiares de P. Teixeira, Giocondo era amigo dele, inclusive bebiam juntos nos bares de Natal, enquanto Guiomar Matos, irmã do então deputado Pedro Matos, vivia na Fazenda Primavera.

Eis trecho da entrevista de Paulo Teixeira a Carlos Lyra:

“PAULO TEIXEIRA - Não, não o conhecia. Houve esse entendimento da família de Luís Júlio com Alzira, e levaram Giocondo para a minha fazenda. Bem, depois de algum tempo, alguns dias, quando chegou em casa (eu tinha uma turma de muita confiança, na fazenda), começaram a me contar umas tantas coisas. Então, pedi:

- Bem, eu sou um homem de negócio, vivo fora de casa, vocês dêem cobertura a isso.

Até quem um dia, um dos moradores me disse:

- “Seu” Paulo, tá havendo isso, isso... (entendimentos dele com minha mulher).

E então perguntei a ela, que já sabia das minhas atitudes, que eram bastante duras, e Guiomar me respondeu:

- Não! Ele procura me conquistar...

Mas, eu que sou um homem que não acredita nessas coisas, sempre tenho desconfiança de mulher, fui a ele, que já estava preso, atrás de fugir.

- Você não foge! Agora, você vai me contar essa história direito.

E ele, então começou a tentar me levar na conversa:

- Giocondo, eu não sou menino! Você sabe como eu sou, minhas atitudes como são.

Isso durou horas, essa conversa com ele. Ai, tomei a atitude:

- Você me perdoe, mas, agora, você vai confessar o que houve! Então, dei um golpe de punhal. Não para matar.

Queria, apenas a confissão dele.

Carlos Lyra - Quantos golpes?

P. Teixeira - Uns quatro golpes?

Carlos Lyra - Onde?

P. Teixeira - Um no rosto (maçã do rosto), um debaixo do braço (axila), esse foi o mais grave, e outros pela barriga. Tudo isso, beliscão, como se diz: beliscão para exigir confissão. Mas, como ele não queria de maneira nenhuma... apliquei.. esse foi o mais grave! - o último na barriga. Ele, então:

- Não me mate, que eu confesso! Aí, chamei uns três cabras de testemunha, e ele contou toda a história. Era o que eu queria: disse que estava sendo conquistado. Nisso, gritam e me chamam: alarme na fazenda, que mamãe estava morrendo, essas coisas... Corro até onde estava minha mãe, dei uma injeção nela, e saí dizendo:

- Agora, vou tomar minha atitude. Num momento desse, eu estava louco, mas, minha mulher já tinha fugido para a casa de um morador. Eu sabia que ela estava lá. Procurei, mas ela, nesse meio tempo (parece que o morador facilitou a ida), pegou um caminhão na estrada e fugiu. E, finalmente, ficou nisso. No outro dia, minha mãe nervosa, eu disse: - Passe um telegrama ao tenente João Pedro, que é autoridade, para vir buscar esse homem.
Ausentei-me de casa. Então, chegou um carro com João Pedro, Nezinho Procópio, Olinto Procópio, Genésio Cabral de Macedo e levaram o homem. O negócio foi este.

João Medeiros - E essa história de você ter amarrado o homem?

P. Teixeira - Mentira! É uma mentira. Eu não amarrei o homem, e nem ninguém salvou ele. A questão é que tomei a atitude, porque queria a confissão dele. Logo que houve a confissão, eu precisava que ele vivesse. Minha honra estava em jogo e eu precisava de uma defesa. Depois, fui acusado, respondi júri, e fui absolvido. Meu advogado foi Manoel Varela, que foi, também, que me convenceu, lá, para fazer um desquite amigável, porque no processo eu estava com toda a razão”.

5 - No seu livro “Vertentes” Gráfica Olímpica Editora Ltda, 1976, Rio de Janeiro, página 141-142) o desembargador aposentado João Maria Furtado, conta o seguinte: “Em Macaíba, por exemplo, Paulo Teixeira, populista de prestígio em Lages, onde era proprietário, entrou à frente dos revoltosos que estabeleceram num salão térreo de um sobrado seu quartel general. E em cima permaneceu João Severiano da Câmara, amigo de Paulo Teixeira, que saíra de Baixa-Verde. Ficou resguardado perfeitamente. E como, quando dos depoimentos tomados ali, apareceu o nome de Paulo Teixeira, o escrivão Cornélio Leite, propositadamente (já tinha uma péssima letra) a fez tão ilegível que não pode depois serem decifrados muitos trechos do que fora escrito.

Tantos envolvimentos teve esse populista Paulo Teixeira na revolta (nada sofreu e nem seu nome sequer apareceu em processo) que levou um dos principais elementos militares revoltosos para uma de suas fazendas em Lages, o cabo Giocondo, depois militante ativo do Partido Comunista Brasileiro. Lá ficou ele ao abrigo de prisão durante mais de um ano. Posteriormente, porém, se desavindo com o proprietário, depois de uma tentativa de morte em que o protegido foi ferido a punhal, foi entregue à Polícia”.

Na página 160, João Maria Furtado, registra mais o seguinte: “Tenho, desde 1935, com dados da época e não pelo registro de memória, uma lista desses “populistas”- adeptos do Partido Popular - que elegeu o governador Rafael Fernandes, com pormenorização de fatos e circunstâncias elucidativas da participação de cada um na revolta vermelha naquele ano. Com relação, por exemplo, a Paulo Teixeira, além do que foi narrado anteriormente, ele andou de metralhadora em punho, juntamente com o cabo Giocondo, do 21º BC, em Macaíba, ambos se havendo hospedado na residência de Mesquita Filho, chefe político populista ali”.

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