Tecido
Social
Correio Eletrônico da Rede Estadual de Direitos Humanos
- RN
N.
020 – 11/02/04
BARBÁRIE ANUNCIADA
Texto do OPINIO IURIS - Instituto de Pesquisas Jurídicas sobre o assassinato
dos fiscais do Ministério do Trabalho
Nós
do OPINIO IURIS - Instituto de Pesquisas Jurídicas, sociedade
civil que reúne advogados, juízes, procuradores, funcionários
e operadores do Direito em geral, consternados pelos trágicos
acontecimentos que enlutaram, não apenas as famílias, mas toda
a comunidade funcional e jurídica do país, vimos de público
manifestar nossa profunda indignação e revolta com
o duplo crime hediondo perpetrado por senhores escravagistas
de Unaí .
Como
referiu o Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Ministro
Francisco Fausto, o bárbaro assassinato dos bravos funcionários
do Ministério do Trabalho veio comprovar o cometimento do outro
crime: o de manter trabalhadores escravizados.
Exigimos
das autoridades constituídas, fazendo coro com outras entidades
que já se manifestaram nesse sentido, a apuração
urgente e inadiável da autoria do crime e a exemplar
punição dos culpados, sejam executantes, sejam, principalmente,
mandantes. Embora a presença do Presidente da República em exercício
e de dois Ministros de Estado e uma Comissão do Congresso Nacional
e o empenho pessoal a respeito assumido pelo Presidente LUIS INÁCIO
DA SILVA temos, nós do OPINIO IURIS, motivos muito fortes para
recordar que a impunidade contra esta espécie de criminosos
somente perpetua a constante ameaça que representam para a sociedade
brasileira: o advogado PAULO FONTELES, do Pará, exemplo de dignidade
profissional e humana, defensor dos posseiros daquela região
e verdadeiro patrono de nosso INSTITUTO, foi assassinado brutalmente
há mais de 20 anos. Hoje seu filho, advogado PAULO FONTELES
JÚNIOR está ameaçado de morte pelos mesmos mandantes e assassinos
de seu pai, que continuam livres e impunes!
Também
exigimos que as autoridades federais e estaduais cumpram a promessa
de proteção policial permanente para os funcionários que desempenham
tarefa tão árdua e perigosa, como ressaltou o Presidente em
Exercício José Alencar. Os funcionários atingidos já haviam
sido ameaçados de morte e mesmo assim não contaram com a proteção
policial necessária. Não foi dada a devida importância para
as ameaças. Subestimou-se o fato inegável de que a certeza da impunidade torna esses bandidos tão audazes
quanto covardes para, escondendo-se de trás de jagunços e de
tocaias, tirarem a vida de quem, no estrito cumprimento do dever
funcional, tentava coibir o outro crime por eles praticado.
No
entanto, as vidas de NELSON
JOSÉ DA SILVA, JOÃO BATISTA SOARES LAGE,
ERASTÓSTENES DE ALMEIDA GONÇALVEZ E AILTON PEREIRA DE
OLIVEIRA, assim como a vida de centenas de trabalhadores
anônimos que são mortos diariamente ao tentarem fugir da escravidão,
devem constituir sementes para continuarmos, agora com maior
tenacidade e desassombro, a luta contra esse crime inominável
que é a escravização de trabalhadores em pleno século XXI. Concordamos,
mais uma vez, com o Ministro FRANCISCO FAUSTO
quando afirma que a única forma eficiente de acabar com
essa mácula vexatória em nosso país é a aprovação - o mais urgente
possível - do Projeto de Emenda Constitucional que determina
o confisco das terras dos escravagistas, além da alteração da
Lei 10.803/03 que tipificou
o crime de trabalho escravo, instituindo pena pouco maior do
que a aplicada anteriormente, para que este crime seja capitulado
entre os crimes hediondos, com as conseqüências daí advindas.
Não
podemos, também, deixar
de registrar, com MAURO SANTAYANA, que o trágico episódio que
ceifou a vida dos funcionários da DRT mineira implica
mais uma seqüela do desmantelamento das instituições
políticas, promovido em favor do mercado. Criou-se - diz SANTAYANA com propriedade
-, em nome do liberalismo
econômico, a falsa idéia de que o Estado é desnecessário, e
deve intervir o mínimo na vida das pessoas.
As
ditas leis de
mercado jamais promulgadas por nenhum legislador,
são as que em sua hipertrofia inumana do laissez faire acabam privilegiando e garantindo a impunidade daqueles que, para
valer-se delas violentam todas as leis: os que procuram
assegurar-se e apropriar-se de gigantescos benefícios
pessoais e setoriais mediante ‘ negócios’ que possibilitem ganhos ilícitos, tais como
os provenientes do tráfico de drogas, do comércio de
armas ou da exploração do trabalho em condições de escravidão
ou servidão.
Investigar
e castigar estes assassinos organizados é uma parte,
hoje indispensável, de uma luta estatal e social a fundo
contra as ‘máfias’ pois é tão mafioso este crime, como
o é a evidente organização criminosa daqueles que ajustaram
decidi-lo, organizá-lo ou executá-lo. |
E quando assistimos setores organizados dos próprios
trabalhadores propondo fortalecer a negociação coletiva e enfraquecer
a intervenção estatal, quer seja da lei, quer seja da JUSTIÇA,
num país onde se pratica, ainda, trabalho escravo e se assassina
quem a tanto se opõe e - institucionalmente - combate, pode-se
verificar quão ilusória é a idéia de liberdade e autonomia dos
trabalhadores a ponto de dispensar a intervenção estatal, em
condições de liberalismo econômico de forma tão intensa, como
a que vivemos em nosso país.
Não é demais recordar - em momentos como estes - a máxima
do Abade LACORDAIRE: “entre o fraco e o forte, entre o rico e o pobre,
entre o patrão e o empregado (e acrescentaríamos,
com vergonha, no caso do nosso país, entre os escravos e os
senhores de escravos),
é a lei que liberta, é a liberdade que escraviza”.
Antônia Mara Vieira Loguercio
Juíza
do Trabalho, Presidente pelo OPINIO
IURIS - Instituto de Pesquidas Jurídicas
Veja
também:
- (IN)JUSTIÇA. O Tribunal
de Justiça do RN negou o recurso contra o desaforamento
do julgamento dos assassinos de Gilson Nogueira de Macaíba
para Natal
- O julgamento dos assassinos
de Gilson Nogueira: histórico de uma farsa
<
Voltar
|