SECRETARIA
DA JUSTIÇA
ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA DO ESTADO - AJE
Ilmo. Sr.
Ouvidor Geral
Dr. Frederico Barbosa
Secretaria da Justiça
Sr. Ouvidor,
Antes de me pronunciar sobre o objeto deste Processo, conforme
determinou Vossa Senhoria, peço vênia para homenagear todas
as prostitutas assumidas, caçadoras do amor/prazer, e professoras
dos nossos antepassados e de grande parte dos nossos descendentes,
porque já enfrentam a competição sexual com um grupo grande
das "patricinhas".
Se essas mulheres corajosas buscam seus clientes, no centro
da cidade, é porque a "sociedade" expulsou-as do
"habitat" delas, a zona boêmia do Recife Velho,
território de Maria Maga, Judite, Vanda, Quina, Anunciada,
Tina e metamorfosearam em Recife Antigo onde mulheres sérias
e prostitutas enrustidas se divertem.
A Interessada esqueceu de falar no tráfico sexual em Boa Viagem,
onde numa atitude imoral, menores também desnudadas se oferecem
aos turistas, em frente aos hotéis cinco estrelas, numa frequência
ativa e progressiva dando margem ao turismo sexual, para prática
comercial do sexo e o uso de drogas.
Costumo passar pelas meninas que borboleteiam pelo centro
da cidade, carentes do físico e da alma, e observo que estão
muito mais bem vestidas, do que as donzelas que exibem as
partes pudendas, com os biquinis fio dental, nos bairros classe
"A" do Recife.
Quanto aos homossexuais, desde que sejam de maior idade, e
não sejam agressivos, podem e devem optar como exercer sua
sexualidade, escolher o que lhe completa e como ser feliz.
O Código Penal não pune a prostituição, o "trotoir",
se refere em seus artigos 214, 227, 228, 229 e outros a mediação,
casa de prostituição, favorecimento de prostituição.
As meninas que não sabemos se choram ou riem, porque não podemos
ver através da máscara da face, como diz o poeta Raimundo
Correia: "então piedade nos causasse".
Repudio o sistema cruel em que vivemos, onde há prostitutas
exploradas, porque falta à nossa infância carente de educação,
saúde e alimentação.
Onde estão os órgãos assistenciais que não apontam uma solução
para essas garotas que se dão por inteiro e por dinheiro,
sem preconceito. Alfabetizá-las, jornada de trabalho remunerada,
assistência a saúde etc.
Se faz necessária a conscientização dessas meninas, para fundarem
associação e sindicato, a fim de se protegerem da senha dos
fanáticos, como já existe no mundo civilizado: países como
a Holanda, Dinamarca, Suécia e tantos outros, vêm há anos
banindo o "preconceito", idéia formada através dos
ditames do juízo de valor normativo, que empobrece a ausência
humana; tendo como única meta o bem-estar do cidadão e o equilíbrio
de forças que devem existir no organismo social, sobre a orientação
maior do Estado em prol da cidadania e não como um juiz onipotente
que agracia uns poucos e fulmina outros tantos.
Teremos que fornecer algumas definições sempre tão importantes
na delimitação do conflito que move este processo:
1 - O que é uma
prostituta?
2 - O que é Ética?
3 - O que é Moral?
1 - Segundo o dicionário,
PROSTITUTA é: "do latim prostituta ou meretrice, mulher
que pratica o ato sexual por dinheiro", tendo ainda alguns
sinônimos na cultura popular bofe, boi, bruaca, bucho, fubana,
jereba, madama, marafaia, quenga rascoa etc. (Ferreira Aurélio,
pág. 1121). Como podemos verificar todas as definições são
limitadas no tocante ao Elan vital (causa primeira) o ponto
mestre de nossa questão, pois tratamos a subjetividade humana,
riquíssima em si, e não a objetividade palavra fria que mata
as madalenas dos fins do século XX; Cristo tratou essa questão
de forma mais coerente, fato registrado nas sagradas escrituras,
em Lucas 7:36-50 com o sub-título "A pecadora perdoada":
quando o fariseu que o havia convidado a comer com ele, repreendeu
Jesus por ter aceito que a proscrita social lavasse seus pés
com suas lágrimas, e os enxugasse com seus cabelos, os cobrindo
de beijos e ungindo com perfume, Cristo respondeu: "Vês
esta mulher? Entrei em tua casa e não me derramaste água nos
meus pés; ela, ao contrário, regou-me os pés com lágrimas
e enxugou-os com seus cabelos. Não me deste um ósculo; ela,
porém desde que eu entrei, não parou de cobrir-me os pés com
perfuma. Por essa razão, eu te digo seus numerosos lhe estão
perdoados, porque ela demonstrou muito amor, mas aquele a
quem pouco foi perdoado mostra pouco amor..."
o que nos parece o Príncipe da Luz dava mais valor à ação
expressa pelo coração do que o conceito formado pelos costumes
de uma determinada época histórica.
A palavra "costume" nos reporta à nossa segunda
pergunta:
- O que é Ética?
Do grego "ethike", de ethikós diz respeito aos costumes
segundo o cientista social (Revista Veja, 19.05.99, pág. 164)
Max Weber a Ética de convicção e a Ética de responsabilidade;
a primeira explicação sobre Ética de convicção "que é
baseada num princípio e só nele" o sujeito da ação se
deve guiar, desta maneira o princípio eleito é não desprovir
a prostituta de sua dimensão humano-social e com isso não
ferir a dignidade da cidadania garantida pela Carta Maior
no tocante do ir e vir, na expressão plena das liberdades
individuais.
Ética é uma construção pessoal forjada no seio da "sagrada
família" durante o desenvolvimento psicossexual que se
espera que todos tenham acesso igualmente perante a lei, é
pena que nem todos vivenciem este "conto de fadas",
o que não invalida a opção do outro, pois isso também é Ética
que a democracia nos garante.
Finalmente chegamos à terceira pergunta:
- O que é Moral?
- Do latim "moralis" que significa costumes. Moral
é um sistema "fechado" de valores, normas, princípios
de uma época histórica e por isso mesmo legaliza o "status
quo" de uma minoria neurotizada que prima pelo privilégio
em detrimento ao Direito de igualdade de todos perante ao
Estado. A tão declamada moral é relativa sempre que fere os
princípios econômicos de um determinado sistema de produção,
se movendo e mudando não só para o interesse do sujeito, e
sim, pela função exigida no tempo histórico, neste tocante
as prostitutas, desempenham seu trágico papel na trama social;
ainda citando Cristo em Mateus 22:37 a 40vv em especial nos
versículos 38 e 39 onde o amor é colocado primeiro ao Senhor
Deus e ao "próximo como a ti mesmo em tão sublime ato
de desprendimento das paixões humanas que cega o bom senso
e nos tenta seduzir para um tribunal onde só existe uma palavra,
louca palavra da injúria, da injustiça, onde a moeda que tenta
nos ser imposta, é a moeda de uma única face tendo como preço
o ostracismo que contraria o direito à vida, à liberdade e
à fraternidade.
A denunciante, a Sra. Maria Eugênia Gaitte desconhece os direitos
fundamentais do humano, mesmo quando esse humano é apenas
gerado em sua miopia social que nega a complexa rede que gera
sintomas, nesse caso a prostituição.
SUGIRO:
- que a Delegacia de Costumes não seja envolvida, neste caso,
por não se encontrar devidamente equipada, e ter a ótica distorcida
sobre a prostituição.
- que este processo seja arquivado por falta de objeto.
A consideração superior,
Mércia de Albuquerque
Ferreira
Defensora Pública - PE