AO CONSELHO
PENITENCIÁRIO FEDERAL
(Cópia
de Documento enviado à Direção da Penitenciária Professor Barreto
Campelo, à Superintendência do Sistema Penitenciário de Pernambuco,
à Auditoria da 7ª CRM, ao Secretários do Interior e Justiça do
Estado de Pernambuco.
1.
Depois de (13) meses na Penitenciaria Professor Barreto
Campelo, constatamos o acúmulo e o agravamento de problemas no
âmbito das condições materiais e o crescente desgaste no relacionamento
com a Direção e elementos isolados da guarda, repercutindo tudo
isso do forma aguda no plano psicológico e caracterizando uma
situação geral de dificuldades e tensão.
2.
O Documento que lhe enviamos em dezembro de 1973, o texto
complementar de janeiro e o Quadro da Situação de Saúde dão uma idéia
aproximada sobre nossas condições carcerárias e as melhorias que
pleiteamos, ao mesmo tempo em que constitui uma síntese do que temos
colocado parceladamente ao exame da Administração da Penitenciária,
da Superintendência do Sistema Penitenciário e da Auditoria. Mesmo
assim apresentamos de forma sintomática o conjunto das nossas
reivindicações, a fim de que se conheça e se avalie seus fundamentos,
sua justeza e se alcance, eliminando-se também
as possibilidades de suposições irreais sobre as mesmas e as
condições do seu atendimento. No período mencionado, vimos
reivindicando. Por meios do requerimentos específicos ou colocações
verbais, sempre que fomos recebidos em audiência: ampliação do espaço
onde estamos recolhidos (22) vinte e duas horas por dia; melhora da
alimentação; tratamento médico aos necessitados; tratamento dentário
que inclua obturações; autorização a entrada de ferramentas que
possibilitem desenvolver o artesanato, resguardando-se o controle da
Penitenciaria sobre as mesmas; acesso aos setores Jurídicos e de Assistência
Social da Penitenciária; acesso a livros que sejam vendidas legalmente
no Pais; banho de sol pela manhã; fornecimento de material de higiene
para a limpeza das celas e do pavilhão onde nos localizamos; ampliação
da lavagem de roupas pela Lavanderia, incluindo um mínimo de peças do
vestuário; prática de esportes três vezes por semana; transferência
da visita do sábado para o domingo; observância do dispositivo da Lei
de Custódia que estabelece o direito a visita dos pais, irmãos; cônjuge
e filhos, durante a semana, no horário normal do expediente,
ressalvando-se nossa disposição de utilizá-lo apenas em situações
excepcionais; acesso a mais algumas mesas e – principalmente –
cadeiras, adquiridas por nós; acesso a um refrigerador para a nossa
disposição por familiares; determinações sobre aspectos rotineiros
da nossa vida carcerária serem dadas por escrito aos escalões
subordinados; concessão de audiência por parte da Direção da
Penitenciária a representantes nossos; resposta aos documentos que
enviamos sobre questões que nos atingem; clareza sobre nível hierárquico
responsável por sanções aplicadas sobre o conjunto dos presos políticos
e razões que as determinaram; transporte em veículos que não
sejam os furgões fechados.
Essas
reivindicações encontram inquestionáveis e explícitos fundamento
no Regulamento Penitenciário do Estado (acesso aos Setores jurídico
e de assistência social, concessão de audiências, esclarecimento
das sanções; na Lei de Custódia dos: Presos Políticos (acesso
a médico particular, alimentação e alojamento dignos; visitas
durante a semana, recreio, transporte em veículos diferentes dos
utilizados pelos presos de delito comum); na tradição da nossa
vida carcerária, desde três ou quatro anos, ainda sob a Casa de
Detenção do Recife (fornecimento de material do higiene, lavagem
de peças de vestuário, esporte diário no banho de sol matutino,
acesso às cadeiras em nível suficiente, preparação por nós da
nossa própria alimentação, visitas no meio da semana) – finalmente,
outras que não se encontram explicitadas em dispositivos legais,
pela sua simplicidade ou especificidade, mas não os encontrariam
e se legitimam pelo senso comum.
3.
Em meio a toda essa situação de dificuldades. Pleitos
reiterados e providências estacionárias, surgiu mais recentemente um
novo fator que lhe acrescenta ingredientes Kafianos e dramáticos.
Se
no documento enviado a V. Excia. em dezembro de 1973 assinalávamos
os constantes, inexplicáveis e longas interrupções” no diálogo com
a direção da Penitenciária, por sua iniciativa, hoje, quando nossos
problemas passaram a nível de Secretaria de Estado, atingiram o Ministério
da Justiça, o Parlamento, a Imprensa, constatamos a passagem às
atitudes de endurecimento e ao desgaste, evidenciados no silêncio ante
pedidos de audiência e prática sistemática de não responder às
questões que formulamos por escrito, em termos inatacáveis; na aplicação
de restrições como a tomada dos nosso jogos de dominó e War; na
negativa em solucionar problemas ínfimos como acreditamos seja o do
fornecimento do material de higiene, quando sabemos que somos os únicos
presos na Penitenciária a arcar com tal ônus. Dentro de tal clima –
para dar só dois exemplos entre vários – numa ocasião é cortado
nosso banho de sol sem explicações; noutra, são-nos comunicadas e
aplicadas restrições como a redução de duas compras por dia para
uma, na cantina. da Penitenciária, e o retardo por meia-hora na entrada
das nossas visitas, durante o expediente da tarde. No da seguinte,
constata-se porém a volta ao sistema de duas compras diárias e a
inexistência do corte de meia-hora nas visitas Subsequentes, Sem que se
saiba das razões e procedência das medidas anteriores – se foram
conhecimento da Direção ou forjadas por indivíduos isolados. Imagine-se
o clima de incerteza e de irritação gerado por situações
semelhantes, que vem se tornando para nós uma espécie de pão de cada
dia. Mais grave, no entanto, foram atitudes de clara provocação por
parte de elementos isolados da guarda, com intuito de nos levar
ao descontrole e justificar atitudes de agressão e até de eliminação,
conforme se expressou em ameaças, ante as quais protestamos no momento
diante do Chefe de Disciplina e as vistas do Diretor, esclarecendo a
fonte do problema, reafirmando nosso interesse de tratar a todos
respeitosamente e sermos correspondidos; Posteriormente, dirigimo-nos
por escrito a Direção, a Auditoria e a SUSIPE – desde que não
tivemos respondido nem atendido pedido de audiência – solicitando
providencias que assegurassem a nossa integridade física e nossa vida e
contornassem a disseminação de um clima de atrito que não nos
interessa nem é fomentado por nós. Até agora, não recebemos nenhuma
resposta desses órgãos a respeito do assunto e acreditamos que a
origem da disposição provocativa mencionada reside no fato de, por
duas oportunidades, termos nos manifestado contra espancamentos
aplicados diante de nós a presos de delito comum – tratamento que, além
de desumano, não encontra fundamentos no Regulamento Penitenciário do
Estado e constitui ilegalidade evidente.
O
conjunto dos fatos enumerados configura uma situação de impasse
onde predomina a corrosão e o esmagamento das nossas aspirações
mínimas ao estabelecimento de uma situação compatível com nossa
dignidade e nossos direitos. Sentimo-nos arrastados a uma política
de beira de abismo, submetidos a testes de resistência e equilíbrio
num clima onde os ânimos se põem constantemente a flor da Pele.
4.
Por último, nesta nova oportunidade onde Pleiteamos a adoção
por parte das autoridades competentes de medidas que nos assegurem
uma sobrevivência carcerária aceitável e estável, fazemos ressaltar
os seguintes aspectos: a Superação da fase de implantação administrativa
desta Penitenciária e dos contatos iniciais com os presos políticos;
o conhecimento em detalhe de todos os nossos problemas, dado pelos
Documentos que temos enviado às autoridades Penitenciárias; o
fundamento legal das nossas reivindicações (art. 76 da Nova Lei
de Segurança Nacional; art. 62 do Código de Processo Penal Militar;
Decreto-Lei n.º 38016, de 5/10/55, em vigor; Regulamento Penitenciário
do Estado); os pronunciamentos de V. Excia: “conjugação de técnica
e humanismo” e “dar aos detentos um tratamento condizente com
a pessoa humana”; a imensa maioria, entre, nós, de pessoas que
já contam com vários anos de prisão; a predominância entre 34
presos políticos de penas elevadíssimas. Que excluindo-se quatorze
companheiros ainda não condenados e as quatro prisões perpétuas
(duas delas aplicadas a uma mesma pessoa) somam 781 anos; o nosso
sistema mais rígido de prisão, sem circularmos na área da Penitenciária
– ao contrário dos outros presos –, permanecendo vinte e duas
(22) por dia isolados no espaço estrangulado do Pavilhão; os 13
meses de dificuldades materiais e o desgaste psicológico que pesam
sobre nossa vida; o particular estado de tensão do momento.
Subscrevemo-nos
atenciosamente
Itamaracá,
de de 1974.