Capitulo
IV
Análise dos processos do Tribunal
de Segurança Nacional relativos ao
Rio Grande do Norte
4.1
- Processos relativos a Natal
Foram 16 Processos: os de
números 2, 3,4,6, 7,8,9,10,,15,18
76, 163, 233, 450, 451 e 492, com um total
de 695 indiciados. A razão para quetvessem
esses números se devia ao fato de
que, a cada denúncia, abria-se um
novo processo e como eram relativos a três
Estados, na medida em que iam surgindo recebiam
uma numeração. Isso significa
dizer que o processo n. 492 por exemplo,
o ultimo relativo ao Rio Grande do Norte,
foi aberto meses após o de No..2
em função de alguma evidência
ou denúncia nos interrogatórios
ou resultado de investigações.
Dos indiciados em Natal,
46 não consta a profissão
e destes apenas 6 foram condenados .Do total
geral, 154 foram condenados.
Os processos mais importantes
são os de n. 2 (o n..l é o
de Luis Carlos Prestes, Antonio Maciel Bonfim,
os assessores da Internacional Comunista,etc
e é o único que não
está no Arquivo Nacional) e o de
n. 76, relativo exclusivamente aos militares
do 21 Batalhão de caçadores..
No primeiro, são 347 indiciados,
dos quais l2 não consta a profissão
e o segundo com um total de 152 indiciados
(ressalte-se que alguns militares do 21
BC foram indiciados também em outros
processos)
A maioria dos indiciados
é constituída de soldados
do 21 BC(153)dos quais 16 foram condenados(11
a 8 anos de prisão, 2 a 2 anos e
6 meses, 1 a 5 anos e 9 meses, 1 a 5 anos
e 1 a 2 anos) , Estivadores com um total
de 125, dos quais 11 foram condenados(6
a 6 anos e 6 meses de prisão, 3 a
5 anos ,1 a 6 anos e 6 meses e 1 a 8 anos),
Agricultores com 89 indiciados e 27 condenados(12
dos quais a 5 anos de prisão), funcionários
públicos com 46 indiciados(15 dos
quais condenados, com penas variado de 1
ano e 9 meses(2) a 10 anos de prisão(3),
comerciantes com 44 indiciados ,dos quais
13 foram condenados e motoristas (33 indiciados,
sendo 10 condenados(um dos quais a maior
pena de todos: 33 anos de prisão)
Do total de indiciados
em Natal, 202 são militares do 21
BC (incluidos 4 oficiais que foram indiciados
algum tempo depois - processo n. 233 - entre
eles o ex-interventor e ex-comandante da
policia militar capitão Aluisio Moura,
mas quando julgados, foram considerados
inocentes).Presos, são enviados de
navio (Butiá) para Recife onde ficam
aguardando julgamento por quase dois anos.
Dos 201 , 153 são soldados, 32 são
cabos dos quais 9 são condenados
e 17 sargentos sendo que 6 são condenados.
São portanto 31 militares que foram
condenados com penas variando de 1 a 10
anos de prisão(estas ultimas para
as lideranças da insurreição,
como os sargentos Quintino Clementino de
Barros e Eliziel Diniz). O que distingue
o caso de Natal em relação
a Recife e Rio de Janeiro é que,
como mostra a relação dos
indiciados, presos e condenados, não
há oficiais. A insurreição
foi organizada e dirigida por cabos e sargentos,
sendo que alguns soldados iriam se destacar,como
são os casos de Raimundo Francisco
de Lima(“Tarol”) e Manoel Albuquerque
Filho, que serão condenados a 8 anos
de prisão.
Quanto aos demais militares
indiciados, há 9 marinheiros, que
foram considerados inocentes (o processo
foi remetido ao Ministério da Marinha,
que o arquivou por falta de provas) e 37
integrantes da policia militar: 23 oficiais,
07 sargentos, 04 cabos e 03 soldados. Quando
julgados, foram condenados 04 oficiais,
0l soldado e 01 sargento.
O que explica o indiciamento
de um numero tão grande de oficiais,
já que uma das características
distitivas da insurreição
em Natal é justamente não
contar com a participação
de oficiais? Conforme relatamos, havia nos
anos que antecederam a insurreição,
um envolvimento muito grande de militares
graduados na vida política do Estado.
De um lado, a oficialidade do 21 Batalhão
de Caçadores(parte dela) que se colocou
ostensivamente contra o interventor Mário
Câmara, posicionando-se em favor do
Partido Popular, e de outro, os oficiais
da policia militar, em especial seu comandante,
nomeado pelo interventor, em defesa deste.
Não por acaso um dos primeiros atos
do governador Rafael Fernandes ao assumir
em 29 de outubro de 1935 é mudar
a oficialidade da policia militar, mandando
chamar à ativa todos aqueles que
havia sido colocado na reserva por Mário
Câmara e inverte o procedimento, colocando
na reserva àqueles mais fiéis
ao ex-interventor. Isso obviamente gerou
descontentamentos. Menos de um mês
depois, eclode a insurreição
e muitos desses oficiais foram vistos no
quartel do 21 Batalhão de Caçadores.
Alguns aderem , como é o caso do
tenente Moisés da Costa Pereira,
que ficou responsável pelo setor
de abastecimento do quartel (no processo,
o tenente é acusado de ser comunista
e junta-se denúncias nesse sentido
quando de sua estada em Mossoró comandando
o quartel da policia militar,pouco tempo
antes) e do tenente Mário Cabral
cuja participação já
foi relatada.
Outro oficial indiciado
e condenado foi o tenente João Antunes
Quirino Mello. Inativo, por ocasião
da insurreição em Natal residia
na praia de Touros. Depois da derrota da
insurreição em Natal foi acusado,
junto com seu filho, Waldemar Antunes de
no dia 25 de novembro de 1935 arrombar as
portas da cadeia pública de Touros,
retirando armas e munições
e assim sendo “... se achava em sintonia
com o movimento subversivo de Natal”.
É condenado a 6 anos e 6 meses de
prisão e seu filho, absolvido.
Os demais oficiais, foram
inocentados por falta de provas. Provavelmente
foram indiciados em razão das perseguições,
tanto dentro como fora dos quarteis e eram
basicamente adversários políticos
do então governador.
Sobre os estivadores, são
indiciados todos os filiados ao sindicato
União dos Estivadores. Viterbino
Cruz, que havia sido expulso do sindicato
sob a acusação de desfalques
no cofre da entidade e tentava formar um
sindicato paralelo(cumprindo todos os rituais
da burocracia do Ministério do Trabalho,
ao contrário da União dos
Estivadores que por isso mesmo era conhecido
como “Estiva Livre”) entrega
à policia uma listagem com 138 nomes
que teriam “ participado ativamente
do movimento subversivo”. ( ).Derrotada
e insurreição, depõem
armas na manhã do dia 27 de novembro,
no bairro da ribeira. Quando ocorrem os
julgamentos, em 1938, apenas 11 são
condenados pelo Tribunal de Segurança
Nacional, entre eles o presidente e o vice
do sindicato, João Francisco Gregório
e José Maria dos Santos, ambos militantes
do partido comunista. No relatório
do procurador da República Carlos
Gomes de Freitas, relativo ao Rio Grande
do Norte, ele diz “uma (...)célula
comunista simulada sob a organização
do sindicato dos estivadores, muito anteriormente
ao movimento de novembro de 1935 se incorpora
às doutrinas e compromissos do comunismo
propagado pela ANL”. João Francisco
Gregório é condenado a 10
anos de prisão. Muito respeitado
como líder, em seu processo é
anexado um abaixo-assinado de dezenas de
moradores do bairro da ribeira - onde ele
morav - inocentando-o. (anexo 5 e 6)
Com relação
aos motoristas . Eram todos motoristas de
taxi em Natal. Entre eles atuava uma célula
comunista constituída por Lauro Teixeira,
João”pretinho”e Epifânio
Guilhermino(que recebe a maior pena de todos
os indiciados e presos: 33 anos em função
do assassinato de Otacilio Werneck). No
início de 1935 eles se destacaram
por liderarem um movimento grevista, que
paralisou o movimento de taxi na cidade
por alguns dias. Quando ocorre a insurreição
no 21 BC e a subsequente vitória,
muitos carros foram requisitados (não
haviam muitos ). No caso dos taxi, os próprios
motoristas se colocaram(ou foram forçados
pelas circunstâncias) à disposição
da junta e, desta forma, prestaram alguns
serviços razão pela qual foram
condenados. Os que comprovadamenbte apenas
usaram seus carros por temor e não
por adesão consciente, foram inocentados
quando houve o julgamento.
Muitos processos foram
sendo instaurados à medida em que
chegavam denúncias. Algumas completamente
infundadas(o papel dos delatores se constitue
um triste capítulo dos acontecimentos
no Rio Grande do Norte. Aproveitou-se para
denunciar desafetos pessoais, inimigos políticos,etc).
O processo n.492 por exemplo, se refere
a dois russos que residiam há algum
tempo em Natal, onde tinham uma pequena
fábrica de biscoitos. Com a derrota
da insurreição, sem que tenham
tido qualquer participação,
são denunciados... por serem russos!
Depois de terem causado inúmeros
transtornos aos acusados, o processo ,sem
qualquer fundamento, foi arquivado.Outro
foi aberto em função de ter
sido encontrada, por acaso, algumas armas
enterradas no quintal de uma casa. São
mais de 300 páginas onde são
descritas detalhadamente as armas, ouvidas
dezenas de testemunhas,vizinhos,etc e conclui-se
pelo ser arquivamento...
Do total de l.039 indiciados
no Rio Grande do Norte, 20 eram mulheres
e apenas uma foi condenada, a revelia, a
5 anos de prisão: Amélia Reginaldo.
Filha de Raimundo Reginaldo(também
condenado à revelia) governativa.
( No inicio de 1935,Juntamente com Leonila
Felix - esposa de Epifânio Guilhermino
- tinha ajudado a fundar em Natal uma seção
da União Feminina Brasileira criada
sob orientação do partido
comunista).
Como já foi dito,
os que foram presos ficaram quase dois anos
aguardando a formação de culpa.
Muitos também eram presos, soltos,
presos novamente, soltos,etc. É o
caso,por exemplo de Lindolfo Coutinho :
preso pela primeira vez no dia 27 de novembro
de 1935 é posto em liberdade no dia
5 de março de 1936. É preso
novamente no dia 8 de agosto de l936 e solto
em 15 de junho de 1936. É preso de
novo em 16 de setembro de 1937 e solto no
dia 31 de dezembro de 1937. No dia 26 de
setembro de 1938 foi condenado a 5 anos
de reclusão e é preso 4 dias
depois. O mesmo ocorre com Lourenço
Ferreira Lima, condenado também nesta
mesma seção do Tribunal de
Segurança Nacional a 5 anos de reclusão.
Muitos foram indiciados
duas ou três vezes, em processos diferentes,
enquadrados nos mesmos crimes. É
o caso ,entre outros, de Eliziel Diniz,
sargento do 21 BC e uma das principais lideranças
da insurreição. Foi condenado
a 10 anos de prisão no processo n.2
e a 6 anos e 6 meses no processo n. 4. No
dia 30 de abril de 1944 solicita ao presidente
do Tribunal de Segurança Nacional
a unificação das penas “de
acordo com o artigo 66, parágrafo
2o. da lei penas” e tem seu pedido
deferido, ficando com a pena de 11 anos
e 8 meses de prisão.
Condenados com base na
lei de 4 de abril de l935 muitos, ao cumprirem
2/3 das penas solicitam livramento condicional,
mas poucos conseguem. o presidente do Tribunal
de Segurança Nacional ao julgar um
pedido dos presos Arari Silva, Carlos Winter,
Aristides Felinto e Lourenço Ferreira
Lima, que já haviam cumprido os 2/3
exigidos por lei para justificar a solicitação,
indefere “tendo como base o artigo
22 do decreto-lei 431 de 18 de maio de 1938
que indefere taxativamente a concessão
de livramento condicional a criminosos políticos
(...) sejam quais forem os fundamentos de
constituído jurídico do “livramento
condicional”a sua finalidade indiscutível
é a concessão de liberdade
dentro de certas normas legais ao condenado
que houver, no cumprimento da pena, revelado
sinais de regeneração, de
modo a poder voltar, sem oferecer maior
perigo, ao convivio social que se acha agregado
” e por esses critérios, até
então não haviam revelado
tais “sinais de regeneração”.
O único que consegue é Lauro
Lago que havia sido condenado a 10 anos
de prisão. No dia 4 de abril de 1942
solicita e obtém livramento condicional,
sendo anexado ao seu pedido uma declaração
do diretor da penitenciária na qual
consta que o mesmo teria um exemplar comportamento
e estava “completamente regenerado”.
Houve casos de presos que,
mesmo depois de terem cumprido a pena, como
Carlos Winter e Aristides Felinto, tiveram
suas saídas proteladas por vários
meses.
Notas
48 - No
processo No. 2 do Tribunal de Segurança
Nacional não consta a profissão
de todos os indiciados. Dos que constam,
há 125 estivadores. É possível
que os 138 tenham sido indiciados.
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