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Insurreição
Comunista de 1935
em
Natal e Rio Grande do Norte
A
Insurreição Comunista de 1935 –
Natal, o primeiro Ato da Tragédia
Homero de Oliveira Costa
Capítulo
I
Algumas considerações sobre
as relações entre o partido
comunista do Brasil e a III Internacional
Comunista
1.3 - O partido
comunista do Brasil l930-l935
A
trajetória do partido comunista do
Brasil, no período comprendido entre
l930 a l935 está feita (6).
Para os fins deste trabalho,destacaria apenas
alguns aspectos:
l. O período que vai de l930 até
julho de l934, quando ocorre a primeira
conferência nacional do partido comunista
do Brasil, pode ser considerada como os
anos de radicalismo obreirista e do ultra-esquerdismo
iniciados com o VI congresso. É o
auge do secterismo: os intelectuais são
afastados, não existindo na direção
do partido nenhum dos seus fundadores. Há
também um rigoroso combate ao prestismo
“e suas influências pequeno-burguesas”;
2. É um período que vai se
caracterizar por constantes mudanças
na direção do partido, nada
menos do que 08 secretários-gerais
em quatro anos(na primeira conferência,
em julho de l934, é eleito Antonio
Maciel Bonfim, o “Miranda” que
em 1932 tivera sua inscrição
rejeitada no partido por se tratar de alguém
ligado a Prestes - sargento do exército
, havia pertencido a Liga de Ação
Revolucionária);
3. Em agosto de l934 Prestes é aceito
pelo partido, por imposição
da III Internacional comunista(já
era membro do COMITERN);
4. Com a aceitação de Prestes
e Antonio Maciel Bonfim, há uma entrada
significativa de militares no partido, assumindo
posições de destaque na hierarquia
interna.
Isso vai significar uma mudança substancial
na composição social do partido.
E para Leôncio Martins Rodrigues essas
modificações vão ser
o fator determinante na opção
pela via insurrecional e das características
de “quartelada”que o levante
de novembro de 1935 iria adquirir, refletindo
a influência tenentista “resultante
da entrada da jovem oficialidade no interior
de um partido comunista inexperiente”
e complementa: “ na hipótese
de que o PC brasileiro fosse um partido
com predominância de trabalhadores
fabris, pensamos que uma eventual radicalização
de sua prática política não
estaria excluída. Porém, nesse
caso, mais provavelmente, ela deveria levar
a ocupação de fábricas,
destruição de máquinas,
greves, etc mas não a quartelada”(Rodrigues,1981,p.370).
No entanto, como mostra Paulo Sérgio
Pinheiro a perspectiva insurrecional antecede
não apenas a entrada dos militares
no partido, como correspondia a antigas
tendência no âmbito da III internacional
comunista (Pinheiro,1987,p.637-638)
5. No ano de l934 estava marcada a realização
em Moscou do VII congresso da internacional
comunista, mas não pôde ser
realizado, tendo sido adiado para agosto
de l935. Mas como os representantes da América
Latina já estavam a caminho, aproveitou-se
a presença deles em Moscou e no mês
de outubro foi realizada a III conferência
dos partidos comunistas latino-americanos
e do Caribe. Esta conferência foi
importante para há versões
de que foi nela em que se decidiu a respeito
da insurreição no Brasil.
É o caso de Forster Dulles “...os
planos para uma insurreição
no Brasil foram traçados em Moscou,
em l934, no curso de reuniões a que
estiveram presentes uns poucos comunistas
brasileiros e membros da cúpula do
COMITERN(terceira internacional)”(Dulles,1985,p.13).
e Eudóxio Ravines, na época
dirigente do partido comunista do Peru e
presente a reunião. Num livro de
memórias, detalha a sua participação.
Segundo Ravines, estavam presentes representantes
dos partidos comunistas da Argentina, México,
Uruguai Peru, Chile e Brasil.- que estava
sendo representado por Luis Carlos Prestes
- que já residia em Moscou há
alguns anos - e”da Silva”, Antonio
Maciel Bonfim, além de dirigentes
da Internacional(entre outros, Guralski,
Motilev, Dimitrov, Manuilsky, Kuusinen).
Quando foi discutida especificamente as
estratégias que os partidos comunistas
latino-americanos deveriam adotar dentro
do novo contexto internacional(crescimento
do nazi-fascismo) as discussões se
acirraram e surgiram, duas posições
polarizadas: uma de Manuilski, que defendia
a insurreição armada e outra
de George Dimitrov, dirigente do PC Búlgaro,
que defendia a constituição
de frentes populares. Com a divergência
de posições, resolvem fazer
um acordo, levando em conta os informes
dos representantes dos partidos e ficou
decidido que para o Chile a estratégia
mais adequada era a constituição
de frentes populares, enquanto que no Brasil
era a insurreição armada.
(Ravines,1971, p. 145-146). Leôncio
Martins Rodrigues ao analisar esta questão
diz “aparentemente na transição
da tática do III período para
o de frentes populares, a alta cúpula
da internacional comunista estava dividida
e cedeu diante das opiniões dos partidos
de um continente sobre o qual tinha poucas
informações. Assim optou pela
tática de frentes populares no Chile
e levante armado no Brasil, em função
das posições assumidas pelos
partidos latino-americanos”(Rodrigues,1981,p.370)
Marcos Del Royo diz que “...a definição
pela linha insurrecional associada à
política de frentes populares, foi
apresentada provavelmente em reunião
do comitê “anti-mil” da
Internacional comunista com parte da delegação
brasileira, prevalecendo a hipótese
de que a insurreição se daria
no primeiro semestre de l936”(Del
Royo,1990,p.274)
No entanto, mesmo considerando a importância
dessa reunião, não se pode
simplesmente reduzir a insurreição
de l935 a uma decisão da cúpula
da III internacional comunista. Prestes
ao se referir a esta questão diz,
“A versão oficial é
de que o levante de 35 foi preparado no
VII Congresso da IC, o que não é
verdade. Não houve nenhuma orientação
de Moscou para que a insurreição
acontecesse. A responsabilidade é
do nosso Partido e do secretário-geral,
Miranda, que transmitia informações
falsas sobre o que estava acontecendo”(Moraes
e Viana, l982, p.59). Embora houvesse inegavelmente
uma preparação para levantes
em unidades militares e certamente com o
conhecimento da Internacional(que inclusive
envia alguns assessores) Prestes tem razão
em atribuir a responsabilidade ao partido
comunista do Brasil e o caso da insurreição
do 21 BC em Natal, que desencadeará
os levantes de Recife e Rio de Janeiro em
novembro de l935, ilustra isso: foi , como
demonstraremos, de responsabilidade da direção
do partido comunista em Natal, levando em
conta determinadas particularidades locais.
6. No início de l935, o partido comunista
discute a formação de uma
ampla aliança pela libertação
nacional, incluindo operários, camponeses,
a pequena burguesia e setores da burguesia
nacional que estivessem dispostas a apoiar
a luta anti-imperialista. É uma modificação
importante, na medida em que até
então o partido se caracterizava
pelo sectarismo e, consequentemente, pelo
isolamento.
Em fevereiro de l935 é lançado
um manifesto-programa do que ficou denominado
Aliança Nacional Libertadora. Em
março o estatuto é aprovado
e eleita uma direção nacional
provisória É lançada
publicamente no dia 30, no teatro João
Caetano, Rio de Janeiro, sendo Luiz Carlos
Prestes ( então exilado em Moscou),
escolhido seu presidente de Honra.
A formação, o crescimento
e a ilegalidade da ANL em julho de l935
são aspectos importantes para compreender
a insurreição de l935. Em
primeiro lugar se é possível
afirmar que ela surge sob influência
do partido comunista, não se pode
reduzir a ele. Como diz Wilson Montagna
“... a ANL não se constitui
numa criação do PCB com a
finalidade de arregimentar massas e facção
militar descontente para promover uma insurreição
teoricamente comandada pela internacional
comunista e sim como uma frente única
criada por personalidades de expressão
social, tanto civis como militares e que
abrigava várias organizações
políticas da oposição,
incluindo o PCB”(Montagna,1988, apresentação)
A ANL tem uma grande crescimento no país.
Seu presidente Hercolino Cascardo, era capitão
da Marinha e havia sido interventor no Rio
Grande do Norte, no período de julho
de l931 a julho de 1932. Embora a organização
da ANL em núcleos pelo Brasil tenha
se diferenciado por região(no Rio
Grande do Norte, por exemplo, atacava duramente
as oligarquias estaduais, enquanto no Rio
de Janeiro dava-se ênfase as liberdades
civis e em São Paulo a uma maior
atuação na área sindical)
é possível afirmar, pelos
dados disponíveis, que congregava
basicamente as camadas médias urbanas.
Seu programa propunha uma luta anti-fascista,
anti-imperialista e anti-latifundiária,
frisando que as medidas devem se manter
dentro dos limites do modo de produção
capitalista “... o governo nacional
popular revolucionário não
significa a liquidação da
propriedade privada dos meios de produção,
nem tomará as fábricas, ou
seja, não propõe a liquidação
da propriedade privada dos meios de produção,
mas de liquidar o feudalismo e a escravidão”
e apresenta 5 pontos básicos: a nacionalização
das empresas estrangeiras; a anulação
de todos os débitos às nações
imperialistas; liberdades públicas;
distribuição das propriedades
feudais entre os camponeses e proteção
ao pequeno e médio proprietário
e finalmente o direito ao governo popular.
Quanto ao partido comunista, Montagna vai
argumentar que a partir da adesão
de Prestes e da reunião do Plenun
do comitê central do PC do B na segunda
quinzena de maio de l934, a cúpula
do partido , com Prestes à frente,
iniciam um “tour de force”para
impulsionar a ANL em direção
à radicalização e à
luta armada “com a entrada de Prestes
no PC do B, mudando sua atuação,
passa, junto com sua cúpula e os
assessores enviados pela IC, a tramar as
ocultas da ANL e das próprias bases
do PCB , uma insurreição visando
derrubar o governo Vargas, que não
constava nos designios da Frente Única”(Montagna,1988,
p.107)
Realmente a leitura dos documentos da ANL
mostram claramente que não se colocava
a questão da luta armada. Quando
é divulgado o manifesto em que Prestes
anuncia publicamente sua adesão à
ANL(05 de julho de l935 - não por
acaso na data comemorativa da primeira revolta
tenentista, em l922), ao mesmo tempo que
dará a Getulio Vargas o pretexto
para usar a nova lei de Segurança
Nacional(decreto n.299 de 04 de abril de
l935), colocando-a na ilegalidade, evidencia
um aspecto que não estava presente
nos documentos anteriores da ANL: a perspectiva
insurrecional. A ANL é apresentada
como continuação direta do
tenentismo dos anos l920 “soam os
canhões de l922”diz o manifesto
no seu início e termina conclamando
à revolta armada com palavras de
ordens como “todo poder a ANL”.
Ou seja, ao mesmo tempo que deu um pretexto
a Vargas(em apenas 3 meses a ANL já
tinha cerca de 100 mil filiados em todo
o país) a perspectiva da constituição
de uma frente ampla vai se incompatibilizar
com os propósitos insurrecionais
do Prestes e da cúpula do partido
comunista.Para Montagna “este manifesto
foi gestado e assinado com o intuito e fechar
a ANL, porque este frente única estava
atrapalhando os designios da cúpula
do PC , de Prestes (...) em virtude da ampla
aceitação pela massas urbanas
da sua política nacionalista de alianças
de classes e reformas sociais e políticas”(Montagna,1985,
p.110)
Quando Prestes retorna clandestinamente
ao Brasil em l935 a fim de preparar o levante,
os indicativos de que se trata de uma insurreição
com caráter eminentemente militar,
ficam expressos nos contatos com seus velhos
companheiros militares(Silo Meireles, Agildo
Barata, Otacilio Alves, Trifino Correia,Agliberto
Vieira de Azevedo, Sócrates Gonçalves
da Silva,etc) com quem irá contar
e que terão um papel fundamental
na preparação da insurreição
militar de l935(é preciso destacar
que, desde o início, os tenentes
que articulam as rebeliões e dela
participam são minoritários
entre os próprios tenentes e houve
pelo menos três grupos distintos:
parte participa do movimento de outubro
de l930 e se integra ao aparelho do Estado
assumindo diversas interventorias, outra
parte adere ao integralismo(em escala bem
menor) e sua ala mais radical, minoritária,
adere ao partido comunista, em especial
com a entrada de Prestes no partido em agosto
de l934.)
Nota
6
- A bibliografia publicada sobre esse período
é relativamente grande. Além
dos autores já citados, podemos destacar
: Eliezer Pacheco “O partido comunista
brasileiro(1922-1964),São Paulo,Alfa
Ômega, 1987; Moisés Vinhas
“O partidão: a luta por um
partido de massas - l922-1974”,São
Paulo, Hucitec, 1982; José Antonio
Segatto “Breve história do
PCB”, São Paulo, Editora Ciências
Humanas, 1981 ; John Foster Dulles”Anarquistas
e comunistas no Brasil”(1900-l935),
Rio e Janeiro, Nova Fronteira, 1979 ; Heitor
Ferreira “Caminhos Percorridos”,
São Paulo, Alfa Ômega,1987
e Edgar Carone “O PCB :1922 a 1943”,São
Paulo, Difel, 1982.
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